quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Fusões e aquisições: administradores pressionados a não resistir a hostilidades

O fato de os raiders ( * vide nota de rodapé ) conseguirem todo o dinheiro de que necessitam não explica por que os acionistas se associam a ele para aquisição hostil, fusão ou liquidação da empresa que possuem.

Existem provas abundantes de que eles não agem assim porque acreditam que a aquisição possa vir a ser benéfica para a empresa. Pelo contrário, os acionistas têm clareza de que a proposta de aquisição hostil geralmente é um desastre para a empresa. Cada vez mais, os acionistas vendem suas ações para o raider ( * vide nota de rodapé ) somente se forem pagos em dinheiro, isto é, se abandonarem a empresa e não tiverem mais nada a ver com ela. Ou, se aceitarem em troca valores mobiliários, eles os passam adiante imediatamente. E, outra vez e mais outra, os acionistas, em sua maioria, ou aceitam a proposta do raider ( * vide nota de rodapé ) ou a recusam, mas apenas se um cavaleiro branco ( *2 vide nota de rodapé ) fizer uma proposta melhor que a do raider ( * vide nota de rodapé ). contudo, vendem imediatamente o que quer que o cavaleiro branco ( *2 vide nota de rodapé ) lhes tenha oferecido em troca de suas ações da empresa que acabou de desaparecer.

Os acionistas que controlam as grandes empresas com ações negociadas em bolsa de valores ( listadas ) não têm outra opção que não seja aceitar a oferta do raider ( * vide nota de rodapé ). Eles são forçados, talvez até legalmente forçados, a aceitar a proposta do raider ( * vide nota de rodapé ) se ela for mais alta que o valor corrente de suas ações. Este é essencialmente o resultado da mudança de propriedade das ações, de indivíduos para instituições que são garantidoras e especialmente, para fundos de pensão. Os fundos de pensão ( e crescentemente também os fundos mútuos ) são os proprietários legais das empresas de capital aberto ( listadas ) dos Estados Unidos da América ( EUA ), chegando a possuir cerda de cinquenta por cento de suas ações ordinárias. O percentual é ainda maior no caso de grandes empresas porque os proprietários institucionais se concentram nelas. As pessoas que administram estas enormes e crescentes agregações de capital, especialmente os gerentes dos fundos de pensão, são agregações de capital, especialmente os gerentes dos fundos de pensão, são administradores, e não os proprietários. Eles são administradores tanto para a administração das empresas que irão pagar pensão a seus funcionários quanto para os principais beneficiários, os próprios empregados e futuros pensionista. Entretanto, como administradores, eles têm muito poucas opções sobre se desejam vender suas ações caso alguém ofereça um preço substancialmente acima daquele que seria arrecadado se fossem oferecidas a preço de mercado. Eles têm de aceitar a oferta. Se disserem não, estarão expostos a uma enorme e não garantida responsabilidade. Os administradores podem ser processados tanto pela direção da empresa quanto pelos maiores beneficiários, os empregados, se seis meses mais tarde, aquelas ações estiverem cotadas abaixo do preço oferecido pelo raider ( * vide nota de rodapé ). Os administradores não têm o direito de sobrepor seu julgamento qo que uma pessoa prudente faria. E uma pessoa prudente certamente optaria pelo pássaro na mão, especialmente se não houver razão para acreditar que exitam dois voando.

Os administradores de fundos de pensão também ficam sob imensa pressão para apresentar resultados acima da média - entretanto, são incapazes de apresentar um desempenho deste tipo como regra. Os fundos de pensão da maioria das empresas norte-americanas são de planos de benefícios definidos: a empresa se compromete a pagar ao empregado , quando ele se aposenta, uma proporção fixa de seu salário, geralmente cerca de sessenta por cento dos rendimentos dos últimos cinco anos. O valor que o empregado erá receber é fixo, ou melhor, será fixado no momento em que ele se aposentar. Contudo, a contribuição da empresa é flexível. Esta contribuição diminui se o fundo de pensão aumenta de valor - se, por exemplo, houver um alto retorno ou lucro de seus investimentos. Se o fundo de pensão não tiver lucro ou se os lucros forem menores que o esperado, a contribuição da empresa aumenta.

Isto contrasta fortemente com planos baseados em uma contribuição definida, segundo os quais o valor que a empresa paga todos os anos é fixo. Quando se aposenta, o empregado recebe um estipêndio fixo ou variável, que depende dos lucros auferidos pelo plano de pensão.

No plano de benefício definido, portanto, a administração pressiona constantemente o gerente do fundo de pensão para que ele apresente lucros, especialmente a partir de investimentos, de fora que a contribuição da empresa possa ser minimizada. Mas isto é uma ilusão total; na verdade, uma impossibilidade. A esta altura, os fundos de pensão são o mercado de ações dos EUA. E, se é o mercado, não há possibilidade de ser vencido.

O histórico de desempenho dos fundos de pensão prova isto: tem sido, quasse sem exceção, desastroso. Na verdade, o desejo de superar o mercado é, em si próprio, a razão pela qual a maioria dos fundos de pensão teve um desempenho substancialmente pior que o do mercado. Em consequência, os fundos de pensão desperdiçam sua substância ao apoiar um gigantesco mercado de ações que malbarata, em forma de comissões, o dinheiro que deveria ser destinado aos futuros beneficiários. Na longa história, cheia de altos e baixos, do mercado financeiro e de investimentos, dificilmente existirá um registro mais consistentemente desanimador que o da administração de fundos de pensão norte-americanos nos últimos sessenta anos.

No entanto, a administração das empresas ainda acredita que seus fundos de pensão possam vencer a lei das probabilidades - da mesma forma que um apostador dos cassinos de Las Vegas, diante de uma máquina caça-níqueis, acredita que possa ganhar. E o administrador do fundo de pensão, que não atua no curto prazo e que se recusa a especular, negociar e mostrar resultados nos três meses seguintes, provavelmente perderá esta conta rapidamente. É provável que não exista uma indústria mais competitiva do que esta. E, assim, uma oferta, formulada por um raider ( * vide nota de rodapé ), de pagar cinquenta e cinco dólares por uma ação que está cotada a quarenta dólares no mercado torna-se irresistível.

Os administradores de fundos de pensão sabem que a proposta do raider ( * vide nota de rodapé ) é deletéria para a empresa cujas ações são de sua propriedade. Mas eles não podem considerar o bem-estar e os interesses de sua propriedade. Eles não são os donos. Eles são, por necessidade, especuladores, embora estejam legalmente investidos do poder dos verdadeiros donos. E, portanto, eles se comportam como especuladores. Eles têm de aceitar a proposta do raider ( * vide nota de rodapé ), a não ser que um cavaleiro branco ( *2 vide nota de rodapé ) faça uma oferta mais vantajosa. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração de autoria de Peter F. Drucker.

P.S.:

Notas de rodapé:

* O conceito da expressão raider do mercado de ações é melhor introduzido em

https://administradores.com.br/artigos/fus%C3%B5es-e-aquisi%C3%A7%C3%B5es-raiders-eles-n%C3%A3o-d%C3%A3o-f%C3%A9rias-para-os-seus-p%C3%A9s .
*2 : o conceito da expressão cavaleiro branco do mercado de ações é melhor introduzido em 

https://administradores.com.br/artigos/fus%C3%B5es-e-aquisi%C3%A7%C3%B5es-raiders-eles-n%C3%A3o-d%C3%A3o-f%C3%A9rias-para-os-seus-p%C3%A9s .

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/fus%C3%B5es-e-aquisi%C3%A7%C3%B5es-administradores-pressionados-a-n%C3%A3o-resistir-a-hostilidades .

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Fusões e aquisições: a origem do dinheiro que financia a hostilidade

A vulnerabilidade das vítimas não explica, por si só, como os raiders ( * vide nota de rodapé ) financiam sua compra. Para montar uma proposta de aquisição hostil de uma grande empresa, é preciso ter um cofre gigantesco. O mínimo de que se necessita para atacar uma empresa de grande porte é um bilhão e meio de dólares. Em alguns casos recentes, este valor chegou a quatro bilhões de dólares. E, como regra, deve ser em dinheiro. Certamente, se a proposta for bem-sucedida, então a empresa-alvo paga. Mas o dinheiro deve estar disponível desde o princípio, isto é, quando ainda não se tem certeza de que a proposta terá sucesso. Se a proposta for aceita por um indivíduo, como tem sido cada vez mais frequente nos últimos anos, geralmente não haverá qualquer garantia pela soma que o raider ( * vide nota de rodapé ) deve pegar emprestado. O raider ( * vide nota de rodapé ), em si, geralmente não possui ativos significativos, principalmente se comparados aos valores necessários. Mesmo que a proposta de aquisição hostil esteja sendo efetuada por outra grande empresa, a quantia necessária para o financiamento vai geralmente muito além do que o raider ( * vide nota de rodapé ) poderia levantar com uma dívida adicional. Apesar disto, a única garantia pelo empréstimo que um raider ( * vide nota de rodapé ) deve obter é sua promessa de que devolverá o dinheiro caso a proposta tenha êxito. Isto dificilmente poderia ser considerado o que no passado se chamava de empréstimo bancável. Contudo, os raiders ( * vide nota de rodapé ) nunca tiveram dificuldade para obter este dinheiro. Na verdade, quando o método de financiamento das propostas de aquisições hostis teve de ser mudado ( basicamente, por questões regulatórias ) - em vez de ser feito mediante empréstimos bancários, passou a ser feito por meio de obrigações ( bonds ) - , o mercado prontamente os apelidou de junk bonds ( obrigações de alto risco, ou, literalmente, obrigações-lixo ), e justificadamente. No entanto, não existe qualquer dificuldade em fazer estas obrigações serem garantidas e emitidas, sendo os bancos comerciais seus mais ávidos compradores.

Empréstimos bancários - ou junk bonds - para financiar aquisições hostis estão disponíveis pela mesma razão que no começo dos anos oitenta, permitiu a países como Brasil, Zaire ( atual Congo ) ou Argentina obter empréstimos de bancos ocidentais em volumes que eram claramente superiores à sua capacidade de pagamento dos juros correspondentes ( isto sem mencionar o pagamento da amortização do principal do empréstimo propriamente dito ). E também pela mesma razão que grandes bancos de financiamento, como o Continental Ilinois, em Chicago, estavam quase sempre dispostos - na verdade, ansiosos - a oferecer empréstimos altamente especulativos, às vezes fraudulentos, a especuladores não existentes na indústria de óleo e gás. Os bancos comerciais americanos se encontram em dificuldades, em decorrência do encolhimento de suas tradicionais fontes de receita, e estão desesperados, tentando encontrar novas fontes, especialmente alguém que esteja disposto a tomar empréstimos pagando altíssimas taxas de juros. E um raider ( * vide nota de rodapé ) que formula uma proposta de aquisição hostil está, é claro, perfeitamente disposto a aceitar estas extorsivas taxas de juros. Afinal, ele não as pagará - a empresa-alvo, que ele pretende adquirir, irá sucumbir depois da operação.

Bancos comerciais, como pode ser lido qualquer livro-texto, ganham a vida como árbitros da liquidez: eles obtêm seu dinheiro de depósitos à vista, que são perfeitamente líquidos - isto é, o dinheiro pode ser retirado a qualquer momento. O banco, então, empresta este dinheiro por períodos mais longos ( de noventa dias a três anos, no período mais comum de um empréstimo comercial ). Portanto, as quantias devidas ao banco têm muito menos liquidez do que as que ele deve. Isto, portanto, justifica a cobrança de uma taxa de juros substancialmente mais elevada. A diferença entre a taxa de juros que o banco cobra em seus empréstimos e aquela que ele paga pelo valor que toma emprestado ( spread ) representa sua receita.

A cada dia que passa, isto funciona menos, uma vez que o banco ou não tem capacidade de ser o árbitro da liquidez ou não é pago. Uma razão para isto é, naturalmente, o fato de que depósitos à vista de juro zero, que, no passado, eram recomendadas pelas autoridades monetárias, praticamente desapareceram. Historicamente, as empresas sempre foram as principais provedoras dos depósitos à vista. Contudo, hoje em dia, poucas empresas mantêm grandes somas em caixa. Além disto, atualmente, a típica conta bancária de um indivíduo paga cinco e meio por cento de juros. Se forem acrescentada a isto o custo de administração, de aquisição e assim por diante, o banco provavelmente acabará pagando oito ou nove por cento pelo dinheiro depositado na contas de seus clientes - o que significa que mesmo depósitos à vista já não proporcionam um spread de juro substancial. E a maioria dos consumidores americanos mantém hoje em suas contas bancárias o menor saldo ( estoque ) possível. O resto está depositado em contas que pagam juros muito mais altos, como contas do mercado monetário, que ainda proporcionam alta liquidez.

Também pelo lado da demanda, a arbitragem da liquidez se tornou muito menos lucrativa. Cada vez menos, as empresas americanas se autofinanciam por meio de empréstimos comerciais. Agora, elas usam títulos negociáveis - a versão das empresas para um empréstimo parcelado. Isto, contudo, deixa o sistema bancário de fora. A empresa com um superávit temporário de caixa compra diretamente títulos negociáveis emitidos por outra empresa com uma necessidade temporária de caixa. Mas o spread dos títulos negociáveis, entre aquele que quem toma emprestado paga e aquele que quem empresta cobra, é muito mais baixo do que o spread entre o tradicional juro zero dos depósitos à vista e taxa de empréstimo do banco dos títulos negociáveis. Este spread pode ser de um emeio por cento contra quatro ou cinco por cento praticados anteriormente.

A esta altura, a maior parte dos bancos americanos, especialmente os maiores, já sabe que não pode esperar que seu negócio continue a crescer com base no spread das taxas de juros, entre o que pagam e o que cobram pelo dinheiro. Eles terão de mudar sua base de receitas, concentrando-se em tarifas e comissões. Entretanto, mesmo aqueles poucos bancos que aceitaram isto na década de setenta e que, desde então vêm trabalhando duro para mudar sua fonte de receita - em vez de ser pago pelo dinheiro, ser remunerado por informações e serviços ( o Citibank de Nova Iorque provavelmente foi o primeiro e é, de longe, o líder ) - ainda têm um longo caminho pela frente. Enquanto isto, os bancos estão encontrando dificuldade em encontrar fontes de receita. Daí a pressão para que encontrem tomadores de dinheiro dispostos a pagar altas taxas de juros - ou, pelo menos, dispostos a dizer que vão pagar - sejam eles exploradores de petróleo em Oklahoma, governos militares sufocados pela inflação em seus países ( como foi o caso de Brasil e Argentina durante a ditadura militar ) ou raiders ( * vide nota de rodapé ). Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

P.S.:

* Nota de rodapé:

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Fusões e aquisições: a mobilização da comunidade para evitar uma hostilidade

Quantas aquisições hostis já ocorreram, ninguém sabe com certeza. Segundo algumas estimativas conservadoras, teriam sido de quatrocentas a quinhentas, com pelo menos metade resultando no desaparecimento da empresa-alvo, ou porque o raider ( * vide nota de rodapé ) é bem-sucedido ou porque o alvo encontra um cavaleiro branco ( *2 vide nota de rodapé ). Um fenômeno deste porte - seja construtivo ou destrutivo - certamente indica a necessidade de mudanças fundamentais na estrutura econômica subjacente, no ambiente de negócios e na economia americana. Entretanto, pelo que sei, até aqui praticamente não houve qualquer discussão sobre o que poderia explicar o fenômeno das aquisições hostis, sobre seu significado e sobre as questões relativas a políticas decorrentes deste fato.

O que, por exemplo, explica a vulnerabilidade das empresas, entre elas, muitas de grande porte, poderosas e bem estabelecidas? Poucos raiders ( * vide nota de rodapé ) têm força financeira suficiente por conta própria. A maioria tem um histórico de poucas realizações nos campos da administração e da gerência. Nos anos sessenta e no começo dos anos setenta, acreditava-se que a administração de uma empresa de grande porte com ações negociadas em bolsa de valores fosse inexpugnável. Nada, a não ser, talvez, a falência da empresa, poderia ameaçá-la, que dirá substituí-la! Naquela época, em livros de grande popularidade ( como os de John Keneth Galbraith, por exemplo ), considerava-se quase uma verdade autoexplicável o fato de que entrava-se numa era do capitalismo corporativo, um estágio novo e diferente, em que administradores profissionais se autoperpetuavam e cuidavam das grandes empresas do país de forma autônoma, deitando regras sem muita interferência de quaisquer de suas supostas bases de apoio. Contudo, nos últimos anos, várias empresas, particularmente algumas de grande porte e com bons resultados por qualquer critério de mensuração, foram engolidas por empresas novatas, até aqui desconhecidas ou obscuras, apesar dos vigorosos esforços de seus administradores.

Estes raiders ( * vide nota de rodapé ) geralmente não dispõem de capital próprio e precisam tomar emprestado cada centavo de que necessitam para comprar uma pequena parcela das ações da empresa e, então, fazer uma proposta de aquisição. Operam com elevado índice de alavancamento, com todos os seus riscos e vantagens inerentes à alavancagem. a esta altura dos acontecimentos, para anular uma proposta de aquisição hostil, mesmo gigantes como a General Motors Company ( GMC ) são forçados a recorrer a subterfúgios caros e complexos, como a dividir suas ações em várias emissões distintas, cada qual com direitos de voto diferentes. O que será que aconteceu ao capitalismo corporativo e ao controle absoluto por uma administração autônoma e profissional, aparentemente tão bem estabelecidas há pouco tempo?

Fundamentalmente, existem três explicações para esta extrema vulnerabilidade das empresas estabelecidas à aquisição hostil.

Uma delas é a inflação.

Há também mudanças estruturais na economia que tornam muitas das empresas mais bem-sucedidas de ontem inadaptadas á realidade econômica de hoje.

Finalmente, o capitalismo corporativo - isto é, o estabelecimento de uma administração e as empresas extremamente vulneráveis. Elas não têm um grupo de apoiadores que possam vir em seu socorro quando atacadas por raiders ( * vide nota de rodapé ).

A inflação distorce. Distorce valores, distorce relacionamentos. Cria flagrantes discrepâncias entre pressupostos e realidades da economia. Os quinze anos de inflação nos Estados Unidos da América ( EUA ) - período que teve início durante o governo Lyndon Johnson ( sucessor de John F. Kennedy ) e continuou até meados dos anos oitenta - não foram uma exceção. E a distorção mais previsível - de fato, a mais típica - é a diferença entre o valor dos ativos e seu poder de gerar lucro. Em qualquer inflação, o custo dos bens de capital tende a crescer muito mais rápido do que o preço dos bens que eles produzem. Assim, torna-se econômico comprar ativos de capital já existentes, em vez de investir em novas instalações e novas máquinas. Portanto, qualquer empresa que seja rica em ativos fixos vale mais quando desmembrada - isto é, quando seus ativos de capital são vendidos como peças imobiliárias, como fábricas, como máquinas ou como equipamentos - do que quando avaliada com base em sua produção, em uma proporção realista de preço / lucro. Esta é uma das distorções que os raiders ( * vide nota de rodapé ) exploram.

O mercado de ações avalia as empresas com base em seus lucros, ou seja, como empreendimentos em atividade. Elas não são avaliadas por seu valor de liquidação. Em consequência, uma empresa com pesados ativos fixos - especialmente uma que tenha também muito dinheiro em caixa, com o qual o raider ( * vide nota de rodapé ), depois da aquisição, poderá se ressarcir ( e ter um lucro substancial para se vangloriar ) - se torna um alvo convidativo. Este tipo de situação corresponde a um quarto ou, talvez um terço de todas as aquisições hostis.

Igualmente importantes são as grandes mudanças estruturais ocorridas na economia mundial e na americana nos referido período inflacionário. Elas tornaram inapropriadas muitas das tradicionais formas de integração econômica. O melhor exemplo é, provavelmente, o da empresa de petróleo integrada. Ninguém precisa ter simpatia pelo Sr. T. Boone Pickens, o raider ( * vide nota de rodapé ) que conseguiu forçar a Gulf Oil, uma das maiores e mais orgulhosas empresas de petróleo dos EUA, a ter um casamento indesejado com um cavaleiro branco ( *2 vide nota de rodapé ) e que quase teve sucesso na tentativa de assumir o controle de duas outras antigas e bem estabelecidas petroleiras: a Union Oil e a Phillips. Entretanto, Pickens tem razão em uma coisa: ele forçou estas empresas, para as quais apontou suas armas, a fazer algo sensato, isto é, a se dividirem em duas partes: uma produzindo e vendendo produtos de petróleo, outra cuidando das reservas de petróleo cru debaixo do solo.

As grandes empresas de petróleo vêm tendo um desempenho sofrível desde o início dos anos oitenta. Seus lucros refletem basicamente em preço do barril de óleo cru em torno de doze a quinze dólares ( preços de pouco depois da crise do petróleo dos anos setenta ), que seria o preço de mercado hoje, não fosse o cartel da Organização dos Países Exportadores de Petróleo ( OPEP ). Entretanto, desde o choque o petróleo de mil novecentos e setenta e três, todas tentam desesperadamente aumentar suas reservas de hidrocarbonetos para o futuro. E estas reservas tiveram valores estabelecidos o mercado, especialmente por que procurava se abrigar dos impostos no longo prazo, sob a expectativa de um preço exponencialmente maior que o atual dali a vinte ou trinta anos ( talvez a época que estamos vivenciando hoje ). na verdade, para justificar o que o mercado estava pagando por petróleo cru e por reservas de petróleo debaixo da terra, seria necessário pressupor que o preço do barril estaria em torno de cem dólares por volta do ano de dois mil e quinze ( o que ocorreu, na verdade ). De outro modo, com base em um fluxo de caixa descontado, a valoração destas reservas provadas debaixo da terra não poderia, em hipótese alguma, se justificar por volta da metade da década de oitenta.

A questão não é se a expectativa de altos preços do petróleo, que se tinha na metade da década de oitenta em relação ao seu preço dos dias atuais, é racional ( apesar de ter se confirmado ). Todas as análises históricas indicariam que a única expectativa racional para os preços do petróleo nos dias atuais eram de que fossem mais baixos do que os preços da metade da década de oitenta - mas esta era uma outra previsão que não se realizou. O fato é que, hoje em dia, não faz muito sentido ser uma empresa integrada de petróleo. Os interesses das pessoas que desejam ter lucros da atual empresa de petróleo e os daqueles que buscam abrigar-se dos impostos no longo prazo ( e que, em outras palavras, não estão muito interessados em lucros atuais ) são incompatíveis. Portanto, a proposta de Pickens, que exigia que uma empresa integrada de petróleo se dividisse em duas, fazia sentido.

Uma situação semelhante ocorre na indústria do aço e, na verdade, em muitas empresas integradas, produtoras de material de grande porte e de capital intensivo. Cada uma destas situações é um convite para um raider ( * vide nota de rodapé ).

Entretanto, talvez a principal razão pela qual as empresas se mostram vulneráveis a um raider ( * vide nota de rodapé ), seja o próprio capitalismo corporativo, isto é, uma administração autônoma, controlada por ninguém e com ninguém a quem se prestar contas. E, em vez de tornar a administração poderosa, o capitalismo corporativo tornou a empresa impotente e isolada, fazendo-a perder sua base de apoio na própria diretoria, junto a seus acionistas e entre seus empregados.

Sempre que uma administração ameaçada por um raider ( * vide nota de rodapé ) foi capaz de organizar uma base de apoio, conseguiu rechaçar a aquisição hostil. Um BM exemplo é a Phillips Petroleum, em Bartlesville, Oklahoma, que mobilizou seus empregados e a comunidade. Foi o suficiente para derrotar Pickens. Por outro lado, quando a administração cede à tentação de se tornar onipotente, acaba, na verdade, impotente. Quando atacadas por um raider ( * vide nota de rodapé ), ficam sem ninguém para apoiá-las se alguém oferecer a seus acionistas alguns dólares acima do valor atual de mercado. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

P.S.:

* Nota de rodapé: o conceito da expressão raider do mercado de ações é melhor introduzido em https://administradores.com.br/artigos/fus%C3%B5es-e-aquisi%C3%A7%C3%B5es-raiders-eles-n%C3%A3o-d%C3%A3o-f%C3%A9rias-para-os-seus-p%C3%A9s .

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Fusões e aquisições: raiders, eles não dão férias para os seus pés

Nestes últimos anos, quase toda semana surge algum relato de mais uma aquisição hostil, ou de mais uma manobra na bolsa de valores para a compra, fusão ou divisão de uma empresa com a ferrenha oposição de seus gerentes e da alta administração. Nenhuma onda especulativa da bolsa de valores atingiu os Estados Unidos da América desde o caso dos mercados dos bears e bulls dos anos de mil oitocentos e setenta, quando os Goulds, os Drews e os Vanderbilts brigaram entre si pelo controle das ferrovias norte-americanas. Os termos bull market e bear market ( mercado do touro e mercado do urso ) descrevem, respectivamente, as tendências de alta e baixa no mercado de ações. A nova onda de aquisições hostis já alterou profundamente os contornos e os marcos da economia americana e se tornou uma força dominante - muitos diriam a força dominante ( com artigo definido ) - no comportamento e nas ações dos administradores americanos e, quase que certamente, importante fator da erosão da liderança competitiva e tecnológica americana. No entanto, os jornais falam no assunto apenas em suas páginas sobre finanças. E poucas pessoas fora do mundo dos negócios sabem realmente com exatidão o que está acontecendo ou o que, efetivamente, é uma aquisição hostil.

A aquisição hostil geralmente começa com um raider ( atacante ) - uma empresa ou um indivíduo legalmente estabelecido que trabalha para uma empresa - que compra um pequeno percentual das ações da empresa-alvo no mercado aberto, em geral com dinheiro emprestado especificamente para este fim. Quando, como espera o raider, a diretoria e os gerentes da empresa-alvo rechaçam sua proposta de compra, ele pega mais dinheiro emprestado - às vezes, alguns bilhões de dólares - , adquire mais ações da empresa no mercado e procura diretamente os acionistas, oferecendo-lhes um quantia substancialmente maior que o valor das ações na bolsa. Se um n´mero suficiente de acionistas da empresa-alvo aceitar dar ao raider controle total, ele, então, tipicamente descarrega a dívida incorrida com a aquisição no própria empresa adquirida. Em uma aquisição hostil, portanto, a vítima acaba pagando pela própria execução.

O raider agora não apenas controla um grande empresa: ele consegue ter um belo lucro sobre as ações que comprou a preços de mercado baixos. Mesmo que sua tentativa de assumir o controle falhe, o raider geralmente acaba ganhando muito dinheiro. A única forma de a empresa-alvo escapar do raider é quando encontra um cavaleiro branco ( white knight ), isto é, alguém menos odioso à administração da empresa-alvo e que esteja disposto a pagar ainda mais por suas ações, inclusive aquelas que estão nas mãos do raider. Alternativamente, a empresa-alvo paga um resgate ao raider - cujo nome parece saído das aventuras de Robin Hood: greenmail - e recompra as ações adquiridas por ele a um preço extraordinário, muito além do que suas receitas ou perspectivas poderiam justificar.

Aquisições hostis eram praticamente desconhecidas antes de mil novecentos e oitenta. Harold Geneen, que nos anos sessenta e setenta, transformou a ITT no maior e mais diversificado conglomerado do mundo, fez literalmente centenas de aquisições, talvez tenha chegado a mil. Contudo, ele jamais fez uma oferta a uma empresa sem que sua administração, antes o tenha convidado a fazê-lo. Na verdade, em muitas de suas aquisições, a iniciativa foi da empresa a ser adquirida. Elas se colocaram à venda. Naquele tempo, teria sido impossível financiar aquisições hostis. Nenhum banco emprestaria o dinheiro para este propósito. Contudo, a partir de mil novecentos e oitenta, a facilidade se tornou cada vez mais maior.

Em um primeiro momento, aquisições hostis eram desencadeadas por grandes empresas que desejavam ter rápido crescimento e ser diversificar. Esta fase atingiu o clímax em mil novecentos e oitenta e dois, com uma batalha de meses entre três gigantes: Bendix ( indústria de defesa e automotiva ), Martin-Marierra ( defesa, aeroespacial e cimento ) e allied ( produtos químicos ). A Bendix começou a briga com uma proposta de aquisição hostil da Martin-Marietta, que prontamente contra-atacou com uma proposta de aquisição hostil da Bendix. Quando estas duas, como dois escorpiões dentro de ma garrafa, se liquidaram mutuamente, a Allied entrou na briga, pagou resgate por uma exausta Martin-Marietta, assumiu o controle da Bendix e, neste processo, demitiu a administração desta, que havia iniciado a guerra.

Desde então, os raiders são cada vez mais operadores individuais da bolsa cujo negócio é exatamente este: aquisições hostis. Alguns, como Carl Icahn, não demonstram preferência, atacando todos os tipos de empresas. T. Boone Pickens, originalmente um pequeno produtor independente de petróleo, se especializou em grandes empresas como a Gulf Oil, Phillips Petroleum e Union Oil. Ted turner, de Atlanta, se especializou em empresas de mídia e esteve envolvido em uma proposta de de aquisiçõa hostil da CBS, a menor das três grandes redes de televisão americanas. Mas existem dezenas de raiders de menor porte em outros países, muitos procurando empresas de porte médio e de rápido crescimento, especialmente aquelas que estejam em áreas atualmente quentes, como de eletrônicos, computadores ou biotecnologia. Outros raiders têm como alvo principal instituições financeiras. Praticamente todos eles operam com dinheiro emprestado a altas taxas de juros. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/fus%C3%B5es-e-aquisi%C3%A7%C3%B5es-raiders-eles-n%C3%A3o-d%C3%A3o-f%C3%A9rias-para-os-seus-p%C3%A9s .

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Administração: uma ciência social aplicada

Três e estrangeiros - todos eles norte-americanos - são considerados pelos japoneses os principais responsáveis pela recuperação econômica de seu país depois da Segunda Guerra Mundial e por sua eclosão como um dos principais poderes econômicos do mundo. Edwards Deming ensinou aos japoneses controle estatístico da qualidade e introduziu os círculos da qualidade. Joseph M. Juran lhes ensinou como organizar a produção na fábrica e como treinar e gerenciar pessoas no trabalho. Aquilo que é hoje, a última palavra em técnica importada pelo Japão e a mais excitante descoberta gerencial dos últimos tempos - o sistema de entrega de inventário jus in time ( em japonês, Kanban ) - foi introduzido no país por Juran, que havia sido um elemento fundamental no desenvolvimento da técnica nos Estados Unidos da América ( EUA ), como parte dos esforços de produção durante a Segunda Guerra Mundial.

Peter F. Drucker foi o terceiro destes professores americanos. Sua contribuição, ou assim veem os japoneses, foi educá-los sobre as técnicas de administração e marketing. Drucker lhes ensinou que pessoas são recursos, e não custos, e que, portanto, devem ser gerenciadas para assumir responsabilidades a fim de atingir objetivos pessoais e de grupo e metas de produtividade. Também lhes orientou que, para funcionar adequadamente,a  comunicação deve ser feita de baixo para cima; mostrou a importância da estrutura, mas também a estrutura que deve seguir a estratégia; ensinou que a alta administração é uma função e uma responsabilidade, em vez de um posto e um privilégio. E também lhes orientou que o propósito de um negócio é criar um cliente e que uma empresa somente existirá em função do mercado.

Os japoneses poderiam ter aprendido todas estas coisas nos livros de Drucker, e com efeito, são eles os leitores mais ávidos de Drucker - alguns destes livros de administração venderam proporcionalmente muito mais cópias no japão do que nos EUA. Mas foram os seminários de três a quatro semanas que causaram mais impacto. A partir do final dos anos cinquenta até meados dos aos oitenta, eles eram organizados a cada dos anos e dirigidos a altos executivos e funcionários do governo. A eficácia nestes seminários, contudo, não era decorrente de conhecimentos sobre as técnicas de administração, mas de interesse em arte japonesa e em familiaridade com a história.

Este interesse começou em mil novecentos e trinta e quatro, quando Drucker ainda era um jovem economista em um banco de Londres, em consequência de uma visita puramente acidental a uma exposição de arte japonesa. Drucker ficou fascinado e isto o levou a perguntar: O que, na história, sociedade e cultura do Japão, explica a habilidade de seu povo ter antecipado, algumas vezes com séculos de antecedência, as mais recentes tendências da arte moderna ocidental, a começar pelo impressionismo e chegando ao expressionismo, ao cubismo e à arte abstrata?

Assim, logo deparou-se, cara a cara, com um mistério que, nem chegou a ser devidamente explicado: Como foi que os japoneses, independentemente de todos os povos não ocidentais, conseguiram construir um país e uma economia modernos, com base em instituições e tecnologias importadas do ocidente e, ainda assim, ao mesmo tempo, manter sua identidade e integridade básicas? À primeira vista, nada que os japoneses tenham feito no século dezenove pareceu diferente do que todos os outros povos fizeram na mesma época. Os novos reinos dos Bálcãs, como o da Bulgária, as repúblicas sul-americanas ou a Pérsia, importaram, a mesma forma, uma ampla variedade de instituições ocidentais - um parlamento e uma Marinha modelados segundo o que existia na Grã-Bretanha; um exército como o da Prússia ( antiga Alemanha ); uma monarquia constitucional, ministérios de governo e educação universal à imagem dos alemães; universidades como nos EUA; sistema bancário segundo os modelos francês e alemão; e códigos legislativos copiados da Alemanha, Suíça e França. Entretanto, somente no japão estas importações estrangeiras pegaram. Além disto, floresceram como instituições modernas eficazes e, ao mesmo tempo, serviram para manter o Japão tão distinto, claramente destacado e indissolúvel quanto era na época em que permaneceu totalmente isolado de interações com o mundo exterior.

Drucker chegou a dizer sempre ter se sentido atraído pelo sucesso inesperado. Em sua experiência, esta é a chave do entendimento. A Drucker, ocorreu á época, que não houve nada mais inesperado nem um caso de sucesso mais peculiar que o do Japão após a Restauração Meiji, ocorrida em mil oitocentos e sessenta e sete. Contudo, Drucker logo teria se dado conta de que esta não havia sido a primeira conquista japonesa deste tipo. O país tivera um caso de sucesso muito semelhante, mil e duzentos anos antes, quando adotaram as instituições e as religiões do que havia sido a civilização mais avançada do mundo, a China da Dinasta T'ang, e usaram isto para criar governos, sociedade, cultura, vida religiosa e arte totalmente diferentes e únicos. E repetiram este sucesso diversas vezes, em escala menor, em sua história subsequente. Quanto mais Drucker investigava esta questão, mais deslumbrado ficava. Contudo, o que se fez mais claro foi que as conquistas dos japoneses se alicerçavam em sua capacidade única de utilizar ferramentas importadas, fossem elas instituições sociais ou técnicas materiais, para incorporar os valores japoneses e atingir os objetivos do país.

Assim, na primeira vez que Drucker se viu trabalhando com altos executivos do governo e de empresas japonesas, foi natural que começasse a conversa com a seguinte pergunta: "Como é possível que seus valores, suas tradições, sua cultura e as crenças a elas relacionadas sejam usados para desempenhar as tarefas objetivas e impessoais de uma economia moderna e captar modernas tecnologias para o desempenho social e econômico?" Em seus primeiros livros, Drucker havia destacado que o seguro-desemprego no ocidente - originalmente, uma invenção britânica - protegia a renda do trabalhador, mas não satisfazia suas necessidades de segurança psicológica e social. Isto - argumentava Drucker - exigia também segurança no emprego. Seguia afirmando que a necessidade de segurança demandava a elaboração de políticas salariais e de emprego, adequadas ao ciclo familiar e às suas necessidades. Finalmente, Drucker apontava que igualmente essencial era a flexibilidade de custos de mão de obra.

Portanto, como Drucker conhecia um pouco de história japonesa, era capaz de ajudar os líderes do país que haviam participado de seus seminários a trabalhar  a combinação de alta segurança no emprego, alta flexibilidade da força de trabalho e uma estrutura salarial ajustada ai ciclo familiar e às suas necessidades - a combinação que, desde então, ficou conhecida no Ocidente como emprego vitalício e que, por setenta anos, deu ao Japão - um país cuja história, até a Segunda Guerra Mundial, tinha várias ocorrências de violentas guerras de classe e de sangrentas revoltas de trabalhadores - uma inédita cooperação e harmonia industrial. Da mesma forma, a única razão pela qual o conceito de marketing que Drucker apresentou em seus seminários pegou no Japão - enquanto nos EUA, seu país de origem, ainda é alvo de muito debate, mas pouca aplicação - foi certamente o fato de que o marketing como técnica podia ser incrustado na ética confuciana ( * vide nota de rodapé ), profundamente arraigada, de relacionamentos mútuos. Uma venda para um cliente cria, portanto um relacionamento e, com ele, um compromisso permanente.

Drucker dizia ter chegado a ser demandado a explicar o sucesso dos japoneses, especialmente quando comparado aos aparentes problemas de desempenho das empresas americanas nestes últimos anos de sua vida. Uma das razões para a diferença não é, como se acreditava, que os japoneses não estejam preocupados com o lucro ou que suas empresas funcionem com menor margem de lucro. Isto é um mito. Na verdade, quando mensuradas em comparação com o custo do capital - a única mensuração válida para a adequação do lucro de uma empresa - nos últimos cinquenta a cinquenta e cinco anos, como regra, as grandes empresas japonesas ganharam mais do que as empresas americanas do mesmo porte. E esta é a razão principal pela qual os japoneses dispõem de recursos para investir na distribuição global de seus produtos. Além disto, em marcante contraste com o comportamento do governo no Ocidente, o governo do Japão, especialmente o poderoso Ministério do Comércio Internacional e da Indústria, está sempre exigindo maiores lucros industriais, de forma que se possa assegurar um fornecimento adequado de recursos para investimentos futuros - em empregos, pesquisas, novos produtos e desenvolvimento de mercado.

Uma das principais razões para o êxito das empresas japonesas é que seus gerentes não começaram estabelecendo um lucro desejado, isto é, não têm um objetivo financeiro em mente. Em vez disto, começam com objetivos do negócio e, especialmente, com objetivos de mercado. Eles começam perguntando "Qual é a participação de mercado de que precisamos para obter liderança?", "De quais novos produtos precisamos par isto?", quanto precisamos gastar para treinar e desenvolver pessoas, montar um esquema de distribuição e prover o serviço requerido?". Somente então, perguntaram: "E qual é o lucro necessário para que possamos atingir este objetivo de negócio"". Então a necessidade de lucro resultante é geralmente bem superior á meta de lucro das empresas ocidentais.

Em segundo lugar, as empresas japonesas - talvez em função da consequência de longo prazo dos seminários de Drucker sobre administração de sessenta ou setenta anos atrás - passaram a aceitar uma visão sua que antes acreditavam ser uma doutrina muito estranha: a de que o objetivo de uma empresa não é ganhar dinheiro. Ganhar dinheiro é uma necessidade de sobrevivência. É também um resultado e uma mensuração do desempenho. Mas, em si, não é desempenho. Como já Drucker chegou a mencionar, o propósito de um negócio é criar um cliente e satisfazê-lo. Isto é desempenho e isto que remunera o negócio. A tarefa e a função da administração como líder, tomadora de decisão e estabelecedora de valores da organização, consistem em tornar produtivos os seres humanos de forma que as capacitações, expectativas e crenças do indivíduo levem ao alcance de seus objetivos por meio do desempenho conjunto.

Estas foram as coisas que Ed Deming, Joe Juran e Drucker, há quase setenta anos tentaram ensinar aos japoneses. Já naquela época, todos os textos americanos sobre administração as recomendavam. Os japoneses, contudo, as vêm praticando desde então.

Drucker chegou a dizer jamais ter escondido técnicas em suas aulas, escritos e consultorias. Técnicas são ferramentas e, sem ferramentas, não há prática, apenas palavras. na verdade, concebeu, ou pelo mesmo, formulou um bom número de ferramentas hoje usadas na administração, como a administração por objetivos, descentralização como princípio da estrutura organizacional e todo o conceito de estratégia de negócio, incluindo a classificação de produtos e mercados.

Os famosos seminários de Drucker no Japão também tiveram grande ênfase em ferramentas e técnicas. No verão de mil novecentos e oitenta e cinco, durante sua visita ao país, uma das pessoas então vivas que havia participado de seu primeiro seminário o lembrou de que, naquela ocasião, a primeira semana de aula foi aberta com a pergunta de um dos participantes: "Quais são as técnicas de análise mais úteis que podemos aprender com o ocidente?" Então, passaram vários dias trabalhando intensamente em análises de ponto de equilíbrio e de fluxo de caixa, duas técnicas que haviam sido desenvolvidas no ocidente em anos imediatamente anteriores e posteriores à Segunda Guerra Mundial, e que ainda eram desconhecidas no Japão.

Da mesma forma, sempre enfatizou em seus escritos, aulas de consultorias a importância das mensurações e dos resultados financeiros. Na verdade, a maioria das empresas não ganha o suficiente. O que elas consideram lucros são, na verdade, custos reais. Uma de suas teses centrais durante oitenta anos foi a de que não se pode nem falar de lucros a não ser que se tenha auferido o verdadeiro custo do capital. E, na maioria dos casos, o custo do capital. E, na maioria dos casos, o custo do capital é muito maior do que aquilo que as empresas - especialmente as americanas - tendem a considerar lucros recordes. Drucker dizia sempre ter sustentado, também, durante toda sua vida - em geral, escandalizando os leitores liberais - , que a primeira responsabilidade social de uma empresa é produzir superávit adequado. Sem um superávit, a empresa rouba da sociedade e subtrai dela e da economia o capital necessário para criar os empregos do futuro.

Além disto, durante mais cem anos do que Drucker conseguia lembrar, sustentava que não existia virtude em ser uma empresa não lucrativa e que, na verdade, qualquer atividade que poderia produzir lucros e não o faz é antissocial. Escolas profissionais eram um exemplo favorito de Drucker. Houve um tempo em que estas atividades eram tão marginais que seu subsídio pela sociedade podia ser justificado. Hoje, elas se constituem em um setor tão grande que precisam contribuir para a formação de capital de uma economia em que o capital necessário para o financiamento dos empregos do futuro são, pode-se dizer, uma exigência econômica central e, até mesmo, uma questão de sobrevivência.

Entretanto, a tese central dos escritos de Drucker, aulas e consultorias tem sido a de que o empreendimento moderno de negócio é uma organização humana e social. A administração, como disciplina e prática, lida com valores humanos e sociais. de fato, a organização existe para um fim que vai além dela mesma. No caso do empreendimento de negócio, o fim é econômico ( o que quer que este termo signifique ); no caso de um hospital, seu fim é o tratamento do paciente e sua recuperação; no caso de uma universidade, é ensino / pesquisa / extensão. Para atingir este fins, a peculiar invenção moderna chamada de administração organiza os seres humanos para um desempenho conjunto e cria uma organização social. Mas, somente quando a administração consegue ser bem-sucedida em tornar os recursos humanos da organização produtivos, torna-se capaz de atingir os desejados objetivos e os resultados externos.

Drucker construiu esta tese de forma natural, uma vez que seu interesse em administração não começou com uma empresa. Na verdade, tudo teve início quando Drucker decidiu se tornar escritor e professor, em vez de continuar em sua promissora carreira como banqueiro de investimentos. Seu interesse em organizações modernas, empresa e administração começou com uma análise da sociedade moderna e com a conclusão, à qual chegou por volta da Segunda Guerra Mundial, de que as organizações modernas, especialmente as grandes corporações de negócio, estavam rapidamente se tornando os novos veículos de integração social. Elas eram as novas comunidades, a nova ordem da sociedade, em que os tradicionais veículos de integração - sejam as pequenas cidades, as associações profissionais ou a igreja - haviam se desintegrado. Então, Drucker começou a estudar administração, certamente com consciência para resultados econômicos, mas também buscando princípios de estrutura e organização, princípios constitucionais, além de valores, compromissos e crenças.

Existe muita conversa nos dias de hoje sobre cultura da empresa. Contudo o livro de Drucker The Practice of Management, publicado há mais de setenta anos, termina com um capítulo sobre o espírito de uma organização, que diz tudo o que está escrito em best-sellers atuais, como Vencendo a Crise. Desde o começo, Drucker escreveu, ensinou e deu consultoria sobre o fato de que a administração deve ser focada para fora no que diz respeito á missão e aos resultados da organização, e focada par adentro no que se refere à estrutura, aos valores e relacionamentos que dão condições ao indivíduo de atingir seus objetivos.

Pro esta razão, desde o princípio, Drucker dizia ter mantido a opinião de que a administração deve ser uma disciplina, um corpo organizado de conhecimento que possa ser aprendido e, talvez até ensinado. Em todos os seus principais livros, começando por Concept of the Corporations ( de mil novecentos e quarenta e seis e Practice of Management ( de mil novecentos e cinquenta e quatro ) e evoluindo até o mais recente, Inonvation and Entrepreurship ( de mil novecentos e oitenta e cinco ), Drucker chegou a dizer ter tentado estabelecer esta disciplina. A administração não é mais ciência do que medicina: ambas são práticas. Uma prática se alimenta de uma larga variedade de verdadeiras ciências. Da mesma maneira que a medicina se alimenta de biologia, química, e física, além de uma série de outras ciências naturais, a administração se sustenta na economia, psicologia, matemática, teoria política, história e filosofia. Contudo, da mesma forma que a medicina, a administração também é uma disciplina por sua própria conta, como seus pressupostos, objetivos, ferramentas, metas de desempenho e mensurações. E, como uma disciplina separada, com identidade própria, a administração é o que os alemães costumavam denominar uma Geisteswissenschaft - embora ciência moral seja provavelmente uma tradução melhor deste ilusório termo do que a moderna ciência social. Na verdade, talvez o antiquado termo ciência humana seja, na visão de Drucker, o mais adequado de todos, embora, no Brasil a administração seja uma das ciência sociais aplicadas. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

* P.S.:

Nota de rodapé:

A filosofia de Confúcio é melhor introduzida em:

https://administradores.com.br/artigos/%C3%A9tica-a-interdepend%C3%AAncia-a-sinceridade-e-conf%C3%BAcio .

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/administra%C3%A7%C3%A3o-uma-ci%C3%AAncia-social-aplicada .

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Administração sindical: novos conceitos de remunerações e benefícios

Nos próximos anos será estabelecido o caminho de longo prazo para os trabalhadores da indústria básica pesada americana. Será que os rendimentos dos trabalhadores e os empregos deste segmento continuarão a diminuir - talvez até mais rápido em bons períodos, quando a indústria consegue arrecadar recursos para investimentos em automação? Ou será que as taxas de emprego se estabilizarão e o valor real dos rendimentos será mantido, pelo menos para a maioria? A decisão será tomada pelos próprios empregados da indústria básica pesada e por seus sindicatos.

A produtividade nas indústrias básicas pesadas americanas precisa ser melhorada consideravelmente. Mas a baixa produtividade não é a verdadeira vilã. Certamente, a Toyota tem um número muito menor de trabalhadores em sua folha salarial por automóvel do que a General Motors Company ( GMC ). Por outro lado, comparada à GMC, a Toyota compra o dobro - ou mais - de componentes de fornecedores externos. Quando se fazem os devidos ajustes, descobre-se que os carros fabricados em Detroit ainda requerem um número menor de homens / hora para sua produção. Entretanto, o custo destes homens / hora é cinquenta por cento maior que o dos japoneses. Apesar disto, a Toyota, em Nagoya, ou a Mercedes, em Stuttgart, não contratam mão de obra barata; o pacote remuneratório total dos trabalhadores japoneses ou alemães é exatamente o mesmo que aquele da maioria dos trabalhadores industriais americanos for ada indústria básica pesada, sejam eles sindicalizados ou não - cerca de trinta mil dólares por ano ( em dólares de mil novecentos e oitenta e cinco ), ou quinze dólares a hora, contando todos os adicionais e benefícios. Acontece que uma hora de trabalho em uma siderúrgica integrada nos Estados Unidos da América ( EUA ) -  na U.S. Steel, Behtlehem ou Armco, por exemplo - ou em qualquer outra das principais indústrias básicas pesadas custa vinte e cinco dólares ( quinze dólares em salário pago em dinheiro e mais dez dólares em adicionais e benefícios ). Isto equivale a cinquenta mil dólares por ano para um trabalhador em tempo integral. E nenhuma indústria seria capaz de superar esta desvantagem de custo de mão de obra em um mercado competitivo, não importa o quanto aumente sua produtividade.

Na raiz de tudo isto - e, na verdade, muito mais importante que dólares e centavos - , estão os pressupostos básicos implícitos nas remunerações das indústrias básicas pesadas americanas. Um pressuposto cultivado como artigo de fé, especialmente por líderes sindicais de menor expressão, agentes de negócio ou líderes locais, é o de que as grandes empresas têm um controle oligopolista do mercado, isto é, elas podem, praticamente sem qualquer limite, passar adiante os custos mais altos na forma de preços mais elevados. Persiste a antiga ilusão de que os capitalistas pagam salários a partir dos lucros - embora os salários e rendimentos em uma economia adiantada representem cerca de oitenta e cinco por cento das receitas e dos lucros de, no máximo cinco por cento ou seis por cento. a maior parte dos líderes sindicais ainda enxerga a força de trabalho de forma homogênea e como se fosse composta por adultos do gênero masculino, trabalhando em tempo integral, e que seriam os principais provedores de suas famílias. Finalmente, existe uma forte crença de que o valor de um benefício não é determinado pelo que ele traz para o beneficiário, o empregado, e, sim, pelo que custa para o empregador. Se determinado benefício custar mais ao empregador, é automaticamente visto um ganho para o trabalhador e uma vitória do sindicato. Estes pressupostos talvez fossem defensáveis ha setenta anos, quando salários em dinheiro correspondiam a noventa por cento do total de remunerações dos trabalhadores americanos e dos benefícios eram exatamente isto, não mais do que seis ou sete por cento. Isto em uma época em que se acreditava ( como era o caso de Eleonor Roosevelt, por exemplo ) que as mulheres casadas estariam alijadas da força de trabalho americana até mil novecentos e oitenta. Hoje, no entanto, estes pressupostos são absurdos e altamente prejudiciais, principalmente para o empregado.

A primeira coisa que a indústria básica pesada precisa - e os próprios trabalhadores confirmariam isto - é do maior número possível ( expansão ) de empregos, menor taxa de perda de postos de trabalho ( desemprego estrutural ) e maior continuidade no emprego ( menor turn over ). O melhor seria provavelmente uma velocidade mais lenta na redução de postos de trabalho a um ponto em que, apesar da automação e das mudanças estruturais da indústria, esta perda não exceda a queda do número de novos entrantes na força de trabalho ( de cerca de trinta por cento nos próximos oito anos, como resultado da queda de natalidade - fator demográfico - após os anos sessenta ), que estão disponíveis para trabalhos manuais tradicionais.

Mas isto é quase certamente mais do que se poderá conseguir. A segunda necessidade da indústria básica pesada é, portanto, de um amortecedor para as consequências d diminuição de empregos, isto é, para o provisionamento de aposentadorias prematuras das pessoas mais velhas e dos retreinamento e da recolocação das pessoas de meia-idade.

A terceira seria a necessidade de se manter o máximo rendimento possível para os trabalhadores da indústria básica pesada.

E a quarta, a necessidade urgente de reestruturação dos benefícios, de forma que eles possam atender á realidade da força de trabalho de hoje. É necessário assegurar de que o benefíciário consiga extrair o máximo possível pelo dinheiro destinado a benefícios.

Estas necessidades poderão ser classificadas por ordem de importância de forma diferente por outras pessoas, mas haverá pouca discordância quanto a seu conteúdo. Elas resultam, contudo, de políticas remuneratórias radicalmente diferentes e altamente controversas.

Em primeiro lugar, uma grane parte dos salários precisa ser flexível, e não fixa. Deve estar atrelada a desempenho,  lucratividade e produtividade, sendo que a remuneração em dinheiro deve ser maior - talvez, bem maior - em anos bons e menor  - talvez, bem menor - em anos ruins. Esta talvez seja a maior quebra de tradição à qual a administração deverá resistir tanto quanto os líderes sindicais. Gerentes intermediários e supervisores, particularmente, se oporão a isto. Não há nada de que se ressintam mais do que um subordinado ganhar mais dinheiro que eles. Contudo, os trabalhadores também têm, tradicionalmente, aceitado pagamento por produtividade e lucratividade apenas como um bônus adicional a seu salário fixo. De modo geral, rejeitam a ideia de haver cortes em seus salários em épocas difíceis. "Não é justo penalizar os trabalhadores por falta de desempenho dos empregados da empresa", este tem sido o argumento de praxe, mas quilo de que se precisa agora - e o que é hoje do próprio interesse dos trabalhadores - é um ajuste das flutuações econômicas mediante a aplicação de custos salariais flexíveis, em vez de aumentar o desemprego. Isto porque, nas indústrias básicas pesadas, é improvável que o desemprego seja cíclico ou temporário, mas sim estrutural e permanente. Um terço dos pagamentos em dinheiro nestas indústrias - o terço que excede o salário prevalente da indústria americana - pode ser, então, considerado flexível e contingente do desempenho ( e, é claro, nos anos bons, isto poderia exceder em muito um terço ). Onde quer que se tenha feito algo parecido, como na Lincoln Electric, em Cleveland, por exemplo, os resultados foram salários dos trabalhadores substancialmente maiores, por longos períodos, com alta estabilidade no emprego.

E, então, para satisfazer a segunda necessidade, as remunerações geradas a partir de produtividade e lucratividade poderão ser usadas como amortecimento para o encolhimento dos postos de trabalho, para prover os fundos de pensão necessários ao atendimento dos aposentados prematuros, mais velhos, ao retreinamento de pessoas de meia-idade e aos recursos necessários para sua recolocação ( trabalhadores mais jovens, com menos de trinta anos de idade, costumam ser altamente móveis e capazes de encontrar, por si próprios, novas colocações ).

Hoje, os benefícios são os mesmo para todos, novos e velhos, homens e mulheres, casados e solteiros. Com uma força de trabalho que se tornou tão heterogênea quanto a americana, isto significa que uma parte substancial do dinheiro dos benefícios é desperdiçada: alguns estimam este valor em quarenta centavos de dólar por dólar. Se os dois parceiros de um mesmo casal trabalharem - e, entre os que têm menos de cinquenta anos de idade, esta é a regra hoje - , ambos terão direito a um plano completo de saúde, embora apenas um possa ser reembolsado. A esposa, ainda que trabalhe em tempo integral, geralmente não permanece o tempo necessário em um único emprego para ter direito a uma pensão de aposentadoria - no entanto, ela é descontada pelo valor integral da contribuição, além de pagar à Previdência social, da qual, mesmo que viva por mais tempo que seu marido, jamais terá um tostão de volta. contudo, a contribuição para o fundo de aposentadoria e da Previdência Social já soma mais de um quinto de seu salário em dinheiro. Com o aumento previsto para a Previdência social, estas contribuições logo passarão de um quarto do salário. Mas há também o homem solteiro, que tem por volta de vinte e oito anos de idade e, que em sua idade, se sairia muito melhor se colocasse de quinze a vinte por cento de seus rendimento em um fundo de aposentadoria, em vez de ganhar um salário maior em dinheiro, mas sujeito a altíssima tributação. Da mesma forma, o mesmo empregado, vinte anos mais tarde, com quarenta e oito anos de idade e filhos na universidade, poderá beneficiar-se muito ao trocar uma contribuição menor para a aposentadoria por um salário em dinheiro maior, e assim por diante. Com os benefícios uniformes e totalmente inflexíveis, os sindicatos, compreensivelmente, precisam ser duros nas negociações para obter benefícios para todos. Cada um dos ganhos ajuda apenas uma minoria de seus membros, mas penaliza todo mundo ao criar desemprego, com a indústria cada vez menos capaz de competir. O que as indústrias básicas pesadas precisam - e, diga-se de passagem, aquilo que os japoneses sempre tiveram - é de um pacote de remuneração total. O valor total disponível por hora ou por empregado é fixo, mas cada trabalhador pode escolher quanto do pacote deve ser em dinheiro e quanto em benefícios. E entre estes benefícios, quais das opções disponíveis oferecem os maiores benefícios reais para o indivíduo, segundo seu status na vida e no círculo familiar. Sempre que benefícios tão flexíveis foram introduzidos, os resultados foram o aumento mensurável da satisfação dos empregados, para não dizer dos rendimentos reais, e um acentuado corte de custos dos benefícios, às vezes chegando a um terço ou mais.

Peter F. Drucker chegou a dizer que, sempre que discutia estes assuntos sindicais, eles assentiam e diziam: "Você está inteiramente certo. É disto que se precisa.". Então, acrescentavam imediatamente: "Mas por que deveríamos colocar nossos pescoços para fora e propor algo tão difícil, tão novo e tão diferente de tudo aquilo que dissemos a nossos sindicalizados durante todos estes anos? Não somos pagos para cuidar dos interesses da empresa. Isto é trabalho de sua administração.". Acontece que isto é uma interpretação totalmente equivocada da realidade. As indústrias básicas pesadas têm alternativas. Elas podem transferir os empregos que requerem trabalho braçal para o Terceiro Mundo - começando pelo México, que fica logo ali, ao sul dos EUA - , onde existe abundante mão de obra de baixo custo. Podem também automatizar - e, do ponto de vista tecnológico, é possível agora facilmente multiplicar a velocidade da automação. No entanto, também o movimento sindical nas empresas privadas da economia americana tem encolhido regularmente nos últimos setenta anos e já encontra-se em um patamar abaixo da proporção da força de trabalho que foi organizada antes de os atuais sindicatos da indústria de produção em massa nascerem na grande onda de sindicalização das indústrias básicas pesadas. Na verdade, são os trabalhadores destas indústrias e seus líderes sindicais que não têm escolha. Ou tomam a iniciativa de desenvolver novos conceitos e políticas para remunerações e benefícios ou terão de se defrontar com a rápida diminuição e o eventual desparecimento de seus sindicatos ou fusão destes com outros. E não seria o líder dos trabalhadores, segundo a famosa frase do fundador dos sindicatos das indústrias básicas pesadas, John L. Lewis, "pago para zelar pelos interesses de seus sindicalizados"? Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/administra%C3%A7%C3%A3o-sindical-novos-conceitos-de-remunera%C3%A7%C3%B5es-e-benef%C3%ADcios .