No curto espaço de um ano, o ano de mil novecentos e oitenta e dois, três conhecidos líderes sindicais - o presidente de um grande sindicato de empregados do governo dos Estados Unidos da América ( EUA ), o presidente de um grande sindicato de uma indústria básica e o diretor de uma indústria de produção em massa - foram em busca de aconselhamento. Cada qual tinha uma preocupação específica. No entanto, cada um deles perguntou - e logo no começo da conversa - se os sindicados ainda exerciam alguma função nos EUA ou se estavam se tornando irrelevantes.
Cada um destes homens acreditava que, para manterem a legitimidade e continuarem a ser aceitos como porta-vozes, representantes e defensores dos trabalhadores americanos, os sindicatos deverão desenvolver posições e tomar ações incompatíveis com sua tradição, seus compromissos e sua retórica.
"A bandeira de que nos orgulhamos mais", afirmou o sindicalista da indústria de produção em massa, "é a de que o pacote remuneratório total de nossa indústria é cerca de trinta a quarenta por cento maior que a média da indústria manufatureira americana. Mas será que haveria uma taxa de desemprego recorde em nossa indústria, que se aproxima daquela existente durante a Grande de Depressão, se estes trinta por cento ou quarenta por cento fossem investidos na modernização das fábricas em vez de se converterem em salários e benefícios? Sei que todos os meus colegas líderes sindicais se fazem esta mesma pergunta, mas nenhum tem coragem de vir a público e repeti-la. Se o fizerem, não sobreviveriam dez minutos.".
Dez, ou mesmo cinco, anos antes, qualquer um que mencionasse os termos formação de capital ou produtividade junto a um líder sindical em escorraçado com a pecha de representante do chefe. Na melhor das hipóteses, assuntos deste tipo eram considerados alheios aos interesses do sindicato e algo como aquilo que justifica o salário dos gerentes. A esta altura, poucas pessoas, sindicalistas ou não, negariam que o bem-estar dos trabalhadores depende da formação de capital e da produtividade, mesmo em curtíssimo prazo. Estes dois fatores determinam, em grande parte, quantos emprego poderão existir, seu grau de segurança e seu nível salarial.
Focar na formação de capital e produtividade, contudo, seria o mesmo que aceitar que os interesses do empreendimento e de seus empregados sejam idênticos - e isto seria visto como uma negação à própria razão de ser do sindicato. Até hoje, nenhum líder sindical sequer tentou conscientizar as pessoas sobre a formação de capital e produtividade, isto é, em benefício dos empregos dos trabalhadores e do raciocínio, políticas e ações do sindicato.
Um segundo desafio confronta os líderes sindicais. Os sindicatos dificilmente conseguirão manter a posição diferenciada que conseguiram chegar durante o século vinte em todos os países desenvolvidos não comunistas. Para usar termos tradicionais, o sindicato se tornou um estamento do reino ( estate of realm ). No final da idade média, na Europa cristã, os estates of realm, eram, em sentido mais amplo, as ordens sociais de uma sociedade hierarquizada. A este respeito, às vezes são considerados três estamentos medievais, em ordem de importância: o clero, a nobreza e o povo. Ao tornar-se uma espécie de estamento do reino, os sindicatos obtiveram substanciais imunidades - de tributos, de enquadramento em leis antitruste e de processos por perdas e danos, por exemplo - e com privilégios legais não muito diferentes daqueles gozados em outros tempos pelo exército da Prússia ( atual Alemanha ), ou pela Igreja,na França pré-revolucionária. Os sindicatos são considerados legítimos como nenhuma outra instituição não governamental. E, ao aceitar e proteger o direito de greve dos sindicatos, foram outorgados a um grupo da sociedade o direito à desobediência civil.
A razão para isto é a delegação dos sindicatos de que, mais que um grupo de interesse, eles seriam uma causa. Eles querem mais para seus membros, assim como todos os outro grupos de interesse, sejam agricultores, farmacêuticos ou corretores funerários. Mas os sindicatos também se apresentam como os paladinos dos desfavorecidos ou dos explorados da sociedade. A verdadeira força do movimento sindical em países desenvolvidos tem sido moral: eles alegam ser a consciência política de uma sociedade secular moderna.
E esta alegação, como a maioria dos líderes sindicais já começou a perceber, não consegue mais se sustentar ( em que pese, esta maioria só existir no papel, sem representar uma quantidade significativa de trabalhadores ). Ela está sendo destruída pela demografia. Não importa a rapidez com que a economia cresça, mas para os trabalhadores idosos significará, inexoravelmente, menos para os mais jovens - e vice-versa. Um dos sindicalistas - o presidente dos empregados do governo - chegou a dizer que "o conflito de gerações, entre pessoas mais novas e mais velhas, e não entre gerentes e subordinados, será o conflito social central iniciado há quarenta anos e vigente até hoje".
Hoje, o apoio à população idosa que não trabalha - em previdência social e contribuições para fundos de pensão - consome cerca de vinte centavos a vinte e cinco centavos de cada dólar disponível para rendimentos e salários da população ativa. Se não for tomada uma providência efetiva, este valor subirá para cerca de trinta e três centavos por dólar nos próximos dez anos ( se é que isto já não aconteceu em vários lugares ) - em parte, porque os idosos estão vivendo muito mais, em parte porque as baixas taxas de natalidade dos últimos sessenta anos e limitam o número de pessoas que entram no mercado de trabalho.
É inconcebível pensar que pessoas que trabalham fiquem sem fazer nada em relação a esta transferência de renda para pessoas que não trabalham, sem que tenha havido poupança interna para tal. Em anos passados, foi comprada sua aquiescência por meio do aumento de rendimentos para fundos de pensão e para previdência social. Mas, agora, este caminho está bloqueado. Com os rendimentos e salários em um ritmo tão acelerado, ou mais, quanto o das contribuições para fundos de pensão e para a previdência social. Com os rendimentos e salários já representando oitenta e cinco por cento do Produto Interno Bruto ( PIB ), tudo o que seria possível conseguir seria criar inflação, o que acaba diminuindo as receitas reais tanto para os aposentados mais idosos quanto para os jovens que estão no mercado de trabalho. Será necessário decidir se os mais velhos, aposentados, devem ganhar mais mediante subtração do dinheiro que iria para os mais jovens, ainda no mercado de trabalho, ou se estes ganharão mais através de medidas como a redução de aposentadorias e de benefícios de saúde e o adiamento da idade de aposentadoria.
Se os sindicatos ignorarem este dilema - como a maioria dos seus líderes compreensivelmente gostaria de fazer - , seus afiliados irão formar,por necessidade, novas organizações concorrentes que ignorarão os sindicatos e os tornarão irrelevantes. Os aposentados já estão fazendo isto. Contudo, se os sindicatos se comprometerem com algum dos lados, serão divididos a partir dentro, e no curto prazo. Qualquer que seja o caminho, logo os sindicatos deixarão de incorporar uma causa ou de ter uma legitimidade particular.
Um problema ainda mais difícil para os sindicatos surge a partir do fato de que os empregados estão rapidamente se tornando os únicos verdadeiros capitalistas e donos dos meios de produção. No Japão, isto foi conseguido por meio do emprego vitalício. Na prática, isto significa que, à exceção de uma situação de falência, as grandes empresas funcionam principalmente para os empregados que, em ermos legais tradicionais, são os usufrutuários.
Nos EUA, onde os fundos de pensão hoje são donos de até cinquenta por cento ou mais da grandes empresas, os empregados são os verdadeiros proprietários, e seus fundos de pensão, a principal origem do capital destinado ao investimento produtivo. Da mesma forma, o dinheiro do fundo de aposentadoria é, cada vez mais, o maior da família americana depois que o chefe da família de quarenta e cinco anos de idade ou mais.
O poder segue a propriedade. Esta é uma das mais antigas e exaustivamente testadas leis da política. Os empregados - ou os administradores que agem em seu nome e a quem prestam contas - irão inevitavelmente fazer parte da supervisão e do gerenciamento dos fundos de pensão. A única alternativa possível seria o controle dos fundos pelo governo pelo governo e por seus procuradores.
O resultado será aquele que qualquer sindicato mais teme e contra o qual luta mais aguerridamente: um órgão dos empregados que expressa a identidade de interesses entre a empresa e os trabalhadores, independente do sindicato, a quem ignora, e, inevitavelmente, contra quem fará oposição como uma entidade externa. Isto é, na verdade, o que aconteceu no Japão, onde o emprego vitalício - que restringe a mobilidade dos trabalhadores e, portando, reduz a ameaça de greves - tornou os sindicatos importantes no setor privado e os transformou em pouca coisa mais que um órgão administrativo. A alternativa para os sindicatos seria legar que representam os empregados tanto contra a administração quanto como administradores - seja por meio da codeterminação, como na Alemanha; do controle e administração dos fundos de pensão, que é o que está sendo exigido pelos sindicatos da Suécia; ou da participação no Conselho de Administração, como por exemplo, na Chrysler, nos EUA.
Contudo, "a responsabilidade segue o poder" também é uma lei de política. Se for ignorada - como foi, por exemplo, pelos membros do sindicato com assento no Conselho da Volkswagen, na Alemanha, que, no final dos anos sessenta, atrasaram o plano da empresa de construir uma fábrica nos EUA porque isto teria o significado de exportar empregos dos trabalhadores alemães - , os resultados podem ser desastrosos. No caso da Volkswagen, a participação da empresa no mercado americano de automóveis caiu de oito por cento, em mil novecentos e sessenta e nove, para menos de um por cento, hoje - o que ameaça seriamente a viabilidade e a sobrevivência do empreendimento como um todo, além dos empregos dos trabalhadores da empresa na Alemanha.
Entretanto, se os representantes dos sindicatos, no papel de administradores ou de proprietários, agirem de forma responsável, isto é, de acordo com o interesse do empreendimento, logo serão acusados de pelegos ou de terem se vendido ao patrão. Isto aconteceu na Alemanha, nos anos setenta, como os representantes dos empregados que atuavam nos conselhos de empresas da indústria do aço e do carvão. Aconteceu também, poucos anos mais tarde, com os líderes da União americana de Trabalhadores da Indústria Automobilística, quando aceitaram concessões salariais para salvar as empresas de uma grave crise. Na ocasião, os membros canadenses se revoltaram e se desligaram da instituição.
Existe um precedente na história política para a resolução deste conflito: o design constitucional que integrava o populus - os trabalhadores de Roma - a uma estrutura de poder, permitindo a seus representantes vetar ações do Senado patrício. Contudo, este não é um problema que possa ser resolvido com boas intenções ou retórica. Ele requer uma redefinição do papel e da função do poder compensatório - os sindicatos - e de seu restabelecimento como a incorporação da máxima identidade de interesses entre empregador e empregado.
A administração - independente de quem seja o dono, ou se a instituição é uma empresa, um escritório de governo ou um hospital - deve ter consideráveis poder e autoridade - ambos baseados nas necessidades do empreendimento e na competência. E o poder - como bem sabiam os redatores da Constituição americana - precisa de um órgão como os sindicatos - os eventos ocorridos na Polônia nos últimos anos de comunismo provaram isto amplamente. A alternativa seria uma burocracia de governo descontrolada e incontrolável. Contudo, para voltarem a ser órgãos dinâmicos, eficazes e legítimos, os sindicatos deverão transformar-se profundamente. De outro modo, ficará provado que os sindicalistas têm razão: os sindicatos irão se tornar irrelevantes. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.
Mais em:
https://administradores.com.br/artigos/administra%C3%A7%C3%A3o-sindical-a-reinven%C3%A7%C3%A3o-como-forma-de-fugir-da-irrelev%C3%A2ncia .
O resultado será aquele que qualquer sindicato mais teme e contra o qual luta mais aguerridamente: um órgão dos empregados que expressa a identidade de interesses entre a empresa e os trabalhadores, independente do sindicato, a quem ignora, e, inevitavelmente, contra quem fará oposição como uma entidade externa. Isto é, na verdade, o que aconteceu no Japão, onde o emprego vitalício - que restringe a mobilidade dos trabalhadores e, portando, reduz a ameaça de greves - tornou os sindicatos importantes no setor privado e os transformou em pouca coisa mais que um órgão administrativo. A alternativa para os sindicatos seria legar que representam os empregados tanto contra a administração quanto como administradores - seja por meio da codeterminação, como na Alemanha; do controle e administração dos fundos de pensão, que é o que está sendo exigido pelos sindicatos da Suécia; ou da participação no Conselho de Administração, como por exemplo, na Chrysler, nos EUA.
Contudo, "a responsabilidade segue o poder" também é uma lei de política. Se for ignorada - como foi, por exemplo, pelos membros do sindicato com assento no Conselho da Volkswagen, na Alemanha, que, no final dos anos sessenta, atrasaram o plano da empresa de construir uma fábrica nos EUA porque isto teria o significado de exportar empregos dos trabalhadores alemães - , os resultados podem ser desastrosos. No caso da Volkswagen, a participação da empresa no mercado americano de automóveis caiu de oito por cento, em mil novecentos e sessenta e nove, para menos de um por cento, hoje - o que ameaça seriamente a viabilidade e a sobrevivência do empreendimento como um todo, além dos empregos dos trabalhadores da empresa na Alemanha.
Entretanto, se os representantes dos sindicatos, no papel de administradores ou de proprietários, agirem de forma responsável, isto é, de acordo com o interesse do empreendimento, logo serão acusados de pelegos ou de terem se vendido ao patrão. Isto aconteceu na Alemanha, nos anos setenta, como os representantes dos empregados que atuavam nos conselhos de empresas da indústria do aço e do carvão. Aconteceu também, poucos anos mais tarde, com os líderes da União americana de Trabalhadores da Indústria Automobilística, quando aceitaram concessões salariais para salvar as empresas de uma grave crise. Na ocasião, os membros canadenses se revoltaram e se desligaram da instituição.
Existe um precedente na história política para a resolução deste conflito: o design constitucional que integrava o populus - os trabalhadores de Roma - a uma estrutura de poder, permitindo a seus representantes vetar ações do Senado patrício. Contudo, este não é um problema que possa ser resolvido com boas intenções ou retórica. Ele requer uma redefinição do papel e da função do poder compensatório - os sindicatos - e de seu restabelecimento como a incorporação da máxima identidade de interesses entre empregador e empregado.
A administração - independente de quem seja o dono, ou se a instituição é uma empresa, um escritório de governo ou um hospital - deve ter consideráveis poder e autoridade - ambos baseados nas necessidades do empreendimento e na competência. E o poder - como bem sabiam os redatores da Constituição americana - precisa de um órgão como os sindicatos - os eventos ocorridos na Polônia nos últimos anos de comunismo provaram isto amplamente. A alternativa seria uma burocracia de governo descontrolada e incontrolável. Contudo, para voltarem a ser órgãos dinâmicos, eficazes e legítimos, os sindicatos deverão transformar-se profundamente. De outro modo, ficará provado que os sindicalistas têm razão: os sindicatos irão se tornar irrelevantes. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.
Mais em:
https://administradores.com.br/artigos/administra%C3%A7%C3%A3o-sindical-a-reinven%C3%A7%C3%A3o-como-forma-de-fugir-da-irrelev%C3%A2ncia .
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