As multinacionais, em sua maioria, ainda estão estruturadas e continuam a funcionar do mesmo modo que os americanos e alemães - inventores destas criaturas - imaginaram, há cento e sessenta anos. Mas esta concepção está se tornando obsoleta.
Na multinacional típica, existe uma empresa-mãe com filhas no estrangeiro. As principais decisões - quais produtos ou serviços vender pelo mundo, eventuais apropriações de capital ou contratação de pessoas-chave - são centralizadas na empresa-mãe, que também se responsabiliza por pesquisa e desenvolvimento, atividade conduzida no país-sede. Contudo, as filhas têm toda a autonomia para realizar as atividades de manufatura, marketing, finanças e gestão de pessoas. Elas são administradas por nativos do país em finanças e gestão de pessoas. Elas são administradas por nativos do país em que estão localizadas, com, no máximo, um ou dois expatriados de primeiro nível da sede. E seu objetivo declarado é tornar-se bons cidadãos do país da filial. A maior homenagem possível para uma multinacional é quando o país reconhece a filha local como "uma de nós". Em Stuttgart, diria um executivo contando vantagem, "as pessoas nem sabem que a empresa é americana. Nosso CEO local, este ano, é o presidente da Câmara de Comércio. E, claro, ele é alemão".
Entretanto, cada uma destas características está se tornando inapropriada e, até mesmo, contraproducente. Nas quatro áreas em que a autonomia local tem sido um objetivo, a empresa multinacional deve, cada vez mais, tomar decisões sistêmicas, em vez de deixar que cada uma de suas filhas tome decisões autônomas. Mesmo o esforço de se tornar uma boa cidadã está se transformando em impedimento.
A economia manufatureira está em rota de colisão com o design tradicional de uma organização. Em uma multinacional típica, a filha local tenta fabricar a maior quantidade possível do produto final que coloca no mercado. "Noventa por cento de tudo que compõe um trator que vendemos na França é francês.". Esta é uma declaração típica. Mas, cada vez mais, mesmo um mercado grande como o francês ( ou mesmo um mercado gigante, como os Estados Unidos da América - EUA ) está se tornando pequeno demais para a produção eficiente de qualquer produto. a automação, particularmente, demanda, de forma crescente, a centralização de uma vasta gama de produtos e processos.
A fábrica de motores de automóveis enquanto era considerada a mais eficiente do mundo, a unidade industrial da Fiat, totalmente automatizada, no sul da Itália, precisava produzir, para ser economicamente viável, mais do que o dobro do volume que a Fiat podia absorver à época. Esta era a principal razão pela qual a empresa havia cortejado a Ford-Europa como principal parceira. Entretanto, muitos serviços, para ser verdadeiramente competitivos, também demandam, cada vez mais especialização e centralização. "Na Europa, estamos em primeiro lugar em leasing de equipamentos", dizia à época m banqueiro americano. "Devemos esta posição, em grande parte, ao fato de termos conseguido centralizar todas as nossas operações no continente, ao passo que os principais bancos europeus operam apenas em um único país.".
No entanto, a decisão de centralizar todas as operações de manufatura de uma única parte - compressores, por exemplo - em uma fábrica na França, por mais que possa ser justificada economicamente, irá imediatamente se chocar com seu compromisso de ser uma boa cidadã. Isto significa subtrair empregos da Alemanha, Itália e Grã-Bretanha e, portanto, atrair a ira e a oposição dos governos e sindicatos destes países. A decisão será combatida com mais força ainda pelas gerências das empesas-filhas ali sediadas e, justificadamente, será encarada como um rebaixamento, de donos de suas próprias casas para gerentes de fábrica.
Pressões semelhantes para que a empresa se torne transnacional, afastando, desta forma, o poder decisório da subsidiária local, também estão assomando na área de marketing. Mesmo alguns países grandes, como a Alemanha e a França, já não são grandes o suficiente ou tão diferentes que justifiquem um tratamento de mercado específico para qualquer coisa. para alguns produtos e serviços, o mercado, efetivamente, se globalizou, com os valores, preferências e hábitos de compra se mantendo os mesmos, independentemente do país ou da cultura. Para outros, os mercados se tornaram mais segmentados - não por geografia, mas por estilos de vida, por exemplo. Para outros ainda, o modo bem-sucedido de comercializá-los é enfatizando sua natureza estrangeira ( como comprova o sucesso dos hospitais em estilo americano, na Grã-Bretanha ). cada vez mais, uma decisão de marketing se torna uma decisão sistêmica. Isto é particularmente verdadeiro no que diz respeito aos serviços prestados a distribuidores e clientes, um fator que está se tornando crucial em qualquer parte do mundo.
E, quando o assunto é finanças, a subsidiária autônoma se torna uma ameaça. A dispersão das decisões gerenciais da área financeira é responsável, em grande parte, pelo fraco desempenho das multinacionais americanas durante os anos em que o dólar estava sobrevalorizado, quando a maioria perdeu posição de mercado e lucratividade. Sabe-se, decerto, como minimizar o impacto das flutuações das taxas de câmbio, tanto nas vendas quanto nos lucros ( esta questão não será melhor ilustrada neste texto pelo fato de que os produtos financeiros disponíveis aos importadores / exportadores no mercado para minimização de riscos cambiais não serem escopo deste texto ). Agora que as taxas de câmbio flutuantes - sujeitas a altos e baixos repentinos e vinculadas, principalmente, a movimentos de capital e decisões governamentais - passaram a ser o padrão, a administração financeira localizada se transformou em uma receita para o desastre de qualquer empresa que atue em economia internacional. Hoje, a administração financeira requer que se retire esta atividade de todas as unidades operacionais, inclusive da empresa-mãe, e se passe a geri-la de forma sistêmica, da forma como empresas veteranas neste jogo - como a Exxon e a IBM - têm feito há muitos anos.
Entretanto, na economia do mundo atual, as apropriações de capital também devem ser gerenciadas com decisões sistêmicas. aliás, esta é uma das áreas da administração de empresas multinacionais em que os japoneses estão se saindo bem, e perigosamente, à frente das multinacionais ocidentais, precisamente porque tratam suas unidades estrangeiras como subsidiárias, e não como filhas.
Nas multinacionais japonesas, as receitas e o fluxo de caixa das unidades no exterior não são delas, assim como as receitas e os fluxos de caixa da fábrica em Nagoia também não pertencem a esta unidade. Isto permite que os japoneses se apropriem dos lucros de uma unidade no exterior, localizada nos EUA ou na Alemanha, por exemplo, mas também dos da empresa-mãe, para investi-los em mercados em crescimento, como Brasil ou Índia. Por outro lado, as multinacionais ocidentais esperam que a subsidiária no Brasil ou na Índia financie seu futuro desenvolvimento de mercado, usando para isto, seus próprios lucros de curto prazo, com os lucros obtidos em países mais maduros sendo destinados a pagamentos de dividendos ou a investimentos nestes países. Portanto, os japoneses tratam os mercados mundiais da forma que as empresas americanas tratam os EUA, onde os recursos ganhos no Estado americano da Nova Inglaterra são usados livremente para investimentos naquela região dos EUA. Em consequência, os japoneses estão rapidamente ganhando o controle dos mercados do futuro - que, no longo prazo, poderão vir a ser uma ameaça maior para as indústrias dos EUA ( e do Ocidente ) do que para a concorrência japonesa em seus mercados domésticos.
Precisamente pelo fato de que a subsidiária de uma multinacional terá de se tornar, cada vez mais, parte de um sistema na administração da manufatura, do marketing e do financeiro, o corpo gerencial terá de se tornar crescentemente transnacional. Tradicionalmente, a unidade estrangeira podia oferecer a seu corpo gerencial carreiras mais ou menos comparáveis àquelas de uma empresa doméstica de tamanho equivalente: oportunidades para que o profissional se tornasse um gerente de primeira linha de sua empresa. Este corpo gerencial de topo poderia, então, ter ma autoridade bastante semelhante à dos gerentes de primeira linha em uma empresa verdadeiramente doméstica.
"Durante meus vinte anos como CEO", afirmou, certa vez, um ex-executivo da subsidiária suíça da National Cash Register, "houve apenas seis decisões que precisei aprovar junto à empresa-mae, em Dayton.". Cada vez mais, no entanto, quase todas as principais decisões terão de ser tomadas de forma conjunta. Isto significa que, por um lado, o corpo gerencial da subsidiária terá muito menos autonomia e se enxergará como gerência intermediária. Por outro lado, deverá estar familiarizado com o todo sistema, em vez de se concentrar apenas em sua empresa e no país em que atua.
Portanto, para atrair os talentos necessários a multinacional terá de abrir, crescentemente, posições gerenciais em toda parte, onde quer que se possam encontrar estas pessoas, independentemente da nacionalidade. Além disto, desde cedo, a empresa terá de expor seus jovens de potencial para todo o sistema, em vez de deixá-los passar toda a carreira em seus países de origem e nas subsidiárias ali localizadas. Algumas poucas multinacionais, notadamente IBM e Citicorp, já fazem isto. Por exemplo, um venezuelano que trabalha no escritório do Estado americano de Dakota do Norte do Citicorp é o diretor de operações de cartões de crédito nos EUA. Mas isto é apenas uma exceção.
Finalmente, a área de pesquisa e desenvolvimento - hoje, a única atividade quase totalmente centralizada no país de origem da multinacional - terá de ser transnacionalizada. Cada vez mais, a pesquisa terá de ir para onde as pessoas qualificadas e quiserem permanecer. Pode não ser coincidência o fato de que as empresas e indústrias em que os EUA conseguiram manter sua posição de liderança ( como a IBM ou a indústria farmacêutica, por exemplo ) são precisamente aquelas que, há muito tempo, apesar das dificuldades de idioma, cultura e remuneração, transnacionalizaram a pesquisa.
A realidade econômica está, assim, forçando as multinacionais a ser tornarem um sistema transnacional. No entanto, o mundo político em que cada empresa deve operar está se tornando mais nacionalista, mais protecionista e, certamente, mais chauvinista, dia após dia, nos principais países do mundo. Mas a multinacional, na verdade, não tem muita escolha: se ela falhar no ajuste à realidade econômica transnacional, rapidamente irá se tornar ineficiente e antieconômica, um centro de custos burocrático, e não um centro de lucros. Ela deve ser bem-sucedida em se tornar a ponte entre as duas realidades de uma economia internacional em acelerada integração e uma desintegração da organização social do mundo. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.
Mais em:
https://administradores.com.br/artigos/com%C3%A9rcio-internacional-a-transforma%C3%A7%C3%A3o-das-multinacionais-em-transnacionais .
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https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2019/07/administracao-financeira-o.html .
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