terça-feira, 7 de junho de 2022

Direitos Humanos: o combate ao tráfico de pessoas garantido em protocolo

O Protocolo de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, especialmente Mulheres e Crianças ( PPSPTPMC ) ( * vide nota de rodapé ), complementar à Convenção da Organização das Nações Unidas ( ONU ) Contra o Crime Organizado Transnacional (  CONUCCOT ) ( *2 vide nota de rodapé ), adotado em Nova Iorque em Quinze de Novembro de Dois mil, foi firmado tendo-se em vista que a prevenção e o combate ao tráfico de pessoas requer atuação conjunta dos países de origem, trânsito e destino, com medidas destinadas a prevenir o tráfico, punir os traficantes e proteger suas vítimas, nos termos de seu preâmbulo,. Possui, em dois mil e vinte, Cento e setenta e oito Estados Partes.


No Brasil, foi aprovado pelo Congresso Nacional ( CN ) por mio do Decreto Legislativo ( DL ) número Duzentos e trinta e um, de Vinte e nove de maio de Dois mil e três, e ratificado em Vinte e nove de janeiro de Dois mil e quatro. Entrou em vigor internacional em Vinte e nove de setembro de Dois mil e três, e, para o Brasil, em Vinte e oito de fevereiro de Dois mil e quatro. Foi finalmente promulgado pelo Decreto número Cinco mil e dezessete de Doze de março de Dois mil e quatro.


O PPSPTPMC possui Vinte Artigos, divididos em quatro partes: disposições gerais ( Artigos Primeiro a Quinto ), proteção de vítimas de tráfico de pessoas ( Artigos Sexto a Oitavo ) e prevenção, cooperação e outras medidas ( Artigos Nono a Treze ) e disposições finais ( Artigos Quatorze a Vinte ).


No Artigo Primeiro, explicita-se que o PPSPTPMC completa a CONUCCOT, devendo ser interpretado em conjunto com ela, cujas disposições aplicam-se, mutatis mutandis ( *3 vide nota de rodapé ), ao PPSPTPMC.


O Artigoi Segundo, por sua vez, enuncia quais são os objetivos do PPSPTPMC, quais sejam:


1) prevenir e combater o tráfico de pessoas, com especial atenção às mulheres e ás crianças; proteger e ajudar as vítimas do tráfico, com respeito pleno aos seus Direitos Humanos ( DH );

2) e promover a cooperação entre os Estados Partes com a finalidade de atingir tais objetivos.


Ainda nas disposições gerais, o Artigo Terceiro apresenta definições para efeitos do PPSPTPMC. O tráfico de pessoas significa:


1) o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas;

2) ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou á situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração;

3) a exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos;

4) o consentimento dado pela vítima será considerado irrelevante em face de pessoas, ainda que a exploração descrita.


De qualquer outro lado, se o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento para fins de exploração ser referem a crianças - assim consideradas qualquer pessoa com idade inferior a Dezoito anos - , restará configurado o tráfico de pessoas, ainda que a exploração não envolva algum dos meios acima referidos.


O Artigo Quinto exige, por sua vez, que o Estado criminalize os atos descritos como tra´fico de pessoas, que tenham sido praticados intencionalmente, bem como sua tentativa, a participação como cúmplice, a organização da prática do tráfico ou a conferência de instruções a outras pessoas para que a pratiquem. O PPSPTPMC se aplica à prevenção, investigação e repressão das infrações estabelecidas quando forem de natureza transnacional e envolverem grupo criminoso organizado, bem como à proteção das vítimas de tais infrações.


Na Parte Segunda, o PPSPTPMC dispõe sobre as medidas para proteção de vítimas do tráfico de pessoas. Neste sentido, no Artigo Sexto, que diz respeito à assistência e proteção às vítimas de tráfico de pessoas, fica estabelecido que o Estado protegerá a privacidade e a identidade das vítimas de tráfico de pessoas ( inclusive com relação aos procedimentos judiciais relativos ao tráfico ), no casos em que se considere apropriado e na medida em que seja permitido pelo seu direito interno. Ademais, o Estado deve assegurar que seu sistema jurídico ou administrativo possua medidas que informem às vítimas do tráfico, quando for necessário, sobre os procedimentos judiciais e administrativos e assistência para permitir que suas preocupações sejam tomadas em conta no processo penal instaurado contra o autor das infrações.


O Estado ainda deve fornecer medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas, em especial alojamento, aconselhamento e informação, assistência médica psicológica e material e oportunidades de emprego, educação e formação. O Estado deve ainda promover esforços para garantir a segurança física das vítimas de tráfico de pessoas e assegurar que seu sistema jurídico viabilize a possibilidade de obterem indenizações por danos sofridos.


No Artigo Sétimo, o PPSPTPMC estabelece um estatuto das vítimas de tráfico de pessoas, de modo que o Estado de acolhimento, prevendo que o Estado deve considerar a possibilidade de adotar medidas que permitam às vítimas de tráfico permaneceram em seu território a título temporário ou permanente.


Finalmente, no Artigo Oitavo o PPSPTPMC versa sobre o repatriamento das vítimas de tráfico de pessoas, de modo que o Estado Parte do qual a vítima é nacional ou em que tinha residência permanente deve facilitar e aceitar sem demora indevida ou injustificada o retorno da pessoa. Evidentemente, conforme previsto, deve-se tomar em conta a segurança da pessoa e a situação de processo judicial relacionado ao fato de a pessoa ser vítima de tráfico.


Na Terceira Parte ( "Prevenção, cooperação e outras medidas" ), são determinadas medidas a serem adotadas pelos Estados para a prevenção e combate ao tráfico de pessoas e para proteção às suas  vítimas, especialmente mulheres e crianças, tais com campanhas de informação e de difusão através dos órgãos de comunicação e iniciativas sociais e econômicas. Neste sentido, devem tomar medidas para reduzir os fatores como a pobreza, o subdesenvolvimento e a desigualdade de oportunidades que possam tornar as pessoas vulneráveis ao tráfico, bem como desencorajar a procura que fomenta atos de exploração de pessoas conducentes ao tráfico.


O Artigo Dez prevê que os órgãos do Estado devem cooperar entre si, mediante troca de informações, para verificar se as pessoas que atravessam ou tentam atravessar fronteira internacional com documentos de viagem pertencentes a terceiros ou sem documentos de viagem são autores ou vítimas de tráfico de pessoas; bem como para verificar os tipos de documentos de viagem que as pessoas têm utilizado ou tentado utilizar para atravessar uma fronteira internacional com o objetivo de tráfico de pessoas.


Os Estados Partes também devem assegurar a formação dos agentes dos serviços competentes para a aplicação da lei, dos serviços de imigração ou de outros serviços competentes na prevenção do tráfico de pessoas; devem reforçar os controles fronteiriços necessários para prevenir e detectar o tráfico de pessoas; devem adotar medidas apropriadas para prevenir a utilização de meios de transporte explorados por transportadores comerciais na prática de pessoas, dentre outras medidas nas fronteiras ( Artigos Dez e Onze ).


Finalmente, os Estados devem adotar medidas necessárias para a segurança e o controle de documentos ( Artigo Doze ), bem como sua legitimidade e validade ( Artigo Treze ).


Nas disposições finais o PPSPTPMC estabelece, além dos dispositivos de praxe, uma cláusula de salvaguarda, pela qual o PPSPTPMC não prejudicará os direitos, obrigações e responsabilidades dos Estados e das pessoas por força do Direito Internacio0nal ( DI ), incluindo-se aí o Direito Internacional dos Direitos Humanos ( DIDH ) e o Direito Internacional Humanitário ( DIH ), e se forem aplicáveis à Convenção de Mil novecentos e cinquenta e um ( *4 vide nota de rodapé ) e o Protocolo de Mil novecentos e sessenta e sete relativos ao Estatuto dos Refugiados ( CER ) e ao princípio de non-refoulement ( não deportação ).


Ademais, as medidas do PPSPTPMC devem ser interpretadas e aplicadas de forma que as vítimas não sejam discriminadas ( Artigo Quatorze, a vítima não pode ser culpada pela situação de tráfico ).


Em Dois mil e dezesseis, foi adotada a Lei número Treze mil trezentos e quarenta e quatro ( Lei do Tráfico de Pessoas  - LTP ), atualizando a legislação interna, que, anteriormente, punia o tráfico de pessoas na sua finalidade de exploração sexual ( Artigos Duzentos e trinta e um e Duzentos e trinta e um - A do Código Penal - CP ). A nova lei é genérica e visa a reprimir o tráfico de pessoas cometido no território nacional contra vítima brasileira ou estrangeira e no exterior contra vítima brasileira ( Artigo Primeiro ). Neste sentido, foram tipificadas diversas condutas ( agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso ) e finalidades de tráfico de pessoas, como o tráfico para fins de remoção de órgãos, submissão a trabalho escravo, servidão, adoção ilegal ou exploração sexual ( redação do Artigo Cento e quarenta e nove - A do CP ), em linha com o Artigo Terceiro do PPSPTPMC analisado.


A Lei número Treze mil trezentos e quarenta e quatro de Dois mil e dezesseis, na linha que dispõe o PPSPTPMC, é calcada em Três eixos, a saber: prevenção ( Capítulo Segundo ), repressão ( Capítulo Terceiro ) e proteção e assistência às vítimas ( Capítulo Quarto ).


Quadro sinótico


PPSPTPMC, complementar ao CONUCCOT


Objetivos:


1) Prevenir e combater o tráfico de pessoas, com especial atenção às mulheres e às crianças;

2) Proteger e ajudar as vítimas do tráfico, com respeito pleno aos seus DH; e

3) Promover a cooperação entre os Estados Partes com a finalidade de atingir tais objetivos.


Definição do tráfico de pessoas: "O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo á ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou á situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviço forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, à servidão ou à remoção de órgãos." O consentimento dato pela vítima será considerado irrelevante em face de qualquer exploração descrita.


Principais medidas para proteção de vítimas do tráfico de pessoas


1) Assistência e proteção às vítimas de tráfico de pessoas ( incluisve proteção da privacidade e da identidade das vítimas de tráfico de pessoas ).

2) Medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas.

3) Segurança física das vítimas de tráfico.

4) Viabilização da possibilidade de, no sistema jurídico, as vítimas obterem indenização por danos sofridos.

5) Medidas que permitam às vítimas de tráfico permanecerem no território do Estado Parte a título temporário ou permanente.        


P.S.:


Notas de rodapé:


* A vedação ao tráfico de crianças, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-protocolo-amplia-prote%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0-contra-a-venda-prostitui%C3%A7%C3%A3o-e-pornografia-infantis .


*2 O combate ao crime organizado transnacional, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-a-coopera%C3%A7%C3%A3o-do-brasil-no-combate-ao-crime-organizado-transnacional .


*3 mutatis mutandis: mudando o que deve ser mudado; fazendo-se as devidas mudanças. Dicionário latim-português: termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieira - São Paulo: Edipro, Dois mil e dezesseis.


*4 A Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, de Mil novecentos e cinquenta e um, é melhor detalhado em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-conven%C3%A7%C3%A3o-protege-pessoas-perseguidas-e-refugiadas .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-o-combate-ao-tr%C3%A1fico-de-pessoas-garantido-em-protocolo-1 .

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