quarta-feira, 24 de março de 2021

Operação lava a jato: parcialidade de ex-juiz tirou direitos de ex-presidente

A Operação Lava a jato deixou muitos cadáveres no mundo da política. Diversas lideranças foram punidas nas urnas pelo eleitor pelo envolvimento revelado com as entranhas mais putrefatas da relação entre políticos e doadores de campanha - Odebrecht à frente. Entretanto, apenas uma liderança de porte nacional foi quase que sumariamente proibida de ter seu comportamento e possíveis crimes expostos ao eleitor para julgamento político. Apenas o ex-presidente Lula ( do Partido dos Trabalhadores - PT ) foi excluído das eleições, impedido de perder ou ganhar.

Sérgio Moro foi considerado parcial na condução dos processos contra o ex-presidente Lula na Lava Jato
Sérgio Moro foi considerado parcial na condução dos processos contra o ex-presidente Lula na Lava a jato ( Foto : Issac Amorim, Ministério da Justiça / Divulgação ) 

Isso só aconteceu porque o ex-juiz Sérgio Moro tomou a punição do ex-presidente da República como causa pessoal, como troféu, abusando das posições e das prerrogativas de magistrado. E foi isso que a segunda turma do Supremo Tribunal Federal ( STF ) entendeu nesta terça-feira, em um julgamento apertado, cheio de reviravoltas e definido por três votos a dois: Moro agiu com suspeição ao julgar o petista e ele merece um julgamento isento.

É curioso que o mesmo STF tenha permitido por tanto tempo este comportamento que agora condena. Era conveniente e popular defender a Lava a jato, era temerário ir contra a popularidade da operação - especialmente a base curitibana, nas mãos do até então herói impoluto Sérgio Moro. Fora uma ou outra crítica dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, a Lava a jato avançou como quis e colheu seus frutos.

Dois ingredientes mudaram completamente este cenário e permitiram que o STF se impusesse contra a Lava a jato. Primeiro, a vaidade de Moro ao aceitar ser ministro do governo Jair Bolsonaro ( sem partido ). Estava formado o argumento de que o ex-juiz entrou para o ministério do presidente que ajudou a eleger ao tirar do caminho o mais forte adversário. A peça que faltava para fechar a narrativa petista de que Lula era vítima de um magistrado imparcial.

O segundo ingrediente foi o que já foi chamado de rompimento da aliança entre o bolsonarismo e o partido da Lava a jato. O momento em que Moro deixou o Ministério da Justiça e Segurança Pública ( MJ ), em abril do ano de dois mil e vinte, acusando Bolsonaro de mudar a cúpula do Departamento da Polícia Federal ( DPF ) para ter acesso privilegiado a investigações no Rio de Janeiro ( RJ ). Naquele momento, Moro tentou implodir o governo e ocupar o espaço de Bolsonaro como líder antipetista e anticorrupção.

Na prática, perdeu os bolsonaristas - responsáveis pela parte mais ruidosa da defesa de Moro e da Lava a jato quando o site The Intercept começou a divulgar as impróprias conversas vazadas entre o ex-juiz e os procuradores responsáveis pela investigação - Deltan Dallagnol à frente.

De dia para a noite, Moro passou a ser inimigo de petistas e de bolsonaristas. Fragilizado, abriu flanco para o avanço e a reviravolta no julgamento de suspeição pedido pela defesa de Lula ainda em dois mil e dezoito. Lavajatista, o ministro Edson Fachin tentou no início de março uma manobra ousada ao anular as condenações do petista por questão de competência e assim evitar que toda a operação fosse maculada pela decisão de que Moro era parcial em sua condução.

Não foi suficiente, Mendes havia segurado por quase dois anos e meio o julgamento da suspeição com um pedido de vista e estava pronto para fazer dele o palco de sua desforra. Diante do empate, duas semanas atrás, a definição ficou nas mãos de Nunes Marques, o único ministro da corte nomeado por Bolsonaro em um acerto com os partidos do centrão. Nos últimos dias, ficou a dúvida sobre se o novo ministro fulminaria Moro ou defenderia a Lava a jato. Na hora de votar, nesta terça-feira, optou por rejeitar a suspeição.

Seria a tese vitoriosa se Cármen Lúcia não decidisse mudar sua posição expressa ainda em dois mil e dezoito, quando não estava claramente desenhado o cenário para a derrocada de Moro. A magistrada, também considerada lavajatista, fez um voto cirúrgico para tentar separar a conduta de Moro com Lula e as demais decisões da Lava a jato. Também fez questão de ignorar as argumentações baseadas nas polêmicas conversas interceptadas por hackers e focar em atos de Moro no próprio processo. Com assepsia, culpou o ex-juiz, encerrou a questão sobre o ex-presidente e salvou o que podia da operação que mudou a política brasileira.

O epílogo deve ser dar em dois mil e vinte e dois. Lula será julgado nos tribunais, mas dificilmente haverá tempo para - caso condenado - seja impedido de disputar a eleição presidencial. Seu maior julgador será o eleitor, em uma disputa que tem tudo para polarizar com Bolsonaro. O atual presidente também sai inteiro da decisão desta terça-feira ( vinte e três de março de dois mil e vinte e um ): se Nunes Marques, seu indicado, tivesse votado contra a Lava a jato, esta decisão poderia ser colocada em seu colo. Não será. Os bolsonaristas poderão continuar a culpar os demais ministros do STF por todos os problemas dentro e fora do governo do capitão.


Com informações de:


Upiara Boschi do jornal Diário Catarinense ( DC ).


Mais sobre a decisão em:


https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/03/operacao-lava-jato-zanin-acusa-acao.html .

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