Os Direitos Humanos ( DH ) podem ser classificados de acordo com a finalidade. De um lado, há os direitos propriamente ditos, que são os dispositivos normativos que visam ao reconhecimento jurídico de pretensões inerentes à dignidade de todo ser humano ( * vide nota de rodapé ). De outro lado, há as previsões normativas que asseguram a existência destes direitos propriamente ditos, sendo denominados garantias fundamentais. As garantias fundamentais visam a assegurar a fruição dos direitos propriamente ditos. O reconhecimento da existência das garantias fundamentais tem como importante consequência a proteção constitucional ( e internacional ) contra a supressão legislativa ou ainda contra a eventual modificação erosiva por emendas constitucionais ( por constituírem-se em cláusulas pétreas ).
Por sua vez, as garantias fundamentais podem ser classificadas em várias espécies. Em primeiro lugar, há a divisão entre as chamadas garantias em sentido amplo e as garantias em sentido estrito ( os chamados remédios fundamentais ). Em segundo lugar, é possível a divisão das garantias de acordo com o origem nacional ( garantias nacionais ) ou ainda internacional ( garantias internacionais ).
As garantias fundamentais em sentido amplo consistem em um conjunto de meios de índole institucional e organizacional que visa a assegurar a efetividade e observância dos DH. É possível ainda denominar estas garantias, em sentido amplo, "garantias institucionais", uma vez que contemplam estruturas institucionais públicas ( por exemplo, o Ministério Público e a Defensoria Pública ) e privadas ( por exemplo, liberdade de imprensa - *2 vide nota de rodapé ) imprescindíveis à plena efetividade dos DH.
Em primeira garantia em sentido amplo dos DH é a garantia diante do Poder Legislativo, que deve legislar conforme aos DH. A Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) lista vários direitos em seu corpo, dotando-os naturalmente de estatuto constitucional, superior às leis. Assim, o controle de constitucionalidade das leis serve como garantia dos DH. Mesmo a emenda constitucional ( EC ) pode ser fulminada, se tender a abolir os "direitos e garantias individuais" ( Artigo Sessenta, Parágrafo Quarto, Inciso Quarto, da CF - 88 ).
A segunda garantia em sentido amplo consiste na exigência da reserva de lei ( *3 vide nota de rodapé ) para a atuação do Poder Público, que consta como princípio da Administração Pública brasileira previsto no Artigo Trinta e sete da CF - 88.
A terceira garantia em sentido amplo é a cláusula da reserva de jurisdição ou reserva absoluta de jurisdição, que consiste na exigência de autorização judicial prévia para a restrição e supressão de determinado direito. Consiste no "monopólio da primeira palavra" ou "monopólio do juiz", no linguajar de Canotilho ( *4 vide nota de rodapé ), pelo qual, em certos casos de apreciação de restrição de direitos, a jurisdição deve dar não somente a última palavra, mas também a primeira palavra ( autorizando ou negando ).
A CF - 88 aceitou a garantia da reserva absoluta de jurisdição, ao dispor que determinados atos de grave intervenção em direitos individuais somente podem ser deferidos pelo Poder Judiciário, com a exclusão de todas as demais autoridades públicas. De acordo com o Supremo Tribunal Federal ( STF ), a garantia constitucional da reserva da jurisdição incide sobre as hipóteses de:
1) busca domiciliar ( CF - 88, Artigo Quinto, Inciso Onze );
2) interceptação telefônica ( CF - 88, Artigo Quinto, Inciso Doze ) e
3) decretação da prisão, ressalvada a situação de flagrância penal ( CF - 88, Artigo Quinto, Inciso Sessenta e um - conferir no Mandado de Segurança número Vinte e três mil seiscentos de trinta e nove / Distrito Federal, relator Ministro Celso de Mello, publicado no Diário da Justiça em Dezesseis de fevereiro de Dois mil e um ). Por outro lado, não há falar em reserva de jurisdição na quebra ou transferência de sigilos bancário, fiscal e de registros telefônicos, pois no teor da CF - 88, estas podem inclusive ser determinadas por Comissão Parlamentar de Inquérito ( CPI ) ( STF, Mandado de Segurança número Vinte e três mil quatrocentos e oitenta, relator Ministro Sepúlveda Pertence, Diário da Justiça da União de Quinze de setembro de Dois mil ).
A quarta garantia em sentido amplo consiste no próprio acesso à justiça ou universalidade da jurisdição ( *5 vide nota de rodapé ), que se funda na possibilidade de se atacar, perante o Poder Judiciário, qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito ( Artigo Quinto, Inciso Trinta e cinco, da CF - 88 ).
A quinta garantia em sentido amplo consiste na implantação de novo perfil do Ministério Público e da Defensoria Pública, que, em seus respectivos âmbitos de atuação, são indispensáveis á proteção dos direitos fundamentais. No caso do Ministério Público, por exemplo, este novo perfil engloba prerrogativas que concernem à "autonomia administrativa e financeira desta instituição, ao processo de escolha, nomeação e destituição de seu titular e ao poder de iniciativa dos projetos de lei relativos á sua organização" ( Ação Declaratória de Inconstitucionalidade número Dois mil trezentos e setenta e oito, relator Ministro Maurício Corrêa, julgado em Dezenove de maio de Dois mi e quatro, Plenário, Diário da Justiça de Seis de setembro de Dois mil e sete ). No mesmo sentido, o STF reconheceu que a independência e a autonomia do Ministério Público representam garantias institucionais que foram feridas pela previsão de nomeação de Promotor Ad hoc pela corregedoria do Poder Judiciário de Goiás ( Ação Declaratória de Inconstitucionalidade número Dois mio oitocentos e setenta e quatro, relator Ministro Marco Aurélio, julgado em Oito de agosto de Dois mil e três, Plenário, Diário da Justiça de Três de outubro de Dois mil e três ). Consequentemente, uma emenda constitucional hipotética que buscasse eliminar este novo perfil seria inconstitucional por ofensa à garantia de DH.
Estes exemplos não são exaustivos. Por exemplo, há quem defenda que a laicidade do Estado caracteriza-se como uma verdadeira garantia institucional da liberdade religiosa individual ( *6 vide nota de rodapé ). O STF reconheceu, por exemplo, que o Artigo Dezesseis da CF - 88 ( "Artigo Dezesseis. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando á eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência" ) consiste em uma "garantia institucional da anualidade" ( voto do Ministro Gilmar Mendes, em julgamento no qual o STF, à unanimidade, decidiu não aplicar ás Eleições de Dois mil e seis a Emenda Constitucional - EC - Cinquenta e dois - ver Ação Declaratória de Inconstitucionalidade número Três mil seiscentos e oitenta e cindo relator Ministra Ellen Gracie, julgado em Vinte e dois de março de Dois mil e seis, Plenário, Diário da Justiça de Dez de agosto de Dois mil e seis ). Na mesma linha, o STF entendeu que a imunidade parlamentar é "garantia institucional deferida ao Congresso Nacional ( CN ). O congressista, isoladamente considerado, não tem, sobre ela, qualquer poder de disposição", não cabendo, então, falar de "renúncia" à imunidade 9 Inquérito número Quinhentos e dez / Distrito Federal, relator Ministro Celso de Mello, Plenário, unânime, Diário da Justiça de Dezenove de abril de Mil novecentos e noventa e um ).
Quanto às garantias institucionais de índole privada, reconhece-se um feixe de dispositivos que representam instituições como o casamento, família, maternidade, opinião pública, aptos a abrigar diversos DH e que merecem, assim, proteção especial.
Porém, deve-se ficar atento com uma banalização de conceito de garantira institucional ( que pode gerar decisionismo e arbítrio na solução de conflito entre garantias institucionais ), que só pode ser utilizado para definir uma forma de organização do Estado ou da sociedade cuja existência é indispensável para assegurar determinado direito fundamental.
Já as garantias fundamentais em sentido estrito consistem no conjunto de mecanismos processuais ou procedimentais destinada a proteger os direitos essenciais ( *7 vide nota de rodapé ) dos indivíduos. Estas garantias são de ordem nacional e internacional. No plano nacional, as garantias em sentido estrito estão previstas na própria CF - 88, e são denominadas remédios constitucionais, a saber habeas corpus ( *8 vide nota de rodapé ), mandado de segurança ( *9 vide nota de rodapé ), habeas data, mandado de injunção, direito de petição ( *10 vide nota de rodapé ), ação popular e ação civil pública. No plano internacional que interessa ao Brasil, há o direito de petição internacional a órgãos quase judiciais, como Comissão Interamericana de DH e Comitês estabelecidos em determinados tratados universais ( celebrados no âmbito da Organização das Nações Unidas - ONU ). Cabe lembrar que no sistema europeu de DH, há ainda o direito de ação internacional das vítimas de violação de DH contra os Estados responsáveis pela conduta ofensiva.
P.S.:
Notas de rodapé:
* O direito à dignidade humana é melhor detalhado em:
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-teoria-geral .
*2 A liberdade de informação e livre divulgação dos fatos é melhor detalhada em:
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-49 .
*3 O princípio da reserva legal é melhor detalhado em;
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-64 .
*4 Canotilho, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Sétima edição. Coimbra: Almedina, Dois mil e oito.
*5 A garantia do acesso à justiça é melhor detalhada em:
*6 Sarmento, Daniel. O crucifixo nos tribunais e a laicidade do Estado, Revista Eletrônica PRPE. Disponível em: < www.prpe.mpf.mp.br/internet/.../RE_%20Danielsarmento2.pdf >. Acesso em: Quinze de setembro de Dois mil e vinte.
*7 Os direitos essenciais são melhor detalhados em:
*8 O direito de habeas corpus são melhor detalhados em:
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-a-lei-do-habeas-corpus-de-1679 .
*9 O mandado de segurança é melhor detalhado em:
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-52 .
*10 O direito de petição é melhor detalhado em:
https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-52 .
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