quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Gestão de pessoas: Hawthorne e as relações humanas

Há anos, Peter F. Drucker recebeu carta do presidente de uma empresa: emprego duas mil e trezentas e pessoas, a maioria mulheres, fazendo trabalho de montagem não qualificada. Por favor, envie-me tão cedo quanto possível um manual de políticas de pessoal adequadas e junte sua nota de honorários. Durante muito tempo, Drucker dizia ter lembrado dessa carta como uma piada, embora não intencional. Porém, mais recentemente, ocorreu a ele que a graça estava realmente em sua interpretação. Seu remetente, começava a achar, era muito parecido com a criança do conto de Andersen intitulado "A roupa do imperador", que teve a inocência de dizer, em alto e bom som, que o rei estava nu, quando todo mundo fingia que via as roupas do soberano.

Boa parte do que se passa hoje na administração da organização humana é mecânica por natureza e, de fato, poderia ser enviada pelo correio. Os dois conceitos gerais sobre administração do trabalhador - administração de pessoal e relações humanas - veem a tarefa a ser feita como algo que se incrusta na empresa. A administração de pessoal trata das atividades e procedimentos: recrutamento e seleção, cargos e salários, treinamento. As relações humanas, como o termo é comumente usado, cuida da satisfação, da comunicação e das atitudes em relação aos empregados. No entanto, ambas as abordagens parecem concordar que gerenciar o trabalhador e o trabalho não exige qualquer mudança na maneira como se conduz a empresa. E as ferramentas e os conceitos necessários parecem aplicar-se igualmente a qualquer empresa.

Indício de que talvez essa não seja a abordagem certa é a falta de progresso, de novas ideias e de novas contribuições, seja em administração de pessoal, seja em relações humanas. Em nenhum outro campo de toda a área da administração tantas pessoas trabalham com tanto afinco. Os departamentos de pessoal estão crescendo como o pé de feijão de João; e todos se inspiram nos trabalhos de pesquisadores adornados com os vistosos PhDs e equipados com poderosos computadores. Em todas as universidades, centenas de pessoas coletam dados, fazem pesquisas e proferem conferências sobre o tema. Com efeito, desenvolveu-se toda uma gama de novas disciplinas - psicologia industrial, sociologia industrial, antropologia industrial, relações industriais, administração de pessoal e assim por diante. Todas produzem dissertações que se supõem originais. Todas publicam livros e promovem eventos. Dezenas de periódicos se dizem especializados nesse campo. E nenhuma organização digna de respeito realizaria uma convenção sem pelo menos ma palestra sobre a gestão de pessoas no trabalho.

E qual tem sido o resultado de toda essa azáfama, o que todo esse trabalho de tanta gente boa, dedicada e inteligente produziu de concreto?

A administração de pessoal, como em geral se compreende o termo, começou com a Primeira Guerra Mundial. Ela surgiu com o recrutamento, treinamento e pagamento de grandes massas de novos trabalhadores no esforço de produção para a guerra. O conflito já terminou há mais de cem anos. No entanto, tudo o que sabe-se sobre administração de pessoal já era conhecido no começo da década de vinte, tudo o que é praticado agora, já era praticado então. Houve refinamentos, mas pouco se chegou além disso. Tudo o que se encontra num dos grandes dispêndios de hoje ( salvo o capítulo sobre relações sindicais ) pode ser encontrado, por exemplo, nos artigos e trabalhos de Thomas Spates ( um dos pais da administração de pessoal ), publicados no começo da década de vinte. Apenas ocorreram contribuições com a roupagem pesada da retórica humanitária - do mesmo modo que um cozinheiro trapalhão derrama um pouco de molho sobre a carne que passou do ponto.

A mesma aridez intelectual também se manifesta no campo das relações humanas - embora, talvez, haja ainda mais atividade nessa área. Também as relações humanas se desenvolveram a partir da Primeira Guerra Mundial; porém, demorou um pouco mais para amadurece. Ela alcançou o apogeu com os famosos experimentos conduzidos por Elton Mayo e colegas, de Harvard, por volta de mil novecentos e vinte e oito - há quase um século - , na fábrica da Western Eletric Company ( subsidiária industrial da Bell Telephone System ), em Hawthorne, Ilinois. Esses experimentos demonstraram que os fatores sociais e psicológicos, a atenção recebida pelos trabalhadores, por exemplo, talvez influenciem mais a produtividade que as condições de trabalho físicas, como iluminação no local de trabalho ou remuneração recebida pelo trabalhador. E os relatórios do grupo de Harvard sobre o trabalho em Hawthorne ainda são o melhor, o mais avançado e o mais completo estudo sobre o tema. Com efeito, ainda se discute os muitos refinanciamentos acrescentados posteriormente, pelo trabalho de inúmeros estudiosos da indústria, dos sindicatos trabalhistas e das universidades, esclareceram ou obscureceram o insight original.

Evidentemente, a simples novidade não é garantia de qualidade. no entanto, é improvável que uma nova disciplina irrompa pronta e acabada, no nascimento, como Vênus das ondas. Em geral, decorrem décadas para se erigir o edifício sobre as fundações construídas pelos primeiros pensadores. Também é de todo improvável que essas duas novas disciplinas tenham sido abençoadas com o dom da maturidade no nascimento. Talvez a razão pela qual se ergueu tão pouco sobre os alicerces da administração de pessoal e das relações humanas seja o fato de que as fundações em si serem inadequadas. Outras informações podem ser obtidas no livro Fator humano e desempenho, de autoria de Peter F. Drucker.

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