segunda-feira, 20 de maio de 2019

Trade-off: a difícil tomada de decisões em condições de escassez

Em toda a Europa ocidental, de Frankfurt a Bonn ( Alemanha ), de Bruxelas ( Bélgica ) a Oslo ( Noruega ), o quadro econômico, em mil novecentos e oitenta e um, permanecia igual, independentemente das  das mudanças de cenário e de língua: produtividade declinante, desemprego - especialmente entre os jovens - , déficits públicos, inflação aumentando e investimento em estagnação. A estagflação era a enfermidade britãnica dez anos antes e, em em mil novecentos e setenta e oito, era a enfermidade americana. Em mil novecentos e oitenta e um ela se tornou a enfermidade europeia.

Os políticos da Europa, é claro, estavam culpando os vilões externos por seu mal. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo ( OPEP ) era um alvo favorito, muito embora três das economias mais doentes da Europa à época  - Grã-Bretanha, Holanda e Noruega - sejam exportadoras líquidas de óleo cru e gás natural e, portanto, beneficiadas dos altos preços do petróleo.

Somente um pouco menos popular como vilã era a política econômica americana com suas taxas de juros artificialmente altas e seu dólar artificialmente alto. Havia apenas dois ou três anos, porém, os europeus estavam reclamando das taxas de juros artificialmente baixas dos Estados Unidos da América ( EUA ) e do dólar artificialmente baixo. Até mesmo os políticos admitiam que a maior parte do fluxo de capital para os EUA não era dinheiro especulativo nem depósitos de curto prazo atraídos por altas taxas de juros. Ao contrário, este fluxo consiste em investimentos de longo, que pouco estavam sendo afetados por diferenciais de taxas de juros.

Embora toda a Europa ocidental estivessem sofrendo do mesmo mal, cada país receitava um tratamento muito diferente. Os britânicos, então sob o governo conservador de Margaret Thatcher, estavam empenhados no primeiro experimento com o monetarismo. Os franceses, então sob o governo de Giscard d'Estaign, praticaram uma forma de economia do lado da oferta que fez a incidência de impostos passar da produção para o consumo.

Os alemães tornaram-se keynesianos tardiamente e praticavam a administração da demanda - pesados subsídios para gerar emprego e estimular o consumo, acompanhados de déficits governamentais descontrolados. E, naquele momento, os franceses, sob o governo de um novo presidente, François Mitterrand, deram uma guinada de cento e oitenta graus rumo a um keynesianismo ainda mais agressivo do que aquele praticado em toda a região do Reno - um keynesianismo completo, com política de estímulo, acentuados aumentos de salários e reduções da jornada semanal, aposentadoria obrigatória com pensões / aposentadorias mais altas e disparada nos gastos públicos.

Cada um daqueles tratamentos era totalmente ineficiente. Em que pese o setor público primeiramente busca a eficácia, ainda que a um custo temporariamente mais elevado, para só em outro momento buscar redução de custos e eficiência, depois de já garantida a eficácia e a transferência de tecnologia. O setor privado percorre o caminho inverso: primeiro busca a eficiência para entrar e / ou permanecer no mercado, para só depois verificar se a eficiência atingida resultou em eficácia. Para este setor, não há problema em ser temporariamente ineficaz, uma vez garantida a lucratividade.

O problema era que os europeus ainda achavam que a política econômica podia ser relativamente indolor. Nos últimos noventa anos, de ambos os lados do oceano Atlântico, a economia havia sido pensada como a ciência alegre. Por mais que as diferentes escolas de pensamento econômico tivessem discordado, todas elas pensavam que sua linha econômica poderia prometer prosperidade sem dor e sem ter de enfrentar escolhas políticas impopulares.

Há mais de cento e quarenta anos, Thomas Carlyle chamou a economia de dismal science, a ciência desoladora, porque ela relembra, a todo momento, que tudo tem um custo e, portanto, um preço, que nada pode ser consumido se não for antes produzido, que nada pode ser produzido ser trabalho e sacrifício e, acima de tudo, que há de ser fazer escolhas entre satisfações concorrentes, entre o presente e o futuro e entre valores objetivos conflitantes.

Porém, a economia dos últimos noventa anos, ao menos conforme entendida por não economistas e por políticos, tem pregado soluções relativamente simples e indolores para o problema da escolha econômica. A panaceia keynesiana era, em essência, a administração da demanda de consumo, a criação de poder de compra por meio de gastos públicos. A panaceia monetarista envolvia manter a base monetária estável. Para o economistas do lado da oferta, cortes nas alíquotas de impostos aumentariam simultaneamente o consumo, o investimento e a receita fiscal total.

Os europeus, à época, ainda queriam acreditar nestas terapias. Quer suas políticas vigentes fossem keynesianas, monetaristas ou do lado da oferta, todas elas expressavam a mesma esperança - de quem um país e o seu governo não precisava enfrentar decisões duras.

Os verdadeiros vilões da Europa não eram a OPEP nem a taxas de juros americanas. Ao contrário, os formuladores de políticas europeus precisavam encarar e lidar com algumas escolhas estruturais e políticas difíceis. Quanta renda nacional podia ser transferida de produtores para não produtores? Que limites era necessário se impor ao tamanho dos custos indiretos governamentais em uma economia? Quanto da renda nacional podia ir para o fundo de salários em vez de par ao fundo de capital sem estimular o desemprego e a depressão? Que recompensas e incentivos são necessários para a adequada formação de capital?

Estas são perguntas impopulares. Qualquer resposta tende a ser tanto controversa como altamente arriscada.

Mas evitar estas perguntas se aferrando à economia dos últimos noventa anos pode ser ainda mais arriscado. É consenso geral que Margareth Thatcher fracassou porque não enfrentou as fraquezas estruturais da Grã-Bretanha. Confiando na panaceia do monetarismo, suas políticas deixaram intocada a parte improdutiva da economia britânica - um governo inflado, um funcionalismo públicos com salários altos demais e perdedores altamente subsidiados - , enquanto caía com toda a força em cima do setor produtivo. A versão da economia do lado da oferta de Giscard d'Estaing teve o mesmo efeito, como também o keynesianismo de Helmut Schmidt.

Taxas de juros artificialmente altas não explicam por que o capital europeu estava buscando investimento nos EUA; na realidade, elas seriam até meio coibitivas. A verdadeira razão é que o Governo do ator Ronald Reagan estava atacando os problemas estruturais e fazendo escolhas. Não havia muito mais de economia do lado da oferta no pacote editado por Reagan; os cortes nas alíquotas de impostos eram basicamente aquilo que qualquer governo teria pedido àquela altura. Mas Reagan fez uma tentativa genuína no sentido de limitar o papel do governo e cortar grande gama de gastos e programas.

Se as escolhas eram ou não corretas, era uma questão de opinião. Peter F. Drucker dizia gostar de ter visto mais coragem em atacar vacas sagradas como a Previdência Social e programa de cupons de desconto em alimentos, e mais discernimento no tratamento de áreas politicamente fracas, mas economicamente importantes, como o apoio à ciência e à pesquisa. Mas a fúria maior despertada pelo orçamento de Reagan não foi resultado das escolhas que foram feitas; qualquer outra lista teria provocado protestos igualmente agoniados. Ela tinha a ver com a aceitação da realidade, com a necessidade de fazer escolhas. Economia era, de novo, a ciência desoladora, a ciência das limitações, dos riscos e das escolhas.

Também a Europa logo terá de seguir pelo mesmo caminho e deixar a economia voltar a se tornar economia política. A mudança pode não ser ruim para a economia como disciplina. Os economistas, é claro, deixariam de ser populares ou amigos de políticos; ninguém gosta de instrumentos de tortura. Mas, afinal, economia é a disciplina de decisões racionais sob condições de escassez. E esta disciplina, em vez de um bom camarada, talvez seja mais apropriada como companheira de consciência. Outras informações podem ser obtidas no livro Os novos desafios dos executivos, de autoria de Peter F. Drucker.

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