quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Economia: inteligência + sabedoria = vida + resistência

Os dois maiores economistas do século vinte, Joseph A. Schumpeter e John Maynard Keynes,nasceram com diferença de meses, há cento e quarenta anos: o primeiro em oito de fevereiro de mil oitocentos e oitenta e três, em uma provinciana cidade da Áustria, e o segundo, em cinco de junho de mil oitocentos e oitenta e três, em Cambridge, Inglaterra. ( Eles morreram com uma diferença de quatro anos : Schumpeter em Connecticut - Estados Unidos da América - EUA, em oito de janeiro de mil novecentos e cinquenta, e Keynes no sul da Inglaterra, em vinte e um de abril de mil novecentos e quarenta e seis. ). O Centenário do nascimento de Keynes foi celebrado com uma plêiade de livros, artigos, conferências e discursos. Se alguém se lembrasse do centenário de Schumpeter, teria sido em uma pequena conferência para estudiosos. Entretanto, está se tornando cada vez mais cristalino que é Schumpeter quem irá moldar o pensamento e responder às questões sobre teoria e política econômica por mais de cem anos após sua morte.

Os dois homens não eram adversários. Ambos desafiaram pressupostos há muito estabelecidos. Os oponentes de Keynes eram os austríacos, de quem o próprio Schumpeter havia sido uma dissidência quando estudante: os economistas neoclássicos da Escola Austríaca. E, embora Schumpeter considerasse todas as respostas de Keynes erradas ou, pelo menos, enganosas, era um crítico solidário. Com efeito, foi Schumpeter quem estabeleceu Keynes nos EUA. Quando a obra-prima de Keynes, A teoria geral do emprego, do juro e da moeda, foi publicada, em mil novecentos e trinta e seis, Schumpeter, então membro sênior do corpo docente de Harvard, disse a seus alunos que lessem o livro e também que o trabalho de Keynes havia superado totalmente seus escritos anteriores sobre moeda.

Keynes, por sua vez, considerava Schumpeter um dos poucos economistas contemporâneos que mereciam respeito. Em suas aulas, ele sempre se referia aos trabalhos que Schumpeter havia publicado durante a Primeira Guerra Mundial, especialmente o ensaio Rechenpfennige ( isto é, unidade de conta ) como estímulo inicial para suas próprias reflexões sobre moeda. A proposta de política econômica mais bem-sucedida de Keynes, a de que a Grã-Bretanha e os EUA financiassem a Segunda Guerra Mundial com impostos, e não com empréstimos, foi extraída diretamente de advertência de Schumpeter, de mil novecentos e dezoito, sobre as desastrosas consequências do financiamento da dívida da Promeira Guerra Mundial.

Schumpeter e Keynes estão frequentemente em posições politicamente opostas: o primeiro é descrito como conservador, enquanto o segundo, como radical. O oposto seria provavelmente mais correto. Politicamente, as opiniões de Keynes eram bastante semelhantes ao que chama-se hoje de neoconservadorismo. Sua teoria teve origem em sua apaixonada ligação com o mercado livre e em sue desejo de manter políticos e governos fora disto. Schumpeter, por outro lado, tinha sérias dúvidas sobre o mercado livre. Ele acreditava que um monopólio inteligente - o sistema American Bell Telephone, por exemplo - tinha grandes vantagens. Poderia tratar do longo prazo, em vez de se orientar transação a transação, em um expediente de curto prazo. Seu amigo mais próximo, durante muitos anos, era o mais radical e doutrinário dos socialistas da Europa, o austríaco Otto Bauer, que, embora convicto anticomunista, era, ainda mais anticapitalista ( ou antiliberalista ). E Schumpeter, embora jamais tenha chegado perto de ser considerado um socialista, serviu, em mil novecentos e dezenove, como ministro de Finanças no único governo socialista da Áustria entre as duas guerras. Schumpeter sempre sustentou que Marx estava completamente errado em todas as suas respostas. Mas ainda se considerava um filho de Marx e o respeitava mais do que qualquer outro economista. Pelo menos, assim argumentava, Marx fez as perguntas certas, e, paraSchumpeter, as perguntas sempre eram mais importantes que as respostas.

As diferenças entre Schumpeter e Keynes vão muito mais a fundo que teoremas econômicos e opiniões políticas. Ambos enxergavam realidades econômicas diversas, tinham preocupações com problemas distintos e definiam economia de forma muito diferente. Estas diferenças são extremamente importantes para o entendimento do mundo econômico atual.

Keynes, por mais que tenha se distanciado da teoria econômica clássica, operava inteiramente dentro de seus limites. Ele era um herege, e não um infiel. Para Keynes, a economia era a economia do equilíbrio, das teorias e Ricardo, formuladas em mil oitocentos e dez, e que dominaram o século dezenove. Esta teoria econômica lida com um sistema fechado e um estático. a pergunta-chave de Keynes era a mesma que os economistas do século dezenove faziam: "Como é possível manter uma economia equilíbrio e êxtase?'.

Para Keynes, o principal problema da economia são as relações entre a economia real de bens e serviços e a economia de símbolos, da moeda e do crédito; as relações entre indivíduos e empresas e a macroeconomia da nação-estado; e, finalmente, se a produção ( isto é, a oferta ) ou o consumo ( isto é, a demanda ) fornecem a força motriz da economia. Neste sentido, Keynes estava diretamente alinhado com Ricardo, John Stuart Mill, os austríacos e Alfred Marshall. Por mais que discordassem em outros assuntos, a maior parte deste economistas do século dezenove - e isto inclui Marx, dera a mesma resposta a estas perguntas: os controles da economia real e a moeda são apenas o véu das coisas - a microeconomia dos indivíduos e das empresas determina, e o governo pode, na melhor das hipóteses, corrigir discrepâncias menores e, na pior, criar deslocamentos; controles de fornecimento, tendo a demanda como sua função.

Keynes fez suas mesmas perguntas que Ricardo, Mill, Marx, os austríacos e Marshall fizeram, mas, com uma audácia sem precedentes, virou cada uma das respostas de cabeça para baixo. No sistema keynesiano, a economia de símbolos, de moeda e crédito, é real, e bens e serviços dependem dela e de suas sombras. a macroeconomia - a economia da nação-estado - é tudo. Nela, indivíduos e empresas não têm poder de influência sobre - muito menos de direcionar - a economia ou a capacidade de tomar decisões eficazes contrárias às forças da macroeconomia. E fenômenos econômicos, formação de capital, produtividade e emprego são funções da demanda.

A esta altura, é sabido - como sabia Schumpeter há quase um século - que cada uma destas respostas keynesianas está errada. Ou, pelo menos, são válidas apenas para casos especiais e muito específicos. Por exemplo, o teorema-chave de Keynes: eventos monetários - déficits de governo, taxas de juros, volume de crédito e volume de moeda circulante - determinam a demanda e, com ela, as condições econômicas. Isto pressupõe, como o próprio Keynes ressaltava, que a velocidade do giro da moeda é constante, não sendo possível que indivíduos ou empresas a modifiquem no curto prazo. Schumpeter destacou, há quase um século, que todas as evidências desmentem este pressuposto. E, com efeito, sempre que se fez uma tentativa, as políticas econômicas keynesianas, sejam na versão original, sejam na versão modificada por Friedman, sempre foram derrotadas pela microeconomia das empresas e dos indivíduos, imprevisivelmente e sem aviso, mudando a velocidade do giro da moeda quase da noite para o dia.

Quando as receitas keynesianas foram inicialmente tentadas - nos EUA, nos primeiros dias do New Deal - , à primeira visa pareciam funcionar. Mas, então, por volta de mil novecentos e trinta e cinco, consumidores e empresas, em um período de alguns meses, repentinamente reduziram, de forma acentuada, a velocidade do giro da moeda, o que anulou uma recuperação que tinha por base os gastos do déficit do governo e provocou um segundo colapso do mercado de ações, em mil novecentos e trinta e sete. O melhor exemplo, contudo, é o que aconteceu nos EUA em mil novecentos e oitenta e um e mil novecentos e oitenta e dois. A tentativa deliberada do Federal Reserve ( o equivalente ao Banco Central dos EUA ) de controlar a economia mediante o controle da oferta monetária foi derrotada, em grande parte, por consumidores e empresas que, de repente e quase violentamente, transferiram os depósitos de poupança para aplicações no mercado aberto ( open market ) e de investimentos de longo prazo para ativos líquidos - isto é, de moeda de baixa velocidade para de alta velocidade - até o ponto em que ninguém conseguia mais dizer qual e era oferta monetária - nem mesmo o que este termo significava. Indivíduos e empresas, buscando otimizar o próprio interesse i guiados por sua percepção de realidade econômica, sempre encontrarão um meio de derrotar o sistema - seja convertendo a totalidade da economia em um único e gigantesco mercado negro, como ocorreu na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas ( URSS - atual Federação Russa ), seja transformado os sistema financeiro, da noite para o dia, apesar das leis, regulações e dos economistas, como foi o caso dos EUA, em mil novecentos e oitenta e um e mil novecentos e oitenta e dois.

Isto não quer dizer que a economia provavelmente retorne para o neoclassicismo pré-keynesiano. As críticas de Keynes às respostas neoclássicas são tão definitivas quanto as críticas de Schumpeter e Keynes. Mas, como agora é sabido que indivíduos são capazes de derrotar o sistema - e o farão - , perderam-se as certezas que Keynes imôs à economia e que tornaram seu sistema e a estrela-gua da teoria econômica e das políticas econômicas por quase um século. Tanto o monetarismo de Friedman quanto a supply-side economics são tentativas desesperadas de se consertar o sistema keynesiano de economia do equilíbrio. No entanto, é pouco provável que qualquer uma destas duas alternativas possa restaurar a independente e autoconfiante economia do equilíbrio, muito menos uma teoria ou política econômica em que um único fator - sejam gastos do governo, taxas de juros, oferta monetária ou cortes de impostos - possa controlar a economia com previsibilidade e quase-certeza.

O fato de que as respostas keynesianas não iriam se provar muito mais mais válidas do que as anteriores, por elas substituídas, estava claro para Schumpeter desde o início. Mas, para ele, esto era muito menos importante do que o fato de que as questões keynesianas - e também as questões predecessoras - não poderiam ser nem mesmo consideradas, em sua opinião, questões importantes. Para Schumpeter, a falácia básica era o próprio pressuposto de que a economia saudável, a economia normal, seria uma economia em equilíbrio estático. Desde seus tempos de estudante, ele sustentava que uma economia moderna estará sempre em desequilíbrio dinâmico. a economia de Schumpeter não é um sistema fechado, como o universo de Newton ou a macroeconomia de Keynes. Ela está em crescimento e transformação perenes. Além disto, sua natureza é biológica, e não mecanicista. Se Keynes era um herege, Schumpeter era um infiel.

Schumpeter foi, ele mesmo, aluno dos grandes homens da economia austríaca em uma época em que Viena era a capital mundial da teoria econômica. Ele manteve a afeição por seus professores pelo resto da vida. Contudo, sua tese de doutorado - que se tornou o primeiro de seus grandes livros, The theory of economic development ( Teoria do desenvolvimento econômico ), que em sua versão original em alemão, foi publicado em mil novecentos e onze, quando ele tinha vinte e oito anos de idade - começa com a assertiva de que o problema central da economia não é equilíbrio, mas mudança estrutural. Isto, então, levou à formulação de seu famoso teorema do inovador como o verdadeiro objeto de estudo da economia.

A economia clássica considerava a inovação fora do sistema - e Keynes concordava com isto. Inovação pertenceria à categoria de catástrofes externas, assim como um terremoto, o clima ou uma guerra que, como todos sabiam, exerciam profunda influência na economia, mas não faziam parte da teoria econômica. Schumpeter insistia que, em contrapartida, a inovação - isto é, o empreendedorismo que transfere recursos de aplicações antigas e obsoletas para outras, novas e mais produtivas - é a própria essência da teoria econômica e, com toda certeza, da economia moderna.

Schumpeter extraiu este conceito - ele mesmo era o primeiro a admitir - de marx. Mas o utilizou para provar que Marx estava errado. em seu livro, Economic development ( Desenvolvimento econômico ), Schumpeter faz o que nem os economistas clássicos nem Marx ou Keynes foram capazes de fazer: o lucro, em contraste com Marx e sua teoria, não é um Mehrwert, uma mais-valia roubada dos trabalhadores. Ao contrário, é a única fonte de emprego e de receita do trabalho para os trabalhadores. A teoria do desenvolvimento econômico demonstra que ninguém, com exceção do inovador, consegue ter lucro genuíno; e o lucro do inovador sempre tem vida curta. Mas inovação, segundo a famosa frase de Schumpeter, é também destruição criativa. Ela torna obsoletos os bens de capital e os investimentos de capital do passado. Quanto mais uma economia progride, de mais formação de capital, portanto, ela precisará. Assim, aquilo que o economista clássico - ou o contador ou a bolsa de valores - considera lucro é custo genuíno, o custo de se manter no negócio, o custo de um futuro em que nada é previsível, exceto que hoje a empresa lucrativa se tornará o elefante branco do futuro. Portanto, a formação de capital e a produtividade são necessárias para manter a capacidade de produção de riqueza da economia e, acima de tudo, para manter os empregos atuais e para criar os empregos do futuro.

O inovador de Schumpeter - justamente com sua destruição criativa - é, até aqui, a única teoria que explica por que existe algo que Peter F. Drucker chamava de lucro. Os economistas clássicos sabiam muito bem que sua teoria não provia qualquer lógica para o lucro. Com efeito, na economia do equilíbrio de um sistema econômico fechado, não há lugar para o lucro, nenhuma justificativa para ele, nenhuma explicação. Contudo, se o lucro for um custo genuíno e, especialmente, se o lucro for o único modo de se manter empregos e de criar novos, então o capitalismo se torna, novamente um sistema moral.

Moralidade e lucros

Os economistas clássicos haviam apontado para o fato de que os lucros seriam necessários como um incentivo ao tomador de risco. Mas não seria isto um suborno e, portanto, impossível de se justificar moralmente? Este dilema levou John Stuart Mill, o economista mais brilhante do século dezenove, já em idade mais avançada, a adotar o socialismo. E tornou mais fácil, para Marx, fundir uma análise desapaixonada do sistema ao engulho moral de um profeta da Torá ( Antigo Testamento ) contra os exploradores. A debilidade, do ponto de vista moral, do incentivo lo lucro permitiu a Marx condenar, de saída, o capitalista como perverso e imoral e assegurar cientificamente que ele não temo qualquer função e que sua rápida morte era inevitável. contudo assim que alguém muda do axioma de uma economia imutável, independente e fechada para a economia dinâmica, crescente, transformadora e cambiante de Schumpeter, o que se denomina de lucro deixa de ser imoral - e se torna um imperativo moral. Efetivamente, a questão à época não era mais a questão que agitou os clássicos e ainda agitava Keynes: Como pode a economia ser estruturada para minimizar o suborno do excedente sem função, chamado lucro, que deve ser repassado ao capitalista para manter a economia em movimento? As perguntas na economia de Schumpeter são sempre: Há o lucro suficiente? Existe formação de capital adequada para sustentar os custos do futuro, os custos de se manter no negócio, os custos da destruição criativa?

Isto por si só, torna o modelo econômico de Schumpeter o único que pode servir de ponto de partida para as políticas econômicas de que se precisa. Claramene, o tratamento Keynesiano - ou clássico - da inovação como externa e, na verdade, periférica à economia, com pouquíssimo impacto, já não pode mais ser mantido ( se é que um dia foi! ). A questão básica da teoria econômica e da política econômica, especialmente em países altamente desenvolvidos, é: Como a formação de capital e a produtividade podem ser mantidas, de modo que a rápida mudança tecnológica e o emprego possam ser sustentados? Qual é o lucro mínimo necessário para pagar os custos do futuro? Qual é o lucro mínimo necessário, acima de tudo, para os empregos existentes e para criar outros novos?

Schumpeter não respondeu. Ele não acreditava muito em respostas. Mas, há cento e dez anos, quando ainda era bem jovem, ele fez a pergunta que será indubitavelmente a questão central da teria econômica e da política econômica dos anos à frente.

E, então, durante a Primeira Guerra Mundial, Schumpeter percebeu, muito antes de qualquer outro - e dez anos antes de Keynes - , que a realidade econômica estava mudando. ele percebeu que a guerra levara à monetarização das economias de todos os países beligerantes. Nação após nação, inclusive a sua própria e atrasada Áustria-Hungria, tinham conseguido, durante o conflito, mobilizar a totalidade da riqueza líquida da comunidade, parcialmente por meio de impostos, mas principalmente por meio de empréstimos. Moeda de crédito, em vez de bens e serviços, haviam se tornado a verdadeira economia.

Em um brilhante ensaio, publicado em um jornal de economia, em mil novecentos e dezoito - quando o mundo em que Schumpeter havia crescido e que conhecia estava desmoronando à sua volta - , ele argumentava que, daquele momento em diante, a moeda e o crédito passariam a ser as alavancas de controle. ele afirmava que nem o fornecimento de bens ( como os clássicos anunciavam ) nem a sua demanda ( como alguns dos primeiros dissidentes  haviam sustentado ) ainda estariam no controle. Fatores monetários - déficits, moedas, créditos, impostos - determinariam a atividade econômica e a alocação de recursos.

Este, é naturalmente, o mesmo insight sobre o qual Keynes, mais tarde, construiu sua Teoria Geral. Entretanto, as conclusões de Schumpeter eram radicalmente diferentes. Keynes chegou à conclusão de que o aparecimento da economia de símbolos, moeda e crédito tornou possível o rei-economista, o economista científico, que, ao manipular algumas simples chaves monetárias - gastos do governo, taxa de juros, volume de crédito ou o volume de moeda circulante - , seria capaz de manter o equilíbrio permanente, com pleno emprego, prosperidade e estabilidade. Mas a conclusão de Schumpeter foi de que o aparecimento da economia de símbolos como economia dominante abriu as portas para a tirania e, mais do que isto, na verdade, incentivou-a. O fato de o economista agora proclamar a si próprio infalível não passava, em sua opinião, de uma pretensão desmesurada. Mas, acima de tudo, ele percebeu que não seriam os economistas a exercer o poder mas os políticos e generais.

E, então, naquele mesmo ano, pouco antes do final da Primeira Guerra Mundial, Schumpeter publicou o livro The tax state - The Fiscal State ( O Estado fiscal ) teria sido uma tradução mais precisa. Novamente, o insight é o mesmo que Keynes teria quinze anos mais tarde ( e, como ele sempre reconheceu, graças, a Schumpeter ): o Estado moderno, por meio de mecanismos de impostos e empréstimos, adquiriu poder para movimentar a renda e, por meio de pagamentos sobre transferências, controlar a distribuição do Produto Interno Bruto ( PIB ). Para Keynes, este poder era uma varinha mágica para que se conseguissem justiça social e progresso econômico, além de estabilidade econômica e responsabilidade fiscal. Para Schumpeter - talvez porque ele fosse, diferentemente de Keynes, estudioso de Marx e da história - , este poder era um convite à irresponsabilidade política porque eliminava todas as salvaguardas econômicas contra a inflação. No passado, a incapacidade do Estado de cobrar mais impostos do que sobre apenas uma ínfima parcela d PIB, ou de pegar emprestado mais do que uma pequena parte da riqueza do país, tornou a inflação autolimitante. Agora, a única salvaguarda contra a inflação seria política, isto é, autodisciplina. E Schumpeter não era muito otimista acerca da capacidade de autodisciplina dos políticos.

O trabalho de Schumpeter como economista após a Primeira Guerra Mundial é de imensa importância para a teoria econômica. ele se tornou um dos pais da teoria dos ciclos econômicos. Entretanto, a verdadeira contribuição de Schumpeter ao longo dos trinta e dois anos entre o final da Primeira Guerra Mundial e sua morte, em mil novecentos e cinquenta, foi como economista político. Em mil novecentos e quarenta e dois, quando todos estavam temerosos por uma depressão deflacionária mundial, ele publicou seu trabalho mais famoso, Capitalism, socialism and democracy Capitalismo, socialismo e democracia ), ainda hoje, merecidamente, muito lido. Neste livro, ele argumentava que o capitalismo seria destruído por seu próprio sucesso. Isto geraria o que seria chamado agora de nova classe: burocratas, intelectuais, professores, advogados, jornalistas, todos beneficiados dos frutos econômicos do capitalismo e, na verdade, segundo Drucker, parasita deles. No entanto, todos contrários ao ethos da produção de riquezas, da poupança e da alocação de recursos á produtividade econômica. Os quarenta anos que se seguiram à publicação desta obra provaram que Schumpeter era um dos maiores profetas do mundo.

E, então, ele continuava argumentando que o capitalismo seria destruído pela própria democracia qe ajudara a criar e tornar possível. Isto porque, em uma democracia, para se tornar popular, o governo teria de , cada vez mais, transferir a renda do produtor para o não produtor; transferir renda de onde ela poderia ser poupada ( e se tornar o capital do futuro ) para onde seria consumida. Em uma democracia, o governo estaria submetido, então, a uma crescente pressão inflacionária. eventualmente, previu ele, a inflação destruiria tanto a democracia quanto o capitalismo. Quando ele escreveu isto, em mil novecentos e quarenta e dois, quase todos caíram na gargalhada. Nada parecia mais implausível do que um inflação baseada no sucesso econômico. Quarenta anos mais tarde, este já se tornara o principal problema tanto da democracia quanto da economia de livre mercado, exatamente como Schumpeter havia profetizado.

Os adeptos de Keynes, nos anos quarenta, davam as boas-vindas a todos em sua terra prometida, onde o rei economista garantiria o equilíbrio perfeito de uma economia eternamente estável, mediante o controle da moeda, do crédito, dos gastos e dos impostos. Schumpeter, entretanto, cada vez mais se preocupava coma questão de como o setor público poderia ser controlado e limitado de forma que fosse possível manter a liberdade política e uma economia capaz de ter um bom desempenho, crescer e mudar. Quando ele morreu, á sua mesa de trabalho, estava revisando o discurso que havia proferido como presidente da American Economic Association ( Associação Americana de Economia ) apenas alguns dias antes. A última frase que escreveu foi: "Os adeptos da estagnação estão errados em seu diagnóstico sobre o motivo pelo qual o processo capitalista deve se estagnar; eles poderão até acabar acertando seu prognóstico de que haverá estagnação - se houver suficiente contribuição do setor público.".

A frase mais conhecida de Keynes é, sem dúvida: "No longo prazo, todos estaremos mortos", que é uma das coisas mais tolas já ditas, se for interpretada fora do contexto adequado. É claro que no longo prazo todos estaremos mortos. Contudo, Keynes, em um momento de maior sabedoria, observou que as façanhas dos políticos de hoje são geralmente baseadas em teoremas de economistas há muito falecidos. E é ma completa falácia que, como sugerido por Keynes, a otimização do curso prazo da política, economia e empresa modernas - o foco no curto prazo que hoje é considerado, com inteira justiça, uma das principais fraquezas dos elaboradores de políticas dos Estados Unidos da América ( EUA ), tanto no governo quanto na iniciativa privada.

Schumpeter também sabia que as políticas devem encaixar-se no curto prazo. Ele aprendeu esta lição de modo mais difícil - como ministro de finanças do então recém-formado governo da república da Áustria, em que ele, de forma totalmente fracassada, tentou conter a inflação antes que ela saísse de controle. Ele sabia que havia falhado porque as medidas que implementara não eram aceitáveis no curto prazo - exatamente as mesmas medidas que, dois anos mais tarde, um neoeconomista, político e professor de Teologia Moral efetivamente aplicou para estancar a inflação, mas somente após a economia e a classe média do país haverem sido praticamente destruídas.

Entretanto, Schumpeter sabia bem que as medidas de curto prazo de hoje provocam impactos de longo prazo. Elas, irrevogavelmente, moldam o futuro. Não levar em conta os efeitos futuros de decisões de curto prazo e seu impacto bem depois que todos estiverem mortos é uma irresponsabilidade. E isto também conduz a decisões equivocadas. É esta constante ênfase que Schumpeter dedica às consequências de longo prazo de que é oportuno, popular, inteligente e brilhante que o torna um grande economista e um guia apropriado para os dias atuais, quando uma economia de curto prazo, inteligente e brilhante e uma prática política de curto prazo, inteligente e brilhante se tornaram falidas.

Sob vários aspectos, Keynes e Schumpeter repetiram os mais famosos confrontos dos filósofos da tradição ocidental - o diálogo platônico entre Parmênides, o brilhante, inteligente e irresistível sofista, e lento, feio mas sábio, Sócrates. Nos anos entre as duas guerras, ninguém foi mais brilhante ou mais inteligente que Keynes. Por outro lado, Schumpeter parecia um homem comum, mas era um sábio. A inteligência faz o homem viver. Mas é a sabedoria que o faz resistir. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

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