quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Gestão de pessoas: a remuneração dos executivos nas campanhas salariais

O igualitarismo jamais teve grande apelo nos Estados Unidos da América ( EUA ), exceto para meia dúzia de intelectuais. Agora, no entanto, algumas poucas altas remunerações de alguns executivos de primeiro nível estão se tornando um debate nacional.

Nas negociações trabalhistas de mil novecentos e oitenta e quatro, a remuneração dos executivos fez o papel de fantasma de Banquo. Trata-se de uma personagem de Macbeth, de Shakespeare. Na peça, Macbeth sente-se tão culpado por ter mandado matar Banquo, que começa a ter alucinações ( isto é, enxergar o ensanguentado fantasma de Banquo ) durante um banquete em que desejava impressionar os nobres da corte, o que os leva a achar que o rei havia ficado louco. Esta não é, naturalmente, uma questão negociável. Tivesse ela sido colocado na mesa pelo sindicato, e os negociadores da empresa certamente teriam dito que aquilo ou era irrelevante ou estava fora de discussão. No entanto, a remuneração dos executivos era claramente o maior obstáculo às tentativas da direção das empresas de limitar aumentos salariais para o pessoal de escritório, evitando, deste modo, a realimentação da inflação e melhorando a posição competitiva da empresa. Existe um imenso ressentimento nos sindicatos em relação ao fato de que, em muitas grandes empresas - especialmente em indústrias pesadas básicas - , as negociações salariais e as concessões efetuadas pelos sindicatos, em mil novecentos e oitenta e dois e mil novecentos e oitenta e três, foram seguidas por substanciais aumentos dos pacotes de remuneração total dos altos executivos. E onde houve, naquele período, cortes de remuneração de executivos, isto foi logo recuperado - e, em geral, com juros compostos. Se os dirigentes dos sindicatos não falam no assunto, seus liderados falam.

O ressentimento a respeito da remuneração dos altos executivos de maneira alguma se restringe aos sindicatos e aos empregados administrativos. Também se infiltra nas hostes de profissionais e gerentes. Por exemplo, uma grande indústria de armamentos perdeu, em mil novecentos e oitenta e três, cerca de vinte engenheiros seniores e gerentes de engenharia - alguns deles com mais de vinte e cinco anos de serviços prestados à empresa. Todos pediram demissão pelo mesmo motivo. Disse um deles: "Enquanto o aumento de nossos salários foi limitado a três por cento, no ano passado, ao argumento de que qualquer coisa acima deste valor seria inflacionária, os nove integrantes da diretoria votaram em benefício próprio para ganhar bônus e opções de compra adicionais de ações da empresa, o que somou cerca de vinte e cinco a trinta por cento de aumento em sua remuneração - e isto é desonesto.". Nem é preciso mencionar que nenhuma destas pessoas é anticapitalista ou remotamente liberal.

O ressentimento contra esta ganância percebida e abuso de poder em altos postos, no futuro, provavelmente se refletirá em impostos: pelo aumento do teto da taxa sobre altas remunerações, por exemplo; pelo aumento dos impostos em ganhos de capital; ou pela penalização e opções de compra de ações dadas a executivos. Com efeito, uma velha proposta - que permaneceu esquecida por setenta ou oitenta anos - está sendo agora reapresentada: estabelecer um teto sobre a remuneração total paga a um executivo ( salários, bônus, benefícios de saúde, provisão para aposentadoria, opções de compra de ações e assim por diante ) que seja dedutível dos impostos pagos pelo empregador.

Todos sabem, é claro, que estas medidas não produzirão um único centavo de receitas adicionais; pelo contrário, elas as reduzirão. quase todos os proponentes destas medidas também concordariam que elas provavelmente prejudicariam a economia. Argumentariam, contudo, que não limitar ou penalizar remunerações excessivas de altos executivos seria ainda pior. Provocaria aumentos salariais inflacionários e criaria dissidências e conflitos de classe. E esta atitude não está apenas confinada aos chamados inimigos das empresas. Em um recente seminário, os proponentes mais ardorosos de um teto na dedutibilidade da remuneração dos altos executivos eram os membros de conselho fiscal de uma das maiores empresas do país.

Gerentes da alta administração, especialmente aqueles de grandes empresas, argumentarão que estes ataques às altas remunerações são excessivos e não têm fundamento algum. Observarão que a remuneração de executivos tem estado em declínio nos EUA durante os últimos setenta anos, tanto se ajustados à inflação quanto se comparados com o total do pacote remuneratório dos empregados comuns, cujos salários e, especialmente, os benefícios vêm aumentando em ritmo equivalente ao dobro da inflação. De fato, até um nível relativamente alto em grandes empresas - em regra, até abaixo do nível de gerente-geral de divisão - , a remuneração de gerentes caiu bastante, qualquer que seja a régua utilizada. Os gerentes intermediários, como supervisores de engenharia ou gerentes de fábrica, costumavam ganhar ( após impostos ) cerca de três vezes mais que o salário dos empregados de chão de fábrica. Nos dias atuais, com o pacote de remuneração total para os operários de indústrias sindicalizadas de produção em massa, como a automobilística ou a do aço, girando em torno de cinquenta mil dólares por ano - ou cerca de quarenta e três mil dólares por ano após a dedução de impostos, uma vez que ainda mais da metade do pacote remunerativo dos operários ou é livre de impostos ou tem diferimento, como os descontos para fundos de pensão - , muitos gerentes intermediários recebem hoje apenas um pouco mais que os operários. Até um nível gerencial relativamente alto, a distribuição de renda nas empresas se tornou extremamente igualitária, talvez igualitária demais.

Entretanto, a verdadeira questão não é a remuneração agregada de executivos; é a remuneração de um minúsculo grupo - não mais que mil pessoas - que ocupa o topo de um número muito pequeno de empresas gigantes. Estatisticamente, este grupo é insignificante. Mas seus números são altamente visíveis. E eles ofendem o senso de justiça de muitos e, a bem da verdade, da maioria dos próprio corpo gerencial. E são vistos como a materialização da ética e dos valores das empresas e dos executivos americanos.

Poucas pessoas - e provavelmente ninguém fora dos escritórios da diretoria - consegue enxergar muitas razões para estas remunerações tão elevadas. Existe pouca correlação entre isto e o desempenho da empresa. Os concorrentes mais difíceis, os japoneses, pagam a seus altos executivos muito menos do que os americanos pagam aos seus: cerca de um quarto do valor, e raramente mais de oito vezes o salários dos operários. No entanto, suas empresas não estão deixando a desejar. Mesmo nos EUA, é possível encontrar flagrantes incongruências dentro de uma mesma indústria: empresas que pagam bem mais que um milhão de dólares para seus principais executivos e, apesar disto, têm um desempenho medíocre, enquanto empresas que não pagam metade disto se desempenham muito melhor.

Na verdade, a única correlação que há vai na direção oposta. A J.P.Morgan descobriu há cento de vinte anos, que a única coisa que seus clientes de mau desempenho tinham, em comum era o principal executivo de cada uma destas empresas recebia uma remuneração cento e trinta por cento superior à das pessoas que ocupavam o nível hierárquico imediatamente inferior, e estas recebiam cento e trinta por cento a mais que o nível abaixo, e assim por diante até o final da linha. A conclusão da J.P.Morgan - que dificilmente poderia ser citada como anticapitalista ou ressentida dos proprietários de grandes fortunas - foi de que salários muitos altos no topo da empresa desagregam a equipe. Eles produzem o efeito de fazer as pessoas dos postos mais elevados enxergarem seus pares como adversários, e não como coletas - como já havia mencionado o representante da empresa de armamentos. E isto acaba com qualquer desejo que alguém tenha de dizer "nós" e de se esforçar, exceto em benefício próprio e imediato.

Uma solução possível seria estabelecer uma ligação visível entre a remuneração de executivos e o bem-estar dos empregados. Especialmente na indústria básica pesada, as gerências estão procurando estabelecer uma ligação deste tipo entre o bem-estar dos empregados e o desempenho da empresa por meio da propriedade de ações da empresa por parte dos empregados ou pela participação nos lucros. Um complemento disto poderia ser ligar os bônus dos altos executivos à segurança no emprego. Isto apresenta, é claro, desvantagens óbvias: recompensa os gerentes nos níveis hierárquicos mais altos por manter o nível de emprego - e, portanto, o custo - alto. Mas, pelo menos, evitaria o maior ressentimento dos empregados: gerentes da alta administração que ganham aumentos substanciais no mesmo ano em que a empresa faz rigorosos cortes nas folhas de pagamento de operários e funcionários administrativos.

Um modo mais simples seria estabelecer uma limitação voluntária do total do pacote de remuneração após impostos pagos a qualquer empregado - incluindo o CEO - até um múltiplo predeterminado do pacote total de remuneração após os impostos dos empregados comuns. O efeito desta medida na prática seria mínimo: na maioria das empresas, seria nula. Mas o impacto psicológico seria considerável. Se os múltiplos fossem estabelecidos, por exemplo, em vinte, resultando em um máximo de cerca de oitocentos e cinquenta mil dólares para os altos executivos, isto afetaria, no máximo quinhentos executivos, considerando a totalidade das empresas americanas. Se o múltiplo fosse estabelecido em quinze - com a resultante remuneração após impostos de cerca de seiscentos e cinquenta mil dólares, hoje aproximadamente mil pessoas seriam afetadas. Tais múltiplos seriam eminentemente aceitos e sua aplicação resultaria em números muito inferiores àquilo que, segundo um bom número de pesquisas, os empregados assalariados acreditam que seja a remuneração dos executivos - "cinquenta vezes o que eu ganho", esta é a estimativa mais comum.

"Mas, nas maiores empresas", dirão os gerentes da alta administração, "uma grande remuneração para seus executivos é necessária porque, em nossa cultura, a hierarquia deve ser expressa por meio dos rendimentos. Cada nível gerencial deve ganhar mais que o nível imediatamente inferior. E, se você for a General Motors Company ( GMC ) ou a Exxon, ou a U.S. Steel, tem vinte níveis hierárquicos, de forma que o alto executivo acaba ganhando mais de um milhão de dólares por ano se o operário ganhar cinquenta mil dólares por ano. De qualquer forma, estes altos rendimentos são, em grande parte, simbólicos. O imposto sobre a renda de qualquer natureza ( IR ) fica com uma boa parte deles". A hierarquia é, sem dúvida, a única explicação lógica para a remuneração dos altos executivos, fora a simples ganância. Mas, se for verdade que estes grandes pacotes remunerativos para os executivos da alta administração nas grandes empresas são apenas galões que sinalizam o nível hierárquico, em vez de dinheiro real ( um argumento com o qual os empregados comuns jamais concordarão ), então porque não tratá-los como símbolos? Até o ponto, por exemplo, em que se o chairman e principal executivo da Universal Internacional deve ganhar mais que determinado múltiplo da remuneração dos empregados comuns, por que será que a empresa não doa o excesso em forma de contribuição à caridade, em seu nome, para quem ele determinar?

Existem, sem dúvida alguma, outras - e talvez melhores - maneiras de equilibrar a necessidade de uma remuneração da gerência de topo alta o suficiente para prover incentivos e recompensar o bom desempenho com a necessidade de uma relação igualitária entre as remunerações mais altas e as mais baixas dentro de uma empresa. E algumas respostas serão trabalhadas nos próximos anos - os sindicatos e políticos cuidarão de resolver este assunto. Em mil novecentos e oitenta e cinco, a excessiva remuneração dos executivos se tornou efetivamente, uma questão discutida na negociação salarial. O fato de o Sr. Lee Iacoca, chairman da Chrysler Corporation, pagar a si próprio um bônus multimilionário no mesmo ano em que cortou os salários dos operários em trinta por cento foi o principal argumento dos sindicatos ao se recusarem a aceitar concessões em salários, benefícios e condições de trabalho e ao impor à Chrysler um contrato com custos trabalhistas tão altos que isto provavelmente destruirá a empresa na hipótese de o mercado automobilístico americano se desaquecer durante alguns anos. Outras informações podem ser obtidas no livro As fronteiras da administração, de autoria de Peter F. Drucker.

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/gest%C3%A3o-de-pessoas-a-remunera%C3%A7%C3%A3o-dos-executivos-nas-campanhas-salariais .

Nenhum comentário:

Postar um comentário