quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Negacionismo: polícia investiga denúncia de injúria racial e ameaça de morte contra vereadora eleita pelo PT em SC

Diversas entidades, instituições e figuras políticas emitiram nota de repúdio durante esta quarta-feira ( dezoito de novembro de dois mil e vinte ) após os ataques racistas e ameaça de morte sofridos pela vereadora eleita Ana Lúcia Martins ( do Partido dos Trabalhadores - PT ). Ela é a primeira mulher negra eleita na história de Joinville ( maior cidade do Estado de Santa Catarina - SC ) para compor o Poder Legislativo Municipal ( PLM ).

Ana Lúcia Martins é a primeira vereadora negra eleita em Joinville
Ana Lúcia é a primeira vereadora negra eleita em Joinville
( Foto : )

Durante a tarde, Ana Lúcia prestou depoimento na Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso ( DPCAMI ) da cidade. A polícia instaurou inquérito por injúria racial e ameaça, após o boletim de ocorrência ser registrado pelos mesmos crimes. 

A delegada Cláudia Cristiane Gonçalves de Lima disse ao Portal G1 nesta quarta-feira ( dezoito de novembro de dois mil e vinte ) que a polícia ainda não tem a autoria do crime. 

- A priori é isto. O racismo a gente vai analisar posteriormente. Iniciamos agora a apuração dos fatos. Em relação à autoria, a gente ainda não tem - pontua. 

Instituições, entidades e políticos prestam apoio à vereadora

O Partido dos Trabalhadores ( PT ) pelo qual a vereadora eleita é filiada emitiu nota de repúdio e exigiu que autoridades atuem de maneira rápida no intuito de descobrir e responsabilizar os autores, para que sejam levados à Justiça. O partido ainda deve reivindicar proteção efetiva à Ana Lúcia por parte das autoridades de segurança pública do estado, para garantia da integridade física da vereadora. O pedido ainda não foi formalizado. 

Confira o que diz a nota:

"O Diretório Municipal ( DM ) de Joinville do Partido dos Trabalhadores ( PT ) repudia e denuncia as ameaças de morte e tentativa de intimidação motivadas por racismo contra a companheira Ana Lúcia, recém-eleita vereadora, a primeira mulher negra na história de Joinville.

Logo que Ana Lúcia foi eleita, velhas práticas como o uso de violência para amedrontar e silenciar revelam o desespero e o ódio daqueles que não respeitam a diferença. Os comentários publicados nas redes sociais e as ameaças à companheira constituem um mecanismo de silenciamento e invisibilidade para impedir a denúncia, a reflexão e a crítica sobre o racismo.

Diante deste gravíssimo fato, manifestamos nossa solidariedade e apoio à companheira Ana Lúcia e esperamos que as autoridades atuem de maneira rápida no intuito de descobrir e responsabilizar os autores, para que sejam levados à justiça. 

Reivindicamos proteção efetiva à Ana Lúcia por parte das autoridades de segurança pública do estado, para garantia da integridade física de nossa companheira.

Seguiremos na luta contra o racismo, em defesa da democracia e dos direitos humanos."

Vereador eleito Alisson Julio ( do Partido Novo )

Alisson Julio ( Novo ), vereador eleito com o maior número de votos no Estado de Santa Catarina, também se posicionou repudiando o ato criminoso. 

- Ameaça é crime, racismo é crime e quem pratica é criminoso e deve ser punido. Não admito estas práticas com nenhuma pessoa. Minha solidariedade a vereadora eleita Ana Lucia - escreveu em publicação nas redes sociais.

COMPIR - Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial

"O COMPIR - Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, vem a público REPUDIAR as injúrias raciais cometidas contra a recém eleita vereadora Ana Lúcia, que no dia quinze de novembro de dois mil e vinte, alcançou com muita luta, a posição da primeira mulher preta, eleita DEMOCRATICAMENTE como vereadora na Cidade de Joinville. Nesse sentido o COMPIR pede RESPEITO a esta notória cidadã, que atingiu um marco histórico e que por este motivo causa desconforto em uma parcela da sociedade; que outrora veladamente, mas agora abertamente pelos meios virtuais, - luta para rebaixar a população negra que por mais trezentos anos foi tratada como mercadoria e que mesmo após a sua "liberdade" " continua lutando pelo merecido espaço social. Sendo parte desta luta, o COMPIR se compromete em acompanhar e denunciar a nível federal estes sujeitos ( pseudo-formadores de opiniões ) que estão se opondo a igualdade racial, na tentativa de novamente jogar o povo preto para senzala. TEMOS POR CERTO QUE NÃO CONSEGUIRÃO E DECLARAMOS PARA QUE TODOS SAIBAM QUE ANA LÚCIA, É UM ORGULHO PARA O POVO PRETO DE JOINVILLE!"

Centro dos Direitos Humanos de Joinville Maria da Graça Bráz

Nota emitida pelo CDH
Nota emitida pelo CDH
( Foto: )

Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil

"O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil ( CONIC ) e a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, constituída por noventa e seis organizações com forte histórico de compromisso com a democracia, expressam sua irrestrita solidariedade à Ana Lúcia, primeira vereadora negra eleita no município de Joinville / SC .

Ana Lúcia é reconhecida no estado de Santa Catarina e em nível nacional pelo seu engajamento e compromisso contra o racismo, pelos imigrantes haitianos, impactados pela xenofobia e pela dignidade das mulheres negras, que são as mais impactadas pelas violências racista e patriarcal.

O resultado das eleições do dia quinze de novembro de dois mil e vinte indica que há um desejo de ruptura com a cultura do ódio e com as polarizações. 

Exemplo disto, foram os mandatos coletivos - que cresceram e ganharam destaque -, o avanço, ainda que pequeno, de mulheres candidatas e eleitas, sem contar as pessoas trans que conseguiram vagas nas casas legislativas municipais. 

Entre as muitas surpresas do último processo eleitoral, um deles foi que a associação de candidatos a um “título religioso” não significou vitória automática, nem reeleição garantida. Isto mostrou que os cidadãos e cidadãs estão cada vez mais conscientes de que o voto não deve ser tutelado.

A segunda surpresa foi a eleição de pessoas que representam grupos socialmente vulnerabilizados e excluídos da política representativa. A eleição de mulheres negras e jovens, de mulheres trans e representações indígenas indicam que há uma mudança social em curso que aponta para a necessidade de ruptura com a política patrimonialista, racista e patriarcal. Entre as variáveis que indicam se uma democracia é forte ou não, é a pluralidade das representações políticas. 

Historicamente, esta variável indica que nossa democracia é caracterizada pela total ausência de representações que expressam a pluralidade da sociedade brasileira. Talvez esta seja a primeira eleição que aponta a possibilidade de transformarmos esta característica da política representativa.

O Brasil tem uma dívida histórica com as populações negras, indígenas e trans. Garantir que os espaços institucionais de representação política sejam reflexo da sociedade é um passo fundamental para repararmos esta dívida. Não há democracia em um país representado por uma pequena elite política identificada e comprometida com agendas políticas que não possibilitam as transformações estruturais necessárias para o aprofundamento da democracia.

Não aceitaremos as ameaças, intimidações e desmerecimento da importância da eleição de Ana Lúcia e de nenhuma outra pessoa e mandato coletivo eleitos pela organização e luta dos grupos vulnerabilizados.

Exigimos que as instituições responsáveis por investigar estas denúncias realizem apurações sérias e transparentes e que as pessoas responsáveis pelas ameaças sejam responsabilizadas nos termos da lei. 

Da mesma forma, repudiamos a tentativa de algumas lideranças políticas, levantar suspeitas sobre o resultado das eleições, insinuando, sem provas, que houve fraude no processo eleitoral.

Quero me ver no poder, foi a afirmação que animou a luta pela democratização do poder ao longo do processo eleitoral. Agora afirmamos, nos manteremos no poder porque a democracia nos garante este direito."


Com informações de:


Patrícia Della Justina ( patricia.justina@somosnsc.com.br ) .

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