O princípio da proporcionalidade ( * vide nota de rodapé ) possui ainda uma dimensão positiva, que consiste na proibição da proteção insuficiente ( ou deficiente ) a um determinado direito. Assim, aos mesmo tempo em que o Estado não se pode exceder no campo dos Direitos Humanos ( DH ) ( dimensão negativa, proibição do excesso ou Übermassverbot ), também não se pode omitir ou agir de modo insuficiente ( proibição da insuficiência ou Untermassverbot ) ( *2 vide nota de rodapé ). Por exemplo, o Estado ao descriminalizar graves ofensas a direitos fundamentais ( *3 vide nota de rodapé ) ( por exemplo, tortura - *4 vide nota de rodapé - ), agiria contra a Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ), pois a tutela penal seria considerada essencial para a adequada proteção destes bens jurídicos graças ao seu efeito dissuasório geral e específico.
Consequentemente, a proporcionalidade consiste não só em instrumento de controle das restrições de direitos, mas também de controle da promoção a direitos. Esta atuação de proibição da proteção insuficiente decorre do reconhecimento dos deveres de proteção, fruto da dimensão objetiva ( *5 vide nota de rodapé ) dos dos DH. A proporcionalidade, então, tem função dúplice:
1) serve para que se analise eventual "restrição em demasia", mas também
2) serve para que se verifique se houve "proteção deficiente" dos direitos.
No Estado Democrático de Direito, no qual o Estado deve intervir na vida social para assegurar uma sociedade justa e solidária ( Artigo Terceiro da CF - 88 ), a proibição de insuficiência fixa um mínimo de proteção adequada, necessária e proporcional em sentido estrito a um direito, que sofre a omissão do Estado ou mesmo a colisão com outros direitos ( *6 vide nota de rodapé ).
No campo penal, a proporcionalidade age com seus dois vieses: na proibição do excesso, há o combate às leis que restringem, de modo excessivo, os direitos dos acusados; na proibição da insuficiência, atua para coibir leis e decisões judiciais que, de modo desproporcional, não protejam o direito à justiça ( *7 vide nota de rodapé ) das vítimas e o direito à segurança de todos beneficiados pela prevenção geral da tutela penal. Há aqueles que denominam, esta combinação das duas facetas do critério da proporcionalidade no âmbito penal de garantismo integral ou positivo ( *8 vide nota de rodapé ).
No Supremo Tribunal Federal ( STF ), há vários precedentes reconhecendo a proibição da insuficiência cmo faceta positiva no princípio ( ou critério ) da proporcionalidade. Entre eles, cite-se a decisão do Ministro Gilmar Mendes, na qual foi sustentado que "os direitos fundnamentais não contêm apenas uma proibição de excesso ( Übermassverbot ), mas também uma proibição de proteção insuficiente ( Untermassverbot ), concluiu o Ministro Gilmar Mendes que "Parece lógico, portanto, que a efetividade deste direito social à segurança não prescinde da ação estatal positiva no sentido da criação de certas condições fáticas, sempre dependentes dos recursos financeiros de que dispõe o Estado, e de sistemas de órgãos e procedimentos voltados a esta finalidade. ( ... ) De outro modo, estar-se-ia a blindar, por meio de um espaço amplo de discricionariedade estatal, situação fática indiscutivelmente repugnada pela sociedade, caracterizando-se típica hipótese de proteção insuficiente por parte do Estado, num plano mais geral, e do Poder Judiciário, num plano mais específico" ( Suspensão de Tutele Antecipada - STA - número Quatrocentos e dezenove / Rio Grande do Norte - Decisão Ministro Gilmar Mendes, julgada em Seis de abril de Dois mil e dez ).
Também o voto do Ministro Ricardo Lewandowski ( relator ), do STF, no caso da constitucionalidade da Lei número Nove mil quinhentos e trinta e quatro de Mil novecentos e noventa e sete ( gratuidade do registro civil de nascimento e da certidão do óbito, indo além do Artigo Quinto, Inciso Setenta e seis, que contempla apenas os "reconhecidamente pobres" ), fez menção às duas facetas do princípio da proporcionalidade: a proibição de excesso e a proibição de proteção deficiente, sustentando que os dispositivos impugnados não violavam alguma delas ( Ação Direita de Inconstitucionalidade - ADI número Mil e oitocentos, relator para o acórdão Ministro Ricardo Lewandowski, julgada em Onze de junho de Dois mil e sete, Plenário, Diário da Justiça de Vinte e oito de setembro de Dois mil e sete ).
Em Dois mil e dezesseis, o Ministro Barroso, votou a favor da descriminalização do aborto realizado até o terceiro mês de gravidez por ofensa ao princípio da proporcionalidade tanto na sua dimensão positiva quanto na sua dimensão negativa ( princípio da proibição da proteção deficiente ). De acordo com o voto, a criminalização da prática do aborto "confere uma proteção deficiente aos direitos sexuais e reprodutivos, à autonomia, à integridade psíquica e física, e à saúde da mulher, com reflexos sobre a igualdade de gênero ( * 9 vide nota de rodapé ) e impacto desproporcional sobre as mulheres mais pobres". No mesmo voto, defendeu-se que não se pode também fornecer uma proteção deficiente à vida do nascituro, por isto caberia reconhecer "a constitucionalidade da tipificação penal da cessação da gravidez quando o feto já estivesse mais desenvolvido", sendo utilizado o parâmetro utilizado em vários Estados ( Alemanha, Bélgica, França, Uruguai ) do limite do primeiro trimestre de gestação ( STF, Primeira Turma, Habeas Corpus número Cento e vinte e quatro mil trezentos e seis / Rio de Janeiro, relator originário Ministro Marco Aurélio, relator para o acórdão Ministro Roberto Barroso, julgado em Vinte e nove de novembro de Dois mil e dezesseis ).
A proibição da proteção insuficiente ( ou deficiente ) também utiliza os mesmos três subcritérios ou m elementos da proporcionalidade:
1) em primeiro lugar, a adequação exige que se verifique se o meio a ser utilizado alcança, em abstrato, o objetivo proposto ( implementar o direito em questão );
2) a necessidade exige que se adote a medida que imponha sacrifício menos intenso a outros direitos;
3) finalmente, a proporcionalidade em sentido estrito exige uma ponderação entre os benefícios alcançados pela proteção pretendida a um direito e os custos impostos a outros direitos, que serão comprimidos pela proteção ofertada.
P.S.:
Notas de rodapé:
* O princípio da proporcionalidade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em:
*2 Para Virgílio Afonso da Silva, foi Canaris o primeiro a utilizar o termo Untermassberbot" ( Silva, Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável, Revista dos Tribunais, São Paulo, número Setecentos e noventa e oito, Páginas Vinte e três a Cinquenta, Dois mil e dois, em especial a Página Vinte e sete.
*3 A diversidade terminológica referente aos Direitos Humanos é melhor detalhada em:
*4 O crime de tortura, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em:
a) https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-a-tortura-definida-como-crime-no-brasil e
*5 As dimensões dos Direitos Humanos são melhor detalhadas em:
*6 A colisão ou conflito de direitos, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em:
*7 O direito ao acesso à justiça, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em:
*8 Fischer, Douglas. Garantismo penal integral ( e não garantismo hiperbólico monocular ) e o princípio da proporcionalidade: breves anotações de compreensão e aproximação dos seus ideais. Revista de Doutrina da Quarta Região, Porto Alegre, número Vinte e oito, março de Dois mil e nove. Disponível em: < http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/ecicao028/douglas_fischer.html >. Último acesso em Quinze de setembro de Dois mil e vinte.
*9 A igualdade de gênero, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em:
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