quinta-feira, 5 de maio de 2022

Direitos Humanos: convenção protege pessoas perseguidas e refugiadas

A Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados ( CER ) ( * vide nota de rodapé ) foi concluída em Genebra, em Vinte e oito de julho de Mil novecentos e cinquenta e um, e adotada pela Conferência da Organização das Nações Unidas ( ONU ) de Plenipotenciários sobre o Estatuto dos Refugiados e Apátridas ( ERA ), convocada pela Resolução número Quatrocentos e vinte e nove ( Quinta ) da Assembleia Geral da ONU, de Quatorze de dezembro de Mil novecentos e cinquenta. Possui em Dois mil e vinte, Cento e quarenta e seis Estados Partes.


Inicialmente, a CER possuída uma limitação temporal ( para acontecimentos ocorridos antes de Primeiro de janeiro de Mil novecentos e cinquenta e um ) e geográfica da definição de refugiado ( somente para os eventos ocorridos na Europa ).


Em Mil novecentos e sessenta e sete, foi adotado o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados ( PER ), que eliminou tais limitações. Este PER foi firmado com a finalidade de se aplicar a proteção da CER a outras pessoas que não apenas aquelas que se tornaram refugiadas em resultado de acontecimentos ocorridos antes de Primeiro de janeiro de Mil novecentos e cinquenta e um. O texto do PER possui onze Artigos, dentre os quais aquele que prevê a cooperação das autoridades nacionais com o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados ( ACNUR ) e seu dever de fornecer informações e dados estatísticos sobre a condição de refugiados, a aplicação do PER e sobre as leis, regulamentos e decretos que possam vir a ser aplicáveis em relação aos refugiados ( Artigo Segundo ).


No Brasil, a CER foi aprovada pelo Congresso Nacional ( CN ) pelo Decreto Legislativo ( DL ) número Onze, de Sete de julho de Mil novecentos e sessenta, foi depositado junto ao Secretário-Geral da ONU o instrumento de retificação ( IR ), e a CER foi promulgada pelo Decreto número Cinquenta mil duzentos e quinze, de Vinte e oito de janeiro de Mil novecentos e sessenta e um.


O PER de Mil novecentos e sessenta e sete foi promulgado internacionalmente com o Decreto número Setenta mil novecentos e quarenta e seis, de Sete de Agosto de Mil novecentos e setenta e dois, tendo sido superada a limitação temporal. Quanto à barreira geográfica, esta foi derrubada somente em Dezenove de dezembro de Mil novecentos e oitenta e nove, por meio do Decreto número Noventa e oito mil seiscentos e dois. Pelo Decreto número Noventa e nove mil setecentos e cinquenta e sete, de Mil novecentos e noventa, o governo brasileiro retirou as reservas aos Artigos Quinze e Dezessete da CER de Mil novecentos e cinquenta e um, ficaram derrubadas também as restrições quanto ao direito de associação e exercício de atividade profissional assalariada aos refugiados.


A CER é formada por Quarenta e seis Artigos, divididos em Sete Capítulos ( disposições gerais, situação jurídica, empregos remunerados, bem-estar, medidas administrativas, disposições executórias e transitórias, cláusulas finais ).


Combinando-se o que determina o Artigo Primeiro do PER com o Artigo Primeiro da CER, pode-se definir "refugiado" como:


1) pessoa que é perseguida ou tem fundado temor de perseguição;

2) por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas e encontra-se fora do país de sua nacionalidade ou residência;

3) e que não pode ou não quer voltar a tal país em virtude da perseguição ou fundado temor de perseguição.


A proteção da CER poderá cessar em hipótese nela expressamente discriminadas, relacionadas ao fato de que a pessoa recuperou a nacionalidade voluntariamente ou voltou a se valer da proteção do país de que é nacional; adquiriu nova nacionalidade e, consequentemente, a proteção do país cuja nacionalidade adquiriu; voltou a estabelecer-se, voluntariamente, no país que abandonou; se deixaram de existir as circunstâncias em consequência das quais a pessoa foi reconhecida como refugiada.


A CER não é aplicável a pessoas que cometeram um crime contra a paz, um crime de guerra ou um crime contra a humanidade ( conforme determinem instrumentos internacionais ), que cometeram um crime grave de direito comum fora do país de refúgio antes de serem nele admitidas como refugiados e que se tornaram culpadas de atos contrários aos fins e princípios da ONU.


O Artigo Segundo da CER prevê as obrigações gerais de todo refugiado, dentre as quais está a obrigação de respeitar as leis e regulamentos do país de acolhida, assim como as medidas que visam á manutenção da ordem pública do país em que se encontra. De outro lado, os Estados se comprometem a aplicar as disposições da CER aos refugiados sem discriminação quanto à raça, religião ou país de origem ( Artigo Terceiro ). Ademais, devem proporcionar aos refugiados tratamento proporcionado aos nacionais no que concerne à liberdade de praticar sua religião e no que concerne à liberdade de instrução religiosa dos seus filhos ( Artigo Quarto ).


No Capítulo Segundo, a CER versa sobre a situação jurídica dos refugiados. O Artigo Doze estabelece que o estatuto pessoal do refugiado será regido pela lei do país de sua residência. Ademais, os direitos que tenha adquirido anteriormente que decorram do estatuto pessoal, especialmente os que resultam do casamento, devem ser respeitados pelo Estado Contratante, ressalvado, se for o caso, o cumprimento das formalidades previstas pela legislação do Estado.


Quanto à aquisição de propriedade móvel ou imóvel e a outros direitos a ela referentes, ao aluguel e aos outros contratos relativos a propriedade móvel ou imóvel, os Estados Contratantes devem conceder ao refugiado um tratamento tão favorável quanto possível e não menos favorável do que é concedido "nas mesmas circunstâncias" aos estrangeiros em geral ( Artigo Treze ). Quanto à propriedade industrial e à propriedade literária, artística e científica, o refugiado deve se beneficiar, no páis em que tem sua residência habitual, da proteção que é conferida aos nacionais do referido páis e, no território de outros Estados Contratantes, deve se beneficiar da proteção dada aos nacionais do país no qual tem sua residência habitual ( Artigo Quatorze ).


Ainda quanto à situação jurídica do refugiado, a CER garante direitos de associação aos refugiados, quanto a associações sem fins políticos e lucrativos e a sindicatos profissionais, com o tratamento mais favorável concedido aos nacionais de um país estrangeiro ( Artigo Quinze ). Ademais, garante-se aos refugiados o direito de propor ações em juízo, assegurando-se o livre e fácil acesso aos tribunais, com o mesmo tratamento recebido por um nacional, incluindo-se aí a assistência judiciária e a isenção de cautio judicatum solvi ( *2 vide nota de rodapé ).


O Capítulo Terceiro cuida do exercício de empregos remunerados pelos refugiados, determinando a aplicação do mesmo tratamento dispensado ao estrangeiro. Para as profissões assalariadas ( Artigo Dezessete ), garante-se que os refugiados gozarão, nas mesmas circunstâncias, do tratamento conferido aos estrangeiros, salvo quando medidas restritivas a estrangeiros forem impostas quando o refugiado delas estiver dispensado na data da entrada em vigor da CER para o Estado ou nas seguintes hipóteses:


1) residir há três anos no país,

2) ser cônjuge de pessoa nacional do país de residência ou ter filho ou filhos de nacionalidade do país de residência.


Também, quanto às profissões não assalariadas na agricultura, na indústria, no artesanato, no comércio e para instalação de firmas comerciais e industriais, também deve ser concedido tratamento tão favorável ou não menos favorável que o concedido ao estrangeiro. Finalmente, também para o exercício de profissões liberais os refugiados terão tratamento tão favorável quanto possível e não menos favorável ao que é dado a estrangeiro, desde que possuam diplomas reconhecidos pelas autoridades competentes do Estado.


O Capítulo Quarto ( Artigos Vinte a Vinte e quatro ), por sua vez, contém disposições sobre o bem-estar dos refugiados. Incialmente, determina o tratamento do refugiado como o nacional em caso de racionamento de produtos de que há escassez ( Artigo Vinte ), assim como para o tratamento em matéria de assistência e de socorro públicos ( Artigo Vinte três ), e oferecimento de ensino primário. Quanto aos graus de ensino superiores ao primário, os Estados devem dar aos refugiados um tratamento tão favorável quanto possível, e em todo caso não menos favorável do que aquele que é dado aos estrangeiros em geral, nas mesmas circunstâncias ( Artigo Vinte e dois ). Quanto a alojamento, deve-se dar aos refugiados o tratamento tão favorável quanto possível e, em todo caso, tratamento não menos favorável do que aquele que é dado, nas mesmas circunstâncias, aos estrangeiros em geral ( Artigo Vinte e um ).


Quanto à legislação do trabalho, os Estados Contratantes podem dar aos refugiados que residam regularmente no seu território o mesmo tratamento dato aos nacionais relativamente à remuneração, duração do trabalho, horas suplementares, férias pagas, restrições ao trabalho doméstico, idade mínima para o emprego, aprendizado e formação profissional, trabalho das mulheres e dos adolescentes e gozo das vantagens proporcionadas pelas convenções coletivas. Também recebem o mesmo tratamento dado aos nacionais quanto a previdência social ( acidentes de trabalho, moléstias profissionais, maternidade, doença, invalidez, velhice, morte, desemprego, encargos de família, além de qualquer outro risco que esteja previsto no sistema de previdência social ), conforme determina o Artigo Vinte e quatro.


O Capítulo Quinto ( Artigos Vinte e cinco a Trinta e quatro ) versa ainda sobre medidas administrativas relativas aos refugiados, Primeiramente, o refugiado deve receber do Estado assistência administrativa para o exercício de direitos que normalmente exigem assistência estrangeira, porque, evidentemente, não podem com ela contar ( Artigo Vinte e cinco ). Qualquer refugiado que não possua documento de viagem válido deverá receber do Estado Contratante documento de identidade ( Artigo Vinte e sete ) e documentos de viagem para que possam viajar para fora do território, salvo por razões imperiosas de segurança nacional ou ordem pública ( Artigo Vinte e oito ). Com efeito, aos refugiados é garantida a liberdade de movimento para escolherem sua residência e circularem no território livremente, com as reservas aplicáveis aos estrangeiros ( Artigo Vinte e seis ).


Os refugiados também não poderão ser submetidos a emolumentos alfandegários, taxas e impostos além do que cobrado dos seus nacionais em situações análogas ( Artigo Vinte e nove ) e o Estado deve permitir que transfiram os bens necessários à sua reinstalação para outro país ( Artigo Trinta ).


Os refugiados em situação irregular no páis de refúgio não serão submetidos a sanções caso se apresentem sem demora às autoridades e expuserem razões aceitáveis para sua entrada ou presença irregulares e apenas restrições necessárias podem ser impostas ao seu deslocamento ( Artigo Trinta e um ). Ademais, o refugiado que estiver regularmente em um território não poderá ser expulso, salvo por motivos de segurança nacional ou ordem pública, mediante decisão judicial proferida em atendimento ao devido processo legal ( *3 vide nota de rodapé ).


O refugiado não poderá ser expulso ou rechaçado para fronteiras de territórios em que sua vida ou liberdade estejam ameaçadas em decorrência de sua raça, religião, nacionalidade, grupo social a que pertença ou opiniões políticas, o que consagra o princípio do non-refoulement ( proibição do rechaço ).


O princípio da proibição do rechaço, entretanto, não poderá ser invocado se o refugiado for considerado, por motivos sérios, um


1) perigo à segurança do país, ou

2) se for condenado definitivamente por um crime ou delito particularmente grave, constitua ameaça para a comunidade do país no qual ele se encontra ( Artigo Trinta e três ).


Obviamente, o Estado deve fundamentar este rechaço, evitando que esta cláusula seja utilizada arbitrariamente simplesmente para diminuir o número de solicitantes de refúgio no Estado de acolhida.


Por fim, a CER prevê que os Estados Contratantes devem facilitar, na medida do possível, a naturalização dos refugiados, esforçando-se para acelerar o processo e reduzir suas taxas e despesas ( Artigo Trinta e quatro ).


O Capítulo Sexto traz as disposições executórias e transitórias ( Artigos Trinta e cinco  Trinta e sete ), dentre as quais a necessidade de cooperação dos Estados Contratantes com o ACNUR ( Artigo Trinte e cinco ) e, finalmente, o Capítulo Sétimo apresenta as cláusulas finais da CER ( Artigos Trinta e oito a Quarenta e seis ).


Quadro sinótico


CER, PER e PF


Definição de refugiado


1) A pessoa que, temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, encontra-se fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude deste temor, não quer valer-se da proteção deste país, ou que, se não tem nacionalidade.

2) Direito de receber dos Estados Partes tratamento pelo menos tão favorável como o que é proporcionado aos nacionais no que concerne à liberdade de praticar sua religião e no que concerne à liberdade de instrução religiosa dos seus filhos.

3) Direitos de associação, quanto a associações sem fins políticos e lucrativos e a sindicatos profissionais.

4) Direito de propugnar em juízo, assegurando-se o livre e fácil acesso aos tribunais, com o mesmo tratamento recebido por um nacional, incluindo-se aí a assistência judiciária e a isenção de cautio judicatum solvi.

5) Direito a receber o mesmo tratamento dispensado ao estrangeiro no exercício de empregos remunerados.

6) Direito a receber tratamento concedido ao nacional em caso de racionamento de produtos de que há escassez.

7) Direito a receber tratamento concedido ao nacional em matéria de assistência e de socorros públicos.

8) Direito a receber tratamento concedido ao nacional em matéria de oferecimento de ensino primário. Quanto aos graus de ensino superiores ao primário, os Estados devem dar aos refugiados um tratamento tão favorável quanto possível, e em todo caso não menos favorável do que aquele que é dado aos estrangeiros em geral, nas mesmas circunstâncias.

9) Direito a receber tratamento para a concessão de alojamento tão favorável quanto possível, e em todo caso, não  menos favorável do que aquele que é dado, nas mesmas circunstâncias, aos estrangeiros em geral.

10) Direito a receber o mesmo tratamento dado aos nacionais quanto a previdência social ( acidentes de trabalho, moléstias profissionais, maternidade, doença, invalidez, velhice, morte, desemprego, encargos de família, além de qualquer outro risco que esteja previsto no sistema de previdência social ).

11) Direito de receber do Estado Contratante documento de identidade, quando não possua documento de viagem válido, e documento de viagem para viajar para fora do território.

12) Direito à liberdade de movimento para escolha da residência e para circulação no território livremente, com as reservas aplicadas aos estrangeiros.

13) Direito de não ser submetido a emolumentos alfandegários, taxas e impostos além do que cobrados dos seus nacionais em situações análogas.

14) Direito de não ser submetido a sanções, caso o refugiado se apresente sem demora às autoridades e exponha razões aceitáveis para sua entrada ou presença irregulares; direito de que apenas restrições necessárias podem ser impostas ao seu deslocamento.

15) Direito de não ser expulso, salvo por motivos de segurança nacional ou ordem pública, mediante decisão judicial proferida em atendimento ao devido processo legal.


Situação jurídica do refugiado


1) Estatuto pessoal do refugiado é regido pela lei do país de seu domicílio ou, na falta de domicílio, pela lei do país de sua residência.

2) Os direitos que tenha adquirido anteriormente que decorram do estatuto pessoal, especialmente os que resultam do casamento, devem ser respeitados pelo Estado Contratante, ressalvado, se for o caso, o comprimento das formalidades previstas pela legislação do Estado.

3) Quanto à aquisição de propriedade móvel ou imóvel e a outros direitos a ela referentes, ao aluguel e aos outros contratos relativos a propriedade móvel ou imóvel: os Estados contratantes devem conceder ao refugiado um tratamento tão favorável quanto possível e não menos favorável do que é concedido "nas mesmas circunstâncias" aos estrangeiros em geral.

4) Quanto à propriedade industrial e à propriedade literária, artística e científica: o refugiado deve se beneficiar, no país em que tem sua residência habitual, da proteção que é conferida aos nacionais do referido país e, no território de outros Estados Contratantes, deve se beneficiar da proteção dada aos nacionais do país no qual tem sua residência habitual.         


P.S.:


Notas de rodapé:


* A Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em:


a) https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-a-participa%C3%A7%C3%A3o-do-brasil-na-defesa-dos-refugiados .


*2 cautio judicatun solvi:

a) cautio: precaução, cautela, garantia, fiança, caução, obrigação. Dicionário latim-português: termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieita - São Paulo: Edipro, Dois mil e dezesseis. Página Setenta.

b) judicatum: julgamento, sentença, despacho; juízo, opinião. Dicionário latim-português: termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieita - São Paulo: Edipro, Dois mil e dezesseis. Página Duzentos e vinte e cinco.

c) solvi: dissolver, decompor, desprender; libertar; romper, violar; largar; afrouxar, amolecer; pagar, saldar, dar quitação de; banir, dissipar. Dicionário latim-português: termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieita - São Paulo: Edipro, Dois mil e dezesseis. Página Trezentos e oitenta e nove.

d) Observe-se que o Protocolo de Las Leñas, firmado entre o Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, prevê esta isenção no âmbito do Mercosul, ao estabelecer, em seu Artigo Quarto, que nenhuma caução ou depósito, qualquer que seja sua denominação, poderá ser imposto em razão da qualidade de cidadão ou residente permanente de outro Estado Parte, o que se aplicará também às pessoas jurídicas constituídas, autorizadas ou registradas conforme as leis de qualquer dos Estados Partes.


*3 O princípio da legalidade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em:

https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-19 .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-conven%C3%A7%C3%A3o-protege-pessoas-perseguidas-e-refugiadas .

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