segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Direitos Humanos: Discriminação e intolerância contrariam Convenção

Em junho de Dois mil e treze, na Assembleia Ordinária da Organização dos Estados Americanos ( OEA ), realizada em Antígua, foram aprovadas duas importantes convenções contra a intolerância e discriminação: a Convenção Interamericana Contra o Racismo, Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância ( CICRDRFCI ) ( numerada como A  - Sessenta e oito ) e a Convenção Interamericana Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância ( CICTFDI ) ( numerada como A  - Sessenta e nove ). A elaboração dessas convenções teve início com a iniciativa, no ano Dois mil, da Assembleia Geral da OEA, que recomendou ao Conselho Permanente ( CP ) estudasse a possibilidade de elaborar projeto de convenção interamericana para prevenir, sancionar e erradicar projeto de convenção interamericana para prevenir, sancionar, erradicar o racismo e toda forma de discriminação e intolerância.


Em Dois mil e onze, o Grupo de Trabalho ( GT ) encarregado da redação da minuta do texto entendendo ser necessário dividir o projeto original, abandonando-se a ideia de uma grande convenção antidiscriminação, uma vez que alguns Estados não ratificariam uma convenção que abarcasse temas envolvendo identidade de gênero e orientação sexual.

 

Por isso, a primeira convenção ( A  - Sessenta e oito ) centrou-se no combate ao racismo e à discriminação racial; a segunda ( A - Sessenta e nove ) ataca a discriminação e a intolerância em geral, combatendo facetas inéditas no Direito Internacional convencional referentes à discriminação, como aquelas geradas por orientação sexual, identidade de gênero e condição infectocontagiosa estigmatizada.

 

Essas convenções tratam de atualizar e fazer avançar o acervo antidiscriminação do Direito Internacional dos Direitos Humanos ( DIDH ) ( * vide nota de rodapé ), que tem seu marco inicial na edição da Convenção da Organização das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial ( CONUETFDR ) de Mil novecentos e sessenta e cinco ( *2 vide nota de rodapé ).


Quanto à Convenção Interamericana Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância ( CICTFDI ), esta já foi assinada, mas não ratificada pelo Brasil. Possui, até Dois mil e vinte, apenas dois Estados Partes ( Uruguai e México ) ( *3 vide nota de rodapé ). Essa CICTFDI é pioneira nas Américas e também precede a eventual tratado universal sobre o combate à discriminação e intolerância em geral. Além disso, essa CICTFDI realizou avanço significativo na matéria: nenhuma outra convenção de Direitos Humanos ( DH ) possui, até o momento, um conceito tão inclusivo no que tange às diferentes facetas da discriminação, explicitando fatores de discriminação e grupos vulneráveis ( contra a orientação sexual e migrantes ) outrora esquecidos.


Em linhas gerais, a adoção de um trtado específico sobre discriminação e intolerância é importante porque fornece:


1) visibilidade e

2) aprofunda a redação e amplitude dos direitos ao segmento vulnerável, como ocorreu, agora, com essa CICTFDI.


Nos "Considerandos", a CICTFDI estabelece o dever dos Estados de fomentar e estimular o respeito aos DH sem distinção de gênero, idade, orientação de gênero, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer natureza, origem social, posição econômica, condição de migração, refugiado ou deslocado interno, nascimento, condição infectocontagiosa estigmatizada, característica genérica, deficiência, sofrimento psíquico incapacitante ou qualquer outra condição social.


Por isso, fica estabelecido que uma sociedade pluralista e democrática deve respeitar a identidade cultural, linguística, religiosa, de gênero e sexual de toda pessoa, que pertença ou não a uma minoria, bem como criar condições que lhe permitam expressar, preservar e desenvolver tal identidade.


A CICTFDI é composta por Vinte e dois Artigos e visa à promoção de direitos pautada na dignidade, ausência de qualquer discriminação odiosa e respeito à alteridade, combatendo simultaneamente a intolerância e a busca da exclusão ilegítima do outro.


Nessa linha, a CICTFDI define discriminação como sendo qualquer:


1) distinção,

2) exclusão,

3) restrição ou

4) preferência em qualquer esfera pública ou privada, que tenha como objetivo ou efeito anular ou  limitar o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de DH consagrados em instrumentos internacionais. 


Assim, a discriminação é todo tratamento de diferenciação, restrição ou mesmo exclusão sem justificativa racional e proporcional, realizado por agentes públicos ou privados, visando à privação ou prejuízo a direitos de outrem.


Na linha dos "considerandos", o Artigo Primeiro ponto Um da CICTFDI estipula que a discriminação pode estar baseada em Quinze motivos, a saber:


1) nacionalidade,

2) idade,

3) gênero,

4) orientação de gênero,

5) identidade e expressão de gênero,

6) idioma,

7) religião,

8) identidade cultural,

9) opiniões políticas ou de qualquer natureza,

10) origem social,

11) posição socioeconômica,

12) nível de educação,

13) condição migratória, de refugiado, repatriado, apátrida ou deslocado interno,

14) deficiência,

15) característica genética,

16) condição de saúde mental ou física, incluindo doença infectocontagiosa, psíquica, incapacitante ou qualquer outra.


A discriminação pode ser direta ou indireta:


1) a discriminação direta assume um dos critérios de diferenciação vistos acima para gerar desvantagem de modo desigual e injusto;

2) a discriminação indireta adota critério aparentemente neutro, mas que implica em desvantagem maior para os que pertencem a determinado grupo.


Ainda, a discriminação pode ser múltipla ou agravada, que consiste em qualquer preferência, distinção, exclusão ou restrição, baseada, concomitantemente, em dois ou mais fatores de diferenciação já expostos acima.


A CICTFDI não considera discriminação odiosa as medidas especiais ou ações afirmativas que são adotadas para assegurar a igualdade material e o exercício de direitos por parte de determinados grupos, desde que tais medidas  não impliquem na manutenção de direitos separados para grupos distintos e ainda que sejam temporárias ( até que seus objetivos sejam atingidos ).


Já a intolerância consiste no ato, conjunto de atos ou manifestações que expressam o desrespeito, rechaço ou desprezo da dignidade, características, convicções e opiniões de seres humanos por serem diferentes ou contrárias. A intolerância pode ser manifestada em atos de marginalização ou mesmo exclusão da participação na vida pública ou privada de grupos em condições de vulnerabilidade, bem como pode ser expressa em atos de violência.


Entre seus principais dispositivos estão:


1) Direitos protegidos. a CICTFDI determina que todo ser humano é igual perante a lei e tem direito à proteção igualitária contra toda forma de discriminação e intolerância em qualquer âmbito ao reconhecimento, gozo, exercício e proteção, em condições de igualdade, de todos os demais direitos e liberdades consagrados no direito nacional e internacional, tanto no âmbito individual quanto no coletivo.

2) Reconhecimento do dever do Estado em prevenir e reprimir a discriminação e intolerância. Os Estados devem prevenir, eliminar, proibir e sancionar os atos e manifestações de intolerância e discriminação em todas as áreas, o que inclui o uso da internet ou qualquer meio de comunicação para tais propósitos ( combate ao hate speech ).

3) Adoção de políticas e ações afirmativas. Os Estados devem adotar políticas e ações afirmativas para garantir o gozo e o exercício de direitos por parte das pessoas e grupos discriminados e alvos de intolerância, com o objetivo de promover condições de igualdade e oportunidade para todos.

4) Representação política pautada na diversidade. Os Estados devem assegurar que seus sistemas políticos e jurídicos reflitam apropriadamente a diversidade dentro de suas sociedades, a fim de atender ás necessidades especiais e legítimas de cada setor da população, para combater a discriminação e intolerância.

5) Mandados de criminalização. Os Estados comprometem-se a assegurar às vítimas de discriminação e intolerância um tratamento equitativo, igualitário e não discriminatório no acesso ao sistema de justiça, com processos ágeis e eficazes, para que seja obtida uma justa reparação no âmbito civil ou penal.

6) Supervisão da Comissão para a Prevenção e Eliminação do Racismo, Discriminação Racial e Todas as Formas de Discriminação e Intolerância ( CPERDRTFDI ). Foi criado um Comitê, composto por especialistas independentes nomeados pelos Estados Partes, que tem a atribuição de monitorar os compromissos assumidos perante esta CICTFDI e também perante a Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância ( CICRDRFCI ).


Quadro sinótico


CICTFDI


Natureza jurídica: Tratado assinado, mas não ratificado ainda pelo Brasil.


Objetivo: Promover o respeito aos direitos sem discriminação odiosa de qualquer natureza, abrangendo fatores de discriminação e intolerância não mencionada explicitamente em tratados anteriores, como a discriminação e intolerância por orientação de gênero, por condição infectocontagiosa estigmatizada etc.


Essência da CICTFDI: Estabelece o dever dos Estados de fomentar e estimular o respeito aos DH sem distinção de gênero, idade, orientação de gênero, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer natureza, origem social, posição econômica, condição de migrante, refugiado ou deslocado interno, nascimento, condição infectocontagiosa estigmatizada, característica genética, deficiência, sofrimento psíquico incapacitante ou qualquer outra condição social.     

 

P.S.:

 

Notas de rodapé:

 

* A diversidade terminológica referente aos Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-as-terminologias.html .


*2 A Convenção da ONU sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/05/direitos-humanos-convencao-visa_9.html .


*3 Disponível em: < http://www.oas/es/sla/ddi/tratados_multilaterales_interamericanos_A-69_discriminacion_intolerancia_firmas.asp > . Acesso em Quinze de setembro de Dois mil e vinte.


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-discriminacao-e-intolerancia-contrariam-convencao .   

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Direitos Humanos: Convenção visa a proteger idosos

A crescente longevidade da humanidade impacta no crescimento da população idosa, que abrange os indivíduos de sessenta anos ou mais. Dados da Organização das Nações Unidas ( ONU ) indicam que o número de pessoas idosas no mundo dobrará de aproximadamente Oitocentos e quarenta e um milhões em Dois mil e treze para mais de Dois bilhões em Dois mil e cinquenta ( *vide nota de rodapé ). A longevidade crescente obtida pela humanidade e o consequente envelhecimento populacional global sensibilizou a ONU a tratar da matéria nas últimas décadas com a adoção dos seguintes textos normativos:


1) Plano Internacional de Ação sobre Envelhecimento ( PIAE, fruto de conferência mundial sobre envelhecimento organizada pela ONU;

2) Resolução número Quarenta e cinco / Cento e seis da Assembleia Geral, de Mil novecentos e noventa, que designou o dia Primeiro de Outubro como o "Dia Internacional da Pessoa Idosa";

3) Resolução número Quarenta e seis, de Mil novecentos e noventa e um, que adotou os "Princípios da ONU em Favor das Pessoas Idosas" ( PONUFPI ); 

4) Plano Internacional sobre o Envelhecimento de Madri ( PIEM ), na Segunda Conferência Mundial sobre a temática, organizada pela ONU, entre outros.


Esses textos não são dotados de força vinculante, compondo a soft law da matéria, mas que podem servir para interpretação, em face da pessoa idosa, do alcance dos direitos previstos nos tratados.


No plano convencional onusiano, o Comentário ( ou Observação ) Geral número Seis 9 de Mil novecentos e noventa e seis ) do Comitê para os Direitos Sociais, Econômicos e Culturais ( CDSEC ) do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ( PIDESC ) ( *2 vide nota de rodapé ) aprofundada interpretação dos direitos das pessoas idosas, com base nos ditames do PIDESC. Em Dois mil e quatorze, o Conselho de Direitos Humanos ( CDH ) da ONU designou um Especialista Independente para o Gozo de Todos os Direitos Humanos das Pessoas Idosas (  EIGTDHPI ).


No plano interamericano, foi adotada a Declaração de Brasília sobre o Envelhecimento na América Latina e no Caribe ( DBEALC ), em dezembro de Dois mil e sete. Nesse diploma de soft law, ficou claro que a velhice não pode mais ser tratada como uma etapa de vida episódica ou mesmo curta, mas sim como uma fase regular e cada vez maior da vida do ser humano.


Em Dois mil e quinze, a OEA deu um importante passo adicional ao adotar a Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas ( CIPDHPI ). A CIPDHPI já foi assinada pelo Brasil ( em Quinze de junho de Dois mil e quinze ), mas ainda não foi ratificada e incorporada internamente até setembro de Dois mil e vinte. Possui, em Dois mil e vinte, Sete Estados Partes.


Essa CIPDHPI é pioneira nas Américas e também precede o eventual tratado universal sobre os direitos das pessoas idosas. A adoção de um tratado específico fornece:


1) visibilidade e

2) aprofundada a redação e amplitude dos direitos ao segmento vulnerável, como ocorreu agora, com a CIPDHPI.


A CIPDHPI é composta por Quarenta e um Artigos e visa a promover, proteger e assegurar o pleno gozo e exercício dos direitos do idoso. Define, inicialmente, a pessoa idosa como aquela com sessenta anos de idade ou mais, exceto se a lei interna determinar uma idade-base menor ou maior, desde que esta não seja superior a sessenta e cinco anos. no Brasil, em linha com a CIPDHPI, o Estatuto do Idoso ( Lei número Dez mil setecentos e quarenta e um / Dois mil e três ) define a pessoa idosa como aquela com idade igual ou superior a sessenta anos. Em dois mil e dezessete, foi editada a Lei número Treze mil quatrocentos e sessenta e seis, pela qual foi alterado o Estatuto do Idoso, tendo sido prevista a figura qualificada do idoso com mais de oitenta anos de idade". A nova lei assegurou, dentre os idosos, prioridade especial aos maiores de oitenta anos, atendendo-se suas necessidades sempre preferencialmente em relação aos demais idosos.


O envelhecimento consiste, para a CIPDHPI, em um processo gradual que se desenvolve durante o curso de vida e que implica alterações biológicas, fisiológicas, psicossociais e funcionais de várias consequências, as quais se associam com interações dinâmicas e permanentes entre o sujeito e seu meio. Por isso, a CIPDHPI adota, como dever do Estado, a promoção do "envelhecimento ativo e saudável", que consiste no processo pelo qual se otimizam as oportunidades de bem-estar físico, mental e social da pessoa idosa, possibilitando a participação em atividades sociais, econômicas, culturais, espirituais e cívicas, bem como assegurando proteção, segurança e atenção, com o objetivo de ampliar sua expectativa de vida saudável e com qualidade e permitindo à pessoa idosa seguir contribuindo ativamente nas relações familiares e sociais.


O principal vetor da CIPDHPI é a promoção de direitos da pessoa idosa pautada na dignidade, independência, protagonismo e autonomia. Assim, não é possível - em virtude da idade - excluir a pessoa idosa das decisões que a afetem.


Entre os principais direitos assegurados pela CIPDHPI, estão:


1) Direito à vida digna na velhice. A pessoa idosa tem direito á vida digna na velhice, em igualdade de condições com outros setores da população. A CIPDHPI não adotou posição sobre a eutanásia ( *3 vide nota de rodapé ), mas exige dos Estados que estabeleçam os "cuidados paliativos", que consistem na atenção e no cuidado ativo, integral e interdisciplinar de pacientes cuja enfermidade não responde a um tratamento curativo ou que sofrem dores evitáveis, a fim de melhorar sua qualidade de vida até a morte. De acordo com a CIPDHPI, os "cuidados paliativos" não aceitam nem retardam a morte. Os Estados devem, ainda estabelecer medidas que impeçam o sofrimento desnecessário e as intervenções fúteis e inúteis ) a chamada obstinação terapêutica ), em conformidade com o direito do idoso a expressar o consentimento informado.

2) Direito à independência e à autonomia. O respeito á autonomia da pessoa idosa na tomada de suas decisões, bem como a independência na realização de seus atos, implica uma série de consequências, como, por exemplo, que a pessoa idosa tenha a oportunidade de escolher seu lugar de residência e onde e com quem viver, em igualdade de condições com as demais pessoas, e não se veja obrigado a viver de acordo com um sistema de vida específico.

3) Direito à participação e integração comunitária. A pessoa idosa tem direito à participação ativa, produtiva, pela e efetiva dentro da família, da comunidade e da sociedade para sua integração em todas elas.

4) Direito à saúde e consentimento livre e informado. A pessoa idosa tem direito a aceitar, recusar ou interromper voluntariamente tratamentos médicos ou cirúrgicos, inclusive os da medicina tradicional, alternativa e complementar, pesquisa, experimentos médicos ou científicos, sejam de caráter físico ou psíquico, e a receber informação clara e oportuna sobre possíveis consequências e os riscos dessa decisão.

5) Direitos à seguridade social. Todo idoso tem direito à seguridade social que o proteja para levar uma vida digna.

6) Direito ao trabalho. A pessoa idosa tem direito ao trabalho digno e à igualdade de oportunidades e de tratamento em relação aos outros trabalhadores, independentemente da idade. Por sua vez, a CIPDHPI prevê que os Estados devem adotar as medidas legislativas, administrativas ou de outra índole para promover o emprego formal do idoso e regular as diversas formas de autoemprego e o emprego doméstico e para impedir a discriminação profissional do idoso.


O conjunto de direitos previsto na CIPDHPI pode ser resumido como consistindo no direito ao cuidado, com autonomia e protagonismo da pessoa idosa.


Quadro sinótico


CIPDHPI


Natureza jurídica: Tratado assinado, mas não ratificado ainda pelo Brasil até 2020.


Objetivo: Fomentar o envelhecimento "ativo e saudável", que consiste no processo pelo qual se otimizam as oportunidades de bem-estar físico, mental e social da pessoa idosa, possibilitando a participação em atividades sociais , econômicas, culturais, espirituais e cívicas, bem como assegurando proteção, segurança e atenção, com o objetivo de ampliar sua expectativa de vida saudável e com qualidade e permitindo á pessoa idosa seguir contribuindo ativamente nas relações familiares e sociais.


Essência da CIPDHPI: Promoção de direitos da pessoa idosa pautada na dignidade, independência, protagonismo e autonomia. Assim, não é possível  - em virtude da idade - excluir a pessoa idosa das decisões que a afetem.    


P.S.:


Notas de rodapé:


* Dados disponíveis em: < https://www.un.org/en/events/olderpersonsday/background.shtml >. Acesso em: Quinze de setembro de Dois mil e vinte.


*2 O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ( PIDESC ) é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/04/direitos-humanos-pacto-assegura.html .


*3 O direito à vida é melhora detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/04/direitos-humanos-doutrinas-e.html .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-convencao-visa-a-proteger-idosos .  

Direitos Humanos: Mecanismo monitora situação de DH nos Estados

No bojo da criação do Conselho de Direitos Humanos ( DH ) em Dois mil e seis, foi criado o Mecanismo de Revisão Periódica Universal ( MRPU ). A essência do MRPU é o peer review – monitoramento pelos pares – pelo qual um Estado tem a sua situação de DH analisada pelos demais Estados da Organização das Nações Unidas ( ONU ) e que, futuramente, poderá vir a substituir os procedimentos especiais.

 

O MRPU prevê que todos os Estados da ONU serão avaliados em períodos de quatro a cinco anos, evitando-se a seletividade e os parâmetros dúbios da escolha de um determinado país e não outro. O trâmite é simples e previsto no anexo da Resolução número Cinco / Um do Conselho de DH, de Dezoito de junho de Dois mil e sete. De início, cabe ao Estado a ser examinado apresentar

 

1)      Relatório nacional oficial ao Conselho de DH sobre a situação geral de DH em seu território. Após, apresenta-se

2)      Uma compilação de todas as informações referentes a DH no Estado examinado constante dos procedimentos especiais do próprio Conselho de DH e demais órgãos internacionais de DH. Por fim, as organizações não governamentais ( ONG ) e a instituição nacional de DH ( INDH ) podem também apresentar

3)      Informes e outros documentos relevantes, que serão resumidos por equipe do Alto Comissariado da ONU para os DH ( ACONUDH ).

Após o Estado a ser examinado é questionado no Conselho de DH em relação à promoção de DH constante da Carta da ONU ( * vide nota de rodapé ), Declaração Universal dos DH ( DUDH ) ( *2 vide nota de rodapé ) e ainda nos tratados internacionais de DH eventualmente ratificados.

 

Esse exame tem como peça-chave o “diálogo construtivo” entre o Estado sob revisão e outros Estados-membros da ONU ( membros ou não do Conselho ). Para tanto é formado um Grupo de Trabalho ( GT ) capitaneado pelo Presidente do Conselho e composto pelos Quarenta e sete Estados-membros. Todos os documentos acima expostos sobre a situação de DH devem ser apreciados em reunião desse GT, previsto para durar três horas.

 

Esse diálogo permite ao Estado examinado responder ás dúvidas e ainda opinar sobre os comentários e sugestões dos demais Estados. Não há, então, condenação ou conclusões vinculantes. Busca-se a cooperação e adesão voluntária do Estado examinado.

 

Para sistematizar o exame, são nomeados pelo Conselho três Estados 9 escolhidos entre os diversos grupos regionais, por sorteio ), conhecidos como “troika”, que atuam como verdadeiros relatores da revisão periódica do Estado examinado.

 

Cabe à troika resumir as discussões, elaborando o chamado Relatório de Resultado ( RR ) ou Relatório Final ( RF ), fazendo constar um sumário dos passos tomados no exame, observações e sugestões dos Estados, bem como as respostas e eventuais “compromissos voluntários” do Estado examinado.

 

Esse RR ou RF será apreciado pelo colegiado do Conselho de DH. O Artigo Vinte e sete do Anexo da Resolução número Cinco / Um deixa claro que o MRPU é um “mecanismo cooperativo”. Assim, o conteúdo do resultado do exame deverá conter uma avaliação objetiva e transparente da situação de DH do país, que inclua os avanços e desafios ainda existentes, bem como os compromissos voluntariamente aceitos pelo Estado examinado.

 

O Brasil foi pioneiro na proposição de um novo mecanismo de exame da situação de DH na ONU e, na condição de membro da primeira composição do recém-criado Conselho, acatou ser submetido a exame já na primeira sessão do Conselho. No primeiro ciclo do MRPU ( de Dois mil e oito a Dois mil e onze ), a “troika” indicada foi composta por Gabão, Arábia Saudita e Suíça, que editou um RR sobre o Brasil em maio de Dois mil e oito. Em Dois mil e doze o Brasil foi submetido a nova revisão, no segundo ciclo do MRPU ( de Dois mil e doze a Dois mil e dezesseis ), a “troika” foi Equador, Polônia e China. O Brasil recebeu Cento e setenta recomendações, das quais acatou integralmente Cento e cinquenta e nove, rejeitou Uma e acatou parcialmente Dez.

 

Em Dois mil e dezessete, o Brasil foi submetido ao terceiro ciclo do MRPU ( que se iniciou em Dois mil e dezessete e deveria ter terminado em Dois mil e vinte e um ), tendo sido escolhidos o Quirguistão, El Salvador e Botsuana para atuar como relatores ( “troika” ). Inicialmente, o Brasil apresentou a sua visão sobre o comprimento das recomendações acatadas em Dois mil e doze. Ressalta-se que não é difícil para o Estado avaliado 9 qualquer que seja ) apontar o comprimento das recomendações, que são propositalmente feitas de modo genérico e programático. Assim, basta apontar a edição de uma lei ou mesmo um investimento para que recomendações do tipo “fazer esforços”, “promover”, “adotar medidas” sejam consideradas cumpridas. Por outro lado, quando um Estado faz uma recomendação direta, cujo cumprimento é de fácil aferição ( tudo ou nada ), basta que o Estado avaliado a recuse. Por exemplo, em Dois mil e doze, a Dinamarca fez recomendação do tipo direto ao Brasil 9 união das polícias civil e militar, gerando a desmilitarização do policiamento ostensivo ), que a recusou.

 

No terceiro ciclo brasileiro, houve intensa participação dos Estados examinadores, com a apresentação de Duzentas e quarenta e seis recomendações. Várias delas continuam a ser programáticas e genéricas 9 por exemplo, adotar medidas para reformar o sistema prisional á luz dos DH – feita pela Itália, Namíbia, Argélia, Áustria, Santa Sé, Irlanda ) e há inclusive recomendação com potencial discriminatório, como a feita pela Santa Sé, que sugeriu que o Brasil continuasse a proteger a “família natural e o casamento, formado pelo marido e esposa” ( *3 vide nota de rodapé ).

 

Foram quatro recomendações rejeitadas pelo Brasil: a formulada pela Santa Sé, Venezuela 9 duas referentes ao impeachment da Presidenta Dilma Rousseff e ao congelamento de gastos por Vinte anos da Emenda Constitucional número Noventa e cinco / de Dois mil e dezesseis ) e ainda a do Reino Unido 9 referente à adoção de critério transparente e meritocrático para seleção de candidatos nacionais para órgãos da ONU ) ( *4 vide nota de rodapé ).

 

O resultado desse mecanismo, coso continuem a existir essas recomendações genéricas, sem maior atenção a dados objetivos e mensuráveis, tende a se restringir a fornecer um espaço político de visibilidade sobre a situação de DH em um determinado país, sem maiores consequências ao Estado avaliado.

 

Quadro sinótico

 

MRPU

 

Criação: Resolução do Conselho de DH, Dois mil e sete.

Composição: Os Membros do Conselho de DH avaliam o Estado. Todos os Estados da ONU devem passar pelo MRPU a cada quatro anos.

Competência: Estabelecer um “diálogo constitutivo” com o Estado examinado. Os compromissos são voluntários e não podem ser impostos.

 

P.S.:

 

Notas de rodapé:

 

*A Carta da ONU é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-manutencao-de-paz-e.html .

 

*2 A Declaração Universal dos Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-onu-declara-liberdade-e-igualdade-em-dignidade-e-direitos .

 

*3 Disponível em: < http://acnudh.org/wp-content/uploads/2017/05/A_HRC_WG.6_27_L.9_Brazil.pdf > . Em português: < https://nacoiesunidas.org/wp-content/uploads/2017/08/RPU-Brasil.docx.docx.pdf > . Acesso em Quinze de setembro de Dois mil e vinte.

 

*4 As in formações de documentos sobre o Brasil e os três ciclos estão disponíveis em: < https://www.ohchr.org/EN/HRBodies/UPR/Pages/BRindex.aspx > . Acesso em Quinze de setembro de Dois mil e vinte .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-mecanismo-monitora-situacao-de-dh-nos-estados .

Direitos Humanos: Carta estimula erradicação da pobreza e enfrentamento da exclusão social

A Carta Social das Américas ( CSA ) foi aprovada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos ( OEA ) em Dois mil e doze, em linha com o que dispõe a Carta Democrática Interamericana ( CDI ) ( * vide nota de rodapé ) no que tange à interdependência entre o desenvolvimento econômico e social e a democracia. A CSA estimula a erradicar a pobreza, enfrentar a exclusão social e combater a desigualdade, que são considerados óbices à consolidação da democracia no continente.


A CSA possui Trinta e cinco Artigos divididos em Cinco Capítulos:


1) justiça social, desenvolvimento com igualdade e democracia;

2) desenvolvimento econômico inclusivo e equitativo;

3) desenvolvimento cultural, diversidade e pluralidade;

4) solidariedade e esforço conjunto das Américas; e

5) cooperação interamericana para obtenção de justiça social e eliminação da pobreza.


Nos "considerandos", a CSA reconhece "a universalidade, a indivisibilidade e a interdependência de todos os Direitos Humanos ( DH ) e seu papel essencial para o desenvolvimento social e a realização do potencial humano, e reconhecendo a legitimidade e a importância do Direito Internacional dos DH ( *2 vide nota de rodapé ) para sua promoção e proteção". Entretanto, esse reconhecimento da indivisibilidade dos DH não impede a CSA de prever, timidamente, a adoção progressiva de medidas para implementar os direitos sociais ( *3 vide nota de rodapé ) ( em sentido amplo ) por parte dos Estados-membros, o que não ocorre com os direitos civis e políticos ( *4 vide nota de rodapé ).


O Primeiro Capítulo abarca dispositivos sobre a busca pela justiça social, que deve ser promovida pelos Estados, já que o desenvolvimento com igualdade fortalece a democracia, sendo ambos interdependentes ( *5 vide nota de rodapé ) e se reforçam mutuamente. Foi enfatizado que a garantia dos direitos econômicos, sociais e culturais ( *6 vide nota de rodapé ) são inerentes ao desenvolvimento integral, ao crescimento econômico com igualdade e à consolidação da democracia nos Estados ( Artigo Segundo ). Contudo, os Estados devem implementar tais direitos apenas progressivamente, pela adoção de políticas e programas que considerem mais eficazes e adequados às suas necessidades, em conformidade com as escolhas democráticas e os recursos disponíveis.


O combate à pobreza deve ser objetivo do Estado, para que seja suprimida a exclusão social e desigualdade, devendo ser adotadas políticas e programas públicos para alcançar esse fim.


Por sua vez, cada Estado tem a responsabilidade primordial pelo seu desenvolvimento e, ao escolher seu sistema econômico e social em um ambiente de democracia, deve buscar o estabelecimento de uma ordem econômica e social mais justa, que possibilite a plena realização do ser humano. Nessa linha, a CSA estipula que a pessoa humana é o centro, partícipe e beneficiária principal do processo de desenvolvimento econômico inclusivo, justo e equitativo ( Artigo Sexto ). Por isso, as políticas econômicas e sociais devem promover a geração de emprego e a redução da desigualdade de renda, focando no combate á pobreza, desigualdade e dignidade, o que é uma luta conjunta do Estado e da sociedade civil.


Os Estados devem buscar eliminar os obstáculos ao desenvolvimento, com vistas á consolidação e plena vigência dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais ( Artigo Sétimo ). No tocante aos direitos dos trabalhadores, cabe ao Estado a promoção do trabalho decente, a redução do desemprego e do subemprego e a atenção aos desafios do trabalho informal,   que constituem elementos essenciais para que se alcance o desenvolvimento econômico com igualdade ( Artigo Oitavo ). A CSA faz ainda referência à Declaração da Organização Internacional do Trabalho ( OIT ) sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Acompanhamento ( PDFTA ), de Mil novecentos e noventa e oito, pela qual se busca o fomento de uma força de trabalho de qualidade e com justiça social.


Além disso, os Estados devem promover e executar políticas públicas voltadas para o desenvolvimento econômico com justiça social, reconhecendo a importância dos programas que contribuam para a inclusão e a coesão social e gerem renda e emprego. A CSA ressalta o importante papel das micro, pequenas e médias empresas, bem como  das cooperativas e outras unidades de produção. As políticas públicas e as estruturas normativas devem promover a criação de novas empresas e a incorporação do setor informal à economia formal ( Artigo Nono ).


Apesar da forte inclinação na proteção dos trabalhadores e dos setores excluídos das sociedades americanas, a CSA reconhece o direito de propriedade ( Artigo Onze ) ( *7 vide nota de rodapé ), pugnando pela criação de um sistema de direitos de propriedade voltado a oferta de segurança jurídica aos povos das Américas, facilitando a formação de capital e promovendo o desenvolvimento econômico com justiça social e, desse modo, contribuindo para a sua prosperidade geral.


A CSA valorizou também o meio ambiente: os Estados promoverão, em parceria com o setor privado e a sociedade civil, o desenvolvimento sustentável por meio do crescimento econômico, do desenvolvimento social e da conservação e uso sustentável dos recursos naturais.


Por sua vez, a CSA estabelece que os Estados devem implementar políticas de proteção social integral, com prioridade aos vulneráveis ( Artigo Quatorze ), reconhecendo as contribuições dos povos indígenas, afrodescendentes e comunidades migrantes para o processo histórico continental, devendo-se valorizá-las. Por isso, cabe aos Estados adotar políticas para promover a inclusão e prevenir, combater e eliminar todos tipo de intolerância e discriminação, especialmente a discriminação de gênero, étnica e racial, para resguardar a igualdade de direitos e oportunidades e fortalecer os valores democráticos.


Tal qual a CDI, a CSA não é um texto vinculante, possuindo a natureza jurídica de soft law primária, ou seja, um diploma não vinculante que serve para apontar, aos Estados, condutas que podem se transformar em normas vinculantes no futuro ( pela sua aceitação como norma consuetudinária ou inserção em tratados internacionais ). Outra possibilidade de aplicação da CSA é seu uso pela Corte Interamericana de DH, como instrumento de interpretação da dimensão social dos direitos previstos na Convenção Americana de DH ( *8 vide nota de rodapé ).


Quadro sinótico


CSA


Natureza jurídica: Soft law, mas pode ser utilizado como instrumento de interpretação da dignidade humana e da dimensão social dos direitos previstos na CADH.


Objetivo: Tratar dos direitos sociais e das missões dos Estados no combate á pobreza, exclusão social e miséria no continente. Vincula, ainda, desenvolvimento social com democracia.


Uso no Brasil: A CSA é valiosos instrumento para a interpretação dos deveres do Estado na elaboração de políticas econômicas, que não podem gerar mais exclusão e concentração de renda.    


P.S.:


Notas de rodapé:


* A Carta Democrática Interamericana ( CDI ) é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-carta-e-vetor-de-como.html


*2 A diversidade terminológica utilizada nos Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-as-terminologias.html .


*3 Os direitos sociais são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-os-direitos-sociais-no.html .


*4 Os direitos civis e políticos são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/04/direitos-humanos-pacto-obriga-estados.html .


*5 A interdependência como característica dos Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-indivisibilidade-e.html .


*6 Os direitos econômicos, sociais e culturais são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/04/direitos-humanos-pacto-assegura.html .


*7 O direito à propriedade é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/05/direitos-humanos-doutrinas-e_17.html .


*8 A Convenção Americana sobre Direitos Humanos ( CADH ) é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-convencao-americana.html .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-carta-estimula-erradicacao-da-pobreza-e-enfrentamento-da-exclusao-social-2 .   

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Direitos Humanos: o respeito aos DH como critério de admissão e permanência no Mercosul

Em que pese a ausência de menções sobre a proteção de Direitos Humanos ( DH ) no tratado de Assunção ( * vide nota de rodapé ) e no Protocolo de Ouro Preto ( espinha dorsal do Mercosul até o momento ) e também a ausência de um catálogo de direitos como o existente na União Europeia ( Carta de Direitos Fundamentais ) ( *2 vide nota de rodapé ) houve evidente evolução na determinação dos direitos no âmbito do Mercosul, especialmente no que tange à admissão e permanência dos Estados no bloco.


Em Mil novecentos e noventa e oito, foi assinado o Protocolo de Ushuaia sobre o Compromisso Democrático no Mercosul ( *3 vide  nota de rodapé ), por mio do qual os quatro membros e os dois Estados associados ( Chile e Bolívia ) reconheceram, em u  tratado internacional, que a vigência das instituições democráticas é condição necessária para o gozo dos direitos de Estado-membro ou associado do processo de integração do Cone Sul. Assim, toda ruptura da ordem democrática é considerada um obstáculo intransponível para o ingresso no bloco ou a continuidade do processo de integração.


No caso de ruptura da ordem democrática em um Estado Parte do Protocolo, no âmbito específico dos acordos de Integração vigentes entre eles, devem decidir sobre a natureza e o alcance das medidas de coerção  - objetivando o retorno ao regime democrático - serem aplicadas, levando em conta a gravidade da situação existente.


O Protocolo, em seu Artigo Quinto, estabelece que as medidas compreenderão desde a suspensão do direito de participar nos diferentes órgãos dos respectivos processos de integração até a suspensão dos direitos e obrigações resultantes destes processos.


As medidas previstas no mencionado Artigo Quinto deverão ser adotadas por consenso pelos Estados Partes daquele Protocolo e comunicadas ao Estado afetado, que não participará do processo decisório pertinente. Tais medidas entrarão em vigor no data em que se faça a comunicação respectiva. De acordo com o Artigo Sétimo do Protocolo, as medidas cessarão com o pleno restabelecimento da ordem democrática.


Embora tenha sido tímido ao exigir o consenso para a tomada de medidas de coerção, pelo menos seu Artigo Oitavo estabelece que o Protocolo é Parte integrante do Tratado de Assunção ( *4 vide nota de rodapé ) e dos respectivos Acordos de Integração celebrados entre o Mercosul, Bolívia e Chile.


Na mesma linha, foi subscrita, em Mil novecentos e noventa e oito, a Declaração Política do Mercosul, Bolívia e Chile como Zona de Paz, pela qual foi dito que a paz constitui elemento essencial para a manutenção do processo de integração regional. Os Estados signatários da citada Declaração comprometeram-se a desenvolver mecanismos de consulta e cooperação nas áreas de defesa, segurança, bem como desarmamento e uso pacífico da energia nuclear.


Em Dois mil e quatro, o Regime de Participação dos Estados Associados ao Mercosul, estabelecido pela Decisão  Mercosul  / CMC número Dezoito  / Dois mil e quatro, prevê ( no seu Artigo Segundo ) que a adesão ao Protocolo de Ushuaia e à Declaração Presidencial sobre Compromisso Democrático no Mercosul constitui condição sine qua non para que um Estado venha a adquirir a condição de Estado Associado ao bloco, cláusula reiterada em Dosi mil e treze ( Decisão CMC número Onze / Treze ).


Em dezembro de Dois mil e onze, foi aprovado pelo Conselho do Mercado Comum a futura reforma do mecanismo democrático do Mercosul, com adoção do Protocolo de montevidéu sobre Compromisso com a Democracia no Mercosul ( chamado pelos próprios redatores de Protocolo "Ushuaia II", para demonstrar suas origens ).


O novo Protocolo supre a lacuna do anterior e prevê, exemplificadamente, aogumas medidas que podem ser adotadas para estimular o retorno á democracia, como:


a) suspensão do direito de participar nos diferentes órgãos da estrutura institucional do Mercosul;

b) fechamento de fronteiras;

c) suspensão ou limitação do comércio, o tráfego aéreo e marítimo, as comunicações e o fornecimento de energia, serviços e abastecimento;

d) suspensão da parte afetada do gozo dos direitos e benefícios emergentes do Mercosul;

e) ações dos demais Estados para incentivar a suspensão do Estado infrator em outras organizações internacionais e também de direitos derivados de outros acordos de cooperação;

f) ação dos Estados para apoiar os esforços regionais e internacionais para o retorno à democracia ( por exemplo, na ONU ou na OEA ); e

g) adoção de sanções políticas e diplomáticas adicionais.


O novo Protocolo almeja evitar que o "inocente pague pelo culpado": as medidas devem ser proporcionais á gravidade da situação existente e não deverão pôr em risco o bem-estar da população e o gozo efetivo dos Direitos Humanos ( DH ) e liberdades fundamentais ( *5 vide nota de rodapé ) no Estado afetado. Dos membros do Mercosul, apenas a Venezuela já o ratificou. No Brasil, o projeto de Decreto Legislativo número Mil duzentos e noventa / Dois mil e treze tramita, sob regime de urgência, no Congresso Nacional ( CN ) brasileiro e foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça ( CCJ ) da Câmra dos Deputados ( CD ), estando em trâmite em setembro de Dois mil e vinte.


Assim, o Protocolo de Ushuais II não entrou em vigor, mas pode servir como norte para a atuação dos estados envolvidos, uma vez que algumas das medidas de coerção listadas acima podem ser adotadas pelos países do Mercosul, no interior do bloco, ou ainda em suas próprias ações diplomáticas e em outras organizações internacionais    


P.S.:


Notas de rodapé:


* O Tratado de Assunção é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-mercosul-tem-tratado.html .

*2 Sobre a proteção de Direitos Humanos ( DH ) na integração econômica, ver Carvalho Ramos, André de. Direitos humanos na integração econômica. Rio de Janeiro: Renovar, Dois mil e oito.

*3 O Congresso brasileiro aprovou o texto do Protocolo de Ushuaia sobre o Compromisso Democrático no Mercosul, Bolívia e Chile, por meio do Decreto Legislativo número quatrocentos e cinquenta e dois, de Quatorze de novembro de Dois mil e um. De acordo com o Artigo Décimo do Protocolo, este entrou em vigor, par ao Brasil, em Dezessete de janeiro de Dois mil e dois. O Protocolo foi promulgado pelo Decreto número quatro mil duzentos e dez em Vinte e quatro de abril de Dois mil e dois.

*4 O Tratado de Assunção é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-mercosul-tem-tratado.html .

*5 A diversidade terminológica referente aos Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-as-terminologias.html .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-o-respeito-aos-dh-como-criterio-de-admissao-e-permanencia-no-mercosul .    

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Direitos Humanos: Mercosul tem tratado em formação; em etapas e; por enquanto, minimalista

Fruto de intensa negociações, foi assinado, em Vinte e seis de março de Mil novecentos e noventa e um, por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, o "Tratado de Assunção para Constituição do Mercado Comum do Sul". Depois do depósito das devidas ratificações, o Tratado de Assunção entrou em vigor em Vinte e nove de novembro de Mil novecentos e noventa e um. O Tratado de Assunção de Mil novecentos e noventa e um é um marco no lento processo de integração entre as economias dos Estados do Cone Sul americano ao estabelecer, como objetivo final, a constituição de um mercado comum entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai e, a partir de Doze de agosto de Dois mil e doze, também a Venezuela ( * vide nota de rodapé ). Em agosto de Dois mil e dezessete, a Venezuela foi suspensa das atividades do bloco e só retornará até que haja a restauração da ordem democrática, conforme mecanismo democrático do Mercosul.


São ainda Estados associados: Bolívia, Chile ( a partir de Mil novecentos e noventa e seis ), peru ( a partir de Dois mil e três ), Colômbia, Equador ( a partir de Dois mil e quatro ), Guiana e Suriname ( Ambos desde Dois mil e treze ).


O direito primário do Mercosul é composto essencialmente pelo tratado de Assunção ( de Milo novecentos e noventa e um ), o Protocolo de Ouro Preto ( de Mil novecentos e noventa e quatro ) e o Protocolo de Olivos ( de Dois mil e quatro ). Esses acordos são considerados tipicamente acordos de integração econômica, porque tratam do delineamento básico da organização internacional integracionista, seus objetivos e instrumentos, bem como seu sistema de solução de controvérsias.


Não há previsão específica ou capítulo próprio sobre a proteção de Direitos Humanos ( DH ) nesses tratados. Contudo, o Tratado de Assunção dispõe, em seu preâmbulo, sobre vários objetivos relacionados com a qualidade de vida dos indivíduos dos Estados-membros do bloco em formação. Na Primeira Alínea do Preâmbulo ficou estabelecido que a ampliação das atuais dimensões dos mercados nacionais dos Estados-membros constitui condição fundamental para acelerar seus processos de desenvolvimento econômico com justiça social. Em complemento, reconheceram os Estados que o Mercosul deve almejar "melhorar as condições e vida de seus habitantes" ( Alínea Sexta do Preâmbulo ), à "necessidade de uma consideração especial para países e regiões menos desenvolvidos do Mercosul".


Assim, há, nos preâmbulos dos dois principais acordos do Direito do Mercosul, uma fraca menção a objetivos sociais ou não econômicos da integração. Todavia, não há nos textos dos citados tratados qualquer menção explícita á proteção de DH ou a sua relação com o processo de integração. Essa tibieza dos Estados é explicada pela concepção minimalista do Mercosul, que objetiva a formação de um mercado Comum em etapas, sendo que a mais factível de ser alcançada ( ainda em formação ) é a união aduaneira. Nesse contexto, não havia maior divagação sobre o impacto da integração econômica na proteção de DH.   


P.S.:


Notas de rodapé:


* Em Dois mil e cinco, a Venezuela apresentou pedido de adesão plena ao Mercosul, com acolhimento consensual do pleito pela Decisão CMC número Vinte e nove / Zero Cinco, de Oito de dezembro de Dois mil e cinco. O Protocolo de adesão da República bolivariana da Venezuela ao Mercosul foi assinado em Dois mil e seis, mas a adesão da Venezuela ao Mercosul foi concluído somente em Dois mil e doze ( seis anos de espera ), por meio da Decisão do Conselho Mercado Comum número Doze. Como a própria decisão estabeleceu, não houve a necessidade de incorporação de tal decisão CMC, por regular aspectos de organização do bloco. Íntegra da decisão disponível em < http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1377717164.pdf > . Acesso em: Vinte e quatro de junho de Dois mil e dezesseis.


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-mercosul-tem-tratado-em-formacao-em-etapas-e-por-enquanto-minimalista

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Direitos Humanos: Convenção visa a prevenir, punir e eliminar desaparecimento forçado

Na esfera da Declaração número Quarenta e sete / Cento e trinta e três da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas ( ONU ) sobre a Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado ( DONUPTPCDF ) ( * vide nota de rodapé ), foi adotada, no âmbito da Organização dos Estados Americanos ( OEA ), em Nove de junho de Mil novecentos e noventa e quatro, em Belém do Pará, a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas ( CIDFP ). A CIDFP é um marco na prevenção, punição e eliminação do desaparecimento forçado, tendo inspirado dispositivos do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional ( ERTPI ) ( *2 vide nota de rodapé ), de Mil novecentos e noventa e oito, e da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado ( CIPTPCDF ) ( *3 vide nota de rodapé ), de Dois mil e sete.


A CIDFP entrou em vigor em Vinte e oito de março de Mil novecentos e noventa e seis e, em Dois mil e vinte, conta com Quinze Estados Partes ( *4 vide nota de rodapé ), o que é pouco se for levada em consideração a prática de desaparecimento forçado generalizada em diversos países nos tempos das ditaduras latino-americanas.


No âmbito nacional, a assinatura brasileira ocorreu em Onze de junho de Mil novecentos e noventa e quatro; a aprovação pelo Congresso nacional ( CN ) ocorreu por meio do Decreto Legislativo ( DL ) número Cento e vinte e sete, em Onze de abril de Dois mil e onze; a ratificação brasileira ocorreu em três de fevereiro de Dois mil e quatorze e a promulgação da CIDFP deu-se com o Decreto número Oito mil setecentos e sessenta e seis, de Onze de maio de Dois mil e dezesseis.


O preâmbulo da CIDFP reconhece que a prática sistemática de desaparecimentos forçados constitui crime contra a humanidade, e os principais objetivos da CIDFP são resumidos no Artigo Primeiro:


1) a proibição à prática, permissão ou tolerância ao desaparecimento forçado em qualquer situação, incluindo as excepcionais ocasiões de Estado de emergência e de suspensão de garantias individuais;

2) a punição interna dos autores, cúmplices e partícipes do crime ou da tentativa de crime de desaparecimento forçado;

3) a cooperação para prevenção, punição e erradicação do desaparecimento forçado; e

4) a adoção de medidas internas, de cunho administrativo, legislativo e judicial, para adimplir os compromissos assumidos na CIDFP.


Para a CIDFP ( Artigo Segundo ), o desaparecimento forçado consiste:


1) na privação da liberdade de um ou mais indivíduos ( a qual pode ocorrer de várias formas ), realizada

2) por agentes estatais ou pessoas autorizadas ou apoiadas pelo Estado, associada

3) á negativa ao reconhecimento da privação de liberdade ou ao fornecimento de informações sobre os indivíduos detidos, de modo a impedir o exercício dos direitos e garantias processuais inerentes á detenção.


Assim, o núcleo deste delito consiste nesses "três elementos":


1) privação de liberdade,

2) envolvimento direto ou indireto de agentes públicos e 

3) negativa do reconhecimento da detenção.


Os Artigos Terceiro e Quarto tratam da obrigação estatal em adotar medidas legislativas para a tipificação do delito de desaparecimento forçado de pessoas no âmbito dos ordenamentos jurídicos internos. O Artigo Terceiro prevê que, na pendência da localização do paradeiro da vítima, o crime seja considerado como de natureza continuada ou permanente, bem como que a pena a ser imposta ao delito corresponda a sua extrema gravidade. Ainda, é facultado aos Estados o estabelecimento de circunstâncias atenuantes nos casos em que os partícipes do crime contribuam para o seu esclarecimento ou forneçam informações sobre o destino das vítimas.


O Artigo Quarto dispõe, incialmente, que os atos constitutivos do desaparecimento forçado de pessoas serão considerados delitos em qualquer Estado parte. Após, determina as hipóteses de jurisdição dos Estados Partes nos casos de desaparecimento forçado. Cabe ao Estado Parte adotar medidas para estabelecer a sua jurisdição quando:


1) os atos forem perpetrados no âmbito da sua jurisdição;

2) os agentes forem nacionais do Estado;

3) as vítimas forem nacionais do Estado, se apropriado; e

4) o agente estiver em seu território e o Estado não o extradite.


Assim, não obstante a CIDFP estipule que o desaparecimento forçado seja reconhecido como crime em todos os Estados Partes, não é permitido o exercício da jurisdição estatal ou das funções reservadas às autoridades internas em outro Estado Parte.


O Artigo Quinto, por seu turno, disciplina a extradição dos agentes que praticarem o crime de desaparecimento forçado, proibindo-se que este seja considerado como delito político. Para os Estados que subordinam a extradição em todos os tratados extradicionais ( existentes e futuros ) celebrados entre os Estados Partes. Nos casos de inexistência de tratado de extradição entre os Estados Partes, a CIDFP pode ser utilizada como substrato jurídico para a solicitação de extradição relativa ao delito de desaparecimento forçado. Nos Estados nos quais os tratados extradicionais não são exigidos, o desaparecimento forçado será reconhecido como crime passível de extradição, sujeita ás condições estabelecidas pelo Estado requerido. Em ambas as situações, a extradição obedecerá a Constituição e nas leis internas do Estado requerido.


De forma complementar, o Artigo Sexto estabelece, caso negada a extradição, o dever de submissão dos casos às autoridades competentes internas  ( aut dedere aut judicare - ou extradita ou julga ). Destarte, investigação e persecução penal devem ser processadas em conformidade com a legislação interna, como se o delito tivesse sido praticado no âmbito da jurisdição do Estado, com a comunicação da decisão ao Estado que originalmente solicitou a extradição.


Os Artigos Sétimo e Oitavo trazem cláusulas específicas para evitar a impunidade dos agentes responsáveis pelo desaparecimento forçado, ao estabelecerem:


1) a sua imprescritibilidade,

2) a impossibilidade de escusa pela obediência hierárquica e

3) a proibição de julgamento por jurisdição especial.


A imprescritibilidade ( da pretensão punitiva e da pretensão executória ) do crime de desaparecimento forçado está expressa no Artigo Sétimo, o qual, contudo, excetua dessa regra os Estados que possuam normas de caráter fundamental que vedem a imprescritibilidade ( o que não é o caso do Brasil ), hipótese em que o prazo prescricional para o desaparecimento forçado deve ser equiparado àquele estipulado para o delito mais grave previsto na legislação interna. Nesse ponto, a CIDFP é distinta da CIPTPCDF, que não parte da imprescritibilidade, mas ordena que a prescrição seja compatível com a natureza grave do crime ( Artigo Oitavo ).


Ademais, tampouco é possível contornar o dever de punir os responsáveis pelo desaparecimento forçado pelo reconhecimento da obediência hierárquica como excludente de ilicitude. O Artigo Oitavo da CIDFP é claro ao estipular, igualmente, que toda pessoa que receber ordens para perpetrar o delito em questão possui o direito e o dever de não obedecê-las. Para implementar a previsão contida nesse dispositivo, os Estados devem garantir que seja fornecida a formação pessoal e a educação adequada relativamente ao delito de desaparecimento forçado aos funcionários públicos encarregados da aplicação da lei penal.


Na mesma linha, para evitar a impunidade, o Artigo Nono fixa a jurisdição comum para o julgamento dos agentes responsáveis pela prática do crime de desaparecimento forçado, excluindo expressamente a possibilidade de incidência de qualquer jurisdição especial. Assim, não apenas é impossível a alegação de que o crime de desaparecimento forçado fora cometido no exercício de funções militares, bem como não são admitidas imunidades, privilégios e dispensas especiais nas ações penais que investiguem a prática deste crime ( ressalvadas, apenas, as disposições da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas ).


O Artigo Décimo reforça a proibição total à prática do desaparecimento forçado, independentemente do contexto sociopolítico interno. Instabilidade política, emergência pública, Estado ou ameaça de guerra, ou qualquer outra circunstância interna não podem ser utilizadas como justificativa para autorizar o desaparecimento foçado de pessoas. Nessas circunstâncias excepcionais, deve ser garantido o acesso a procedimentos judiciais expeditos e eficazes para determinar a autoridade responsável pela detenção e o paradeiro e condições das pessoas detidas. Para combater o desaparecimento forçado, é garantida às autoridades judiciárias que tiverem indícios da prática deste crime a livre entrada em todos os centros de detenção, inclusive àqueles sujeitos à jurisdição militar.


Já o Artigo  Onze traz as garantias mínimas relacionadas à detenção. São deveres do Estado relacionados á privação de liberdade:


1) manter os detentos em locais oficialmente reconhecidos;

2) conduzir os detentos, sem demora e nos ditames da legislação interna, á autoridade judiciária competente; e

3) manter registros oficiais atualizados sobre detidos, com consulta disponível para os familiares e advogado do detido, bem como para os juízes, autoridades e outras pessoas com interesse legítimo.


Reconhecendo o caráter perene do desaparecimento forçado, bem como o seu impacto negativo sobre as entidades familiares, o Artigo Doze estipula a cooperação recíproca entre os Estados Partes para a localização, identificação e restituição de menores que tenham sido transportados para ou retidos em outros Estados como  consequência do desaparecimento forçado de seus pais ou tutores.


A importância do sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos ( DH ) ( *5 vide  nota de rodapé ) para prevenir e punir o crime de desaparecimento forçado está estabelecida nos Artigos treze e Quatorze. O Artigo treze dispõe que a tramitação de petições relativas  a tal crime na Comissão IDH segue o rito estabelecido na CADH, bem como nos estatutos e regulamentos da própria Comissão IDH e da Corte IDH, com menção especial à possibilidade de adoção de medidas cautelares.


Paralelamente aos procedimentos perante o sistema interamericano, o Artigo Quatorze estabelece que, quando do recebimento de petição relatando desaparecimento forçado, a Comissão IDH requisitará ao Estado pertinente informação, em caráter urgente e confidencial, sobre o paradeiro e outras circunstâncias relevantes da pessoa supostamente desaparecida. Tal pedido de informação, contudo, não tem o condão de prejudicar a admissibilidade da petição apresentada á Comissão IDH.


O Artigo Quinze traz limitações á aplicabilidade da CIDFP, ao prever que ela não restringe tratados bilaterais ou multilaterais assinados pelos Estados partes, bem como não se aplica aos conflitos armados disciplinados pelas Convenções de Genebra de Mil novecentos e quarenta e nove sobre a proteção dos feridos, doentes e náufragos das forças armadas, e a prisioneiros civis em tempos de guerra.


Os Artigos Dezesseis a Vinte e dois trazem as condições para que um Estado se obrigue à CIDFP. Os Artigos Dezesseis e Dezessete preveem que a CIDFP está aberta para assinaturas por todos os Estados-membros da OEA, ficando sujeita à ratificação, a ser depositada na Secretaria-Geral da OEA. A adesão da CIDFP por outros Estados, mediante depósito do referido instrumento também na Secretaria Geral, é facultada no Artigo Dezoito.


A apresentação de reservas à CIDFP está autorizada no Artigo Dezenove, as quais podem ser realizadas na sua aprovação, assinatura, ratificação o adesão, desde que sejam específica e compatíveis com os objetivos da CIDFP. O Artigo Vinte determinou a entrada em vigor da CIDFP no plano internacional com o depósito de Segundo instrumento de ratificação ( IR ) e, para os Estados que a ratificarem posteriormente, a sua entrada em vigor no trigésimo dia a partir da data do depósito da sua ratificação.


Finalmente, o Artigo Vinte e um admite a possibilidade de denúncia à CIDFP, com a cessação de efeitos para o Estado denunciam após um ano contado do depósito do instrumento de denúncia ( ID ) na Secretaria Geral da OEA. Já o Artigo Vinte e dois prevê que o depósito do Instrumento original da CIDFP, nas línguas oficiais, será realizado também na Secretaria Geral da OEA, sendo enviada cópia autenticada do texto para o Secretariado da ONU. Ainda, haverá assinatura, ratificação, adesão, reserva ou denúncia á CIDFP, os Estados-membros da OEA serão comunicados.


Quadro sinótico


CIDFP


Objetivos:


1) proibição à prática permissão ou tolerância ao desaparecimento forçado em qualquer situação;

2) punição interna dos autores, cúmplices e partícipes do crime de desaparecimento forçado;

3) cooperação para prevenção, punição e erradicação do desaparecimento forçado;

4) adoção de medidas internas, de cunho administrativo, legislativo e judicial, para prevenir, punir e erradicar o desaparecimento forçado e

5) Reforça o dever dos Estados de prevenir, punir e eliminar os desaparecimentos forçados, com o reconhecimento de que a sua prática sistemática constitui crime contra a humanidade.


Definição de desaparecimento forçado: Restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada o agravada pelo ambiente econômico e social.


Mecanismo de monitoramento:


1) Adoção dos mesmos procedimentos previstos na CADH, permitindo a Comissão IDH e á Corte IDH zelarem pela observância da CIDFP.

2) novidade: ao receber a petição sobre desaparecimento forçado, a Comissão IDH pode pedir informações urgentes e em sigilo ao Estado tido como infrator, sem que isso interfira no processamento regular da petição em si.           


P.S.:


Notas de rodapé:


*A Declaração da ONU sobre a proteção de todas as pessoas contra o desaparecimento forçado é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/05/direitos-humanos-convencao-protege_20.html .


*2 O Estatuto de Roma é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-um-tribunal.html .


*3 A Convenção Internacional para a Proteção de todas as Pessoas Contra Desaparecimento Forçado é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/05/direitos-humanos-convencao-protege_20.html .


*4 Disponível em: < http://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/a-60.html >. Acesso em Quinze de setembro de Dois mil e vinte.


*5 O sistema interamericano regional de proteção dos Direitos Humanos ( DH ) é melhor introduzido em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-o-sistema-americano.html


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-convencao-visa-a-prevenir-punir-e-eliminar-desaparecimento-forcado .  

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Direitos Humanos: Carta é vetor de como promover a democracia

A Carta Democrática Interamericana ( CDI ) foi aprovada em Onze de setembro de Dois mil e um na primeira sessão do Vinte e oito período extraordinário da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos ( OEA ), em Lima, Peru. A Carta, por ter sido aprovada como resolução da Assembleia Geral da OEA, não é vinculante, compondo a soft law primária ( direito em formação ) que rege a temática na região. Contudo, a CDI constitui importante vetor de interpretação de como promover a democracia prevista na Carta da OEA ( * vide nota de rodapé ) ( Artigo Segundo, Alínea b - *2 vide nota de rodapé ).


O ineditismo da CDI consiste em seu objetivo de exigir o respeito à democracia formal ( rotatividade do poder e eleições periódicas ) e também à democracia substancial ( justiça social ), estabelecendo o direito à democracia, bem como superando a antiga preocupação de defesa da ordem democrática somente nos casos de golpes de Estado que caracterizaram a região por décadas.


A CDI possui Vinte e oito Artigos divididos em Seis Partes:


1) a democracia e o sistema interamericano;

2) a democracia e os direitos;

3) democracia, desenvolvimento integral e combate á pobreza;

4) fortalecimento e preservação da institucionalidade democrática;

5) a democracia e as missões de observação eleitoral; e

6) promoção da cultura democrática.


A Parte Primeira abarca disposições gerais sobre o exercício da democracia na região latino-americana. A democracia é tida como direito, tendo os governos o dever de promovê-la e defendê-la ( Artigo Primeiro e, sendo o seu exercício a base do Estado de Direito, este deve ser realizado de forma ética e responsável com a participação permanente dos cidadãos ( Artigo Segundo ).


O Artigo Quarto, por sua vez, elenca a transparência, a probidade, a responsabilidade na gestão pública e o respeito aos direitos sociais ( *3 vide nota de rodapé ) e à liberdade de imprensa ( *4 vide nota de rodapé ) com o componentes fundamentais ao exercício da democracia. O Artigo quinto demonstra preocupação com o papel dos partidos políticos na democracia diante dos altos custos de suas campanhas eleitorais, primando pelo estabelecimento de regime equilibrado e transparente de seus financiamentos.


Já o Artigo Sexto evidencia a importância da participação popular, a qual é concomitante direito, responsabilidade e condição para o exercício efetivo da democracia.


A parte Segunda enfatiza a indispensabilidade da democracia para o pleno exercício dos 
Direitos Humanos ( DH ) ( Artigo Sétimo ). Como violações a tais direitos podem gerar denúncia aos órgãos do sistema interamericano ( *5 vide nota de rodapé ), os Estados devem assegurar sua proteção ( Artigo Oitavo ). Nesse sentido, a promoção dos DH e da diversidade e a eliminação de toda forma de discriminação e intolerância fortalecem a democracia e a participação cidadã ( Artigo Nono). O Artigo Décimo lembra, também, que a melhoria das condições de trabalho e qualidade de vida dos trabalhadores auxilia na promoção da democracia.


A relação entre democracia, pobreza e desenvolvimento é analisada na Parte Terceira. Expressa-se a interdependência e o reforço mútuo entre os três conceitos ( Artigo Onze ), assinalando que os baixos índices de desenvolvimento contribuem negativamente para a democracia de modo que os Estados devem adotar ações objetivando a criação de empregos, a redução da pobreza e a coesão social ( Artigo Doze ).


O crescimento econômico, por sua vez, pressupõe a promoção dos direitos de cunho econômico, social e cultural ( Artigo Treze ) ( *6 vide nota de rodapé ) e os Estados devem fomentar o diálogo e cooperação para promovê-los ( Artigo Quatorze ). O exercício da democracia também contribui para o desenvolvimento sustentável, de modo que políticas de preservação ambiental devem ser adotadas pelos Estados ( Artigo Quinze ). Grifa-se, ademais, que a educação acessível para todos é fundamental para a consolidação das instituições democráticas e para o crescimento econômico ( Artigo Dezesseis ).


A manutenção das instituições democráticas é o foco da Parte Quarta da CDI. Estabelece-se que, caso se considere que o processo político democrático ou o seu exercício estão em risco, o Secretário-Geral ou o Conselho Permanente ( CP ) podem, com o consentimento prévio do governo afetado, realizar visitas e elaborar relatórios de avaliação coletiva da situação para instruir o CP sobre a necessidade de adotar medidas para preservar e consolidar a democracia  na região ( Artigos Dezessete e Dezoito ). tal prerrogativa do CP de atuação para a normalização da institucionalidade democrática também pode ser provocada pelos Estados-membros ( Artigo Vinte ).


A ruptura da ordem democrática ou alteração constitucional que a afete gravemente constitui, enquanto durar, obstáculo á participação de membro na Assembleia Geral e demais órgãos estabelecidos na OEA, ficando o Estado suspenso mediante voto afirmativo de dois terços dos demais membros, o que já consta do Protocolo de Washington, de Mil novecentos e noventa e dois ( que reformou a Carta da OEA ). Contudo, tal suspensão não escusa o Estado do cumprimento de suas obrigações como membro da OEA, especialmente o respeito aos DH ( Artigos Dezenove e Vinte e um ). Para a superação da suspensão, quando cessada a situação que lhe deu causa, exige-se o mesmo quórum de dois terços ( Artigo Vinte e dois ).


No âmbito da responsabilidade dos Estados pela organização de processos eleitorais livres e justos, a parte Quinta trata das missões de observação eleitorais, as quais podem ser solicitadas por Estados-membros para auxiliarem no desenvolvimento das instituições e processos eleitorais ( Artigo Vinte e três ). A formalização e o alcance das missões de observação eleitorais, imparciais e independentes, são estipulados em convênio celebrado entre o Secretário-Geral e o Estado solicitante e os resultados sobre as condições necessários á realização de eleições livres e justas são apresentados ao CP, o qual, caso necessário, pode enviar missões especiais para melhorar os indicadores potencialmente problemáticos ( Artigos Vitne e quatro, Vinte e cinco e Vinte e seis ).


Por fim, a parte Sexta versa sobre a promoção da cultura democrática, a qual abarca o desenvolvimento de programas que considerem a democracia como sistema de vida com liberdade e desenvolvimento econômico, social e cultural ( Artigo Vinte e seis ). Tais programas devem ter como objetivos específicos a promoção da governabilidade, boa gestão e fortalecimento das instituições políticas, com especial atenção para a educação na infância e juventude como ferramenta para a continuidade dos valores democráticos e para a participação da mulher nas estruturas políticas ( Artigos Vinte e sete e Vinte e oito ).


A CDI é valioso instrumento para a interpretação do direito á democracia e dos direitos políticos no Brasil, especialmente diante de inovações como a "Lei da Ficha Limpa", que busca afastar - temporariamente - da possibilidade de ser eleito aqueles cuja conduta revela falta de compromisso com o direito à boa governança, entre outros.


Quadro sinótico


CDI


Natureza jurídica: Soft law, mas deve ser utilizado como instrumento de intermpretação dos deveres do Estado na promoção da democracia ( que consta da Carta da OEA ).


Objetivo: tratar de maneira ampla o direito á democracia, tanto no aspecto formal ( eleições livres, periódicas e justas ) quanto no aspecto material 9 ou substancial ), que abarca a justiça social e o desenvolvimento sustentável.


Uso no Brasil: A CDI é valioso instrumento para a interpretação do direito á democracia e dos direitos políticos no Brasil, especialmente diante de inovações como a "Lei da Ficha Limpa", que busca afastar - temporariamente - das eleições aqueles cuja conduta revela falta de compromisso com o direito à boa governança, entre outros.  


P.S.:


Notas de rodapé:


* A Carta da OEA é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-consagracao-da-ordem-e.html .


*2 "Artigo Segundo: Para realizar os princípio em que se baseia e para cumprir com suas obrigações regionais, de acordo com a Carta da ONU, a OEA estabelece como propósitos essenciais os seguintes: ( ... ) b. Promover e consolidar a democracia representativa, respeitando o princípio da não intervenção.".


*3 Os direitos sociais são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-os-direitos-sociais-no.html .


*4 A liberdade de imprensa é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/04/direitos-humanos-doutrinas-e_20.html .


*5 O sistema interamericano regional de proteção aos Direitos Humanos ( DH ) é melhor introduzido em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-o-sistema-americano.html .


*6 Os direitos econômicos sociais e culturais são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/04/direitos-humanos-pacto-assegura.html .


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-carta-e-vetor-de-como-promover-a-democracia .