quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Direitos Humanos: as terminologias utilizadas ao longo da história dos DH

Os direitos essenciais ( * vide nota de rodapé ) do indivíduo contam com ampla diversidade de termos e designação: Direitos Humanos ( DH ), direitos fundamentais, direitos naturais, liberdades públicas, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais. A terminologia varia tanto na doutrina quanto nos diplomas nacionais e internacionais.


A Constituição de Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) acompanha  uso variado de termos envolvendo DH. Inicialmente, o Artigo Quarto, Inciso Segundo, menciona DH. Em seguida, o Título Segundo intitula-se "direitos e garantias fundamentais". Neste título, o Artigo Quinto, Inciso Sessenta e um, usa a expressão "direitos e liberdades fundamentais" e o Inciso Setenta e um adota a locução "direitos e liberdades constitucionais". Por sua vez, o Artigo Quinto, Parágrafo Primeiro, menciona "direitos e garantias fundamentais". Já o Artigo Dezessete adota o dicção "direitos fundamentais da pessoa humana" ( Artigo Trinta e quatro, Inciso Sétimo, Alínea b ). Quando trata das cláusulas pétreas, a CF - 88 ainda faz menção à expressão "direitos e garantias individuais" ( Artigo Sessenta, Parágrafo Quarto ). No Artigo Sétimo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ( ADCT ), há o uso novamente, da expressão DH.


No Direito Internacional, há também uma utilização livre de várias expressões. A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem de Mil novecentos e quarenta e oito ( *2 vide nota de rodapé ) adota, já no preâmbulo, as locuções "direitos do homem" e "direitos essenciais do homem". A Declaração Universal dos Direitos Humanos ( DUDH ) ( *3 vide nota de rodapé ), por seu turno, estabeleceu em seu preâmbulo a necessidade de respeito aos "direitos do homem" e logo após a "fé nos direitos fundamentais do homem" e ainda o respeito aos "direitos fundamentais do homem". A Carta da ONU emprega a expressão DH ( preâmbulo e Artigo Cinquenta e seis ), bem como "liberdades fundamentais" ( Artigo Cinquenta e seis, Alínea c ). A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia do ano Dois mil ( revisada em Dois mil e sete ) lança mão da expressão "direitos fundamentais" e a Convenção Europeia de Direitos do Homem e Liberdades Fundamentais de Mil novecentos e cinquenta adorou a locução "liberdade fundamental".


Esta impressão terminológica é resultado da evolução da proteção de certos direitos essenciais do indivíduo, pela qual a denominação de tais direitos foi sendo alterada, a partir do redesenho de sua delimitação e fundamento.


Neste sentido, o uso da expressão "direito natural" revela a opção pelo reconhecimento de que estes direitos são inerentes á natureza do homem. Este conceito e terminologia foram ultrapassados ao se constatar a historicidade de cada um destes direitos, sendo os DH verdadeiros direitos "conquistados".


Por sua vez, a locução "direitos do homem" retrata a mesma origem jusnaturalista da proteção de determinados direitos do indivíduo, no momento histórico de sua afirmação em face do Estado autocrático europeu no seio das chamadas revoluções liberais, o que imprimiu um certo caráter sexista da expressão, que pode sugerir preterição aos direitos da mulher. No Canadá, há o uso corrente da expressão "direitos da pessoa", apta a superar o sexismo da dicção "direitos do homem".


Já a expressão "direitos individuais" é tida como excludente, pois só abarcaria o grupo de direitos denominados de primeira geração ou dimensão ( direito à vida, à igualdade, à liberdade e à propriedade - *4 vide nota de rodapé ). Contudo, há vários outros direitos, tais como os direitos a um ambiente ecologicamente equilibrado ( *4 vide nota de rodapé ) e outros, que não se amoldam nesta expressão "direitos individuais".


Outra expressão muito usada, em especial na doutrina de inspiração francesa, é "liberdade pública". Novamente, teme-se que esta terminologia seja excludente, pois não englobaria os direitos econômicos e sociais. Os "direitos públicos subjetivos", locução cunhada pela escola alemã de Direito Público do Século Dezenove, surgem direitos contra o Estado. Revelariam um conjunto de direitos que limita a ação estatal em benefício do indivíduo. A evolução do papel do Estado, saindo do Estado-Gendarme para o Estado Social de Direito, além da atual expansão da aplicação dos DH nas relações entre particulares, torna esta expressão de menor utilização.


Finalmente, chegou-se a duas expressões de uso corrente no Século Vinte e um: DH e direitos fundamentais.


Inicialmente, a doutrina tende a reconhecer que os DH servem para definir os direitos estabelecidos pelo Direito Internacional em tratados e demais normas internacionais sobre a matéria, enquanto a expressão "direitos fundamentais" delimitaria aqueles direitos reconhecidos e positivados pelo Direito Constitucional de um Estado específico.


Porém, como viu-se, o Direito Internacional não é uniforme e nem utiliza a locução DH sempre. Há casos recentes de uso da expressão "direitos fundamentais" em normas internacionais, como se vê na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ( redigida no ano Dois mil e alterada em Dois mil e sete ). Também o Direito Constitucional de um país pode adotar a expressão DH, como se viu em dispositivos da CF - 88.


Uma segunda diferença entre DH e "direitos fundamentais" também é comumente assimilada: os DH não seriam sempre exigíveis internamente, justamente pela sua matriz internacional, tendo então uma inspiração jusnaturalista sem maiores consequências; já os direitos fundamentais seriam aqueles positivados internamente e por isto passíveis de cobrança judicial, pois teriam matriz constitucional. Ora, a evolução do Direito Internacional dos DH não se coaduna com esta diferenciação ou qualificativo. Trata-se, então de ênfase e valorização da condição humana como atributo para o exercício destes direitos. Assim, o adjetivo "humanos" significa que tais direitos são atribuídos a qualquer indivíduo, sendo assim considerados "direitos de todos".


Muitos já utilizam uma união entre as duas expressões vistas acima, DH e "direitos fundamentais", criando-se uma nova terminologia: "DH fundamentais" ou ainda "direitos fundamentais do homem".


Esta "união de termos" mostra que a diferenciaçao entre DH, representando os direitos reconhecidos pelo Direitos Internacional, e os "direitos  fundamentais", representando os direitos positivados nas Constituições e leis internas, perde a importância, ainda mais na ocorrência de um processo de aproximação e mútua relação entre o Direito Internacional e o Direito interno na temática dos DH.


Esta aproximação entre o Direito Internacional e o Direito Nacional é consagrada, no Brasil, pela adoção do rito especial de aprovação congressual dos tratados de DH ( previsto no Artigo Quinto, Parágrafo Terceiro 0 da CF - 88. Este rito especial consiste na aprovação de um tratado por maioria de três quintos e em dois turnos em cada Casa do Congresso Nacional ( CN ) para que o futuro tratado seja equivalente à Emenda Constitucional ( EC ). Assim, um tratado de DH será equivalente à EC, ou seja, um direito previsto em tratado ( DH ) será considerado um direitos constitucional ( direitos fundamental ).


Outro ponto de aproximação entre DH e "direitos fundamentais" está no reconhecimento da jurisdição da Corte Interamericana de DH pelo Brasil, que deve agir na falha do Estado brasileiro em proteger os direitos previstos na Convenção Americana de DH ( *2 vide nota de rodapé ) pelo Brasil, que deve agir na folha do Estado brasileiro em proteger os direitos previstos na Convenção Americana de DH. Logo, a efetividade dos DH ). Assim, a antiga separação entre DH ( matriz internacional, sem maior força vinculante ) e direitos fundamentais ( matriz constitucional, com força vinculante gerada pelo acesso ao Poder Judiciário ) no tocante aos instrumentos de proteção fica diluída, pois os DH também passaram a contar com a proteção judicial internacional.


Além disto, vários destes direitos previstos nacionalmente foram também previstos internacionalmente. Os direitos fundamentais espelham, então, os DH . Assim, uma interpretação nacional sobre determinado direito poderá ser confrontada e até corrigida internacionalmente, como ocorreu no caso da Guerrilha do Araguaia ( divergência de interpretação entre o Supremo Tribunal Federal e a Corte Interamericana de DH ).


Abre-se a porta para a uniformização de interpretação, erodindo o sentido de termos separado rigidamente o mundo internacional dos DH e mundo constitucional dos "direitos fundamentais".


Quadro sinótico


Terminologia: os DH e os direitos fundamentais


A imprecisão terminológica para designar os direitos essenciais à vida digna decorrente de evolução que levou ao redesenho de sua delimitação e fundamento:


Direito natural: Opção pelo reconhecimento de que este direitos são inerentes à natureza do homem. Conceito ultrapassado ante a constatação da historicidade destes direitos.


Direitos do homem: Retrata a mesma origem jusnaturalista da proteção de determinados direitos do indivíduo, no momento histórico de sua afirmação perante o Estado autocrático europeu no seio das revoluções liberais.


Direitos individuais: terminologia tida como excludente, pois só abarcaria o grupo de direitos denominados de primeira geração ou dimensão, mas não os vários outros direitos, que não se amoldam neste termo.


Liberdade pública: Terminologia tida come excludente, pois não englobaria os direitos econômicos e sociais.


Direitos públicos subjetivos: Termo cunhado pela escola alemã de Direito Público do Século Dezenove, sugere direito contra o Estado ( conjunto de direitos que limita a ação estatal em benefício do indivíduo ).


DH e direitos fundamentais: Terminologia mais utilizadas São comumente assim diferenciados:

a) DH: matriz internacional, sem força vinculante e

b) direitos fundamentais: matriz constitucional, com força vinculante gerada pelo acesso ao Poder Judiciário.

A distinção, porém, está ultrapassada por dois fatores:

a) maior penetração dos DH no plano nacional, com a incorporação doméstica dos tratados, inclusive, no caso brasileiro, com a possibilidade de serem equivalentes à EC ( conforme Artigo Quinto, Parágrafo Terceiro da CF - 88 ) e

b) força vinculante dos DH, graças ao reconhecimento da jurisdição de órgãos como a Corte Interamericana de DH.


P.S.:


Notas de rodapé:


* Os direitos essenciais do indivíduo são melhor abordados em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-os-direitos-considerados-indispens%C3%A1veis .


*2 A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem de Mil novecentos e quarenta e oito é melhor detalhada em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-a-conven%C3%A7%C3%A3o-americana-v%C3%A1lida-e-promulgada-no-brasil .


*3 A Declaração Universal dos Direitos Humanos ( DUDH ) da ONU é melhor detalhada em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-onu-declara-liberdade-e-igualdade-em-dignidade-e-direitos .


*4 A teoria geral dos DH e a segregação por geração de direitos é melhor detalhada em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-teoria-geral .


*5 O direito a um meio ambiente equilibrado é melhor detalhado em:

https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-teoria-geral .

Mais em:

https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-as-terminologias-utilizadas-ao-longo-da-hist%C3%B3ria-dos-dh .

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