quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Direitos Humanos: o direito à liberdade e à enunciação dos direitos do preso

A importância de se garantir os direitos de um indivíduo no momento da prisão ( *4 vide nota de rodapé ) é universal, pois evita abusos a um indivíduo que está fragilizado e evidentemente em situação de vulnerabilidade. Para implementar esses direitos nos Estados Unidos da América ( EUA ), a Suprema Corte estadunidense - durante o período de atuação do Chief Justice Warren - decidiu, no caso "Miranda versus Arizona" ( * vide nota de rodapé ) em Mil novecentos e sessenta e seis, que todo custodiado deve ser advertido, no momento da prisão, pela própria polícia, que tem direito de ficar em silêncio ou, caso prefira falar, de consultar previamente seu advogado ( *2 vide nota de rodapé ). Qualquer outro comportamento da polícia ensejaria nulidade da confissão obtida. No caso Miranda, o voto do Chief Justice Warren expôs as vísceras do sistema de investigação policial norte-americano, por mio da transcrição de partes de manuais de interrogatório, que ensinavam como obter a confissão do suspeito, por meio de técnicas diversas.


O ponto em comum de todas essas técnicas usadas nos EUA era criar uma atmosfera de dominação, isolar e fragilizar o suspeito, impedindo contatos com advogados e parentes. Assim, valia tudo para obter a confissão: uso da representação com "testemunhas" e reconhecimentos forjados para desestabilizar o suspeito, duração  excessiva  do interrogatório, sugestão de esculpantes ( como legítima defesa - mas que não teriam credibilidade alguma, uma vez que o suspeito teria incialmente negado a autoria ), argumentos para convencer o suspeito a não chamar um advogado ( "se você é inocente, por que precisa de um advogado?" ), entre outras "técnicas". Tudo isso sem contar a violência dos policiais, que, obviamente, não constava dos manuais, mas que foi lembrada no voto do Juiz Warren, no célebre "Caso Miranda" da Suprema Corte dos EUA ( que reforçou o dever de enunciação dos direitos do preso ) ( *3 vide nota de rodapé ). O resgate desse voto histórico é importante para demonstrar a importância universal dos direitos do indivíduo no momento em que é preso.


A Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) enumera alguns direitos do indivíduo que devem ser enunciados pelo executor da medida:


1) Direito à comunicação do local de sua prisão


O preso tem o direito de que seja comunicado


a) à família ( ou a pessoa por ele indicada ) e

b) ao juiz competente do local onde se encontre.


Essa segunda comunicação permite o relaxamento da prisão ilegal ou ainda a concessão da liberdade provisória.


2) Direito ao silêncio


O preso será informado do seu direito de permanecer calado. Esse direito é também denominado "autodefesa passiva", com o investigado ou réu preferindo adotar uma linha de defesa não ativa, uma vez que cabe á Acusação provar o alegado. ora, por conseguinte, não pode o acusado ser apenado por um exercício regular do direito de defesa, e, então, não se pode extrair alguma consequência negativa do exercício do direito ao silêncio, como, por exemplo, estipulava a antiga redação do ?Artigo Cento e oitenta e seis ( *5 vide nota de rodapé ) do Código de Processo Penal ( CPP ) brasileiro, já alterada ( *6 vide de rodapé ).


3) Direito à assistência da família e de advogado


O preso tem assegurada a assistência da família e de advogado. Caso não possua recursos para pagar o advogado sem prejuízo da subsistência pessoal ou familiar, tem direito à assistência jurídica integral por intermédio da Defensoria Pública.


4) Direito à identificação dos captores e dos interrogadores


O preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial.


A jurisprudência ainda extraiu o privilégio contra a auto incriminação do preso e dos demais investigados e acusados, decorrente do direito expresso ao silêncio do preso. 


P.S.:


Notas de rodapé:


* Ernesto Miranda foi preso por suspeita de autoria do crime de estupro. Após, foi levado para interrogatório e confessou, sem assistência de advogado. Condenado, recorreu à Suprema Corte americana, que anulou o julgamento pela violação ao direito de não ser obrigado a se autoincriminar. Em um novo julgamento, Miranda foi novamente condenado. Anos mais tarde, Miranda foi assassinato. Ironicamente, o suspeito de seu assassinato foi advertido sobre seus direitos graças à Miranda Rule.


*2 As advertências hoje feitas compõem a chamada Miranda Rule. no original: "You have the right to remain silent. anything yoy say can and will be used against you in a Court of Law. You have you cannot afford a lawyer, one will be provided for you in a Court of Law. You have the right to be speak to an attorney, and to have an attorney present during any questioning. If you cannot afford a lawyer, one will be provided for you at government expense".


*3 Ver em Miranda versus Arizona, Trezentos e oitenta e quatro Estados Unidos da América Quatrocentos e trinta e seis ( Mil novecentos e sessenta e seis ).


*4 O direito à liberdade e suas exceções que resultam em prisão, no contexto dos Direitos Humanos, são melhor detalhadas em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/08/direitos-humanos-o-direito-liberdade-e.html .


*5 Redação anterior do Artigo Cento e oitenta e seis: "Antes de iniciar o interrogatório, o juiz observará ao réu que, embora não esteja obrigado a responder às perguntas que lhe forem formuladas, o seu silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa".


*6 A Lei número Dezmil setecentos e noventa e dois / Dois mil e três deu nova redação ao Artigo Cento e oitenta e seis do Código de Processo Penal ( CPP ), adequando-o ao processo penal de partes. O novo Artigo Cento e oitenta e seis estipula que: "Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas. Parágrafo Único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa". 

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