sexta-feira, 16 de abril de 2021

Direitos humanos: doutrinas e jurisprudências

Resumo


Para melhor entendimento deste texto, recomenda-se antes a leitura do texto introdutório disponível em https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-teoria-geral . Para quem já leu o referido texto introdutório, agora sim, segue o resumo do subtema doutrinas e jurisprudências sobre DH.


Tratamento constitucional da tortura ( Artigo Quinto, Incisos Terceiro e Sessenta e três )


O Artigo Quinto da Constituição Federal prevê que ninguém será submetido à tortura 


( Dicionário Aurélio: Verbete: tortura [ Do latim. tortura. ] S. f. 1. Suplício ou tormento violento infligido a alguém. 2. V. tortuosidade. 3. Fig. Grande mágoa. 4. Lance difícil ) 


nem a tratamento desumano ou degradante ( Inciso Terceiro ); bem como que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. O Artigo Quinto, Inciso Quarenta e três, da Constituição Federal é uma norma constitucional de eficácia limitada, pois necessita da atuação do legislador infraconstitucional para que sua eficácia se produza. Assim, quanto à inafiançabilidade e insuscetibilidade de graça ou anistia foi editada a lei dos crimes hediondos ( Lei número Oito mil e setenta e dois  / Mil novecentos e noventa ), todavia, no tocante à definição o crime de terrorismo e tortura, tornou-se necessária a edição de lei infraconstitucional, de competência da União ( Artigo Vinte e dois, Inciso Primeiro, da Constituição Federal ), tipificando-os, em razão do próprio preceito constitucional do Artigo Quinto, Inciso Trinta e nove.


O termo tortura, para a Assembleia Geral das Nações Unidas, significa


qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram ( Artigo Primeiro da Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, adotada pela Resolução número Trinta e nove / Quarenta e seis da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Dez de dezembro de Mil novecentos e oitenta e quatro ).


Questão controvertida, decidida pelo Supremo Tribunal Federal, considerou por maioria de votos ( Seis a cinco ) que existia lei tipificando o delito de tortura, quando praticado contra a criança ou adolescente, ao analisar a constitucionalidade do Artigo Duzentos e trinta e três do Estatuto da Criança e do Adolescente.


O Ministro marco Aurélio, posicionando-se em sentido contrário, afirmava que o Artigo Duzentos e trinta e três do Estatuto da Criança e do Adolescente não poderia ser considerado como crime de tortura pois,


"a simples menção à tortura, sem que se defina o comportamento suficiente a configurá-la, deixa ao sabor da capacidade até mesmo intuitiva daquele que exerce o ofício judicante o alcance da norma penal, a conclusão sobre a prática, ou não, do crime ao qual o contexto jurídico-constitucional impõe consequências das mais gravosas, como são o afastamento da graça, do indulto e da anistia, da fiança, o elastecimento da prisão temporária e o cumprimento da pena, na sua integralidade, no regime fechado. A insegurança grassará e, o que é pior, julgamento das ações penais correrá à conta da formação do julgador. Como redigido, o Artigo Duzentos e trinta e três do Estatuto da Criança e do Adolescente, reclama postura do magistrado que contraria a máxima gizada por Nelson Hungria em Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, Mil novecentos e cinquenta e oito. t. Um, Páginas Um a oitenta e seis, consoante a qual 'a lei penal a lei penal deve ser interpretada restritivamente quando prejudicial ao réu e extensivamente no caso contrário'. O juiz partirá para o campo da interpretação extensiva, definindo ele próprio o que se entende como crime de tortura e assumindo, com isto, a posição reservada ao legislador" ( Temas de direito penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, número Oito ).


A divergência foi solucionada pelo legislador que, ao editar a Lei número Nove mil quatrocentos e cinquenta e cinco, de Sete de abril de Mil novecentos e noventa e sete, definiu os crimes de tortura ( Artigo Primeiro ) e, expressamente em seu Artigo Quarto, revogou o Artigo Duzentos e trinta e três do Estatuto da Criança e do Adolescente ( Lei número Oito mil e sessenta e nove de Mil novecentos e noventa ). Ressalte-se que as elementares características do crime de tortura são o constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental.


Ressalte-se que a presente lei veio atender à organização das Nações Unidas que exige, no Artigo Quarto da citada Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, que cada Estado-parte assegurará que todos os atos de tortura sejam considerados crimes segundo a sua legislação penal. O mesmo aplicar-se-á à tentativa de tortura e a todo ato de qualquer pessoa que constitua cumplicidade ou participação na tortura.


Definição de tortura


Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - "Tortura é a composição de ações empregadas por uma ou mais pessoas, com relação a outra, ou outras, que pelo modo violento e desgastante, quer no aspecto físico, quer psíquico, com o perdurar do tempo, acaba por derrotar toda a resistência natural inerente ao ser humano, tornando-o desorientado, depressivo e sujeito às mais várias reações, dentre elas, aquela que mais interessa a quem tortura - o irremediável medo" ( Apelação Criminal número Cento e noventa e dois mil cento e vinte e dois - Dígito Três - Taubaté - Segunda Câmara Criminal - relator Prado de Toledo - Dezesseis de outubro de Mil novecentos e noventa e cinco - v. u. ).


Tortura e produção de provas


Supremo Tribunal Federal - "Os problemas jurídicos atinentes à inadmissibilidade processual e às consequências da admissão indevida, no processo, das provas ilícitas - da barbárie primitiva da tortura física à sofisticação tecnológica da interceptação telefônica - , ainda geram controvérsias doutrinárias e vacilações jurisprudenciais nos ordenamentos de maior tradição cultural. No brasil, porém - sobretudo, a partir da Constituição - , o direito positivo deu resposta explícita às questões fundamentais do tema, antes que elas se tornassem objeto de sedimentação doutrinária e da preocupação frequente dos tribunais. Não é que, nestas bandas, a persecução penal, algum dia, tivesse sido imune à utilização das provas ilícitas. Pelo contrário. A tortura, desde tempos imemoriais, continua sendo a prática rotineira da investigação policial da criminalidade das classes marginalizadas, mas a evidência da sua realidade geralmente só choca as elites, quando nos tempos de ditadura, de certo modo se democratiza e violenta aos inimigos do regime, sem discriminação de classe" ( trecho do voto do ministro relator Sepúlveda Pertence, Habeas Corpus número Sessenta e nove mil novecentos e doze / Rio Grande do Sul - Informativo Supremo Tribunal Federal número Trinta e seis ).


Tortura e responsabilidade objetiva da Fazenda Pública


Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - "Indenização - Detenção Arbitrária e submissão da vítima a tortura por policiais civis - Decorrente incapacidade permanente para o trabalho caracterização de lesão corporal gravíssima - Procedência - Hipótese de responsabilidade objetiva da Fazenda" ( Apelação Cível número Cento e setenta e cinco mil e oitenta e dois - Dígito Um. Origem: São Paulo. Órgão: Casa Civil 1. relator Luis de Macedo. Data: Vinte e dois de setembro de Mil novecentos e noventa e dois ). No mesmo sentido: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Revista dos Tribunais número Quinhentos e setenta / Cento e oitenta e oito .


Estatuto da Criança e do Adolescente e crime de tortura


Supremo Tribunal Federal - "Tortura contra criança ou adolescente - Existência jurídica deste crime no Direito Penal Positivo brasileiro - Necessidade de sua repressão - Convenções internacionais subscritas pelo Brasil - Previsão Típica constante do Estatuto da Criança e do Adolescente ( Lei número Oito mil e sessenta e nove de Mil novecentos e noventa, Artigo número Duzentos e trinta e três ) - Confirmação da constitucionalidade desta forma de tipificação penal - Direito imputado a policiais militares - Infração penal que não se qualifica como crime militar - Competência da Justiça Comum do Estado-membro - Pedido deferido em parte" ( Pleno - Habeas Corpus número Setenta mil trezentos e oitenta e nove - Dígito Cinco / São Paulo - relator Ministro Celso de Mello; julgado em Vinte e três de julho de Mil novecentos e noventa e quatro ). Neste sentido também: Habeas Corpus número Setenta mil trezentos e trinta e dois - Rio de Janeiro, relator Ministro Néri da Silveira, Vinte e quatro de setembro de Mil novecentos e noventa e seis - Informativo Supremo Tribunal Federal número Quarenta e sete. Relembre-se, novamente, de que o Artigo Duzentos e trinta e três do Estatuto da Criança e do Adolescente foi expressamente revogado pelo Artigo Quarto da Lei número Nove mil quatrocentos e cinquenta e cinco / Mil novecentos e novena e sete .


Uso de algemas e tratamento desumano e degradante


Supremo Tribunal Federal - "No tocante à necessidade ou não do uso de algemas, aduziu-se que esta matéria não é tratada, específica e expressamente, nos códigos Penal e de Processo Penal vigentes. Entretanto, salientou-se que a Lei e Execução Penal ( Artigo Cento e noventa e nove ) determina que o emprego de algemas seja regulamentado por decreto federal, o que ainda não ocorreu. Afirmou-se que, não obstante a omissão legislativa, a utilização de algemas não pode ser arbitrária, uma vez que a forma juridicamente válida do seu uso pode ser inferida a partir da interpretação dos princípios jurídicos vigentes, especialmente o princípio desproporcionalidade e o da razoabilidade. Citaram-se, ainda, algumas normas que sinalizam hipóteses em que aquela poderá ser usada ( Código de Processo Penal, Artigos Duzentos e oitenta e quatro e Duzentos e noventa e dois; Constituição Federal, Artigo Quinto, Incisos Terceiro, parte final e Décimo; as regras jurídicas que tratam de prisioneiros adotadas pela Organização das Nações Unidas, número Trinta e três; o Pacto de San José da Costa Rica, Artigo Quinto, Inciso Segundo ). Entendeu-se, pois, que a prisão não é espetáculo e que o uso legítimo de algemas não é arbitrário, sendo de natureza excepcional e que deve ser adotado nos casos e com as finalidades seguintes:


a) para impedir, prevenir ou dificultar a fuga ou reação indevida do preso, desde que haja fundada suspeita ou justificado receio de que tanto venha a ocorrer;


b) para evitar agressão do preso contra os próprios policiais, contra terceiros ou contra si mesmo.


Concluiu-se que, no caso, não haveria motivo para a utilização de algemas, já que o paciente não demonstra reação violenta ou inaceitação das providências policiais. Ordem concedida para determinar às autoridades tidas por coatoras que se abstenham de fazer uso de algemas no paciente, anão ser em caso de reação violenta que venha a ser por ele adotada e que coloque em risco a sua segurança ou a de terceiros, e que, em qualquer situação, deverá ser imediata e motivadamente comunicado ao Supremo Tribunal Federal" ( Supremo Tribunal Federal - Primeira Turma - Habeas Corpus número Oitenta e nove mil quatrocentos e vinte e nove / Rondônia - relator Ministra Cármen Lúcia, decisão: Vinte e dois de agosto de Dois mil e seis - Informativo Supremo Tribunal Federal número Quatrocentos e trinta e sete, Seção Primeira, Página Três ). No mesmo sentido: Superior Tribunal de Justiça - "A imposição do uso de algemas ao réu, por constituir afetação aos princípios de respeito à integridade física e moral do cidadão, deve ser aferida de modo mais cauteloso e diante de elementos concretos que demonstrem a periculosidade de acusado - Recurso provido" ( Sexta Turma - Recurso de Habeas Corpus número Cinco mil seiscentos e sessenta e três / São Paulo, relator. Ministro William Patterson, Diário da Justiça, Seção Primeira, Vinte e três de setembro de Mil novecentos e noventa e seis, p. Trinta e cinco mil cento e cinquenta e sete ).


Tortura e excesso de prazo


Superior Tribunal de Justiça - "Em se tratando de crime hediondo, praticado por vários réus, de forma continuada, com tortura e violência, sendo portanto, inafiançável, é de boa prudência que se mantenha a custódia preventiva" ( Quinta Turma - Habeas Corpus número Mil e setenta e quatro - Dígito Zero - Rio Grande do Sul. Registro número Nove bilhões duzentos milhões cento e oitenta e cinco. relator Ministro Edson Vidigal. Ementário Superior Tribunal de Justiça número Cinco / Cento e oitenta e um ).


Internação em hospital psiquiátrico sem previsão legal - tratamento degradante


Superior Tribunal de Justiça - "Constatado, mediante laudo médico, que o réu condenado pela Lei de Tóxicos deve ser submetido a tratamento em regime ambulatorial, não pode a autoridade judiciária determinar seu internamento, pelo prazo da sentença, em hospital de custódia e tratamento. O réu foi condenado a cumprir pena de detenção em regime semiaberto e a internação em hospital psiquiátrico implica em incabível reforma da sentença, transformando a detenção em reclusão degradante" ( Quinta Turma - Recurso Especial número Dois mil novecentos e sessenta e dois / Rio de Janeiro - Registro número Novecentos milhões quatro mil cento e quarenta e dois - 2. relator Ministro Edson Vidigal. Ementário Superior Tribunal de Justiça, Quatro / Duzentos e oitenta e quatro ).


Referência


Moraes, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos artigos primeiro a quinto da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência - Oitava edição - São Paulo: Atlas, Dois mil e sete. Páginas Cento e seis a Cento e nove.


Mais em:


https://administradores.com.br/artigos/direitos-humanos-doutrinas-e-jurisprud%C3%AAncias-22 .   

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