A discriminação injusta ( inconvencional e inconstitucional ) ( * vide nota de rodapé ) é constatada na ocorrência de tratamento igualitário para situações diferenciadas e, também, na ocorrência de tratamento diferenciado para situações idênticas.
O Estado possui dois instrumentos para promover a igualdade ( *2 vide nota de rodapé ) e eliminar a discriminação injusta:
1) o instrumento repressivo e
2) o instrumento promocional ( voltado ao fomento da igualdade ).
O primeiro instrumento é o repressivo. Como prevê a Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ), a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais ( Artigo Quinto, Inciso Quarenta e um ) ( *3 vide nota de rodapé ) e ainda a prática do racismo ( *4 vide nota de rodapé ) constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei ( Artigo Quinto, Inciso Quarenta e dois ) ( *5 vide nota de rodapé ).
Consequentemente, o legislativo pode constituir em tipos penais outros comportamentos discriminatórios, como, por exemplo, a discriminação por orientação de gênero ( *6 vide nota de rodapé ) ou por procedência nacional ( *7 vide nota de rodapé ). Nessa linha, a Lei número Sete mil setecentos e dezesseis / Mil novecentos e oitenta e nove ( alterada por leis posteriores ) determinou a punição dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor etnia, religião ( *8 vide nota de rodapé ) ou procedência nacional.
O segundo instrumento é o promocional, uma vez que a proibição da discriminação não assegura, de pronto, a inclusão do segmento social submetido a determinada situação inferiorizante. A opção da CF - 88 foi de também utilizar políticas compensatórias que acelerem a igualdade e a consequente inclusão dos grupos vulneráveis ( *9 vide nota de rodapé ).
Entre outras, o Artigo sétimo, Inciso Vinte, determina a proteção do mercado de trabalho ( *10 vide nota de rodapé ) da mulher ( *11 vide nota de rodapé ) mediante incentivos específicos, bem como o Artigo Trinta e sete, Inciso Sétimo, que determina que a lei reservará percentual de cargos e empregos públicos para as Pessoas com Deficiência ( PcD ) ( *12 vide nota de rodapé ). Assim, a CF - 88 abriu a porta para a implementação de outras ações afirmativas ou políticas de discriminação positiva.
As ações afirmativas consistem em um conjunto de diversas medidas, adotadas temporariamente e com foco determinado, que visa a compensar a existência de uma situação de discriminação que políticas generalistas não conseguem eliminar e objetivam a concretização do acesso a bens e direitos diversos ( como trabalho, educação - *13 vide nota de rodapé - , participação política - *14 vide nota de rodapé ) etc. ).
Tais ações tutelam os interesses e grupos sociais em situação de vulnerabilidade e objetivam, no futuro, a realização da igualdade substantiva ou material. No Supremo Tribunal Federal ( STF ), o Ministro Nelson Jobim destacou que "a discriminação positiva introduz tratamento desigual para produzir,m no futuro e em concreto, a igualdade. É constitucionalmente legítima, porque se constitui em instrumento para obter a igualdade real" ( voto do Ministro Nelson Jobim, na Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI - número Mil novecentos e quarenta e seis - medida Cautelar ( MC ) / Distrito Federal, relator Ministro Sydney Sanches, julgada em Três de abril de Dois mil e três, Plenário, Diário da Justiça de Dezesseis de maio de Dois mil e três ).
No Direito Comparado, destacam-se as discussões sobre as ações afirmtivas na Índia 9 origem da temática, com Government of India Act, de Mil novecentos e trinta e cinco, para ações afirmativas às castas subalternas às castas subalternas ) e nos Estados Unidos da América ( EUA ). A Suprema Corte americana foi protagonista na aceitação da teoria do treatment as equal, a partir de meados dos anos Cinquenta do Século Vinte, pela qual foram aceitas as políticas públicas ou condutas privadas que tratam desigualmente os desiguais, para efetivamente combater situações de inferioridade e discriminação. Para Joaquim Barbosa, as ações afirmativas diferem das tradicionais políticas governamentais antidiscriminatórias baseadas em leis de conteúdo meramente proibitivo, em geral de caráter penal, que são caracterizadas por oferecerem ás respectivas vítimas tão somente instrumentos jurídicos de caráter reparatório e de intervenção post facto. pelo contrário, as ações afirmativas objetivam fornecer condições estruturais de mudança social, evitando que a discriminação continue através de mecanismos informais, enraizados nas práticas culturais e no imaginário coletivo ( *15 vide nota de rodapé ).
As medidas de ações afirmativas ( também chamadas de políticas ou ações compensatórias ) são de diferentes espécies: desde o encorajamento do órgãos públicos e privados para que ajam em prol da inclusão de grupos vulneráveis, passando por estímulos diferenciados ( por exemplo, cursinho preparatório para o ingresso em Faculdade para afrodescendentes ), benefícios fiscais e prefer~encias 9 por exemplo, pontuação adicional em licitações ) até a imposição de percentual de vagas para grupos vulneráveis em determinados temas ( as cotas ).
No Brasil, além da reserva de vagas para as PcD, há a cota de candidatura por gênero ( Trinta por cento no mínimo e Setenta por cento no máximo, para cada gênero - Lei número Doze mil e trinta e quatro / Dois mil e nove ). Não são cotas para as mulheres, mas têm especial impacto nas candidaturas femininas, pois tradicionalmente a política partidária é dominada pelo gênero masculino.
Além disso, o Terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos ( PNDH-3 ) ( *16 vide nota de rodapé ) incentiva a adoção de políticas compensatórias, defendendo o aumento das ações afirmativas em favor de grupos em situação de vulnerabilidade. No plano federal, há o Programa de Ações Afirmativas da Administração Pública Federal ( PAFAPF ) ( Decreto número Quatro mil duzentos e vinte e oito, de treze de maio de Dois mil e dois ), que determina a observância, pelos órgãos da APF, de requisito de garantia a realização de metas percentuais de participação de afrodescendentes, mulheres e PcD no preenchimento de cargos em comissão e ainda a observância, nas licitações promovidas por órgão da APF, de critério adicional de pontuação, a ser utilizado para beneficiar fornecedores que comprovem a adoção de políticas compatíveis com os objetivos do PAFAPF.
Quanto á base normativa específica, o Brasil ratificou e incorporou internamente três tratados de âmbitos global que contam com a previsão de ações afirmativas:
1) A Convenção da Organização das Nações Unidas ( ONU ) sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial ( CONUETFDR ) ( *17 vide nota de rodapé ) dispõe, no Artigo Primeiro, Parágrafo Quarto, que são legítimas as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso de certos grupos raciais ou étnicos ou indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo de exercício de Direitos Humanos ( DH ) e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em consequência, á manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos;
2) Convenção da Organização das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher ( CONUETFDCM ) ( *18 vide nota de rodapé ) permite que os estados imponham medidas especiais de caráter temporário destinadas a acelerar a igualdade de fato entre o homem e a mulher ( Artigo Quatro ponto Um ). São medidas de compensação à situação histórica de desigualdade entre os gêneros, em prejuízo da mulher;
3) A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos das PcD ( CONUDPcD ) ( *19 vide nota de rodapé ), no seu Artigo Quinto, item Quarto, que as medidas específicas que forem necessárias para acelerar ou alcançar a efetiva igualdade das PcD não serão consideradas discriminatórias. No Artigo Vinte e sete, Alínea h, prevê o dever do Estado de promover o emprego de PcD no setor privado, mediante políticas e medidas apropriadas, que poderão incluir programas de ação afirmativas, incentivos e outras medidas.
Em dois mil e dez, foi editada a Lei número Doze mil duzentos e vinte e oito, que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial. Foi criado o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial ( SINAPIR ) que busca a implementação do conjunto de políticas e serviços prestados pelo Pode Público Federal ( PPF ) e destinados a superar as desigualdades étnicas existentes no País.
São objetivos do SINAPIR:
1) promover a igualdade étnica e o combate às desigualdades sociais resultantes do racismo, inclusive mediante adoção de ações afirmativas;
2) formular políticas destinadas a combater os fatores de marginalização e a promover a integração social da população negra;
3) descentralizar a implementação de ações afirmativas pelos governos estaduais, distrital e municipais;
4) articular planos, ações e mecanismos voltados á promoção da igualdade étnica;
5) garantir a eficácia dos meios e dos instrumentos criados para a implementação das ações afirmativas e o cumprimento das metas a serem estabelecidas.
Em Dois mil e doze, o STF reconheceu a constitucionalidade da adoção de cotas para afrodescendentes em universidades, ao julgar improcedente a Arguição de Descumprimento de Preceitos Fundamentais ( ADPF ) número Cento e oitenta e seis ( relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgada em Vinte e seis de abril de Dois mil e doze, Plenário, Diário da Justiça eletrônico de Vinte de outubro de Dois mil e quatorze ). Nessa ADPF, as seguinte balizas foram consagradas no tocante às políticas de cotas para afrodescendentes e povos indígenas ( *20 vide nota de rodapé ) nas Universidades ( *21 vide nota de rodapé ):
1) Objetivo: ficou evidenciado que a cota étnica-racial nas universidades tem objetivo constitucionamente adequado: estabelecer um ambiente acadêmico plural e diversificado, superando a pouca diversidade racial do ensino superior público e, com isso, eliminando distorções sociais historicamente consolidados.
2) Critério: é importante que o critério a ser utilizado seja também adequado. No caso da cota para afrodescendentes há dois critérios utilizados comumente: a autoidentificação e a heteroidentificação ( identificação feita por terceiros ). no caso da ADPF Cento e oitenta e seis, ambos os critérios foram considerados constitucionais, mesmo a polêmica heteroidentificação. Nesse último critério, exigiu-se o
a) respeito á dignidade pessoal dos candidatos, com a
b) formação de comitê composto de modo plural e com
c) mandatos curtos, que julgue por fenótipo e não por ascendência, na linha do sugerido por Daniela Ikawa ( *22 vide nota de rodapé )
3) Proporcionalidade: a cota deve ser proporcional e razoável, reservando-se as vagas em número adequado, apto a não excluir em demasia os demais membros da comunidade não abrangidos no critério de seleção. Assim, para o relator, Ministro Lewandowski, no caso da Universidade de Brasília, areserva de Vinte por cento de suas vagas para estudantes afrodescendentes e de um pequeno número delas para "índios de todos os Estados brasileiros", pelo prazo de Dez anos, constitui providência adequada e proporcional ao atingimento da igualdade material.
4) Transitoriedade - o caráter temporário da discriminação positiva 9 compatível com a produção de efeitos no futuro ) foi realçado pelo voto do Ministro marco Aurélio na ADPF Cento e oitenta e seis, para quem tal sistema há de ser utilizado na correção de desigualdades e afastado tão logo eliminadas essas diferenças.
Ainda na busca por igualdade material no ensino superior, a Medida Provisória número Duzentos e treze instituiu o Programa Universidade para Todos ( PROUNI ), hoje regido pela Lei número Onze mil e noventa e seis / Dois mil e cinco. O PROUNI destina bolsa de estudos para alunos carentes, determinando dotas para alunos egressos da rede pública, da rede privada ( desde que tenham cursado com bolsa integral ), pessoa com deficiência e professor da rede pública, para determinados cursos.
Também em Dois mil e doze, o STF julgou improcedente o pedido feito na Ação Direta de Inconstitucionalidade ( ADI ) número Três mil trezentos e trinta, considerando constitucional a Lei número Onze mil e noventa e seis / Dois mil e cinco, que instituiu o PROUNI.
Após o julgamento da ADPF Cento e oitenta e seis, houve a edição da Lei número Doze mil setecentos e onze / Dois mil e doze, que determinou a implantação de cotas sociais com recorte étnico-racial em Universidades Federais e instituições federais de ensino técnico, exigindo a reserva de, no mínimo, Cinquenta por cento das vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio ou fundamental ( a depender do curso ) em escolas públicas. Além disso, a lei exigiu que a cota social fosse preenchida, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e índios ( PPI ) ( recorte racial ) na população da Unidade da Federação ( UF ) onde está instalada a Instituição, segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE ). Assim, o censo do IBGE ditará o percentual de vagas a serem oferecidas sob esses critérios.
Em Dois mil e quatorze, foi editada a Lei número Doze mil novecentos e noventa, que instituiu a reserva aos negros de Vinte por cento das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da APF, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União. De acordo com o Artigo Segundo da Lei, o critério adotado foi o do autorreconhecimento ou autoidentificação, pelo qual poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclarem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação do IBGE ( preto, pardo, amarelo, branco ou indígena ).
De acordo com os dados de Dois mil e quatorze, aproximadamente Cinquenta e três por cento dos brasileiros autodeclaram-se preto ou pardo. não há previsão explícita na lei do uso de características estereotipadas de fenotípico ( cor de pele, características físicas, etc ), mas há previsão de punição por "declaração falsa", resultando na necessidade implícita da existência de heteroidentificação ( para detectar justamente a declaração falsa ).
Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. Dessa maneira, esse dispositivo legal é curioso, pois indica que a condição de negro ou parto é sindicável, ou seja, seria possível que um determinado observador ( terceiro ) defina que é ou não merecedor da ação afirmativa. haveria, então, um modo "objetivo" de se definir que é preto ou pardo, mas a lei nada esclareceu sobre quais seriam esses "critérios". Mesmo eventual transferência da questão ao Poder Judiciário ( por intermédio de ações judiciais promovidas pelo interessado pelos outros candidatos ) exigiria que o juiz fundamentasse sua decisão sobre se alguém é ou não merecedor da cota, conforme exige o Artigo Noventa e três, Inciso Nono, da CF - 88 ( exigência de fundamentação das decisões judiciais ). Assim, o heterorreconhecimento, em que pese não ter sido considerado inconstitucional pelo STF ( ADPF Cento e oitenta e seis ) ficou sem alguma baliza ou critério legal. Como bem resume Vitorelli, como a má-fé não se presume, caberia à Administração Pública ( AP ) provar ( por documentos ou testemunhas ) que o candidato se apresentava como "branco" e somente se apresentou como negro para fraudar o concurso ( *23 vide nota de rodapé ).
Em resumo, a Lei número Doze mil novecentos e noventa / Dois mil e quatorze:
1) atinge os concursos públicos do Poder Executivo Federal ( PEF ), tanto da Administração Pública Federal ( APF ) Direta quanto da APF Indireta, inclusive as empresas públicas ( Caixa Econômica Federal - CEF - , por exemplo ) e as sociedades de economia mista ( Banco do Brasil - BB - , por exemplo );
2) abrange os concursos do Poder Legislativo Federal ( PLF ), Poder Judiciário Federal ( PJF ), Ministério Público da União ( MPU ) e Defensoria Pública da União ( DPU ), bem como os concursos realizados pelas Forças Armadas ( FA ). Não abrange os da área estadual ou municipal;
3) não abrange os concursos cujos editais foram publicados antes da entrada em vigor da lei, no dia Dez de junho de Dois mil e quatorze ( Artigo Sexto da lei );
4) o critério adotado é o da autoidentificação, abrangendo tanto os que se reconhecem como "pretos" ou "pardos", de acordo com a classificação do IBGE;
5) a previsão da penalidade administrativa à "declaração falsa" ( sem prejuízo da previsão legal de sanções de outras espécies - Artigo Segundo, Parágrafo Único ) gera perplexidade, pois o critério da lei é o da autoidentificação. Para o STF, a lei, assim, admitiu a heteroidentificação, permitindo que terceiro ( comissão de concurso, organizações da sociedade civil, comissão de notáveis, etc. ) determine o que é ser "pardo" ou "negro";
6) tal qual como ocorre na aplicação - mais longeva - das cotas para PcD nos concursos públicos, o candidato dege:
a) concorrer concomitantemente na lita geral e na lista de vagas reservadas, o que permite que um candidato negro ou pardo com nota para ser aprovado na lista geral não ocupe a vaga dos Vinte por cento;
b) o candidato na lista da cota deve superar os critérios mínimos de aprovação, o que assegura a qualidade da seleção;
7) a nomeação dos candidatos deve ser alternada entre a lista geral e a lista das vagas reservadas, para que, ao final, haja também nas nomeações o respeito ao percentual ( Oitenta por cento versus Vine por cento );
8) como se espera de qualquer medida compensatória, há um prazo para a sua duração: a lei prevê o prazo de Dez anos para tais cotas ( Artigo Sexto ).
A Lei número Treze mil quatrocentos e nove / Dois mil e dezesseis também instituiu cotas ao prever que, em cada instituição federal de ensino superior ( IFES ) ou de ensino técnico ( IFET ) de nível médio, devem ser reservadas vagas, por curso e turno, por autodeclarados PPI e por PcD, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação ( UF ) onde está instalada a IF, segundo o último censo da Fundação IBGE.
Em Oito de junho de Dois mil e dezessete o STF julgou a Ação Declaratória de Constitucionalidade ( ADC ) número Quarenta e um, reconhecendo a constitucionalidade da Lei número Doze mil novecentos e noventa / Dois mil e quatorze, que reserva Vinte por cento das vagas oferecidas em concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da APF Direta e Indireta, no âmbito dos Três Poderes. A decisão foi unânime e, com ela, ficaram afastadas dúvidas na aplicação da cota dos Vinte por cento para concursos de membros e servidores do PJ e MPU. Também foi aceita a utilização da heteroidentificação, desde que com respeito ao contraditório e á ampla defesa, sendo preservada ainda a dignidade do candidato ( que não pode ser sujeito à verificação vexatória de sua condição ). A tese fixada na ADC foi a seguinte: "É constitucional a reserva de Vinte por cento das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da APF Direta e Indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa" ( ADC número Quarenta e um, relator Ministro roberto Barroso, julgada em Oito de junho de Dois mil e dezessete, Publicada no Diário da Justiça eletrônico de Dezessete de agosto de Dois mil e dezessete ).
No caso da magistratura, as cotas em concursos para magistrados também estão previstas na Resolução número Duzentos e três / Duzentos e quinze do Conselho Nacional de Justiça ( CNJ ), que reserva Vinte por cento de vagas para pretos e pardos no âmbito do PJ. Já no caso do MP, a cota de Vinte por cento de vagas para PPI no concursos de provimento de cargos de membro do MP consta na Resolução número Cento e setenta / Dois mil e dezessete do Conselho Nacional do Ministério Público ( CNMP ). Ambas as resoluções vigorarão até Nove de junho de Dois mil e vinte e quatro, término do prazo de vigêncvia da Lei número Doze mil novecentos e noventa / Dois mil e quatorze.
Em Dois mil e dezenove, foi editada a Lei número treze mil oitocentos e setenta e dois, que adotou mais uma medida de ação afirmativa, assegurando à mãe o direito de amamentar seus filhos de até Seis meses de idade durante a realização de provas ou de etapas avaliatórias em concursos públicos na Administração Publica ( AP ) direta e indireta dos Poderes da União, mediante prévia solicitação à instituição organizadora.
As políticas de ação afirmativa pode ser também adotadas pelo setor privado sem que tais medidas sejam consideradas discriminatórias, na medida em que tenham como metas
1) a correção da desigualdade e
2) a obtenção de igualdade material.
Assim, a diferenciação na área privada ( tal qual na área pública ) que vise à inclusão não pode ser tida como discriminação odiosa. O próprio Estatuto da Igualdade Racial ( Lei número Doze mil duzentos e vinte e oito / Dois mil e dez ) prevê, em seu Artigo quarto, Inciso Sexto, o estímulo a iniciativas oriundas da sociedade civil direcionadas á promoção da igualdade e oportunidades e ao combate às desigualdades étnicas. No que tange ao mercado de trabalho, o Poder Público deve incentivar a adoção de medidas que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra 9 Artigo número Trinta e nove da Lei número Doze mil duzentos e vinte e oito ). No plano convencional referente à discriminação em matéria de emprego e ocupação, a Convenção da Organização Internacional do Trabalho ( OIT ) número Cento e onze ( realizada e incorporada internamente ) prevê que é não discriminatória à medida que se destina a atender necessidades particulares de pessoas ( Artigo Quinto ). Novamente, a diferenciação para a inclusão é distinta da discriminação para exclusão. Caso recente de programa de trainee voltado exclusivamente para negros é típico caso de diferenciação para inclusão, sendo constitucional e convencional, na medida em que serve para cumprir a igualdade material em determinada empresa, cujos quadros diretivos quase não possuíam PPI. Houve ação civil pública da Defensoria Pública da União ( DPU ) contra tal programa na Justiça do Trabalho, que apontou a existência de "racismo reverso". O conceito de racismo exige a existência de uma situação de vulnerabilidade e inferiorização na qual a vítima se encontra, o que impede que grupos hegemônicos na sociedade possam se utilizar do regime jurídico de combate ao racismo, o qual justamente visa a corrigir tal situação de fragilidade do grupo não hegemônico discriminado ( justiça corretiva ).
P.S.:
Notas de rodapé:
* A vedação à discriminação injusta, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/03/direitos-humanos-conselho-colabora-com.html .
*2 o direito à igualdade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/05/direitos-humanos-o-direito-igualdade-na.html .
*3 A diversidade terminológica, referente aos Direitos Humanos, é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-as-terminologias.html .
*4 A vedação ao racismo, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-racismo-e-formas.html .
*5 O crime de racismo, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/06/direitos-humanos-doutrinas-e_9.html .
*6 O direito à orientação de gênero, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/06/direitos-humanos-aplicacao-do-direito.html .
*7 O direito do imigrante, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-os-direitos-do.html .
*8 O direito à liberdade de culto religioso, no contexto dos Direitos Humanos, é melhora detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/04/direitos-humanos-doutrinas-e_88.html .
*9 A inclusão como estratégia promocional da igualdade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/11/direitos-humanos-o-desenvolvimento.html .
*10 O direito ao trabalho, no contexto dos Direitos Humanos, é melhora detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-protocolo-volta-se.html .
*11 A participação das mulheres no mercado de trabalho, no contexto dos Direitos Humanos, é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-participacao-das.html .
*12 A proteção das Pessoas com Deficiência, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/02/direitos-humanos-protecao-das-pcd-no.html .
*13 O direito à educação, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/11/direitos-humanos-educacao-e-cultura-em.html .
*14 O direito à participação política, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-os-direitos_4.html .
*15 Gomes, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade. Rio de janeiro: Renovar, Dois mil e um, Páginas Quarenta a Quarenta e um.
*16 O Terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos é melhora detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/03/direitos-humanos-os-programas-nacionais.html .
*17 A Convenção da Organização das Nações Unidas ( ONU ) sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-peritos-visam-eliminar.html .
*18 A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-eliminacao-da_27.html .
*19 A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/06/direitos-humanos-protecao-das-pessoas.html .
*20 O direito dos povos indígenas, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-declaracao-promove.html .
*21 A reserva de vaga para povos indígenas em Universidades, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor exemplificado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/03/direitos-humanos-povos-originarios.html .
*22 Ikawa, Daniela. Ações afirmativas em universidades. Rio de janeiro: Lumen Juris, Dois mil e oito.
*23 Em sentido contrário ao defendido neste texto, Vitorelli defende que a Lei número Doze mil novecentos e noventa / Dois mil e quatorze é inconstitucional do ponto de vista formal ( somente emenda constitucional - EC - poderia agregar critério diverso do "mais apto para a função" para preenchimento de vaga no serviço público ) e do ponto de vista material, por violar o princípio da igualdade e da motivação dos atos administrativos ( eis que a lei não explicita os fatores pelos quais pode entender que houve "declaração falsa" ). Vitorelli, Edilson. "O equívoco brasileiro: cotas raciais em concursos públicos". Revista de Direito Administrativo, Volume Duzentos e setenta e um, Páginas Duzentos e oitenta e um a Trezentos e quinze, maio de Dois mil e dezesseis.
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