A Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) prevê, no seu Título Segundo, direitos e garantias fundamentais. Por garantias fundamentais, entendem - se os instrumentos, inseridos na CF - 88, que asseguram e promovem os direitos fundamentais. Entre essas garantias, há ações constitucionais, também chamada de remédios constitucionais, que possuem natureza híbrida: representam ações regidas pelo Direito Processual, mas, ao mesmo tempo, são inseridas na CF - 88 e desempenham a função de proteger direitos fundamentais .
Há oito ações constitucionais: o habeas corpus ( * vide nota de rodapé ), mandado de segurança ( *2 vide nota de rodapé ), mandado de injunção ( *8 vide nota de rodapé ), o habeas data ( *9 vide nota de rodapé ), a ação popular, a ação civil pública ( *18 vide nota de rodapé ) e ainda o direito de petição ( *19 vide nota de rodapé ) . Neste texto, será detalhada a ação popular. Os demais direitos fundamentais serão detalhados em outros textos.
Ação Popular
Conceito e origem - A ação Popular consiste em ação em que qualquer cidadão pede a anulação de ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa ( *10 vide nota de rodapé ), ao meio ambiente ( *11 vide nota de rodapé ) e ao patrimônio histórico ( *12 vide nota de rodapé ) e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má - fé, isento de custas judiciais e do ônus de sucumbência . Sua origem está nas chamadas ações públicas romanas ( publica judicia ), no qual o autor agia a favor do povo ( pro populo ) . No Brasil, a primeira Constituição a prever tal garantia fundamental foi a Constituição de Mil novecentos e trinta e quatro, no inciso Trinta e três do Artigo Cento e treze que estabeleceu : " Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou a anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios " . A ação popular protege o direito fundamental à boa governança, que consiste no direito difuso de toda a comunidade de ser governada segundo os princípios da legalidade ( *13 vide nota de rodapé ), da moralidade ( *10 vide nota de rodapé ) e de invocar a tutela jurisdicional ( *14 vide nota de rodapé ) para combater práticas lesivas a tal direito . O direito de propor ação popular é do cidadão ( age, em nome próprio, na defesa de direito difuso - substituição processual - , o que o insere na categoria dos " direitos políticos de fiscalização " .
Objeto - Inicialmente, a ação popular trata de invalidar atos praticados com ilegalidade de que resultou lesão ao patrimônio público. Essa ilegalidade pode advir de vício formal ou substancial, devido à violação de regra de incompetência do agente, ou ainda forma, bem como fruto de ilegalidade do objeto e inexistência dos motivos ou desvio de finalidade. Após a CF - 88, houve a ampliação do objeto da ação popular, que abarca agora ato lesivo à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural . A moralidade administrativa consiste no conjunto de preceitos de bom agir do governante, sendo considerada a conduta ética ( *15 vide nota de rodapé ) e em boa-fé que se espera do gestor público . Há Três elementos básicos do regime jurídico da ação popular:
1) cidadão é o proponente;
2) ilegalidade; e
3) lesividade.
Para o Superior Tribunal de Justiça ( STJ ), o alargamento das hipóteses de cabimento da ação popular não elimina o dever do Autor Popular de comprovar a lesividade do ato, mesmo em se tratando de lesão à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural ( Embargo de Declaração no Embargo de Divergência no Recurso Especial número Duzentos e sessenta mil oitocentos e vinte e um / São Paulo, Relator para o Acórdão Ministro Otávio de Noronha, Primeira Seção, Diário da Justiça de treze de fevereiro de Dois mil e seis ( *16 vide nota de rodapé ) .A ação popular, ainda, é o instrumento pioneiro na tutela de direitos difusos no Brasil, sendo regulamentada pela Lei número Quatro mil setecentos e dezessete, de Mil novecentos e sessenta e cinco .
Legitimidade ativa e passiva - A legitimidade da ação popular é do cidadão, que é o nacional exercente de direitos políticos . Por isso, deve comprovar, na petição inicial, ser eleitor e estar em gozo dos seus direitos políticos. A propositura da ação popular é direito político, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus de sucumbência ( CF - 88, Artigo Quinto, Inciso Setenta e três ), Para Pedro Lenza, não cabe assistência ao menor cidadão ( como se sabe, o jovem de Dezesseis a Dezoito anos de idade pode, de modo facultativo, se eleitor ) ( *5 vide nota de rodapé ) . Excepcionalmente, o Ministério Público ( MP ) assumirá o polo ativo, para dar continuidade a ação popular: os inalistáveis ou inalistados, aqueles que sofrem de suspensão de direitos políticos, os estrangeiros ( mesmo os portugueses no gozo do estatuto da igualdade, pois não há a reciprocidade em Portugal exigida pela CF - 88 ), os partidos políticos e entidades de classe ou qualquer outra pessoa jurídica. Quanto á legitimidade passiva, cabe a propositura contra as pessoas jurídicas cujo patrimônio foi lesado, bem como contra os agentes que causaram o dano - por ação ou omissão, e ainda contra os beneficiados. É possível a mudança de polo da pessoa jurídica de direito público ou privado, que pode abster - se de contestar e também pode atuar ao lado do Autor .Essa inusitada modificação do polo de uma ação demonstra a natureza de tutela de direitos difusos da ação popular .
Trâmite - O pedido na ação popular consiste na invalidade do ato ou omissão ou sua desconstituição, com a reparação dos prejuízos causados e eventual restituição de bens e valores. O Autor não paga custas ou honorários, salvo má-fé . O MP intervém obrigatoriamente como custos legis ( guardião da lei ) e, no abandono pelo Autor Popular, pode assumir o polo ativo . Cabe tutela antecipatória e ainda a propositura de ação popular preventiva. A sentença de improcedência ou de carência exige reexame necessário ( Artigo Dezenove da Lei número Quatro mil setecentos e dezessete de Mil novecentos e sessenta e cinco ) e a coisa julgada é secundum eventum litis, ou seja, a sentença terá eficácia de coisa julgada oponível erga omnes ( todas as pessoas ), exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por falta ou deficiência de prova; nessa hipótese, qualquer cidadão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo - se de nova prova . O prazo de prescrição da ação popular é de cinco anos da conduta ( Artigo Trinta e sete, parágrafo Quinto da CF - 88 ( " A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento " ), impõe a imprescritibilidade da ação de reparação de danos ao erário, o que impacta não só ações ordinárias, mas também a ação popular que venha a exigir a reparação de danos . Essa posição ( imprescritibilidade de ações de reparação de danos ao erário ) foi inicialmente, a adotada pelo STF ( Mandado de Segurança número Vinte e seis mil duzentos e dez, Relator então Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em Quatro de setembro de Dois mil e oito, Plenário, Diário da Justiça eletrônico de Dez de outubro de Dois mil e oito ), mas em Dois mil e dezesseis, houve alteração do entendimento, tendo firmado o STF a tese pela qual " é prescritível a ação de reparação de danos à Fazendo Pública, decorrente de ilícito civil " ( Recurso Especial número Seiscentos e sessenta e nove mil e sessenta e nove / Minas Gerais, Relator Ministro Teori Zavascki, julgado em Três de fevereiro de Dois mil e dezesseis, Plenário, Diário da Justiça eletrônico de Vinte e oito de abril de Dois mil e dezesseis, com repercussão geral ) . Em Dois mil e dezoito, foi firmada a imprescritibilidade do ressarcimento de dados ao erário oriundos de ilícitos penais ou de atos de improbidade, com aprovação, pelo STF, da seguinte tese com repercussão geral: " São imprescritíveis as ações de ressarcimento aop erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa " ( Lei do Colarinho Branco - *17 vide nota de rodapé ) " ( STF, Recurso Extraordinário número Oitocentos e cinquenta e dois mil quatrocentos e setenta e cinco, Relator Ministro Edson Fachin, julgado em Oito de agosto de Dois ml e dezoito, Diário da Justiça eletrônico de Vinte e cinco de março de Dois mil e dezenove, Tema número Oitocentos e noventa e sete ) .
Competência - a competência para o conhecimento de uma ação popular varia de acordo com o bem jurídico protegido: se for patrimônio da União, por exemplo, a competência será do juízo federal. Será, em geral, do juízo de Primeiro Grau - federal ou estadual. Não há foro por prerrogativa de função, mesmo para o Presidente da República, para a ação popular. Excepcionalmente, pode uma ação popular ser julgada originariamente pelo STF no caso da Alínea n do Artigo Cento e dois da CR - 88 ( a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados " ) .
Súmulas do STF
1) Súmula número Cento e um - O mandado de segurança não substitui a ação popular.
2) Súmula número trezentos e sessenta e cindo - Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular .
P.S.:
Notas de rodapé:
* O direito ao habeas corpus, o contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em : https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-direito-de-locomocao.html .
*2 O direito ao mandado de segurança, no contexto dos Direitos Humanos, é melhora detalhado em : https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-direito-liquido-e.html .
*3 O direito à nacionalidade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em : https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/05/direitos-humanos-convencao-visa-reduzir.html .
*4 O direito à cidadania, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em : https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/08/direitos-humanos-cidadania-plena-versus.html .
*5 Lenza, Pedro. Direito constitucional esquematizado. Décima - sexta edição. São Paulo: Saraiva, Dois mil e doze, Página Mil e cinquenta e três .
*6 Erga omnes: para com todos; o que é válido contra todos. Dicionário latim-português : termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieira - São Paulo : Edipro, Dois mil e dezesseis.
*7 ex nunc : a partir de agora. Dicionário latim-português : termos e expressões / supervisão editorial Jair Lot Vieira - São Paulo : Edipro, Dois mil e dezesseis. Página Cento e quarenta e seis .
*8 O direito ao mandado de injunção, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em : https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-falta-de.html .
*9 O direito de habeas data, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-as-informacoes-sobre.html .
*10 O dever de moralidade administrativa, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/08/direitos-humanos-declaracao-da-onu-e-o.html .
*11 O direito a um meio ambiente equilibrado, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-acordo-promove-acesso.html .
*12 O dever de preservação do patrimônio histórico, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2020/11/administracao-publica-o-administrador.html .
*13 O princípio da legalidade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/04/direitos-humanos-doutrinas-e_13.html .
*14 O direito ao acesso à justiça, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/10/direitos-humanos-o-direito-de-acesso.html .
*15 o dever de boa conduta ética, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2019/05/etica-interdependencia-sinceridade-nos.html .
*16 Meirelles, Hely Lopes. Mandado de segurança e ações constitucionais ( atualizado por Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes ). Trigésima - quarta edição. São Paulo : Malheiros, Dois mil e doze .
*17 O dever da probidade administrativa é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2020/11/administracao-publica-administracao.html .
*18 O direito à ação civil pública, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-ministerio-publico-e.html .
*19 O direito de petição, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-acesso-justica-e-o.html .
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