Cada vez mais, nos próximos anos, falarão a respeito da reindustrialização dos Estados Unidos da América ( EUA ), isto é, sobre restaurar a força competitiva e a liderança do país na indústria da manufatura. Em seus programas para a campanha presidencial de mil novecentos e oitenta, os dois partidos principais focaram a reindustrialização em suas plataformas. E há reclamos semelhantes por políticas de reindustrialização no Japão, na Alemanha, na Grã-Bretanha, na Suécia e em outros países industriais desenvolvidos.
É importante, porém, fazer a distinção entre os dois significados do slogan. Quando líderes sindicais e executivos de setores industriais tradicionais clamam pela reindustrialização, o que eles querem dizer, de modo geral, são políticas que mantenham o emprego do operário tradicional - especialmente empregos de operadores de máquinas semiqualificados - em indústrias tradicionais de produção em massa.
Mas, nos EUA e em todos os outros países altamente desenvolvidos, inclusive as partes mais industrializadas do bloco comunista, políticas visando à manutenção do emprego operário tradicional são incompatíveis com um outro significado da reindustrialização: a restauração da competitividade internacional do país para produzir e exportar produtos manufaturados. Ao contrário, a única forma de uma economia desenvolvida como a dos EUA reconquistar sua competitividade internacional é estimulando um encolhimento relativamente rápido do emprego operário tradicional.
A razão deste paradoxo é a demografia, não a tecnologia. A maioria dos países desenvolvidos começava a experimentar sua segunda transição demográfica importante no século vinte. A primeira, que começou ao redor da virada do século dezenove para o vinte e teve o seu auge depois da Segunda Guerra Mundial, foi a mudança da agricultura para a indústria da manufatura como centro do emprego.
O movimento de grandes massas da terra para a fábrica criou o operário moderno, isto é, o operador de maquina semiqualificado, e com ele a indústria da produção em massa. Os contingentes de mão de obra agrícola foram dizimados. Os agricultores eram sessenta por cento da força de trabalho total dos EUA no ano de mil e novecentos, mas correspondiam na década de oitenta a apenas de três a quatro por cento, enquanto, no Japão, a proporção caiu dos sessenta por cento em mil novecentos e quarenta e seis para menos de dez por cento na década de oitenta. Mas esta mudança demográfica possibilitou que tanto a produção agrícola como a produção industrial triplicassem ou quadruplicassem.
A segunda transição demográfica levou a mão de obra a migrar maciçamente do trabalho braçal para o trabalho de conhecimento. Em comparação com cinquenta anos atrás, apenas metade dos jovens entrantes no mercado de trabalho ingressava com o nível de escolaridade, as expectativas e as qualificações que os levaram ao trabalho operário tradicional. O aperto se tornou ainda maior quando os filhos da geração baby bust ( em que houve uma súbita queda na taxa natalidade ) dos anos sessenta e setenta atingiram a maioridade legal de trabalho: em mil novecentos e noventa, a mão de obra ingressante e potencialmente operária correspondia a apenas um terço do que havia em mil novecentos e cinquenta.
A mudança demográfica nos países industrializados está inextricavelmente ligada a transformações nas economias em desenvolvimento, as quais estão agora passando pela mesma transição, com a migração das fazendas para a cidade, que ocorreu anteriormente nas economias desenvolvidas. Graças a esta transição e a uma acentuada diminuição da mortalidade infantil desde mil novecentos e cinquenta, a maioria dos países em desenvolvimento tem agora um tremendo contingente de jovens qualificados unicamente para o trabalho tradicional - intensivo de mão de obra de baixa ou média qualificação - da operação de máquinas. Mesmo com os milagres da produtividade, não há como os trabalhadores semiqualificados dos países como Malásia, México e China continental, com suas taxas de desemprego de quarenta a cinquenta por cento e seus milhões de jovens trabalhadores urbanos semiqualificados.
Para manter a força competitiva e a liderança no setor manufatureiro, quer competindo com a Alemanha e o Japão ou com os países em rápida industrialização do Terceiro Mundo, é necessário, portanto, que um país como os EUA direcione a tecnologia industrial para sua mão de obra disponível de trabalhadores do conhecimento e não para o minguante contingente de operários braçais. É necessário mudar o trabalho industrial da operação de máquinas para a programação de máquinas e, na verdade, para a programação de fábricas e processos industriais, não de máquinas ou linhas individuais.
Talvez o mais importante de tudo, é necessário que haja uma mudança na atitude gerencial. A mão de obra deve ser tratada não como um custo ( uma visão que, de qualquer forma, é incompatível com a verdadeira produtividade ), mas como um recurso. Porque, em termos de custo, é impossível a mão de obra, nos países desenvolvidos, ser produtiva e competitiva.
Há três abordagens paralelas para este tipo de reindustrialização. A que vem atraindo mais atenção nos últimos sessenta e cinco anos é a automação, em especial o uso de robôs ou máquinas-ferramentas totalmente automatizadas, na linha de montagem. Sofisticados robôs já estão sendo usados na indústria automobilística, particularmente na unidade de Zama da Nissan, fabricante dos carros do modelo Datsun, como também em algumas unidades montadoras da General Motors Company ( GMC ) nos EUA.
Mas, por mais espetaculares que os robôs possam parecer para os leigos, provavelmente eles são muito menos importantes do que uma segunda abordagem da reindustrialização: o redesenho de fábricas inteiras e processos industriais inteiros como sistemas de fluxo integrado. Este redesenho não afeta em quase nada a montagem convencional, porém muda totalmente a manufatura de peças e seu controle de qualidade, os quais são integrados e constantemente calibrados de acordo com o feedback do produto final. Os fabricantes japoneses de televisores usam este método em suas fábricas localizadas nos EUA, como também o faz a RCA, cujas fábricas nos EUA são capazes de competir com fabricantes que dispõem de mão de obra barata e de superá-los com folga.
A terceira e mais importante forma de se abordar a reindustrialização é a integração do microcomputador e do minicomputador na máquina, na ferramenta, no instrumento. Esta evolução está avançando com tal velocidade e fúria que alguns observadores falam de uma terceira revolução industrial. Seu impacto é totalmente comparável ao do motor de fração de cavlo-força de cento e quarenta anos atrás.
Num período de trinta anos, o motor de fração de cavalo-força transformou a paisagem industrial e tornou possível a tecnologia industrial de hoje, a agricultura de hoje e os eletrodomésticos de hoje. Da mesma forma, a integração do minicomputador nas máquinas e ferramentas faz os trabalhadores passarem de operários operadores de máquina semiqualificados para técnicos de semiconhecimento com uma demão de colarinho branco.
As pressões demográficas são tão grandes e tão irreversíveis que tornarão fútil qualquer política que tente manter o emprego operário tradicional na fábrica tradicional. Mesmo ao curto prazo, tal política só fará diminuir o número de empregos operários, não importa quanto dinheiro se gaste em criá-los e mantê-los, porque isto só tornaria os setores manufatureiros menos competitivos.
O caminho oposto seria maximizar os empregos de conhecimentos, estimulando a automação e a mudança da condição de trabalhadores operários para técnicos com uma demão de colarinho branco, ou seja, técnicos de colarinho branco, e aliviando o peso dos antigos operários por meio da demissão planejada. A mudança para a produção baseada no conhecimento é a única forma de expandir o emprego sem piorar a inflação.
Mas será que um político de qualquer paíse desenvolvido pode defender isto? O melhor que pode-se esperar é uma política de reindustrialização que emule a política agrícola desde a época de Franklin Roosevelt.
Já há noventa anos, a retórica com relação à agricultura vem apregoando como seu objetivo a manutenção do pequeno produtor familiar. Mas, de modo geral, as políticas agrícolas têm priorizado tornar a atividade agrícola competitiva, não proteger os agricultores ineficientes. Ou, no mínimo, as políticas agrícolas têm se restringido a dispensar o agricultor ineficiente em vez de fortalecê-lo. Que os políticos e líderes do setor agrícola sempre souberam o que estavam fazendo, Peter F. Drucker dizia duvidar. Mas, do modo geral, eles compreenderam a transição demográfica e a viram como uma oportunidade.
Será que, igualmente agora, será usada a segunda transição demográfica como uma oportunidade para a verdadeira reindustrialização dos EUA? Outras informações podem ser obtidas no livro Os novos desafios dos executivos, de autoria de Peter F. Drucker.
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