Há cento e quarenta anos, por volta de mil oitocentos e oitenta, Karl Marx baseou sua previsão do inevitável e iminente colapso daquilo que hoje é chamado de liberalismo, neoliberalismo, capitalismo ou ainda sistema de livre iniciativa ( os termos só passaram a ser usados depois da morte de Marx ) na lei dos rendimentos decrescentes do capital. Em que pese, a principal obra de Marx ( O Capital ) ter ficado inacabada com sua morte.
O que aconteceu foi que, durante um século e meio, a produtividade do capital nos países desenvolvidos - ou melhor, nos países desenvolvidos com economias de mercado - estava aumentando, exceto durante os anos de depressão mais profunda. Esta foi uma das maiores conquistas do mundo dos negócios moderno e talvez o alicerce das conquistas posteriores. Que percentual da população mundial foi beneficiada com estas conquistas, é objeto de outra análise que não será explorada neste texto. Em parte, esta conquista foi empresarial: a contínua migração do capital de áreas de investimento antigas rapidamente menos produtivas para áreas novas e mais altamente produtivas, por exemplo, para inovações técnicas ou sociais, as quais, como Joseph Schumpeter, o grande economista austro-americano, convincentemente demonstrou há cento e dez anos, é o verdadeiro capital livre de uma economia moderna.
Mas o aumento contínuo da produtividade do capital é igualmente resultado da ação gerencial, do esforço continuado para melhorar o montante do trabalho produtivo que dada unidade de capital realiza na empresa. Um exemplo são os bancos comerciais, nos quais uma unidade de capital financia hoje, muitas vezes o volume de transações que financiava na época de Marx.
Ainda assim, a lógica básica de Marx era impecável, até na visão de Peter F. Drucker. Se a produtividade do capital fosse de fato diminuir inexoravelmente, um sistema baseado na alocação de capital no mercado - isto é, o sistema de livre iniciativa - não sobreviveria mais que uma poucas décadas cheias de crises, se não fosse amplamente e continuamente reformado com o passar das décadas.
O fato mais inquietante da economia mundial de hoje pode, portanto, ser a reversão, desde o início dos anos sessenta, da longa tendência secular de aumento da produtividade do capital nos países desenvolvidos. A tendência da queda não está em absoluto restrita aos países de livre iniciativa do Ocidente e Japão. Ela é ainda mais pronunciada no mundo comunista e em especial na antiga Rússia soviética, onde, segundo todas as informações,a já baixíssima produtividade do capital na indústria e na agricultura vem sofrendo queda precipitosa e quase catastrófica desde as décadas de sessenta e setenta. Mas isto não é grande consolo para as pessoas que vivem nas economias de mercado. Em um sistema como o da economia soviética, no qual o capital é alocado por decreto político e não pelo mercado, a produtividade baixa e em queda do capital prejudica, de início, somente a eficiência, os padrões de vida e os custos. Em que pese, a palavra soviética vem da palavra soviet, que significa conselho, que seria representante dos produtores ou o mercado russo. Ela não precisa necessariamente por em perigo o sistema em si, e isto por muito tempo.
A evidência dos últimos cento e quarenta anos é, porém, bastante clara: não há nada de inevitável, nada de inexorável no que se refere a tendência de queda da produtividade do capital, se o sistema não tivesse sido continuamente reformado. A produtividade do capital pode ser mantida e até aumentada, contanto que os homens de negócios trabalhem nela de forma constante e determinada.
Na realidade, trabalhar na produtividade do capital é a maneira mais fácil e geralmente a mais rápida de melhorar a lucratividade de uma empresa, e a de maior impacto. Lucro, como o primeiro capítulo de qualquer livro de economia empresarial explica, é a margem de lucro multiplicada pelo giro do capital, isto é, pela produtividade do capital. Se a margem de lucro é de seis por cento, por exemplo, e o capital gira uma vez por ano, há um retorno de seis por cento sobre o capital toral. Se o giro do capital puder ser aumentado para um vírgula dois vez por ano, o retorno total sobre o capital subirá para sete vírgula dois por cento.
Aumentar as margens de lucro em vinte por cento costuma ser extremamente difícil e pode ser impossível em um mercado competitivo. Porém, aumentar o giro do capital de uma vez por ano para um vírgula dois vez por ano requer, de modo geral, apenas muito trabalho sistemático, mas rotineiro. na verdade, com base nuns bons anos de experiência neste campo, Peter F. Drucker se dispunha a prever que uma melhora desta magnitude - isto é, uma melhora de vinte por cento na produtividade do capital ao longo, talvez de quatro ou cinco anos - estaria acessível a qualquer um que fizesse seriamente este trabalho.
No entanto, apesar de sua importância e compensações, não são muitos os administradores de empresas que prestam grande atenção à produtividade do capital, e menos ainda que trabalham sistematicamente no sentido de aumentá-la. Tampouco administradores e empresas de serviço público, tais como hospitais, prestam suficiente atenção à produtividade do capital, muito embora ela tenha caído, nos últimos anos, bem mais acentuadamente nas instituições de serviço público do que nas empresas privadas.
Uma das razões, talvez a mais importante delas, é que os administradores, em geral, obtêm poucas informações sobre a produtividade do capital em suas empresas. A maioria das empresas decerto sabe quantas vezes por ano giram seu capital inteiro. Mas o giro anual do capital inteiro da empresa num negócio, por exemplo, uma indústria de papel ou uma loja de departamentos, é um agregado. e não se pode administrar um agregado. Sempre se tem de administrar - e, portanto, medir primeiro - os principais componentes separadamente. No entanto, poucas diretorias sabem quais são os mais relevantes componentes do capital em seus negócios, e menos ainda qual é, poderia ou deveria ser a produtividade do capital de cada um deles.
O primeiro passo para se gerenciar a produtividade do capital é, portanto, determinar as principais áreas da empresa nas quais o capital é efetivamente investido. Raramente são mais do que um punhado delas. Por exemplo, numa empresa industrial típica, máquinas e equipamentos, estoques de materiais, suprimentos e produtos acabados, e recebíveis costumam, juntos, responder por três quartos do total do dinheiro investido. Numa loja de departamentos típica, há espaço de prateleira ( ou espaço de venda ), recebíveis e estoques ( no varejo, os estoques geralmente têm de ser subdivididos, por exemplo, em artigos de vestuário, móveis e artigos de decoração, eletrodomésticos etc.., para que sejam inteligíveis e administráveis ). Quanto trabalho produtivo o capital empregado em cada uma destas áreas faz? Com que frequência ele gira? Quanto ele traz de retorno ou contribuição? Depois, caberia a pergunta: quanto este capital poderia e deveria produzir, e o que há de se fazer para conseguir isto?
As diretorias precisam aprender também algumas regras elementares da administração da produtividade do capital.
Pode-se aumentar a produtividade do capital de duas maneiras: fazendo o capital trabalhar mais e trabalhar melhor, de forma mais inteligente. A propósito, esta é uma das principais razões por que é mais fácil gerenciar a produtividade do capital do que os outros dois principais recursos - os recursos físicos e os recursos humanos. Em geral, a produtividade dos recursos humanos só pode ser aumentada fazendo-os trabalhar melhor; a dos recursos físicos, somente fazendo-os trabalhar mais.
Manter o estoque da empresa em armazéns regionais estrategicamente localizados, de modo que a mesma quantidade de estoque possa sustentar um volume de venada maior, é fazer o capital trabalhar mais. Controlar o mix de produtos de modo a vender uma proporção maior dos produtos que trazem a mais alta contribuição ou uma proporção menor dos que trazem contribuições baixas é fazer o capital trabalhar melhor. Muitas vezes, é possível fazer ambos ao mesmo tempo. Mas é difícil prever de antemão qual abordagem é a mais apropriada em dada situação, a mais produtiva e a menos arriscada. Ambas precisam ser pensadas e examinadas em termos de cada área mais importante de investimento em cada negócio isolado.
O capital fixo e o capital circulante, embora sejam capital, exibem abordagens diferentes na administração de sua produtividade.
A maioria dos homens de negócios sabe que, em se tratando de ativo fixo, não há nada mais antieconômico do que o tempo não trabalhado. No entanto, poucos parecem perceber que o modelo de contabilidade de custos-padrão pressupõe - e tem de pressupor - a produção contínua, a um padrão preestabelecido, de dado ativo fixo, seja ele um laminador numa siderúrgica, uma unidade de espaço de venda numa loja ou um leito num hospital clínico. Em outras palavras, o modelo de contabilidade de custos-padrão não mede nem controla o maior custo isolado de um ativo fixo: o custo da improdutividade do capital.
Da mesma forma, a contabilidade de custos tem de pressupor um mix de produtos padrão, muito embora tanto os custos como as receitas variem tremendamente nos diferentes mixes ( talvez muito mais no leito hospitalar, entre todos os principais investimentos de capital fixo ). Gerenciar o tempo não trabalhado e gerenciar o mix de produtos são as formas mais eficazes de melhorar a produtividade do capital da maioria dos investimentos fixos. Para isso, porém, primeiro é preciso saber quanto tempo não está sendo trabalhado e por quê. é preciso conhecer a economia dos vários mixes de produtos. É preciso dispor de informações econômicas além dos dados analíticos do modelo contábil. Então se poderá melhorar em muito a utilização do tempo e, com ela, a produtividade do capital fixo.
Já o capital circulante, ou de giro, precisa ser medido de forma diferente e gerenciado de forma diferente. Ao contrário dos ativos fixos, ele não está produzindo capital, mas sustentando o capital. A pergunta, portanto, a se fazer e: o que ele sustenta e o que deveria sustentar?
Recebíveis - isto é, crédito concedido pela empresa a seus clientes - são o exemplo óbvio. As empresas tipicamente medem seu gerenciamento de crédito de primeira categoria, uma vez que os prejuízos de crédito são de menos que um por cento é um comentário que se ouve com frequência. Mas os fabricantes não estão no ramo bancário e, considerando seu custo de capital, nem poderiam competir com os bancos. Eles dão crédito para fazer vendas lucrativas. Assim sendo, qual deveria ser o objetivo de uma política de crédito com relação á criação de mercado, lançamento de produtos, vendas e lucros, tendo a experiência de prejuízos baixos como a restrição, não como meta ou fator de medição? Toda empresa que se fez esta pergunta descobriu que:
a) Põe o grosso do seu crédito onde menos recebe de volta e
b) Concede menos crédito onde mais recebe de volta.
No decorrer de um período de três a quatro anos, uma empresa que trabalha sistematicamente na produtividade do capital empregado em recebíveis pode esperar que com dois terços do dinheiro agora empatado em crédito seja possível financiar um volume de vendas maior e mais lucrativo.
Por fim, poucas diretorias parecem saber que há áreas importantes de uma empresa que normalmente não são consideradas investimento de capital - e certamente não aparecem assim no balanço - , mas que se comportam, economicamente falando de maneira muito semelhante ao capital fixo e devem ser gerenciadas visando, sobretudo, à produtividade de capital. Tais áreas são aquelas nas quais o tempo é o principal elemento do custo, enquanto, em qualquer dado período, outros custos são relativamente fixos e inflexíveis. Dentre elas, a mais importante é a força de vendas ( ou a equipe de enfermagem, em um hospital ). Isso é capital humano fixo. E, economicamente, deve ser gerenciado como se fosse capital fixo, sem qualquer ressalva.
Há grandes diferenças na capacidade de venda dos diversos vendedores, as quais o volume de treinamento não parece capaz de superar ou sequer diminuir de forma significativa. Mas o mais capaz dos vendedores - ou a mais dedicada das enfermeiras - só dispõe de um recurso: tempo. Há uma relação razoavelmente constante entre o tempo que um vendedor tem para fazer visitas de vendas e o número de vendas que ele efetivamente fecha. O tempo não disponível para trabalho é o principal - embora, em geral, totalmente oculto - elemento do custo destes ativos humanos fixos. E isto significa que como no caso de todos os ativos fixos, os administradores precisam, primeiro, saber qual é a produtividade do tempo, e em especial quanto do tempo que deveria estar disponível para o trabalho, e por que ( por exemplo, por que o vendedor gasta dois terços do seu tempo cuidando de papelada em vez de estar vendendo ). Assim sendo, às vezes uma pequena mudança pode trazer substanciais aumentos de produtividade. Por exemplo, em alguns hospitais, a introdução de um auxiliar de estação de enfermagem para cuidar da papelada fez dobrar o tempo das enfermeiras para fazer aquilo pelo que elas são pagas e treinadas, e que elas querem fazer, que é cuidar dos pacientes.
Peter F. Drucker dizia ter plena consciência de que supersimplificou um assunto complexo. Afinal, a produtividade é o resultado combinado das produtividades dos três fatores de produção: capital, recursos naturais e recursos humanos. E é tão perigoso aumentar a produtividade do capital á custa de diminuir a produtividade dos outros dos fatores quanto, por exemplo, aumentar a produtividade do recurso humano à custa de reduzir a produtividade do capital ( como se fez tão frequentemente nos últimos sessenta e cinco anos ).
Finalmente, Drucker dizia saber muito bem que há um bom número de diretores e gerentes, tanto em empresas pequenas como grandes, que, tendo lido até o momento, dirão: "Que novidade! Temos feito isto e muito mais, só Deus sabe há quanto anos.". Mas com base na sua experiência, eles constituem uma ínfima minoria até entre empresas de grande porte e administradas por profissionais. A maioria das empresas não tem sequer dados da produtividade do capital - e, sem eles, não se pode administrar.
Já está mais do que na hora de os administradores de empresas dos Estados Unidos da América ( EUA ), em sua grande maioria, aprenderem e aceitarem que diretores e gerentes são pagos para gerenciar a produtividade, em especial a produtividade do capital, da qual, em última análise, dependem todas as outras produtividades; que a produtividade do capital pode ser gerenciada e que a produtividade do capital deve ser gerenciada. Outras informações podem ser obtidas no livro Os novos desafios dos executivos, de autoria de Peter F. Drucker.
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