Uma das causas básicas do desempenho fraco por parte de analistas, investidores e administradores de empresas é o medidor que eles usam para determinar como a empresa está se saindo - o lucro por ação ( LPA ).
Em uma empresa, desempenho significa aplicar capital de forma produtiva, sendo que só existe um medidor apropriado do desempenho das empresas. Este medidor é o retorno sobre todos os ativos (ROA - sigla em inglês ) empregados ou sobre todo o capital investido ( os dois são diferentes, mas não significativamente ). Se os ativos vêm de fora ou de dentro não faz diferença. Os lucros retidos são dinheiro, tanto quanto um empréstimo bancário ou capital próprio novo. Uma empresa que não fature o suficiente para cobrir o custo de capital corrente de todo o dinheiro da empresa não está cobrindo seus verdadeiros custos e tem deficiência de receita, não importa qual seja seu LPA.
O ROA deve incluir todo o dinheiro disponível para pagar o serviço do capital. Estas importâncias de dinheiro incluem não apenas os lucros, dos quais pode-se pagar dividendos, mas também todos os encargos de juros sobre toda a dívida. Isto inclui depreciação, a qual não figura no LPA, mas exclui lucros de estoque, os quais frequentemente figuram, dependendo das práticas contábeis adotadas pela empresa.
Estes são medidores que fazem sentido econômico. Se o investimento fluir para empresas com altos retornos segundo estes medidores, o desempenho econômico será otimizado. Estes são os medidores da função de regulação econômica costumeiramente atribuída a lucros.
O que é, portanto, o LPA que as empresas e seus contadores despejam tão regularmente e propagandeiam com tanta veemência? O número convencional do LPA não apenas mede o desempenho corporativo, como também raramente mede o verdadeiro LPA. O termo é inadequado. O que ele realmente representa é LPA tributável. É aquilo que resta depois de todos os encargos que o fisco aceita como dedutíveis. Mas é um número puramente arbitrário que tem pouco ou nada a ver com desempenho econômico.
O LPA conforme reportado quase nunca é aquilo que as pessoas pensam que é, ou seja, lucro disponível para o acionista. Se fosse, as empresas poderiam distribuir, como de resto distribuiriam a maior parte dele ou todo ele na forma de dividendos - e praticamente nenhuma empresa faz isto. Para saber realmente quanto uma empresa lucrou verdadeiramente com seu capital próprio, é preciso corrigir os números reportados daqueles encargos de capital, os quais, embora sejam custos genuínos, não são aceitos como dedutíveis pelo fisco e são, portanto, incluídos no LPA reportado. Para tanto, é preciso começar pelo ROA. Somente este número mostra quais são os encargos de capital procurados, além daqueles que o fisco aceita.
Há quatro destes encargos de capital que são genuínos, cada um representando um custo verdadeiro, mesmo que incluído no número de lucro reportado. O primeiro é a deficiência de receita conforme medida contra as necessidades de caixa futuras - a única área, a propósito, à qual os analistas prestam muita atenção. Uma empresa que não consegue suprir com sua receita as necessidades de caixa previsíveis de suas operações, incluindo o serviço de sua dívida, não lucra o suficiente.
Segundo, uma empresa precisa auferir o custo de capital corrente de todo o dinheiro que está no negócio ( Custo Médio Ponderado de Capital ). Uma companhia que mostra alto LPA porque, por exemplo, continua usufruindo os benefícios das taxas de juros mais baixas do passado, está consumindo capital e o reportando como lucro. Tal empresa não consegue captar dinheiro sem deprimir seu lucro. Mas, mais cedo ou mais tarde - e geralmente mais cedo - , o capital de custo baixo terá de ser reposto; então o custo do capital corrente terá de ser pago. Um ganho resultante dos baixos custos do dinheiro do passado deveria entrar na reserva, não no lucro. Este ganho não reflete verdadeiramente a lucratividade da empresa.
O terceiro é a provisão para riscos desconhecidos e previsíveis. Isto é um custo genuíno, como o é qualquer prêmio de seguro. O risco mais comum é o cíclico. É um perigo previsível e de alta probabilidade. O lucro de um ano, como qualquer outra cifra mensal ou trimestral, é, portanto, por si só, enganoso, salvo se ajustado para um período cíclico. Outro risco típico para o qual o lucro precisa ser ajustado é o alto risco de superexposição e vulnerabilidade após um um período de rápido crescimento. É prudente pressupor que até mesmo um ligeiro contratempo após tal período reduzirá as vendas para o ponto em que elas teriam estado se a empresa ou o setor tivesse crescido ao longo daquele período e o ano médio. Esta fórmula, embora bastante não científica, condiz notavelmente bem com a experiência real - a da indústria de casas móveis, por exemplo, na década de sessenta e início da década de setenta. E depois se ajusta o lucro à cifra de longo prazo mais provável, levando em consideração o risco do crescimento para se ter uma medição confiável do desempenho da empresa ou setor.
Finalmente, o número do LPA precisa ser ajustado de modo a considerar as necessidades conhecidas e previsíveis da empresa. Uma delas é a necessidade de fazer provisão para o crescimento requerido para manter a posição de mercado da empresa num mercado em expansão ou sua liderança tecnológica numa tecnologia em expansão e em mudança. A empresa que deixa de fazer isto põe em perigo sua própria sobrevivência. Uma segunda necessidade é a proteção do capital contra os efeitos devastadores da inflação. E a depreciação deve certamente ser ajustada pela inflação, e não ser baseada no custo histórico.
Já se sabia tudo isto há mais de cem anos. "Nunca escuto os analistas do mercado financeiro; eu escuto os analistas de crédito", consta que Bernard Baruch disse quando solicitado a explicar seu desempenho como o maior e mais ousado especulador de Wall Street nas primeiras décadas do seculo vinte. Há quase cem anos, a DuPont Company codificou seu conhecimento em seus famosos quadros de retorno sobre o investimento ( ROI - sigla em inglês ), em torno dos quais a administração da DuPont estava organizada.
Mas o trabalho definitivo sobre lucro, sobre custo do capital e sobre a medição do desempenho econômico foi feito nos últimos setenta nos por toda uma geração de economistas empresariais.
Em consequência deste trabalho, é sabido que ativos empregados ou capital investido significam exatamente o que estas palavras dizem. Quer o dinheiro tenha sido posto em prédios ou em recebíveis, isto é irrelevante; há diferentes usos do dinheiro, mas não existe dinheiro diferente. Quer o dinheiro seja capital próprio ou empréstimos, também não faz nenhuma diferença, como também não importa se o dinheiro investido seja próprio ou captado fora. A capacidade de gerar lucros e, acima de tudo, o LPA fica seriamente prejudicada - e muito rápido - se os lucros retidos forem investidos a uma taxa menor que o custo total do capital de fora.
É sabido também que incluir no retorno sobre o capital ( ROC ) e no ROA. Uma vez que o objetivo é medir o desempenho econômico de uma empresa, todo o dinheiro disponível para pagar o serviço do capital faz parte do retorno. Isto inclui todos os encargos de juros sobre todas as dívidas, depreciação ( a qual, em termos econômicos, é em essência retorno não tributável ), como também aquilo que é tradicionalmente considerado lucro sobre o capital próprio. Todavia, não inclui lucros que não reflitam a capacidade da empresa de gerar lucros. Prejuízos de estoque são prejuízos genuínos. Mas lucros de estoque não entram no ROA . Outros ganhos não recorrentes e eventuais da empresa, como o ganho advindo da venda de uma fábrica, também não entram no ROA - exceto numa empresa cuja atividade seja comprar e vender fábricas industriais.
O ROA não é o único medidor disponível para a medição do desempenho de uma empresa. Na verdade, toda empresa poderia muito bem usar um segundo medidor. Numa empresa industrial, por exemplo, o retorno sobre o valor agregado na fabricação - isto é, a diferença entre a receita de produtos vendidos e o dinheiro desembolsado para pagar suprimentos e materiais - é uma medição importante. Ela é muito sensível, sendo também um indicador antecedente que tende a aumentar ou diminuir antes de o ROA mostrarem variações significativas. No caso de uma empresa de varejo, o retorno sobre o espaço de venda ( ou área bruta locável - ABL ) é igualmente um importante indicador do desempenho.
Mas estas medições adicionais têm de ser apropriadas para cada empresa específica. O medidor do valor agregado só faz sentido para empresas que são verdadeiramente industriais; além do que costuma estar acessível somente para pessoal interno e raramente para gente de fora.
Embora muitos executivos de empresa sejam céticos quanto a acurácia do LPA como medição empresarial, eles costumam dizer: "Que opção nós temos? Fazendo ou não sentido, o mercado usa esta medida.". Mas esta é, na melhor das hipóteses, uma meia-verdade. Há enormes diferenças nos índices preço-lucro. A principal razão é que o mercado de ações tende a avaliar uma ação principalmente com base numa estimativa aproximada do ROA, em vez de com base no número amplamente divulgado e de grande visibilidade do LPA. Apesar de suas loucuras, excentricidades e modismos, o mercado acionário é muito mais racional do que os especialistas ao menos durante qualquer período mais longo.
Os melhores exemplos disto foram os preços das ações durante a farra de aquisições do final da década de sessenta. Um bom número dos conglomeradores jogou o jogo do LPA e estruturou as compras de uma aquisição de modo a mostrar um LPA maior, muito embora o ROA não tivesse aumentado e não raras vezes tivesse diminuído. As pessoas que venderam suas empresas contra pagamento na forma do que viria mais tarde a ser chamado de dinheiro chinês, acabaram, todas tando enorme prejuízo - exceto aquelas que venderam os títulos de imediato. O mercado de ações expeditamente ajustou o preço da ação pelo real ROA em lugar do LPA reportado.
Portanto, há um fundo de verdade na antiga crença de que o preço da ação reflete o valor descontado de dividendos futuros, isto é, o valor presente de lucros futuros efetivamente disponíveis para distribuição.
É possível, com um pouquinho de trabalho e alguma engenhosidade, determinar, com adequada probabilidade, o desempenho de retorno de empresas de capital aberto. Mas não seria má ideia as próprias empresas fornecerem as informações necessárias. A exigência de divulgação completa concentra-se cada vez mais nas perspectivas econômicas da empresa e em seu desempenho econômico, ou seja, em que grau ela efetivamente produz riqueza a partir dos recursos que lhe foram confiados.
Aqui o número-chave é o ROA relativo a necessidades de caixa, custo de capital, riscos e necessidades. É isto, e não o inexpressivo LPA, que o público a SEC ( a agência reguladora equivalente à Comissão de Valores Mobiliários - CVM no Brasil ), os analistas e, sobretudo os acionistas deveriam esperar - e poderiam exigir - das contas e dos relatórios anuais publicados pela empresa.
E é este número que deveria fornecer e constituir a relação entre desempenho da empresa e remuneração de seus executivos. É legítimo e desejável relacionar a remuneração dos executivos ao desempenho da empresa, mas que seja o desempenho real. Vincular a remuneração ao número reportado do LPA é o mesmo que por as aparências em primeiro lugar, em detrimento do desempenho. Esta vinculação pode até remunerar e gratificar os executivos por sugar, não por construir uma empresa. Outras informações podem ser obtidas no livro Os novos desafios dos executivos, de autoria de Peter F. Drucker.
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