Em meados de mil novecentos e setenta e oito, o presidente dos Estados Unidos da América ( EUA ) anunciou os princípios de uma abrangente legislação da área de saúde. Mas o futuro sistema de saúde dos EUA estava sendo construído naquela momento e sem benefício de legislação específica. As propostas de Carter, quaisquer que tenham sido elas, foram nonstaters, ou seja, não tinham nenhuma chance de sucesso. Houve dias e dias de audiências no Congresso a respeito delas, com montanhas de estudos, depoimentos e relatórios. Mas, se isto gerou alguma coisa, foi o proverbial ridiculus mus, o ridículo rato.
A razão disto não é sequer a resistência aos custos de novos programas governamentais. é a total ausência de pressão popular por grandes mudanças na área de saúde.
Não é verdade que o povo americano estava insatisfeito com o sistema de saúde. Em qualquer pesquisa da época, a maioria esmagadora - ao redor de noventa por cento - se declarava satisfeita ou muito satisfeita. E é ainda menos verdade que os americanos sentiam que etavam sofrendo sob o peso dos custos monumentais de um sistema de taxa por atendimento, conforme Peter F. Drucker dizia ter ouvido à época na oratória de um dos ilustre senadores norte-americanos.
Médicos e hospitais, em sua maior parte, trabalham na base da taxa por atendimento; os pacientes, não. Dezenove em cada vinte pessoas - em torno de noventa e cinco por cento da população americana pré-pagavam um plano ( ou seguro ) de saúde e não pagavam pelo atendimento recebido. na verdade, este pode ser um dos motivos de ser tão difícil controlar os custos da saúde.
A maioria dos americanos tem plano de saúde empresarial, com o restante sendo atendido pelo Medicare ou Medicaid ( para dos de baixa renda ). E a maioria dos americanos não sabe nem se preocupa com quais são os custos individuais de seguro-saúde. Este é considerado grátis na maioria dos casos, ou seja, os custos, como em um plano de saúde nacional, estão sendo pagos por meio de uma arrecadação compulsória, cobrada sobre o salário bruto e antes do imposto sobre a renda de qualquer natureza ( IR ).
O único motivo, suspeitava, à época Peter F. Drucker, de ainda se ouvir falar de um serviço nacional de saúde é o era o desejo - compreensível - do Senador Edward Kennedy de ter seu nome em alguma legislação nacional importante. Até os sindicatos que assinavam embaixo da proposta de Kennedy e a endossavam estavam, na melhor das hipóteses, pouco entusiasmados. Todos os diretores e empregadores de sindicatos com quem Drucker dizia ter conversado queriam que os benefícios de saúde permanecessem como um item inegociável, o que, era lógico, deixaria de ser ser fosse a aprovada uma legislação sobre um sistema único de saúde ( SUS ) que cobrisse tudo para todos.
Na verdade, a maioria dos líderes sindicais - e mais ainda seus conselheiros - vê os benefícios de saúde como sendo a única área de ganhos sindicais potenciais nos próximos anos, considerando a resistência a aumentos salariais e a impostos mais altos, e a liberdade de negociar benefícios de saúde como essencial para a própria sobrevivência do movimento trabalhistas americano.
Embora os políticos lutem falsas batalhas, o futuro sistema de saúde americano - ao menos para noventa e cinco por cento da população - está emergindo rapidamente e pode ser previsto com altíssima probabilidade. Ele será diferente do sistema atual em três aspectos: na cobertura dos custos da saúde; em seu pluralismo de entidades de atendimento na área da saúde; e em seu controle organizado e seu autocontrole de padrões médicos e custos de saúde.
Mais cedo ou mais tarde, cerca de três quartos do povo americano terão seguro para doenças graves; hoje os que o têm são menos de sessenta por cento. Daqui a dez anos, noventa e cinco por cento o terão. Não haverá teto, isto é, nenhum valor máximo acima do qual o seguro não paga. Na realidade, não existe este teto hoje, exceto no contrato. Como todo hospital sabe, débitos não cobertos pela apólice de doenças graves não são cobráveis.
Mas, embora a incidência de custos acima do teto seja bastante pequena, o temos deles é real. Todavia, será possível ver bastante ênfase em uma franquia razoavelmente alta - um piso para reembolsos nas apólices de doenças graves - e em alguma características de cosseguro até certa quantia ou até determinada porcentagem da renda familiar do segurado. Talvez seja possível ver o resseguro governamental de custos de doenças graves para cinco por cento não asseguráveis, proposto pela primeira vez nos anos cinquenta, pelo presidente Eisenhower.
Daqui a cinco anos, dois quintos da população - os empregados de grandes companhias e do governo - terão seguro para os custos de remédios vendidos mediante receita médica, novamente com uma franquia talvez de cem dólares por ano, por família. E o mais importante - e mais dispendioso - , ao redor do ano de mil novecentos e noventa, a previsão era de que até aquela época, cerca da metade das famílias dos EUA teria seguro odontológico e, em mil novecentos e noventa e cinco, a grade maioria já o teria. Estas previsões, não se confirmaram de todo mas foram úteis para o planejamento dos custos. Naquela época, a maioria já teria também seguro para despesas com os três principais instrumentos médicos - óculos de grau, aparelhos auditivos e dentaduras. Confirmou-se que há seguros para tudo isto e muito mais no mercado de produtos financeiros. Entretanto, na falta de estatísticas confiáveis para se calcular as coberturas, os prêmios permanecem fora da realidade da maioria.
O veículo destas ampliações de cobertura de seguros não será a lei, mas os contratos entre empregadores individualmente e seus empregados. Todavia, problemas emocionais não serão cobertos pela maioria destes contratos, pelo menos acreditava Peter F. Drucker à época de suas previsões, exceto no caso de doenças psicóticas genuínas que exigem hospitalização. O custo de psicoterapia é alto demais e impossível de se controlar. Apesar de os experts afirmarem que três em quatro americanos sofrem de doença emocional, a crença na eficácia da psicoterapia provavelmente já atingiu o seu auge e pode estar diminuindo muito rapidamente.
A maior parte da atual discussão em torno do atendimento de saúde propõe uma escolha entre o médico individual atendendo em seu consultório ou a Health Maintenance Organization ( HMO ), um corpo coletivo de médicos operando a partir de um local central e controlando seu próprio hospital. Mas o sistema de saúde americano do futuro será composto de três canais de atendimento paralelos e concorrentes: o médico particular, a Individual Physicians Association ( IPA ) e a HMO.
Daqui a dez anos, o grosso do atendimento de saúde ainda será feiro pelo médico particular, embora mais e mais deles terão as chamadas ( equivocadamente ) práticas de grupo, ou seja, compartilharão consultórios, pessoal e laboratórios. A próxima em importância será a IPA. Empregadores de certas áreas se reunirão e estabelecerão padrões e honorários para serviços médicos, com a ajuda de um diretor ou de um consultório médico. Os médicos que concordarem com os níveis dos padrões e honorários serão recomendados aos empregados pela IPA.
Este é, em essência, o sistema que vem funcionando bem na Alemanha já desde os anos setenta. Ele preserva a liberdade de escolha por parte do paciente, mas também propicia um meio de controle de custos e qualidade. Tais planos já existem nos EUA e estão crescendo muito rápido.
A HMO, por outro lado, só crescerá à medida que o governo impuser seu uso. Peter F. Drucker dizia estar acostumado a ser um fervoroso defensor das HMOs, mas, por outro lado, ele mesmo admitia que elas podiam ser uma ideia cujo tempo já havia passado, apesar dos fervorosos defensores em Washington. A IPA faz tudo o que a HMO faz, sem sua limitações, ou seja, a ausência de escolha de médicos e uma relação médico-paciente permanente. A única vantagem da HMO em termos de custo é a sua capacidade de concentrar seus pacientes numa única unidade de saúde com administração centralizada. Mas, num país descentralizado como os EUA, e com mais e mais mulheres trabalhando a quilômetros do marido e dos filhos, esta não é, em absoluto, uma vantagem.
O grande atrativo de uma IPA é que a fiscalização de padrões ficará dentro da classe médica. O diretor da IPA e seu conselho médico decidirão quais médicos serão aceitos para atender os subscritores de seus serviços.
A avaliação por colegas - isto é, de médicos por médicos - em hospitais está crescendo por causa das ações por imperícia e da pressão do governo. Vindo ainda mais rápido está a avaliação sistemática dos custos hospitalares pela Blue Cross e outras seguradores, bem como por empregadores e grandes sindicatos. Daqui a dez anos, grandes empregadores, órgãos governamentais, IPAs, e hospitais determinarão conjuntamente padrões e custos médicos à moda tipicamente americana - de forma desordenada e descentralizada.
Não é verdade que o sistema de saúde americano é mais caro do que qualquer outro; na realidade, ele pode estar entre os mais baratos em termos de renda nacional bruta e renda familiar. os números que vivem circulando sobre os custos mais baixos de outros sistemas são falsos - o custo real do Serviço Nacional de Saúde ( NHS - modelo para o Sistema Único de Saúde - SUS no Brasil ) do Reino Unido, por exemplo, não é de menos de sete por cento do PNB"; ele está mais para próximo dos doze por cento ( em números do final da década de setenta ), considerando que os ingleses, para compensar sua falta de leitos hospitalares, têm de gastar quase o mesmo tanto que estão gastando com as atuais operações de atendimento de saúde e que mais e mais ingleses estão fazendo planos privados de seguro-saúde.
Não é verdade que os custos de saúde nos EUA aumentaram mais rápido do que os de outros países; eles aumentaram muito mais rápido na Alemanha e na Suécia, por exemplo. Não é verdade que os EUA usam hospitais mais do que qualquer outro país. Em todos os países desenvolvidos da Europa, o número de internações hospitalares por mil habitantes é maior que nos EUA, o custo por dia é mais alto.
Inclusive, pode até não ser verdade que os custos da saúde, e em especial, os custos hospitalares, tenham aumentado mais rápido que qualquer outro item importante dos EUA, e mais rápido que a inflação - isto pode ser verdade somente para aqueles custos, como o Medicaid, que são os impostos do governo.
Em outras palavras, há boas razões pelas quais, em todas as pesquisas, a grande maioria dos americanos se declara bastante satisfeita com seu sistema de saúde e não há pressão popular para nada além de pequenas mudanças. Em que pese, haja particularidades demográficas e de oferta de mão de obra de serviços de saúde que não se apliquem em outros países. Também continue existindo o fator ideológico na saúde, dividindo-a entre medicina de Estado e medicina de mercado. Outras informações podem ser obtidas no livro Os novos desafios dos executivos, de autoria de Peter F. Drucker.
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