O direito à segurança jurídica consiste na faculdade de obstar a extinção ou alteração de determinado ato ou fato jurídico posto a salvo de modificações futuras, inclusive legislativas.
Há duas facetas do direito á segurança jurídica:
1) a objetiva, pela qual se imuniza os atos e fatos jurídicos de alterações posteriores, consagrando a regra geral da irretroatividade ( * vide nota de rodapé ) e a
2) subjetiva, que também é chamada de princípio da confiança, pela qual a segurança jurídica assegura a confiança dos indivíduos no ordenamento jurídico.
Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal ( STF ) que é obrigatória a " observância do princípio da segurança jurídica enquanto subprincípio do Estado Democrático de Direito ( EDD ) ", sendo o princípio da confiança um elemento da segurança jurídica ( Mandado de Segurança número Vinte e dois mil trezentos e cinquenta e sete, relator Ministro Gilmar Mendes, julgado em Vinte e sete de maio de Dois mil e quatro, Plenário, Diário da Justiça eletrônico de Cinco de novembro de Dois mil e quatro ) .
Nessa linha, a Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) determinou que a lei não pode prejudicar:
1) o direito adquirido, que consiste no direito que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aquele cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem ( Artigo Sexto, Parágrafo Segundo, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB );
2) o ato jurídico perfeito, que consiste no ato já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou ( Artigo Sexto, Parágrafo Primeiro da LINDB ); e
3) coisa julgada, que consiste na decisão judicial de que já não caiba recurso ( e não a denominada coisa julgada administrativa, como decidiu o STF no Recurso Extraordinário número Cento e quarenta e quatro mil novecentos e noventa e seis, Relator Ministro Moreira Alves, julgado em Vinte e nove de abril de Mil novecentos e noventa e sete, Primeira Turma, Diário da Justiça de Doze de setembro de Mil novecentos e noventa e sete ).
No STF, o direito à segurança jurídica foi diversas vezes discutido para se firmar:
1) Em casos de nova lei que elimine direitos de servidores públicos, não há direito adquirido à permanência de regime jurídico benéfico da data da posse do servidor; apenas se asseguram os direitos que já se incorporaram ao seu patrimônio. Nesse sentido: " O STF já pacificou sua jurisprudência no sentido de que os quintos incorporados, conforme Portaria do Ministério da Educação ( MEC ) número Quatrocentos e setenta e quatro / Mil novecentos e noventa e sete, constituem direito adquirido, não alcançado pelas alterações promovidas pela Lei número Oito mil cento e sessenta e oito / Mil novecentos e noventa e um " ( Agravo de Instrumento número Setecentos e cinquenta e quatro mil seiscentos e treze - Agravo Regimental, voto da Relatora Ministra Ellen Gracie, julgado em Vinte de outubro de Dois mil e nove, Segunda Turma, Diário da Justiça eletrônico Treze de novembro de Dois mil e nove ). Ou ainda, decidiu o STF que " Gratificação incorporada aos proventos por força de norma vigente á época da inativação não pode ser suprimida por lei posterior " ( Recurso Extraordinário número Quinhentos e trinta e oito mil quinhentos e sessenta e nove - Agravo Regimental, Relator Ministro Cezar Peluso, julgado em três de fevereiro de Dois mil e nove, Segunda Turma, Diário da Justiça eletrônico de Treze de março de Dois mil e nove ) .
2) Não ofende direito adquirido, a mudança da lei que incide sobre ato cujo ciclo de formação ainda não se completou, não sendo possível a proteção de mera expectativa de direito. Assim, caso haja mudança constitucional sobre as regras da aposentadoria, aqueles que ainda não possuíam todos os requisitos para a aposentadoria pelas regras revogadas não podem alegar direito adquirido. Porém, ressalte-se que a previsão de regra de transição adequada pode ser exigida em nome da igualdade, não podendo a nova lei tratar de modo idêntico aos demais aqueles que já estão há anos contribuindo pelas regras revogadas.
3) a supremacia do Poder Constituinte Originário. Para o STF, a inviabilidade do direito adquirido, ato jurídico perfeito e da coisa julgada não pode ser invocada contra o Poder Constituinte Originário ( Recurso Extraordinário número Cento e quarenta mil oitocentos e noventa e quatro, Relator Ministro Ilmar Galvão, julgado em Dez de maio de Mil novecentos e noventa e seis, Primeira Turma, Diário da Justiça de Nove de agosto de Mil novecentos e noventa e seis ) .
4) A validade do termo de adesão previsto na Lei Complementar ( LC ) número Cento e dez / Dois mil e um. O STF editou a Súmula Vinculante número Um, segundo o qual, ofende a garantia constitucional do ato jurídico perfeito a decisão que, sem ponderar as circunstâncias do caso concreto, desconsidera a validez e a eficácia de acordo constante de termo de adesão instituído pela LC número Cento e dez / Dois mil e um.
5) a irretroatividade da lei e o arrependimento do Poder Público. A irretroatividade da lei não pode ser invocada pelo ente estatal que a tenha editado, o que permite que leis novas preservem a mera expectativa de direito ( Súmula número Seiscentos e cinquenta e quatro do STF ), não podendo, após, o Poder Público arrepender-se e questionar a constitucionalidade da própria lei.
6) a irretroatividade da lei o e o Direito Penal. A segurança jurídica é expressamente afastada no caso do Direito Penal, pois a CF - 88 prevê que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu ( Artigo Quinto, Inciso Quarenta da CF - 88 ) .
O direito à segurança jurídica não é absoluto, podendo ser afastado para que prevaleçam outros direitos fundamentais.
Há a possibilidade de invocação da coisa julgada inconstitucional, para permitir a superação da coisa julgada ( mesmo após o prazo da ação rescisória - coisa julgada soberana ), como apregoa o Artigo número Quinhentos e vinte e cinco, Parágrafo Doze, do novo Código de Processo Civil ( CPC ) de Dois mil e quinze, que considera também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tido pelo STF como incompatível com a CF - 88, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
O STF considerou constitucional o afastamento da coisa julgada em casos de execução de sentença transitada em julgado, fundada em norma inconstitucional, nas seguintes hipóteses:
1) a sentença a ser executada esteja frustrada em norma reconhecidamente inconstitucional, seja por
a) aplicar norma inconstitucional,
b) seja por aplicar norma em situação ou com um sentido inconstitucionais
2) a sentença a ser executada tenha deixado de aplicar norma reconhecidamente constitucional;
3) e desde que, em qualquer dos casos acima mencionados, o reconhecimento dessa constitucionalidade ou a inconstitucionalidade tenha decorrido de julgamento do STF realizado em data anterior ao trânsito em julgado da sentença a ser executada ( Recurso Extraordinário número Seis centos e um mil quinhentos e oitenta, Relator para o Acórdão Ministro Edson Fachin, julgado em Vinte de setembro de Dois mil e dezoito, Publicado em Informativo número novecentos e dezesseis, tema número Trezentos e sessenta )
Também foi afastada a coisa julgada em ação de investigação de paternidade, para fazer valer o direito à identidade ( * 2 vide nota de rodapé ) genética, tendo o STF decidido que o princípio da segurança jurídica não pode prevalecer em detrimento da dignidade da pessoa humana ( *3 vide nota de rodapé ), sob o prisma do acesso à informação ( *4 vide nota de rodapé ) genética e da personalidade do indivíduo ( Recurso Extraordinário número trezentos e sessenta e três mil oitocentos e oitenta e nove, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado em sete de abril de Dois mil e onze, Plenário, Informativo número Seiscentos e vinte e dois, com repercussão geral ) .
P.S.:
Notas de rodapé:
* A regra geral da irretroatividade, como característica dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/06/direitos-humanos-doutrinas-e_8.html .
*2 O direito à identidade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/06/direitos-humanos-aplicacao-do-direito.html .
*3 O direito à dignidade da pessoa humana, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-dignidade-humana-e.html .
*4 O direito ao acesso à informação, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/09/direitos-humanos-o-direito-ao-acesso.html .
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