terça-feira, 14 de maio de 2024

Direitos Humanos: o direito dos indígenas e seu impacto sobre o direito processual

Inicialmente, o Artigo Duzentos e trinta e dois da Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) ( * vide nota de rodapé ) prevê a legitimatio ad causam aos indígenas, suas comunidades e organizações na defesa de direitos ou interesses coletivos indígenas ( *2 vide nota de rodapé ). Desse dispositivo ( *3 vide nota de rodapé ), há as seguintes consequências:

Administrador Cláudio Márcio Araújo da Gama ( registrado no Conselho Regional de Administração de Santa Catarina - CRA/SC - sob o número Vinte e quatro mil seiscentos e setenta e três ) ( de chapéu ) , então secretário - Geral do Conselho Estadual dos Direitos Humanos de SC ( CEDH/SC ) com indígenas em Florianópolis, em Dois mil e vinte e dois . Foto: divulgação .

1) não elimina a necessidade de capacidade postulatória, por intermédio de advogado;

2) não são direitos individuais ( *4 vide nota de rodapé ) de um indígena, mas sim direitos coletivos ( *5 vide nota de rodapé );

3) pode a comunidade indígena, os indígenas e suas organizações ocuparem a condição de autor, oponente ou assistente ( " ingressar em juízo em defesa de seus direitos " na linguagem da CF  - 88 ), mas não cabe a condição de réu;

4) há a possibilidade de atuação concorrente, como substituto processual, do Ministério Público Federal ( MPF ), da Fundação Nacional do Índio ( FUNAI ) e da União Federal, uma vez que o Artigo Cento e nove, Inciso Onze, da CF - 88 estabelece que compete aos juízes federais julgar e processar a " disputa sobre direitos indígenas " . Caso não seja o autor, o MPF atuará nessas causas como custos legis ( guardião da lei ) .


Quanto à competência do juízo federal para as causas indígenas, após diversas oscilações  na jurisprudência, foi editada a Súmula número Cento e quarenta do Superior Tribunal de Justiça ( STJ ), que prevê: " Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o indígena figure como autor ou vítima " . a lógica adotada foi a restritiva, sendo competência da Justiça Federal criminal somente os crimes que fossem realizados em contexto de " disputa sobre  direitos indígenas " . Um crime contra um indígena ou cometido por um indígena sem relação com essa " disputa sobre direitos indígenas " seria da competência do juízo estadual .


Anteriormente no STF, a competência criminal da Justiça Federal na matéria indígena era total, englobando inclusive crimes cometidos por indígena ou contra indígena em particular, conforme precedentes dos anos Noventa do Século Vinte .Nesse sentido, decidiu o STF: " Caso em que se disputam direitos indígenas. Todos os direitos ( a começar pelo direito á vida - *6 vide nota de rodapé ) que possa ter uma comunidade indígena ou um indígena em particular estão sob a rubrica do Inciso Onze do Artigo Cento e nove da CF - 88 " ( Habeas Corpus número Setenta e um mil oitocentos e trinta e cinco - dígito verificador número Três / Mato Grosso do Sul, Relator Ministro Francisco Rezek, Diário da Justiça da União de Vinte e dois de novembro de Mi novecentos e noventa e seis ) .


Contudo, no Século Vinte e um, a jurisprudência do STF modificou  - se profundamente e adotou o entendimento restritivo do Artigo Cento e nove, Inciso onze, com votos vencidos. O leading case foi o julgamento do Recurso Extraordinário número Quatrocentos e dezenove mil quinhentos e vinte e oito, Relator para o Acórdão Ministro Cezar Peluso, julgado em três de agosto de Dois mil e seis, Plenário, Diário da Justiça de Nove de março de Dois mil e sete ) .


No tocante à competência cível, o STF mantém o mesmo raciocínio, sendo competente a Justiça Federal apenas no trato de matéria envolvendo a comunidade indígena, como, por exemplo, disputas fundiárias ou temas de direitos difusos envolvendo a cultura indígena. Casos individuais, nos quais o indígena é autor ou réu, devem ser apreciados pela Justiça Estadual .


O MPF buscou, em Dois mil e treze, reverter essa jurisprudência em caso de maus-tratos a menor indígena, mas, novamente, o STF fez valer a atual jurisprudência, confirmando a competência da Justiça Estadual ( STF, Agravo de instrumento número Setecentos e noventa e quatro mil quatrocentos e quarenta e sete - Agravo Regimental, Relator Ministro Marco Aurélio, julgado em Vinte e quatro de setembro de Dois mil e treze, Primeira Turma, Diário da Justiça eletrônico de Vinte e um de novembro de Dois mil e treze ) .


Quanto ao tratamento processual privilegiado, o Artigo Sessenta e um do Estatuto do Índio dispõe que " são extensivos aos interesses do Patrimônio Indígena os privilégios da Fazenda Pública, quanto à impenhorabilidade de bens, rendas e serviços, ações especiais, prazos processuais, juros e custas " . Nesse sentido, decidiu o STJ a favor da Comunidade Indígena Gavião, reconhecendo o prazo em dobro para recorrer ( Agravo de Recurso Especial número Dois mil e sete ponto Dois ponto Duzentos e quarenta e nove mil e noventa, Relator Ministro Francisco Falcão, Diário da Justiça eletrônico de Dezesseis de abril de Dois mil e oito ) . Por outro lado, o Artigo Sessenta e três do mesmo Estatuto exige que nenhuma medida judicial seja concedida liminarmente em causas indígenas, sem prévia audiência da União e da Fundação Nacional do Índio 9 FUNAI ) . Também nesse sentido, o STJ decidiu pela nulidade de decisão que concedeu liminar de reintegração de posse de terras em processo de demarcação, na qual não foram ouvidos a União e a FUNAI ( Recurso Especial número Dois mil e seis ponto Zero zero ponto Oitocentos e cinquenta e dois mil oitocentos e cinquenta e quatro, Relator Ministro Castro Meira, Diário da Justiça de Vinte e três de abril de Dois mil e sete ) . 


P.S.:


Notas de rodapé:


* Os direitos dos indígenas na Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-direito-dos_29.html .


*2 Anjos Filho, roberto dos. Artigos Duzentos e trinta e um e Duzentos e trinta e dois. In: Bonavides, Paulo; Miranda, Jorge; Agra, Walber de Moura ( Organizadores ) . Comentários à Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito. São Paulo: Forense, Dois mil e nove, Página Dois mil quatrocentos e vinte e seis .


*3 Os dispositivos e princípios constitucionais sobre o direito dos indígenas na Constituição Federal de mio novecentos e oitenta e oito são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-direito-dos_30.html .


*4 Os direitos  individuais, no contexto dos Direitos Humanos, são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-os-direitos.html .


*5 Os direitos coletivos, no contexto dos Direitos Humanos, são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-quando-os-dh-vao-alem.html .


*6 O direito á vida, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/04/direitos-humanos-doutrinas-e.html .  

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