terça-feira, 7 de maio de 2024

Direitos Humanos: o direito dos indígenas e o diálogo entre as Cortes

A Corte Interamericana de Direitos Humanos ( Corte IDH ) ( * vide nota de rodapé ) construiu ampla jurisprudência na temática do direito indígena, fixando parâmetros interpretativos para a proteção dos direitos indígenas na região. Dentre esses casos internacionais, seis tratam diretamente do denominado  " direito à propriedade coletiva, comunal ou ancestral dos povos indígenas " ( *2 vide nota de rodapé ) . A Começar pelo instituto jurídico escolhido, a Corte IDH opta pela propriedade coletiva, diferentemente da Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) ( *3 vide nota de rodapé ), que se utiliza da posse e do usufruto exclusivo como instrumentos de garantia do direito á terra das populações indígenas . Essa opção decorre da interpretação do Artigo Vinte e um da Convenção Americana de Direitos Humanos ( CADH ) ( *4 vide nota de rodapé ) ( propriedade privada ), em especial em face da Convenção número Cento e sessenta e nove da Organização Internacional do Trabalho ( OIT ) .

Administrador Cláudio Márcio Araújo da Gama ( registrado no Conselho Regional de Administração de Santa Catarina - CRA/SC - sob o número Vinte e quatro mil seiscentos e setenta e três ) ( de chapéu ),  então Secretário - Geral do Conselho Estadual de Direitos Humanos de SC ( CEDH/SC ) com indígenas em Florianópolis em Dois mil e vinte e dois .


Nesse sentido, a Corte IDH decidiu, no caso Moivana versus Suriname, que, na hipótese da posse da terra ter sido perdida por motivos alheios à vontade  dos indígenas, esses continuam os proprietários, salvo se, mesmo sem posse, acabaram vendendo - as a terceiros de boa-fé ( Corte IDH, Comunidade Moivana versus Suriname, sentença de Quinze de junho de Dois mil e cinco ) . Essa hipótese da venda é descartada pela CF - 88 ( são propriedade da União ), mas constitui um parâmetro valioso nos casos em que o ordenamento nacional permite tal alienação .


A Corte IDH também analisou a situação da perda da posse pelos indígenas involuntariamente com o agravante de, após, suas, terras tenham sido vendidas a terceiros de boa-fé . Nesse caso, os  indígenas possuem o  direito de recuperá - las ou de obter terras de igual extensão e qualidade ( Corte IDH ),  Comunidade Indígena Yakye Axa versus Paraguai, sentença de Dezessete de junho de Dois mil e cinco ) . Essa situação é similar aos fatos do caso Guyráoka, no qual o não indígena possuía o título de propriedade da terra que havia adquirido presumidamente de boa-fé .


No que tange ao limite temporal à recuperação das  terras tradicionais, a Corte IDH decidiu que, enquanto o vínculo espiritual e material da identidade dos povos indígenas continuar existente em relação às suas  terras tradicionais, é cabível a  reivindicação; caso contrário, não há mais o direito de recuperação de tais terras . a determinação do " vínculo entre a comunidade indígena e a terra " só pode ser aferido no caso concreto, devendo incluir a análise do seu uso ou presença tradicional, seja através de laços espirituais ou cerimoniais; assentamentos ou cultivos esporádicos; caça, pesca, coleta ( permanente ou nômade ); uso dos recursos naturais ligados a seus costumes ou qualquer outro elemento característico de sua cultura ( Corte IDH, Comunidade Indígena Sawhoyamaxa versus Paraguai, sentença de Vinte e nove de março de Dois mil e seis, em especial, Parágrafo Cento e trinta e um ) .


Nas situações em que tenha ocorrido qualquer forma de impedimento de acesso à terra por causas alheias á vontade dos indígenas e que impliquem em obstáculo real para a manutenção dessa relação - com o emprego de violência, ameaça, etc. - ( o chamado " renitente esbulho " em sentido amplo - *5 vide nota de rodapé ), o direito á recuperação da terra persistirá até que os impedimentos desapareçam ( corte IDH, comunidade indígena Sawhoyamaxa versus Paraguai, sentença de Vinte e nove de março de Dois mil e seis, em especial, Parágrafo Cento e trinta e dois ) .


A jurisprudência da Corte IDH sobre os direitos dos indígenas à propriedade coletiva da terra assemelha - se ao conteúdo da teoria do indigenato, pela qual o vínculo material e espiritual dos indígenas em relação á terra são suficientes para declarar a existência do direito a ela, dispensando - se o critério do marco temporal ( no caso, a edição da CF - 88 ) . Nota - se, assim, a necessidade de efetivo diálogo entre as cortes ( Corte IDH e Supremo Tribunal Federal - STF ), que caso não seja feito, pode levar ao controle de convencionalidade de matriz internacional a ser realizado pelo Corte IDH a ser realizado pela Corte IDH, impondo ao Brasil deveres de reparação pela violação do Artigo Vinte e um da CADH ( *6 vide nota de rodapé )  


P.S.:


Notas de rodapé:


* A Corte Interamericana de Direitos Humanos é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-corte-interamericana.html .


*2 Comunidade indígena Xákmok Kásek versus Paraguai ( Dois mil e dez ); Povo Saramaka versus Suriname ( Dois mil e sete ); Comunidade indígena Sawhoyamaxa versus Paraguai ( Dois mil e seis ); Comunidade Moiwana ( Sumo ) Awas Tingni versus Nicarágua ( Dois mil e um ) .


*3 O direito indígena na Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/04/direitos-humanos-o-direito-dos_29.html .


*4 A Convenção Americana de Direitos Humanos é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-convencao-americana.html .


*5 O direito indígena às terras esbulhadas, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2024/05/direitos-humanos-o-direito-dos_6.html .


*6 Sobre a temática, ver o indispensável estudo de Pegorari, Bruno. " O choque de jurisdições e o diálogo das togas: uma proposta dialógica para o conflito interpretativo entre o STF e a Corte IDH em matéria de direito á propriedade coletiva para os povos indígenas " . In: Wagner Menezes ( Organizador ) . Direito Internacional em expansão. Belo horizonte: Arraes, Dois mil e dezesseis, Volume Sexto, Páginas Quatrocentos e oitenta e um a Quinhentos .   

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