sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Direitos Humanos: golpistas bolsonaristas podem responder por crime contra o Estado Democrático de Direito

Os manifestantes golpistas que invadiram neste domingo ( Oito de janeiro de Dois mil e vinte e três a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, podem responder por crime contra o Estado democrático de Direito. Especialistas avaliam se os invasores e a omissão das autoridades podem ser punidas.


Manifestantes golpistas invadiram Congresso, STF e Palácio do Planalto ( Foto : Marcelo Camargo / Agência Brasil )

O que aconteceu em Brasília concretizou o temor de que a escalada da violência em atos antidemocráticos após as eleições resultassem em um episódio semelhante a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos da América ( EUA ), em Dois mil e vinte e um.

— Se a gente pode chamar o que acontece hoje de nossa invasão do Capitólio, nós temos no Artigo Trezentos e cinquenta e nove - L do Código Penal ( CP ) o crime equivalente ao delito de insurreição — afirma Diego Nunes, professor de história do direito penal da Universidade Federal de Santa Catarina ( UFSC ).

O Artigo citado por Nunes foi acrescentado pela Lei do Estado Democrático de Direito ( LEDD ), que foi sancionada em Dois mil e vinte e um para substituir a Lei de Segurança Nacional ( LSN ), da ditadura militar. Ele prevê a reclusão de Quatro a Oito anos para quem "tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais".

Autoridades no Direito de diversas universidades do país avaliam a situação que ocorreu em Brasília e como os invasores e o poder público omisso pode ser enquadrado, além de explicar se Jair Bolsonaro pode responder criminalmente por incitação às manifestações golpistas.

Entenda os crimes na invasão golpista


Quais são os crimes na invasão à Esplanada dos Ministérios?

Especialistas em direito penal apontam violações previstas pela LEDD - sancionada em Dois mil e vinte e um. Uma análise comum é de que os manifestantes poderão responder pelo crime de abolição violenta do EDD. A pena é de quatro a oito anos. A punição pode ser ainda maior, caso tenham sido cometidos outros crimes.

— Poderia pensar na hipótese de restrição, prevista nesse Artigo, porque com a depredação das instalações físicas, você vai ter uma restrição a realização de sessões nos próximos dias porque a depredação foi bastante grande — afirma Nunes.

A advogada criminalista Flávia Rahal afirma que a caracterização é possível pela invasão dos prédios públicos, depredação e pelo simbolismo dos espaços ocupados. "Há uma mensagem clara que é atentatória da democracia", diz.

Outros especialistas consideram que é possível ir além e caracterizar a invasão como crime de golpe de Estado, definido como a tentativa de "depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído". A pena pode chegar a Doze anos e aumentar caso tenham sido cometidos outros delitos.

— Essa invasão fere cada um dos brasileiros e brasileiras, porque fere as instituições do EDD. As pessoas que fizeram devem ser processadas e, em flagrante, presas — afirma o professor de direito processual penal da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo  ( PUC-SP ), Cláudio Langroiva.

Para ele, o que aconteceu em Brasília não pode ser enquadrado como manifestação crítica aos Poderes.

Há um dispositivo no texto que afirma que não é crime "a manifestação crítica aos Poderes constitucionais nem a atividade jornalística ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais".

— Não estamos falando de manifestações políticas, pacíficas, greves ou manifestações de qualquer natureza. É uma manifestação violenta, com uso de arma e ameaça às pessoas — diz Langroiva.

Para Lênio Streck, professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos do Rio Grande do Sul ( Unisinos - RS ) e um dos autores da nova lei, o Artigo pode ser aplicado contra líderes e organizadores da invasão.

Além dessas condutas, também é apontado o crime de dano e incitação ao crime, previsto no CPA advogada criminalista e professora da Fundação Getúlio Vargas - Direito de São Paulo( FGV - Direito - São Paulo ), Raquel Scalcon, cita ainda a possibilidade de responsabilização a partir da Lei número Doze mil oitocentos e cinquenta de Dois mil e treze, sobre organizações criminosas. Ela reforça que a prisão em flagrante é possível tanto durante como depois dos crimes.

No caso das autoridades se omitirem, qual é a responsabilização possível?

Caso fique comprovado que houve omissão por parte das autoridades responsáveis, Langroiva afirma que ficaria caracterizado o crime de prevaricação. Definido como retardar ou deixar de agir para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, o delito tem penal de até um ano, além de multa.

Para o advogado Alexandre Wunderlich, professor do Instituto de Direito Penal ( IDP ), em Brasília, e da PUC do Rio Grande do Sul ( RS ), a postura das autoridades no episódio deve ser investigada, assim como o financiamento e a organização do ataque à democracia.

— O mais grave é que aparentemente [ a invasão ] pode ter ocorrido conivência de órgãos policiais, o que impõe pronta investigação. As condutas afetam as instituições democráticas no seu funcionamento e regularidade — diz ele, que é autor do livro "Crime Político, Segurança Nacional e Terrorismo".

Bolsonaro pode ser responsabilizado pela invasão?

O ex-presidente pode ser responsabilizado caso exista provas de seu envolvimento na invasão golpista.

— A responsabilidade criminal depende de se comprovar que tenha de algum modo contribuído: incitando, instigando, orquestrando. Ademais, se ele estava ainda no Poder e nada fez para impedir, também aqui poderia haver responsabilidade criminal pela omissão — afirma Raquel.

Diego Werneck, professor do Insper, considera que Bolsonaro deveria ter sofrido impeachment por incitar as pessoas contra as instituições ao longo do mandato.

— Agora que saiu do cargo, os instrumentos e critérios para apurar responsabilidade são outros. No mínimo, se entendermos que o que ocorreu hoje em Brasília foi crime, seria necessário discutir a responsabilidade penal de Bolsonaro por ter incitado — diz.

Saiba o que diz o CP


Crimes de Invasão


Artigo Duzentos e oitenta e seis: Incitar, publicamente, a prática de crime

  • Pena: detenção, de três a seis meses, ou multa.
  • A mesma pena será aplicada para quem incita, publicamente, animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os Poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade.

Artigo Duzentos e oitenta e oito: associarem-se três ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes

  • Pena: reclusão, de um a três anos
  • A pena aumentará até a metade se a associação for armada ou se houver a participação de criança ou adolescente.

Crimes de Prevaricação

Artigo Trezentos e dezenove: Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal


  • Pena: detenção, de três meses a um ano, e multa

Crimes Contra as Instituições Democráticas

Artigo Trezentos e cinquenta e nove - L: tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o EDD, impedindo ou restringindo o exercício dos Poderes constitucionais

  • Pena: reclusão, quatro a oito anos, além da pena correspondente à violência.

Artigo Trezentos e cinquenta e nove - M: tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído.


  • Pena: reclusão, de quatro a doze anos, além da pena correspondente à violência.

Com informações de:

Géssica Brandino e Mayara Souto ( mayara.collar@nsc.com.br ) .

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