A pena criminal foi regrada pela Constituição Federal de Mil novecentos e oitenta e oito ( CF - 88 ) uma vez que representa importante limitação do direito à liberdade.
Eis as principais características constitucionais das penas:
1) Princípio da pessoalidade, intranscendência, incontangibilidade ou intransmissibilidade da pena. " A pena criminal é personalíssima, não podendo passar da pessoa do condenado. Por isso, o Supremo Tribunal Federal ( STF ) já decidiu que viola o princípio da incontangibilidade da pena criminal determinada decisão judicial que permite ao condenado fazer - se substituir, por terceiro absolutamente estranho ao ilícito penal, na prestação de serviços á comunidade " ( Habeas Corpus número Sessenta e oito mil trezentos e nove, Relator Ministro Celso de Mello, julgado em Vinte e sete de novembro de Mil novecentos e noventa, Primeira Turma, Diário da Justiça de Oito de março de Mil novecentos e noventa e um ) .
2) Princípio da individualização da pena. A CF - 88 exigiu que a lei regulasse a individualização da pena, podendo prever, entre outras,
a) pena de privação o u restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos.
Esse princípio reflete - se nos três momentos do processo de formação da resposta punitiva do Estado:
a) o legislativo ( no qual ficam estabelecidas as penas e seus limites máximo e mínimo ),
b) o judicial ( na sentença, com a dosimetria da pena e eventual penas substitutivas, bem como nas decisões sobre o regime de cumprimento de pena ) e
c) o executivo ( com a concessão da graça, ou indulto ) .
Nos últimos anos, houve intensa análise do princípio da individualização da pena no STF, produzindo as seguintes posições:
a) A proibição em abstrato da progressão de regime de cumprimento de pena nos crimes hediondos ( prevista originalmente na Lei de Crimes Hediondos - * vide nota de rodapé - , Lei número Oito mil e setenta e dois / Mil novecentos e noventa ) foi declarada inconstitucional pelo STF em Dois mil e seis, por violar a individualização da pena, que foi tida como garantia individual ( Habeas Corpus número Oitenta e dois mil novecentos e cinquenta e nove, Relator Ministro Marco Aurélio Mello, julgado em Vinte e três de fevereiro de Dois mil e seis, Plenário, Diário da Justiça de Primeiro de setembro de Dois mil e seis ) . Após, foi editada a Súmula Vinculante número Vinte e seis, de Dois mil e nove: " Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena pro crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do Artigo Segundo da Lei número Oito mil e setenta e dois, de Vinte e cinco de julho de Mil novecentos e noventa, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico " . Atualmente, a Lei número Oito mil e setenta e dois prevê que a progressão de regime será feita após o comprimento de Dois quintos da pena se o apenado for primário, e de Três quintos se reincidente ( Lei número onze mil quatrocentos e sessenta e quatro, de Dois mil e sete ) .
b) Também em nome do princípio da individualização da pena, o STF decidiu também que a lei não pode, em abstrato, proibir a substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos ( habeas Corpus número Noventa e sete mil duzentos e cinquenta e seis, Relator Ministro Ayres Britto, julgado em Primeiro de setembro de Dois mil e dez, Plenário, Diário da Justiça eletrônico de Dezesseis de dezembro de Dois mil e dez ) .
c) para o STF, " a imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea " ( Súmula número Setecentos e dezenove ) .
d) também o STF decidiu que " admite - se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória " ( Súmula número Setecentos e dezesseis ) .
e) para o STF, " a pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo Artigo número Setenta e cinco do Código Penal 9 CP ), não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução " ( Súmula número Setecentos e quinze ) .
3) Penas proibidas. A CF - 88 determinou a proibição das penas:
a) de morte ( *2 vide nota de rodapé ), salvo em caso de guerra declarada, nos termos do Artigo número Oitenta e quatro, Inciso Dezenove;
b) de caráter perpétuo ( *3 vide nota de rodapé );
c) de trabalhos forçados ( *3 vide nota de rodapé );
d) de banimento ( *3 vide nota de rodapé );
e) cruéis ( *4 vide nota de rodapé )
O STF já decidiu que:
a) A medida de segurança criminal também tem prazo máximo de Trinta a nos, pois a CF / 88 veda prisão de caráter perpétuo. Eventual necessidade de internação por prazo adicional deve ser discutida no juízo cível ( Habeas Corpus número Oitenta e quatro mil duzentos e dezenove, Relator Ministro Marco Aurélio, julgado em Dezesseis de agosto de Dois mil e cinco, Primeira Turma, Diário da Justiça de Vinte e três de setembro de Dois mil e cinco ) .
b) Também não pode ser perpétua a pena de inabilitação para o exercício de cargos de administração ou gerência de instituições financeiras ( Recurso Extraordinário número Cento e cinquenta e quatro mil cento e trinta e quatro, Relator ministro Sydney Sanches, julgado em Quinze de dezembro de Mil novecentos e noventa e oito, Primeira Turma, Diário da Justiça de Vinte e nove de outubro de Mil novecentos e noventa e nove ) .
4) O dever do Estado de propiciar diferentes tipos de estabelecimentos prisionais. A CF - 88detreminou que o indvíduo que perde a liberdade tem o direito fundamental de cumprir sua pena em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e seu gênero. Em virtude de caos do sistema prisional brasileiro, com superlotação de presídios e falta de vagas em regimes semiaberto e aberto, esse tema foi intensamente discutido no STF, que decidiu o seguinte:
a) " Não pode o juiz determinar que o preso continue no regime fechado, se o único óbice à progressão e regime é ausência de vaga em colônia penal agrícola ou colônia penal industrial ou em estabelecimento similar. A solução, é dar - lhe o direito de permanecer em liberdade, até que o Poder Público providencie vaga em estabelecimento apropriado, não podendo ser mantido em prisão domiciliar que é destinada para outras hipóteses " ( Habeas Corpus número Oitenta e sete mil novecentos e oitenta e cinco, Relator Ministro Celso de Mello, julgado em Vinte de março de Dois mil e sete, Segunda turma, Informativo número Quatrocentos e sessenta ) . Em outra linha, o STF reconheceu o direito até mesmo, na falta de vagas, à conversão da prisão em prisão domiciliar, pois " incumbe ao Estado aparelhar - se visando á observância irrestrita das decisões judiciais. Se não houver sistema capaz ade implicar o cumprimento da pena em regime semiaberto, dá - se a transformação em aberto e , inexistente a casa do albergado, a prisão domiciliar " ( Habeas Corpus número Noventa e seis mil cento e noventa e seis, Relator Ministro marco Aurélio, julgado em Vinte e cinco de agosto de Dois mil e nove, Primeira Turma. Diário da Justiça de Nove de outubro de Dois mil e nove ) .
b) Finalmente, em Dois mil e dezesseis, foi editada a Súmula vinculante número Cinquenta e seis, com o seguinte teor: " A falta de estabelecimento penal adequado a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como " colônia agrícola, industrial " regime semiaberto ) ou " causa de albergado ou estabelecimento adequado " ( regime aberto ) . No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado .
b ii )No caso de déficit de vagas, deverão ser determinadas:
a) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas;
b) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas;
c) o cumprimento de penas restritivas de direito e / ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto.
b iii ) Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado .
Por sua vez, em virtude de inexistência de vagas no regime semiaberto ( o regime de cumprimento previsto na sentença ), o STF reverteu decisão da Justiça paulista ( que havia mantido o preso em regime fechado, mais gravoso que o previsto na sentença ) para determinar o cumprimento da pena em prisão domiciliara até o surgimento de vaga no regime semiaberto. Para o Ministro Barroso, manter o preso em regime mais gravoso pela inexistência de vaga criada pelo Estado no regime adequado é clara violação da Súmula vinculante número Cinquenta e seis ( STF, Reclamação número Vinte e quatro mil oitocentos e noventa e dois, decisão de Onze de outubro de Dois mil e dezessete ) .
c) " O direito à prisão especial, antes da prisão por sentença definitiva, deve ser assegurado, conforme o disposto no Artigo Duzentos e noventa e cinco do Código de Processo Penal ( CPP ) e ainda em leis diversas ( Lei Complementar número Setenta e cinco / Mil novecentos e noventa e três, para os membros do Ministério Público ( MP ) e Lei Complementar número Oitenta / Mil novecentos e noventa e quatro, para os membros da Defensoria Pública ( DP ) .Para o STF, atende à prerrogativa profissional do advogado ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, em cela individual, dotada de condições regulares de higiene, com instalações sanitárias satisfatórias, sem possibilidade de contato com presos comuns ( Habeas Corpus numero Noventa e três mil trezentos e noventa e um, Relator ministro Cezar Peluso, julgado em Quinze de abril de Dois mil e oito, Segunda turma, Diário da Justiça eletrônico de Nove de maio de Dois mil e oito ) .
5) Execução da pena. A CF - 88 assegurou aos presos o respeito à integridade física e moral ( *5 vide nota de rodapé ). Além disso, de acordo com o Artigo Quinto, Parágrafo Segundo, o Brasil deve respeito às regras internacionais de proteção aos direitos dos reclusos ( editadas pela Organização das Nações Unidas - ONU - *6 vide nota de rodapé ). A CF - 88 também fez previsão do direito ao aleitamento materno ( *7 vide nota de rodapé ).
6) Transexuais. Direito das transexuais femininas ao cumprimento de pena em presídios femininos, de acordo com a sua identidade de gênero ( *8 vide nota de rodapé ). Diante da necessidade de assegurar o respeito à dignidade humana ( *9 vide nota de rodapé ), à liberdade, à igualdade ( *10 vide nota de rodapé) por orientação de gênero, as transexuais femininas têm o direito de cumprir pena em presídios femininos. O Ministro Barroso, em sua decisão, salientou a dupla vulnerabilidade á qual os transexuais e travestis estão sujeitos, decorrente tanto da situação desencarceramento quanto da identidade de gênero. Essa dupla vulnerabilidade indica que pessoas pertencentes a tais grupos sofrem mais exclusão e violência, gerando situações equiparáveis a atos de tortura ( *11 vide nota de rodapé ) e tratamento cruel, devendo o Estado adotar medidas de prevenção. Os Princípios de Yogyakarta ( *8 vide nota de rodapé ) exigem que as pessoas presas participem de decisões relacionadas ao local de detenção adequado a sua orientação e identidade de gênero ( Princípio número nove ). Assim, o encaminhamento de transexuais femininas a presídios femininos é providência " necessária a assegurar a sua integridade física e psíquica, diante do histórico de abusos perpetrados contra essas pessoas em situação de encarceramento. Não há, no caso, uma opção aberta ao Poder Público sobre como tratar esse grupo, mas uma imposição que decorre dos princípios constitucionais da dignidade humana, da liberdade, da autonomia, da igualdade, do direito à saúde e da vedação ao tratamento cruel e á tortura " STF, Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de preceito Fundamental - ADPF - número Vinte e sete, decisão monocrática do Ministro Luís Roberto Barroso, de Vinte e seis de junho de Dois mil e dezenove ) .
7) Lei Anticrime e o regime jurídico das penas. A Lei Anticrime modificou o tempo máximo do cumprimento de pena privativa de liberdade, que agora não pode ser superior a Quarenta anos ( Artigo Setenta e cinco - antes o limite era trinta anos ) . Também foram alteradas as regras de progressão de regime, com maior rigor em especial para aqueles
a) condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado do livramento condicional;
b) condenados por exercer o comando de organização estrutura para a prática de crime hediondo ou equiparado;
c) condenados pela prática do crime de constituição de milícia privada ( devem ser cumpridos Cinquenta por cento da pena em regime fechado ).
Os maiores percentuais de cumprimento de pena como requisito de progressão para os reincidentes em crime hediondo ou equiparado com resultado morte.
P.S.:
Notas de rodapé:
* A vedação aos crimes hediondos, no contexto dos Direitos Humanos, é melhora detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/10/direitos-humanos-vedacao-aos-crimes.html .
*2 A vedação à pena de morte, com exceções, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/05/direitos-humanos-o-direito-vida-versus.html .
*3 A vedação à pena de caráter perpétuo, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/06/direitos-humanos-doutrinas-e_64.html .
*4 A vedação apenas cruéis, no contexto dos Diretos Humanos, é melhor detalhada em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/11/direitos-humanos-comite-e-constituido.html .
*5 O direito à integridade física e moral, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/06/direitos-humanos-o-direito-integridade.html .
*6 Os direitos dos reclusos, no contexto dos Direitos Humanos, são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2021/06/direitos-humanos-doutrinas-e_22.html .
*7 Os direitos das mulheres reclusas, no contexto dos Direitos Humanos, são melhor detalhados em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-as-regras-para-o.html .
*8 O direito à identidade de gênero, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/06/direitos-humanos-aplicacao-do-direito.html .
*9 O princípio da dignidade humana, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/03/direitos-humanos-dignidade-humana-e.html .
*10 O direito à igualdade, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2023/05/direitos-humanos-o-direito-igualdade-e_16.html .
*11 A prevenção e punição à tortura, no contexto dos Direitos Humanos, é melhor detalha em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/10/direitos-humanos-convencao-previne-e.html .
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