O preâmbulo do Estatuto de Roma ( ER ) ( * vide nota de rodapé ) dispõe que "é dever de cada Estado exercer a respectiva jurisdição penal sobre os responsáveis por crimes internacionais". Logo, estabeleceu-se mais um exemplo da subsidiariedade da jurisdição internacional, tal qual ocorre com os tribunais internacionais de Direitos Humanos ( DH ). O princípio que espelha essa subsidiariedade é o princípio da complementaridade. Por esse princípio, o Tribunal Penal Internacional ( TPI ) ( *2 vide nota de rodapé ) não exercerá sua jurisdição caso o Estado com jurisdição já houver iniciado ou terminado investigação ou processo penal, salvo se este não tiver "capacidade" ou "vontade" de realizar justiça. Nesse ponto, o próprio Estado Parte pode solicitar a intervenção do TPI ou ainda o próprio TPI pode iniciar as investigações e persecuções criminais. Assim, a jurisdição internacional penal é complementar á jurisdição nacional e só poderá ser acionada se o Estado não possuir vontade ou capacidade para realizar justiça e impedir a impunidade.
Além disso, o caso é também inadmissível se a pessoa em causa já tiver sido julgada nacionalmente pela conduta a que se refere a denúncia, salvo se o julgamento doméstico tenha sido um simulacro para obter a impunidade e, finalmente, se o caso não for suficientemente grave para justificar a ulterior intervenção do TPI.
A fim de determinar se há ou não vontade ou capacidade de um Estado em agir em um determinado caso, o TPI, tendo em consideração as garantias de um processo equitativo reconhecidas pelo Direito Internacional, deve verificar a existência de uma ou mais das seguintes circunstâncias:
1) intenção evidente do Estado de usar o processo nacional para subtrair a pessoa em causa á sua responsabilidade criminal por crimes da competência do Tribunal, gerando impunidade;
2) delonga injustificada no processo;
3) condução tendenciosa e parcial, ou seja, incompatível com a intenção de fazer justiça;
4) eventual colapso total ou substancial da respectiva administração da justiça, que, assim, não está em condições de realizar ou concluir o processo..
O Artigo Vinte, Parágrafo terceiro, do ER chega ao ponto de esclarecer que o TPI não julgará de novo o criminoso, salvo se o processo criminal nacional tiver sido feito para obtenção da impunidade. Quem decide se o julgamento nacional, mesmo que chancelado pela Suprema Corte local, foi um simulacro para a obtenção da impunidade? O próprio TPI.
Assim, o princípio da complementaridade é complexo, pois, a cada um primeiro olhar, evita conflito com as jurisdições locais ao remeter a jurisdição do TPI a um papel secundário, "complementar", bem diferente do princípio da primazia assumido pelos tribunais ad hoc penaais para a ex-Iugoslávia e Ruanda.
Porém, em um olhar mais atento, cabe ao próprio TPI definir se a jurisdição nacional agiu a contento, podendo inclusive desconsiderar a coisa julgada local que, na sua visão, serviu para camuflar a impunidade, o que implica manter, sempre nas mãos internacionais, o poder de instaurar ou não os processos contra esses criminosos no TPI.
Quanto ao regime jurídico dos crimes sujeitos à jurisdição do TPI, cabe notar que:
1) Os crimes são imprescritíveis ( Artigo Vinte e nove ).
2) Nenhuma imunidade é admitida ( Artigo Vinte e sete ). Não é imunidade a regra prevista no Artigo Noventa e oito do ER, pelo qual um Estado Parte no TPI pode deixar de colaborar com o Tribunal e não entregar uma pessoa procurada, caso tenha acordo nesse sentido ( da não entrega ) com outro país. Se o TPI lograr cumprir o mandado de captura, a pessoa não poderá alegar imunidade.
P.S.:
Notas de rodapé:
* O Estatuto de Roma é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-um-tribunal.html .
*2 O Tribunal Penal Internacional é melhor detalhado em: https://claudiomarcioaraujodagama.blogspot.com/2022/01/direitos-humanos-um-tribunal.html .
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